Volume 1
Capítulo 12: Alfor e coleção Electi I
— PAREM!
Ray, exaltado, tenta acalmar a todos.
— Parem, por favor.
— Ray, o que está acontecendo? Quem são essas pessoas?
— Desculpe, mestre, eu deveria ter contado. Esses são os amigos que eu fiz.
— Certo, mas o que fazem aqui?
— Vão nos acompanhar.
— Você está louco?
Onurb demonstra ânimo.
— Finalmente alguém que me entende. Sim, ele é louco.
Ray sorri. Maxmilliam se aproxima deles. Anirak, Onurb e Baltazar baixam a guarda, e alguns empregados comentam entre si:
— Neste barco só dá briga, vamos ajudar o quanto antes e cair fora.
Empolgado, Ray apresenta todos:
— Pessoal, esse é meu mestre Maxmilliam, e mestre, esses são Anirak, Onurb e Baltazar.
Maxmilliam demonstra insatisfação e pergunta:
— Na missão “secreta” que pretendemos fazer, você trouxe um ladrão…
Onurb interrompe:
— Eu prefiro o termo “impulso mórbido em possuir pertences valiosos de donos desgostosos com o próprio pertence”.
Maxmilliam olha para todos e continua:
— Uma assassina…
— Eu prefiro o termo “transtorno explosivo intermitente em alvos pré-selecionados”.
Ray ri com as “correções” que todos estão fazendo. Maxmilliam segue:
— Me deixe adivinhar, o seu caso é “transtorno de déficit de atenção/hiperatividade”?
Baltazar olha sem entender:
— Não… sou um bárbaro, adoro brigar, caçar e comer.
Maxmilliam passa a mão na cabeça e, sem entender, questiona Ray:
— O que você pretende, Ray?
— Você disse que eu preciso de amigos, então… Eles querem uma aventura e serão de grande ajuda, não acha?
— Essa missão é sua, se você confia neles e acha melhor assim, então assim será.
Maxmilliam demonstra mais empatia e continua a conversa.
— Prazer em conhecer vocês. Se Ray os qualificou, devem ser de confiança.
Onurb comenta baixo, para si mesmo:
— Se luta como qualifica, então estamos perdidos.
Todos cumprimentam Maxmilliam acenando a cabeça e se dividem, indo cada um para um lado diferente do barco. Todos ficam calmos e pensativos. Enquanto isso, a tripulação acaba de arrumar o barco e a comida.
Depois de tudo arrumado, os ajudantes vão embora, ficam apenas sete para cuidar do barco na viagem. Ray confirma o trajeto com Maxmilliam.
— Mestre, este barco é a forma mais rápida mesmo?
— Sim, o rio que cruza o Grande Continente tem uma boa correnteza.
— Rio?
— Sim, o rio é bem amplo.
— Então por que não vamos de barco até o final?
— Não, o controle do Império de Cristal sobre os rios é maior do que por terra, por isso vamos uma parte de barco, a parte em que ele não tem controle, e depois seguimos por terra.
— Entendi.
Ray e Maxmilliam são abordados por uma mulher da cozinha.
— Com licença, o barco já está pronto para partir e a comida já está pronta.
— Obrigado.
A mulher se retira. Os outros ajudantes assumem seus postos no barco, esperando a ordem de partida. Os que não participaram do trajeto saem do barco se despedindo dos seus companheiros. Com tudo pronto, Ray vai atrás de Baltazar, Anirak e Onurb para avisá-los da comida, e Maxmilliam se dirige para a rampa, que recebe uma visita.
— Bem-vinda a bordo, Houri.
— Obrigada, Maxmilliam.
— Vou lhe apresentar Ray e os amigos dele.
Maxmilliam acompanha Houri pelo barco e chega à cabine onde está sendo servida a comida, uma área grande com mesas e cadeiras. Ray, Baltazar, Anirak e Onurb estão comendo à mesma mesa, e a tripulação come em duas mesas separadas.
