Volume 1

Capítulo 29: Milite e a Donzela de Ferro

Manhã, 24 de setembro de 1590. Milite, Torre de Cristal.

Baltazar sai da torre de teleporte junto com um grupo de soldados amistosos com atitudes diferentes dos outros, mais simpáticos.

Eles o guiam pela cidade de Milite, que tem uma pequena parte de casas residenciais e a maior parte com barracas, dormitórios, torres e quartéis de guerra para os soldados, destacando-se um grande quartel, uma ampla construção feita de grandes pedras.

No trajeto até esse quartel, Baltazar avista vários soldados treinando e marchando, até um grupo de mulheres treinando com arco e flechas e luta desarmada.

Chegando ao grande quartel, Baltazar e os soldados são barrados por um homem de aparência comum, idade entre 60 anos, testa grande, estatura baixa e trajes de alto nível hierárquico com armadura leve.

— Bem-vindos a Milite. Sou Alfred, irmão de Karl Emil, o lorde de Milite. Como devem saber, temos uma burocracia a seguir, algum de vocês trouxe os relatórios?

Um dos soldados entrega um punhado de papéis desorganizados. Alfred olha desanimado para eles e consegue colocá-los em ordem rapidamente.

Depois de analisados, ele repara em Baltazar, pois se destaca dos outros pelas vestes e altura. Após uma breve análise, Alfred aborda Baltazar.

— O senhor? É um enviado do Império?

— Sim, e por que estamos aqui? Cadê a batalha?

— Acalme-se, homem, ainda é cedo… Um homem que anseia pela batalha, ótimo… Mas seguimos com alguns “passos” antes de ir para a batalha… Escutem todos, esse grupo de vândalos se manifestou e ganhou volume rápido, estamos organizando um grupo adepto para que não seja um massacre, pois já houve um, e não queremos que se repita… E você? Qual é seu nome mesmo?

— Baltazar…

— Odeio quando o Império vem com esses clandestinos sem informação. Você é enviado de qual capitão do Império?

— Capitão? Eu fui enviado por Ian Nai.

Baltazar mostra o pergaminho com os dados de Milite e a assinatura de Ian. Alfred se espanta ao ouvir o nome de Ian Nai e olha atentamente o pergaminho. Depois de verificada e certificada a veracidade, ele olha novamente para Baltazar e pronuncia:

— Soldados, sigam para aquele quartel, que vocês serão direcionados para suas tarefas… E você, Baltazar, me siga… Você é um caso que pula a burocracia, uma exceção.

Baltazar fica sem entender o sistema, mas o segue. Eles entram no grande quartel até chegarem a uma grande sala no último andar. No caminho, Baltazar aprecia a beleza da construção, um lugar limpo e bem ajeitado.

Há vários soldados de armadura diferente dos outros do lado de fora, demonstrando serem mais fortes, como uma “elite”, os melhores de Milite. Na grande sala, Baltazar fica atento.

Dois soldados guardam a porta do lado de fora, há várias janelas, bandeiras, mapas e três mesas com pergaminhos, instrumentos que Baltazar nunca tinha visto antes, que parecem servir para escrever, contar, cortar, enfim, itens de escritório.

As mesas estão posicionadas formando um triângulo. Baltazar foi deixado no meio delas por Alfred. Há uma mulher em uma das mesas, de cabelo curto e trajes finos, uma mistura de conselheira e princesa.

Na mesa maior, um homem velho, estatura média, porte físico acima do peso, cabelo curto, preto e liso, barba e bigode ralos, que está sentado analisando uns papéis, até que Alfred se aproxima e apresenta o pergaminho dado por Baltazar.

O homem lê atentamente e se apresenta para Baltazar.

— Sou Karl Emil, lorde de Milite.

Baltazar olha sem interesse e diz:

— Homens de fala bonita, não me interessa quem vocês são, eu só quero resolver o assunto pelo qual fui mandado aqui, só.

A mulher levanta e começa a procurar algo importante em um armário cheio de papéis e pergaminhos, enquanto Karl conversa com Baltazar.

— Me desculpe! Como você é enviado de Ian… fiquei curioso e quis me apresentar. Ian não falou nada sobre Milite antes de enviá-lo?

— Não.

— Imaginei.

