Volume 1
Capítulo 05: Uma Noite Tranquila
Ray é quase carregado por seis dos oito homens escuros para o convés, onde há uma boa parte da tripulação e passageiros, mais comida, mais bebida, menos assentos e música. Durante o percurso, Maxmilliam é conduzido para um dos quartos com os outros dois Monk para verificar o estado de saúde do outro irmão.
No convés, Ray é colocado em um lugar perto dos “artistas”, das bebidas e com uma boa vista de todo convés, podendo avistar tudo o que está acontecendo, os artistas produzindo músicas animadas, pessoas dançando, bebendo, comendo, rindo e conversando em um grande barulho, mal dá para se ouvir a pessoa ao lado.
Com o passar do tempo, Ray se desinibe um pouco, passeando pelo convés, bebendo um pouco, ouvindo algumas bobagens dos Monk, que aproveitam de tudo que está no convés, e, em uma troca de ritmo de música, Ray vai em direção aos artistas e senta perto deles para ouvir melhor a música produzida.
Ele fica admirado com tudo, principalmente com a bela noite, cheia de estrelas, sem nuvens e as luas iluminando as águas do mar. Ray começa a refletir sobre sua missão, sobre o que pode ter acontecido com seus amigos, como seria essa jornada, maravilhas que poderia encontrar e batalhas a travar.
O convés vai ficando mais vazio, o barulho vai cessando, comida e bebida acabando, pessoas indo para seus quartos e a música ficando mais adequada para o silêncio, mais calma e serena. Ray também vê que os outros dois Monk que estavam com Maxmilliam saíram para o convés para informar aos outros que o irmão doente ficaria bem.
Com a noite ficando mais fria, os Monk saem do convés para a cabine de passageiros, e ao mesmo tempo um grupo de jovens da mesma faixa da idade de Ray se exalta no convés, andando para um lado e para o outro, derrubando coisas e falando alto, parecendo alterados pela bebida.
O grupo é formado por homens de aparência nada agradável, feios, com odor de suor e álcool, apenas um deles é bonito e mais arrumado.
— É! Que noite boa… Bebida e comida…
Um deles aponta para os artistas que estão cantando e tocando instrumentos musicais.
— E ali, rapazes, a banda.
Ray encosta a um canto e visualiza o grupo de malandros ir em direção ao grupo de músicos. Nisso, os músicos, ao perceberem uma possível confusão, param de tocar e arrumam seus pertences, guardando-os para se retirarem. Com o fim da música, o grupo de rapazes reclama.
— Ei, ei… Já vai acabar?
— É, toca mais uma para “nóis”.
Entre os músicos havia cinco mulheres e dois homens, todos adultos, com idade menor do que 35 anos. Entre as mulheres, se destacavam duas com beleza e atributos mais chamativos para o sexo oposto. Entre os homens, um deles, alto e forte, se colocou na frente do grupo, que estava com intenções ousadas.
— Peço desculpas, mas já está tarde e já tocamos muito por hoje, vamos descansar.
Os malandros olham de cima a baixo, analisando-o. Um deles olha para as mulheres e insinua, aproximando-se de uma delas:
— Olha lá, quem sabe essa artista possa cantar num lugar mais íntimo comigo.
O músico altão avança em cima dele, e começa uma confusão. Os rapazes atacam com socos e chutes. O alto é agarrado pelos outros que estão tentando separar a briga.
Ray não resiste, contorna o grupo e empurra o ousado que se insinuou para a mulher, que na confusão já a tinha puxado pelo braço.
— Não está injusto isso? Seis contra dez!
Com a confusão se complicando cada vez mais, os outros que estavam no convés saem para os aposentos, deixando o convés vazio de expectadores. No leme, estão o capitão e mais quatro guardas, que o abordam:
— Vamos interferir?
— Não… É só mais uma briga de bêbados. Se a situação se complicar mais, vocês podem interferir.
Como Ray empurrou o ousado para defender uma das mulheres, o grupo de músicos se agrupa junto com seu parceiro mais alto, e Ray fica entre o grupo de rapazes e a mulher. Atrás dos rapazes, os outros músicos tentam acalmar a situação.
— Vamos parar com isso!
