Volume 1

Capítulo 39: Prince e o Exército sem Alma

Éh! É o Ray, só pode ser, ele é amaldiçoado e amaldiçoa todos ao seu redor! Aziago!

Baltazar deixa Ray no quarto do sacerdote, volta para o salão, mata um inimigo e puxa Onurb, para trancar a porta do corredor. Eles bloqueiam o caminho e voltam para o quarto onde está Ray. Ali, Onurb abre uma passagem secreta na parede.

— Achei essa passagem quando vasculhei o quarto.

— Perfeito.

Baltazar coloca Ray novamente em seu ombro e sai junto com Onurb, que destrói o mecanismo da passagem secreta para que não sejam seguidos.

Eles passam por um túnel iluminado com cristais de luz fraca, mas dá para ver o caminho, que é longo, e passam por esgotos, corredores estreitos, muita sujeira e cheiro ruim.

Durante o caminho, Onurb vê algumas saídas para voltar à cidade, mas em todas há pessoas suspeitas. Depois de um tempo, ele acha uma saída vazia, e saem ainda em alerta.

O tempo ainda está nublado e frio. Onurb e Baltazar entram em uma casa vazia. Baltazar coloca Ray deitado em um sofá na sala, e Onurb vistoria a casa.

Quando ele volta a se reunir com Baltazar na sala, Ray desperta, um pouco atordoado.

— O que houve?

— Ray? Que bom que acordou! Você está bem? Se sente bem?

Onurb se aproxima com sua adaga em mãos.

Ei. EI! Se ele fizer algo parecido com aqueles moribundos, eu corto a cabeça dele fora.

— Fica quieto, Onurb, senão eu é que vou cortar a sua.

Onurb cruza os braços, e Ray diz:

— Eu me lembro do sacerdote… E da magia que deixa eles assim.

— Sim, eu ouvi falar antigamente de uma vila que foi controlada por magia, transformando a população em marionetes.

Ray elogia Baltazar.

— Baltazar também é cultura.

— Sempre.

Ray também se lembra dessa história.

— Já ouvi falar também, mas a vila estava viva, estes estão mortos… É uma magia fraca e rara, pois é fácil os enfeitiçados saírem do controle… Mas usada em mortos não se tem resistência, inteligente.

Onurb questiona:

— Mas essa magia não domina a mente? Então deveriam estar vivos.

— Não, por isso é fraca, é uma magia que comanda o sistema nervoso, literalmente uma marionete, por isso é rara de ser usada, pois o corpo fica numa disputa entre o dono e o controlador.

— E por que não usar em objetos?

— O corpo humano ou até mesmo o corpo de uma criatura é mais complexo e dá mais variedade de controle do que um objeto.

— Mas corpos mortos não ficam atrofiados? Seria como controlar objetos.

— Estamos falando de magia, mas se o corpo “morreu” recentemente, a magia o mantém “maleável”, e, pelo que vimos, se cortar o fluxo mágico cortando o pescoço ou a coluna, a magia quebra.

— Mas como todos estes morreram? Alguns têm traços de dano, outros não.

— Pode ter sido por doença ou até mesmo a magia. Precisamos conversar com alguém vivo e consciente aqui da cidade para ter certeza.

— Entendi… Outro ponto é: aonde vamos agora?

— Pelo que me lembro da cidade e da história dela, em caso de ataque eles evacuam para o forte Detroit…

— Ótimo, e você sabe o caminho?

— Sei se eu souber onde estamos.

Ray levanta e anda até a janela da casa. A visão não ajuda, pois ainda está muito nublado. Ele pensa por uns instantes e questiona Onurb e Baltazar:

— Quando vocês vieram para cá, viram algum rio?

Baltazar se recorda:

— Sim, passamos por um, está perto.

— Ótimo, a correnteza dele nos levará para Detroit, vamos seguir o rio.

Onurb elogia:

Hmmm... Você se lembra desses detalhes também?

— Sim, esta cidade é histórica, o líder dela ainda deve ser Ford, um poderoso mágico, ele criou…

Onurb interrompe:

— Ótimo, vamos indo, quando você se empolga conta muita coisa.

Ray, Onurb e Baltazar saem e vão até o rio. Ao longe dá para ver algumas silhuetas. Eles evitam confronto dando volta nas casas sem serem vistos.