Karl e Alfred se olham e dizem ao mesmo tempo:

— Caso de exceção!

Baltazar olha sem entender:

— Por que exceção?

Alfred senta à outra mesa, e Karl responde Baltazar:

— Aqui era muito desorganizado, então eu criei uma “burocracia” para melhorar a situação. O Império enviava soldados sem informação de quem eram ou em que eles eram bons, muitas vezes bons arqueiros eram colocados na linha de frente e vice-versa, perdendo grandes habilidades e vantagens de luta, não só em batalha, até soldados com visão estratégica eram designados só para mensageiros… Enfim, vários casos de desperdício e talentos.

A mulher se aproxima com uns papéis que achou no armário, entrega para Karl e entra no assunto.

— Não vamos esquecer-nos de vários espiões que se infiltravam com os soldados leigos. Como não tínhamos informações e registro do novo grupo, esses espiões tinham fácil acesso a tudo. Desculpe-me por minha educação, eu sou Marianne.

Baltazar acena com a cabeça, cumprimentando, e Alfred comenta com Marianne:

— Teve uns recentemente, descobrimos muito tempo depois, quais eram os nomes?

— Lembro que tinha uma mulher, Meena, no meio, não lembro o nome dos outros.

Baltazar lembra que esse nome é da amiga de Ray, e, antes que perguntasse algo, Karl lê os papéis e o aborda:

— Baltazar Thur, conhecido como “o Touro Náutico”, raça humana, 44 anos, guerreiro náutico… Vejo que teve várias conquistas com seu grupo de guerreiros, você não veio com eles?

— Minha história está num papel aqui?

— Como disse antes, informação é necessária…

— Entendo, mas estou com um novo grupo que está ajudando as outras cidades do Império, meu antigo grupo está descansando e curtindo a fama e a glória que conquistamos anos atrás.

— Interessante! Então você não tem vínculo com o Império?

— Não, fui abordado por Ian e, com um gesto de “amizade”, vim ajudar vocês.

Karl levanta e caminha para perto de Baltazar.

— Ótimo. Infelizmente não vou mais para a linha de frente nas batalhas, então não irei acompanhá-lo, mas estou te devolvendo o pergaminho de Ian e dando um meu, com este você terá acesso rápido, já que se enquadra para o que precisamos agora.

— Obrigado.

— Me permita dar-lhe este broche como gesto de apreciação de suas conquistas, é uma honra ter um guerreiro náutico experiente nos ajudando.

Karl coloca no peito de Baltazar um broche de ouro no formato de uma pirâmide e pede para Alfred:

— Irmão, por favor, leve Baltazar para Trufre… Baltazar, Trufre é a cidade em que eu nasci e agora está sendo destruída por esse grupo de vândalos. No caminho, Alfred falará mais detalhes. Agora, vão, pois já tenho um grupo se formando para ir.

Alfred concorda com a cabeça e pede para Baltazar segui-lo. Ao saírem da sala, quatro soldados os escoltam para fora do quartel e para fora de Milite. Ao lado de fora, uma cavalaria já formada se prepara para ir a Trufre.

Enquanto todos se aprontam e aguardam outros se juntarem ao grupo, Alfred questiona Baltazar:

— Você precisa de alguma coisa? Comida? Armamento?

— Não, comi antes de chegar aqui e já estou armado com o necessário.

— Certo. Lá em Trufre, tome cuidado, eles usam golpes baixos, além de serem bem furtivos. Esse grupo está indo para salvar um último grupo de cidadãos que estão presos lá, após isso o Império irá devastar a cidade e acabar com todos, por isso antes precisamos salvar o máximo de cidadãos possível.

— E por que não tomaram a cidade ainda? Vocês são o Império de Cristal.

— O Império está tendo vários ataques por várias cidades, não podemos deixar nossa defesa fraca, não sabemos ao certo a origem desses ataques, por isso agimos com cautela.

— Entendi. Espero que meus amigos tenham êxito.

Um soldado chega com um shire, uma raça de cavalo de grande porte, para Baltazar, que aprecia o cavalo e o monta com facilidade. Todos se organizam e seguem em direção a Trufre.