A tripulação come normalmente, mas com olhares assustados para Baltazar, que come muita comida e com as próprias mãos. Anirak come civilizadamente, com os talheres e quieta, Ray come e ri ao ver Baltazar comendo e Onurb criticando-o.
— Pare! Desse jeito a comida de três dias vai durar uma refeição.
Com a boca cheia, Baltazar dialoga:
— Preciso repor energia, e esta comida está ótima.
— Reponha só a sua energia, não a de todos!
Ray continuava a rir. Termina de comer e vê que Maxmilliam chega acompanhado, cumprimenta a tripulação com Houri e depois chegam à sua mesa para a apresentação.
Ray repara em Houri. Idade entre 22 anos, cabelos curtos e arrepiados, estatura média, porte físico forte, com armadura média cobrindo tronco, antebraços e pernas, do joelho até as botas. Todos param de comer, com exceção de Baltazar, e Ray cumprimenta:
— Legal, um guerreiro, prazer em conhecê-lo…
Onurb e Anirak riem baixo, enquanto Maxmilliam corrige Ray:
— Me desculpe, Houri! Este é Ray… Ray, esta é uma das conselheiras do rei, Houri.
Ray fica desconcertado por ver que é uma mulher com traços e roupas masculinas, mas tenta se desculpar:
— Me desculpa, não sabia…
Houri sorri e diz, com empatia:
— Não foi nada, já estou acostumada. Tudo bem com vocês?
— Sim, Houri. Estes aqui são Baltazar, Onurb e Anirak.
— Seus amigos?
— Sim.
— Prazer em conhecer vocês… Que mundo pequeno, não é, Anirak?
— Nem tanto.
— Amigos novos?
— Sim, novidades são boas para variar um pouco.
As duas sorriem e se cumprimentam dando as mãos, e Anirak continua o assunto.
— Preocupada com Militis?
— Não é exatamente em Militis, é perto, mas já temos um grupo lá tentando controlar.
— Bom, não me chamaram dessa vez?
— Você sabe que você tem missões mais restritas do que os outros, mas meu irmão está lá… Onde está o capitão? Precisamos desembarcar o mais rápido possível… Se vocês me deem licença, eu vou verificar essa informação.
Todos acenam para Houri, que sai da cabine. Maxmilliam senta e fica mais tranquilo.
— Agora que já apresentei a todos, poderei comer… Mas onde está a comida?
Ray e Anirak riem baixo, enquanto Onurb fala com Maxmilliam:
— Esse touro velho monstro aqui já devorou tudo.
Baltazar demonstra irritação.
— De novo você com esse assunto! Eu sou grande, e você, pequeno, você come pouco, e eu como muito, e fim da história.
— Fim? Você que deu fim…
Anirak interrompe:
— Baltazar, você já terminou de comer e, como tem experiência em alto-mar, pode ser de grande ajuda para Houri e o capitão lá no leme, o que acha?
— Uma boa ideia, eu vou para lá.
— Maxmilliam, tem mais comida na mesa dos tripulantes, eles nos informaram que se acabasse aqui teria uma reserva lá.
— Obrigado, Anirak.
— Onurb, eu acho que tem bastante corda no mastro para você se enforcar.
— Engraçada… Vou lá ver se tem corda para nós dois.
Baltazar sai da cabine em direção ao leme. Onurb também sai para avistar a movimentação do barco, que já está partindo. Maxmilliam segue para a outra mesa para comer, enquanto Ray questiona Anirak.
— Você conhece o guerreiro, digo… a guerreira?
— Sim, e ela é uma guardiã.
— Primeira vez que vejo uma mulher com aparência masculina.
— Sim, ela e o irmão são assim.
— Irmão? Então ele tem aparência…
— Sim, feminina… Eles são da linhagem de Adéa e Ivo.
— Lembro que já estudei sobre esses dois, eles são os primeiros humanos em terem gosto pelo mesmo sexo.
— Isso, e alguns têm variações nos hormônios, o caso dela… Eles são ótimas pessoas.
— Aproveitando que estamos aqui, gostaria de conversar mais sobre a joia que estava com você…
— O que você quer saber?