No rio, eles avistam um pequeno barco amarrado e a correnteza forte; Baltazar inspeciona o barco e verifica que está apto para uso, assim eles encaram a correnteza. No caminho, Onurb fica com medo por ver pessoas marionetes na beira do rio olhando-os, alguns se jogam na água para chegar ao barco, mas não conseguem se aproximar, Baltazar o conduz bem.

Depois de um bom tempo, aparecem mais marionetes armadas na beira do rio. Alguns arqueiros atiram, surpreendendo Onurb e Ray.

Todos conseguem esquivar, mas o número de marionetes aumenta, espantando-os. Onurb reclama com Ray:

Éh claro, o amante do azar ia nos levar para onde tem um exército desses bichos.

— Tem um exército aqui porque eles devem estar lutando contra os vivos da cidade.

— Ótimo! Mortos contra vivos. Eu só espero terminar sem ser recrutado pelos “mortos”.

Ray ri, e Onurb fica mais nervoso.

Ei! Você ri? Antes de morrer, vou pedir para esse demônio me possuir, para te dar uma surra.

Ainda se esquivando de flechas, Ray ri, e Onurb, com raiva, arremessa objetos do barco, atingindo as marionetes na beira do rio. Baltazar ouve som de guerra em terra firme.

— Fiquem alerta, ouço som de batalha.

Aos poucos, eles saem da neblina e veem um grande campo de batalha, trincheiras, armadilhas, destruição, escombros, muros caídos, muros improvisados e uma grande cratera que pegou o rio.

— Precisamos sair do barco.

Baltazar se joga na água. Onurb e Ray o seguem e logo chegam à beira do rio, vendo o barco cair na cratera. Algumas marionetes os veem e avançam. Ray, Onurb e Baltazar correm para as muralhas de Detroit, e as marionetes param de seguir.

Eles chegam até o portão da muralha, que se abre, e logo são cercados por vários homens, mulheres, civis e soldados do Império, que se armam, e Ray dialoga:

— Por favor, viemos em paz, fomos enviados por Ian Nai.

Todos abaixam as armas, e Onurb comenta:

— De Questtis também.

Todos levantam as armas. Onurb desmente:

Nããooo, não, só com Ian Nai… Ian Nai, ele é o cara.

— Desculpem o meu amigo… Eu sou Ray, ele é Onurb e o grandão aqui é Baltazar, estamos ao dispor de Prince.

Um soldado o aborda.

— Ray? Ouvimos falar de você, nos siga.

Baltazar e Onurb estranham, mas seguem Ray, que é escoltado para dentro do forte, que está preparado para a guerra, com a muralha fortificada, grandes catapultas, balistas, cavaleiros com elmos com chifres.

Ray nota um campo de treinamento, que ensina soldados e civis a usarem golpes precisos no pescoço e na cabeça. Todos entram no quartel, que segue o padrão do Império, grande, fortificado, feito de tijolos, com grandes janelas, armas e símbolos do novo e do antigo império.

Depois de subir alguns andares, eles entram em um grande salão cheio de pessoas comuns e soldados. Ray, Onurb e Baltazar são colocados em frente a uma mesa grande com um homem e uma mulher traçando estratégias no mapa de Prince.

O homem humano é branco, de estatura média, magro, idade aparente de 40 anos, cabelo curto e grisalho, sem barba, olhos pretos, usando roupa de nobre, o que indica ser o líder de Prince. O homem os vê, sai de trás da mesa e os cumprimenta com apertos de mãos.

— Prazer em conhecê-los, ouvi falar muito de vocês e estou impressionado. Eu sou Hen Ford, lorde de Prince, e esta é minha esposa Clara.

Ray fica feliz por ser conhecido por um grande líder que estudou tempos atrás.

— Eu ouvi falar muito de você também, é uma honra.

Onurb questiona:

— Mas como soube de nós?

— Nesta manhã tivemos um encontro inesperado com estas duas belas moças, que nos contaram sobre o Koètuz.

Ford aponta para Anirak e Alexia, que saem do meio das pessoas na sala. Ray fica maravilhado e abraça forte as duas.

— Que ótimo rever vocês, estávamos preocupados.

Onurb cruza os braços e senta em uma cadeira próxima.

Hum! Fale só por você.

Anirak olha para ele e comenta:

— Este clima de guerra não muda o humor do Onurb… Eu fiquei preocupada com vocês também. Todos vocês.