— O que vocês querem?
O bonito do grupo é o mesmo que puxou uma das artistas. Ele toma a frente do grupo em direção a Ray.
— Eu quero surrar esse aprendiz e pegar essa mulher para me satisfazer esta noite.
Ray pergunta:
— Qual é seu nome, moça?
— Joara.
E, com um belo sorriso, Ray fala, de um jeito tranquilo:
— Prazer, meu nome é Ray.
O malandro fica mais irritado por ser ignorado.
— Ei? Não ouviu o que eu falei? Estão me ignorando?
Ray o afronta.
— Verdade, você está aí.
O grupo de rapazes ri e começa a agitar.
— Você “tá” ou não “tá” aí, Fernand?
— Vai fazer o que, Fernand? Vai deixar assim?
Fernand fica desconcertado com toda a situação, e Ray conversa com ele.
— Fernand, esse é o seu nome? Vamos parar com isso, vocês estão alterados, está tarde, vamos todos dormir e fingir que nada aconteceu, o que acha?
Fernand tira uma adaga de suas vestes e avança em Ray. Com o susto, Joara se afasta com medo. O grupo de músicos tenta avançar, mas são parados pelo grupo de Fernand.
Ray esquiva do golpe perfurante e se prepara para o próximo ataque, que foi um soco. Ele percebe que Fernand usa uma mesma sequência de facadas e socos, então ele vai se esquivando em direção à mesa e pega uma faca para o contra-ataque.
Cada ataque que Fernand usa com a adaga, Ray apara com a mão limpa, mirando no pulso de Fernand; para cada soco, Ray usa a faca. Ao sangrar, Fernand recua.
— Miserável!
— Já vai baixar o nível?
— Não, vou subir!
Fernand ataca Ray novamente com sequência de facadas e socos, mas alternando o alvo de cabeça e tronco. Ray leva dois socos no tronco, mas esquiva dos outros golpes, atacando as pernas com a faca e socos, até que Fernand cai de lado, apoiando-se com uma das mãos.
Ray aproveita e termina a luta com um soco na cara de Fernand, fazendo-o cair totalmente de costas. Seu grupo, ao verem-no apanhar, avança um a um em direção de Ray com agressividade.
Ray pega um pano na mesa, improvisando uma funda, e com a faca já em mãos se prepara para os ataques. Um a um passam por Ray com golpes diferentes, socos, chutes e até pontadas de adagas; alguns o acertam, pois ele preferiu dar ênfase a se defender dos golpes de adaga.
Depois de todos os ataques, o grupo de malandros cerca Ray, encurralando-o. Fernand levanta e, em tom superior, o afronta:
— Vamos, “herói”, está justo para você agora?
O grupo de músicos se aproxima, mas Ray os interrompe.
— Não façam nada, pode ficar pior.
Os malandros se preparam para atacar todos juntos dessa vez, liderados por Fernand, mas uma voz alta e grossa os interrompe.
— Pode ficar pior, e vai!
Todos olham de onde vem a voz e veem se aproximando sete homens grandes de pele escura com ar agressivo. O grupo de Monk cerca o grupo de malandros e conversa com Ray.
— Tudo bem aí, Ray?
— Podia estar melhor.
O silêncio toma o convés, todos parados esperando alguma ação, músicos, malandros, capitão, guardas, Ray e os Monk. Zuriel, o Monk que demonstra mais hostilidade, com o rosto sério encarando todos, entra no círculo, aproximando-se de Ray e na frente de Fernand, intimidando-o.
— Vou explicar como funciona: se todos vocês forem atacar o meu irmãozinho aqui, nós sete vamos entrar nessa roda, e te garanto, vocês chegarão à costa nadando.
Fernand se aproxima de Zuriel, tentando intimidá-lo com um ar confiante, mas sem perceber que seus comparsas recuaram, desfazendo a roda.
— Muita moral pro meu gosto. Tudo isso é porque está com seus amigos?
Ray fica com pena do que pode acontecer com Fernand.
— Acalmem-se, não vamos tomar medidas desnecessárias.
— O que você quer…
Fernand se cala ao notar que está só no meio dos músicos, Monks e de Ray e fica sem ação. Zuriel o intimida novamente.