No caminho a Trufre, Baltazar observa que todos os soldados estão motivados, pois muitos estão indo buscar familiares e estão mais armados do que os vândalos. Alguns cantam música de guerra de motivação, e outros comentam que há um grande perigo em Trufre, uma guerreira experiente. Baltazar e o grupo de soldados chegam à cidade.

Trufe é grande, com pouco comércio, muitas residências feitas de madeira e pedra com o teto arredondado, com pequenos muros formando os seus quintais. Uma bela vista sem floresta próxima dá uma boa visão dos arredores, como morros, planície e um pequeno rio que passa ao lado da cidade, que não possui muros altos para defesa nem torres, o que possibilita ver seu interior.

Há várias casas de tamanho pequeno e médio e ao longe, próximo ao centro da cidade, um grande templo. Todos tomam uma formação de batalha, se armam e se preparam para o confronto. Inicialmente, a cidade parece vazia, mas ao longe podem ser vistas várias pessoas em um terreno grande e vazio. Aparentemente, casas foram destruídas para formar essa planície dentro da cidade, pois há alguns destroços.

Ao identificar vândalos dos cidadãos na multidão, os soldados atacam com tudo. Ainda em seus cavalos e armados de grandes lanças e espadas, eles conseguem tomar rápido o controle e se agrupam com os cidadãos, matando alguns vândalos e imobilizando outros.

Baltazar, durante todo esse tempo, ficou parado, só observando sem entender, pois o ataque foi muito impulsivo. Ele tem um mau pressentimento, esconde seu cavalo e fica de longe observando.

Os soldados soltam alguns cidadãos que estão amarrados por cordas e amarram os vândalos, todos com aparência simples, sem nenhum destaque. Depois que todos os inimigos estão presos, alguns soldados comentam:

— Não está muito fácil?

— Nosso ataque foi de surpresa e estamos mais armados do que eles, não tinham chance mesmo…

 

Uma risada grave interrompe a conversa, e de dentro de uma das casas sai uma mulher humana com idade entre 40 e 50 anos, alta, de porte físico forte, acima do peso, cor de pele escura, igual aos seus olhos e cabelo, que é crespo e curto com algumas tranças embutidas, duas cicatrizes na testa chegam até as suas sobrancelhas grossas, nariz e boca grandes.

Ela usa roupas de couro e pelugem de urso polar, um peitoral de cristal corrompido, aparentemente roubado do Império, um brinco de diamante e vários anéis diferenciados nas duas mãos, entre eles um no formato de pirâmide, parecido com o broche dado a Baltazar. Ela segura uma grande maça com espinhos, que manuseia facilmente com apenas uma mão.

Mãos fortes e calejadas. Sua beleza é comum, longe de uma dama delicada, rústica, uma dama de ferro forjada na guerra com mais cicatrizes em seus braços e com um rosto bravo.

 

— Fácil? Ataque-surpresa? Por que os soldados do barraco de cristal são tão burros?

De dentro das casas saem vários homens e mulheres usando vários tipos de armas, muitas roubadas do Império.

Os soldados do Império tomam uma formação de defesa e se preparam para o ataque. A mulher olha para o grupo de soldados como se estivesse procurando alguém e resmunga, admirandos seus anéis:

— Decepção… Nenhum líder, general ou um herói famoso para fazer parte da minha coleção de vitórias?

Os soldados ficam firmes e, sem demonstrar medo, andam na direção em que há poucos inimigos para sair da cidade. Vendo isso, a mulher os aborda.

— Já pensam em ir? Detesto visita curta. Ataquem!

Os vândalos avançam com tudo para cima dos soldados e dos cidadãos. Os soldados, com uma boa formação de defesa, conseguem repelir a fúria e deixar os cidadãos a salvo.

Há um barulho alto de espadas colidindo, escudos quebrando de tantos golpes; nenhum ataque à distância, tudo corpo a corpo e ferozmente, todos lutando para viver e matar.

A mulher, ao longe, sorrindo, começa a rodear o grupo de soldados, vendo o melhor ponto fraco da formação. Baltazar volta a montar no cavalo e avança.

Aproximando-se da batalha, ele dá um grito de guerra que ecoa na cidade, assustando os vândalos, atropela alguns e se joga do cavalo, derrubando quatro homens.

Então levanta animado, empunha seu machado e começa a atacar.

— Enfim a batalha!



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