Ford fala para as pessoas na sala:

— Por favor, verifiquem o próximo ataque das marionetes, preciso falar a sós com o Koètuz.

Ray questiona Anirak e Alexia:

— Como chegaram aqui?

— Difícil explicar agora, Ray, depois que resolvemos o problema de Prince a gente relata tudo, também quero saber sobre suas proezas.

Ray sorri, e todos saem da sala. Ficam Ford, Clara, três cavaleiros e o Koètuz. Todos se sentam em volta da mesa de Ford, que começa a explicar a situação.

— Faz dez dias que estamos sob ataque dessas marionetes. No início, não sabíamos o que era ou o que queriam, parecia fácil derrotá-los, mas quando eles matam alguém, esse alguém se levanta e se junta a esse exército sem alma, uma magia rara e fraca bem empregada, com uma particularidade: o controlador tem acesso a memórias e à visão real de todas as marionetes, mesmo de longo alcance.

Ray comenta:

— Eu vi uma linha, uma aura que conecta a cabeça ao corpo, mas não vejo onde ela termina.

— Sim, Ray, nossos arqueiros ficaram inúteis, pois só os golpes fortes de corte surtem efeito, principalmente cortando a cabeça.

— Mas vocês sabem quem começou tudo isso? Como ele consegue controlar tantos ao mesmo tempo e permanecer oculto?

— Muitos que viram o primeiro ataque não estão mais aqui, mas um nome correu no campo de batalha… “Sokushin Butsu”.

— Sokushinbutsu?

— Sim, um nome antigo, usado por um mestre de maldição morto na antiga guerra. Eu acredito que algum aprendiz tenha assumido seu nome e queira se vingar do Império. Aos poucos a cidade de Prince foi sendo tomada. Antes que ele ganhe por cansaço, eu estou reunindo meus generais para buscar e matar o controlador.

— Vocês têm alguma pista de onde o controlador está?

— Infelizmente só tenho suposições, usei magia para localizar de onde vem esse “fio” que liga todas as marionetes, e tenho sete localizações diferentes.

— Sete? São muitos lugares.

— Sim, temos bastantes soldados para essa averiguação, mas peço que vocês cuidem de dois lugares, pois assim terei todos os pontos principais no campo de batalha, a busca pelo inimigo principal e a defesa do forte.

Ray olha para seus amigos e concorda com Ford.

— Certo, podemos ajudar.

— Mais cedo Anirak me perguntou se eu sei algo sobre Maxmilliam, mas infelizmente nossa comunicação com o Império está nula, estou terminando de fazer uma sala de teleporte improvisada para termos contato e até reforços rápidos.

— O Império não se manifestou ainda?

— Infelizmente sim, eles foram atacados e só aumentaram o exército inimigo. Depois consegui contato com um capitão do castelo de Cristal e o deixei atualizado da situação. Ele enviará um grupo para nos ajudar, mas não quero depender de ajuda externa. Precisamos de uma mudança o quanto antes. Por favor, comam e descansem, atacaremos à noite.

Onurb reclama:

— À noite? Você os nomeou de “exército sem alma” e quer enfrentá-los à noite?

— À noite não haverá mais neblina e as minhas invenções nos ajudarão no avanço.

— Invenções?

— Sim, fiz uma produção em massa, sigam-me.

Todos saem da sala e seguem Ford por um caminho atrás do quartel, um amplo galpão com forjas, metais, grandes pedras, homens trabalhando enfileirados, formando uma grande linha de produção que conserta e termina de montar alguns humanoides feitos de pedra, madeira e ferro. Ford para no meio do galpão e explica:

— “Motor Company”, nome do meu grupo, criado junto com outros onze lordes. Em um capital de vinte e oito mil, este galpão é um símbolo de inovação e prosperidade para a nova geração… Junto com minha mulher, eu criei uma carruagem mágica que se move sem precisar de um animal puxando, e aqui expandi.

Onurb comenta:

Éh... Ele parece o Ray, se empolga fácil nas explicações… Você disse carruagens? Parecem bonecos com aparência humana.

— Sim, esse aqui é o modelo “T”. Melhor eu mostrar para vocês.

Ford se aproxima da invenção e com poder e autoridade diz firme e alto:

Autósmobilis!



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