— Quem você já viu que fez a joia ficar na cor dourada?
— Por que a curiosidade?
— Porque acho que deve ter sido meu pai.
— Ynascar?
— Sim! Como você sabe o nome dele? Foi ele?
— Não, eu sei porque antes de vir eu pesquisei sobre você.
— Entendi.
— Nycollas falou sobre você e me deixou vir por causa da sua linhagem e sua missão.
— Você sabe sobre a minha missão?
— Sim, mas a minha é seguir você até seu destino e voltar depois disso… Estou bem curiosa em conhecer a grande rainha de Libryans.
— Certo…
— Mas não fique triste com isso, pelo que eu vi, seu pai foi um grande guerreiro, e respondendo à sua pergunta, a outra pessoa que eu vi fazer a joia ficar dourada foi Alfor.
— Eu vi a estátua que fizeram para ele no centro de Coniuro.
— Não, ele mesmo fez a estátua.
— Sério? Por que fez isso?
— Ele enganou um mestre de maldição fazendo-o achar que o transformou em pedra.
— Incrível, ele era um Mestre de Magia?
— Não, um Praeteritum.
— Sério? Eu li sobre os Octoniões, mas achei que só alguns eram Praeteritum.
— Sim, eles são mais conhecidos como os Imortais, e todos eles eram Praeteritum.
— Eu deveria ter associado isso antes, no diário que tenho diz que ele é um Praeteritum, mas eu não me importei com esse fato.
— Certo, então terminamos aqui o assunto?
— Espere, você sabe mais sobre Alfor? Você poderia me contar mais sobre ele?
— Você não conhece a história da “Guerra D” ou do grupo dos Octoniões?
— Sei pouco. A antiga guerra que foi travada nas primeiras ilhas e que foi conquistada pelo grupo de Guerreiros Imortais, mas nada detalhado, como a identidade deles, não se sabe se existe algum vivo atualmente.
— Entendo, mas no treinamento dos Octoniões cada um deles fez coisas incríveis, um exemplo que posso dar é de Alfor com os artefatos e relíquias Electi.
— Sim, as armas Zordrak, um meteoro negro que caiu, do qual foram forjadas armas e itens magníficos, certo?
— Isso, interessante, poucos sabem da origem do material delas… Mas sim, esse metal, que eu não sei se posso chamar de metal, tem facilidade de conter magia e até de destruí-la, tem grande resistência, e dizem que foi um presente do Criador, nosso Deus. Alfor se interessou pelas histórias dessas armas e foi atrás delas, ele queria completar a coleção.
— E conseguiu?
— Sim, mas com o crescimento do povo no Grande Continente, ele presenteou várias pessoas com esses artefatos.
— Legal, mas ele ficou com algum?
— Sim, Nycollas, o filho de Alfor, leva consigo o cajado Nycols…
— Nome semelhante ao do filho.
— Sim, esse cajado é feito de “Pinus longaeva” e é cravejado com estilhaços do meteorito Zordrak, acho que é o único item que não tem o minério trabalhado, até o primogênito aprovou esse cajado.
— Pinus longaeva? Raro conseguir extrair madeira dessa árvore sem que ela morra ou comprometa o cajado.
— Realmente você é um rapaz instruído.
— Obrigado.
— Verdade, também é raro achar essa árvore com uma idade avançada e em bom estado para criar um cajado poderoso.
— Incrível! Você saberia me contar mais sobre essa coleção? Sabe de todas elas?
— Sei um pouco…
A tripulação começa a arrumar a cabine, limpando-a. Anirak termina de beber o que havia em seu copo e fala a Ray:
— Vamos para a proa aproveitar a vista e a brisa, lá te conto o que eu sei sobre a coleção de Alfor.
— Certo… Meu mestre saiu e eu nem vi.
— Também não percebi.
Ray e Anirak saem para o convés e avistam tudo normal, tempo bom, a brisa da qual Anirak falou estava refrescando o sol quente. Onurb conversava com a tripulação, Houri estava na parte mais alta conversando com o capitão e Baltazar.
Chegando à proa, Anirak se debruça na beira do barco para ver a água, enquanto Ray fica ao seu lado espreguiçando os braços para cima e, em um ar de satisfação, boceja. Anirak continua o assunto.
— Conheço algumas histórias de algumas armas Zordrak, mas não conheço todas, pois há boatos de que outras foram feitas escondido. Alfor colecionou as que têm registro em livros ou em boatos, algumas assumiram nomes correspondentes às pessoas que foram presenteadas.
— Mas por que ele deu a coleção?
— Ele as colecionou por gosto, era um pouco competitivo, mas era um homem extraordinário e, modéstia à parte, lindo… Daria para fazer um conjunto com essas armas, mas não daria para usar todas, pois há muitas…
— Grande modéstia, então.
— Ele não simplesmente dava, ele usava magia para sentir se o futuro “presenteado” merecia e precisava do item.
— Entendi.
— A história de Nycols é só como foi criada, Alfor adorou o cajado que ganhou de seu mestre e comprou os estilhaços em uma vila e colocou em seu cajado. Quando teve seu filho, colocou um nome semelhante ao do seu cajado e deixou como herança… Tem outra história que abalou as montanhas de White Irene.
— As grandes montanhas brancas?
— Sim. Um Dionamuh, ou melhor, “Magna” denunciou um de seus amigos por conspiração, ganhando a confiança e a liderança do exército das montanhas, que conquistou a vitória. Com isso, ele foi honrado a conhecer os Praeteritum e presenteado com uma arma Electi. Perdeu o amor da sua vida na guerra. Foi triste, ele gritou até as montanhas ecoarem sua tristeza. Muitos choraram naquele dia.
— Conheço a história da batalha da montanha, mas essa parte não.
— Essa parte não é muito contada.
— Deveria, ainda mais envolvendo uma arma Zordrak.
— Sim, Maritus!
— Maritus?
— Isso, em homenagem ao amor dele.
— Mas… ele também era um descendente de Ivo?
— Era não, é! Ele ainda vive nas montanhas.
— Um herói de guerra, eles não deveriam ter ocultado essa parte da história.
— Muitos não entendem o amor de um “Ivo” ou de uma “Adéa” pelos seus iguais, principalmente o rei das montanhas, que só o deixou ser honrado e permanecer nas montanhas se ele se privasse de se relacionar novamente e escondesse esse fato. O rei fez isso achando que diminuiria a honra do reino, esse rei que também ganhou um artefato.
— Uma coroa… Não sei o nome, onde eu li não mencionava.
— “Coroa-Te Rocha”, tem esse nome por ele ter uma cabeça dura, ele é muito teimoso.
— Mas sei que é um reino muito promissor.
— Sim, mas não tenho interesse em saber da economia ou transações dos reinos… Porém, Libryans é um lugar sobre o qual eu vou gostar de saber de tudo.
— Verdade, Libryans é um exemplo perfeito de um mundo melhor, que bom que é o nosso destino.
— Tem duas histórias que envolvem esse reino, as moedas de libra e a espada da rainha.
— Salve a rainha. Li sobre essa espada, mas achei que fosse mais um título.
— E é! Ela nomeou a espada, a história dela é um pouco oculta…
— Ela perdeu a mãe quando ainda era criança, certo?
— Sim, as duas mães.
— Duas?
— Sim, a história conta como a mãe de sangue morreu, mas há boatos de que essa mãe não gostava dela, não a queria, assim ela teve uma babá que a cuidou como se fosse sua filha. Esta foi a mãe que a criou.
— Interessante… Não tem registro dessa babá?
— Não, a história que eu ouvi foi que um poder maligno matou várias pessoas da vila, e essa babá deu a sua vida para salvar sua filha.
— Salve a rainha.
— Sim, por isso o título. A mãe que a rejeitou era a líder da vila, depois desse ataque ela herdou o direito de comandar as terras, expandiu o território, e hoje é o segundo maior país de Arbidabliu.