— Engoliu a língua, moleque?
Fernand dirige um olhar brabo para seu grupo e sai do convés em direção ao seu quarto. Seu grupo o segue, passando pelos Monk e fazendo-se de brabos para intimidá-los. Dois dos Monk revertem a intimidação ameaçando bater neles.
Com medo, eles saem do convés mais rápido. Depois que todos foram embora, os Monk riem alto e elogiam Ray.
— Isso aí!
— Não é que ele deu conta?!
— Esse é nosso irmãozinho.
Ray devolve a faca e o pano à mesa, fica meio envergonhado com os elogios e, com um sorriso, retribui:
— Nada, se não fosse por vocês eu é que iria a nado para a costa.
— Que nada, Ray.
— Sorte que soubemos que a comida aqui não tinha acabado… ainda!
— Falando nisso, irmãos, vamos comer.
O grupo dos Monk cumprimenta Ray e vai em direção à mesa onde ainda havia comida e bebidas. Os músicos se agrupam com Joara e agradecem Ray.
— Obrigada por nos ajudar.
Ray, novamente com um belo sorriso, fala para o grupo:
— Disponha! Minha cultura não permite injustiça e falta de educação, e o que eu puder fazer para ajudar farei.
— Muito nobre de sua parte, vou apresentar meu grupo.
— Ótimo, gostei muito de vê-los tocarem.
Joara aponta para cada um de seu grupo e informa o nome. Todos cumprimentam Ray com um aperto de mão.
— Estes são Alim Sobrinho, Jefferson Kung, Lays Woman, Rômulo Godo, Sida Sobrinho e eu, como já tinha falado, me chamo Joara Fernan.
— Prazer em conhecer vocês.
— Vamos nos sentar?
— É claro, gostaria de saber um pouco da história de vocês, é raro ver artistas por aqui.
Todos fazem uma roda em volta dos instrumentos, as mulheres sentadas nos bancos e os homens sentados no chão. Nesse tempo, o grupo do capitão faz uma ronda no convés.
O grupo dos Monk fica conversando entre eles em um tom baixo na mesa com comida. A noite fica bem mais intensa, vento frio, céu bem iluminado pelos corpos celestes. Mais tochas são acesas pelos guardas que fazem a ronda, e o mar está bem tranquilo.
— E seu nome é Ray?
— Isso, Ray Blok W.
— Legal. Antes de falarmos de nós, fale um pouco de você, Ray.
— É claro. Eu nasci e treinei na Pronuntio…
— A Ilha da Água? Você mora lá?
— Sim.
— Que legal.
— E você segue que classe, Ray?
— Eu sou guerreiro, mas pretendo aperfeiçoar minhas habilidades para poder ser um guardião.
— Interessante, Ray. Seria uma amplitude, com combate desarmado, armadura mais leve e mais agilidade, entre outras coisas.
— Incrível, como você sabe?
— Nós somos artistas, Ray, sabemos sobre todas as outras classes, teoricamente, é claro.
— Ótimo. Eu quero saber como definir alguém só de olhar fisicamente.
— É difícil, mas com alguns traços você consegue.
Jefferson se levanta.
— Levante-se, Ray, vamos ver como você avalia.
Ray levanta, e Jefferson chega ao seu lado, apontando para os outros:
— Olhe para eles, Ray, avalie um a um, e nós vamos dizer se você acertou ou não.
Ray olha atentamente para cada um, roupa, cabelo, estatura, sotaque, atitudes no meio do confronto, instrumentos tocados, músicas selecionadas, e começa falando da primeira.
— Alim Sobrinho, 30 a 33 anos, roupas comuns, não usa armas, tímida, “paralisia frente ao combate”, romântica e solteira.
— Bom, acho que são informações boas para investigar ou saber se ela é hostil. O que você diz para Ray, Alim? Ele foi bem?
— Foi bem, mas… está tão óbvio que sou solteira?
Jefferson ri:
— Todos aqui estão solteiros, Alim, não há com o que se preocupar… Ray, continue.
E assim Ray continuou, tendo a resposta da pessoa analisada em seguida.
— Sida Sobrinho, uns 28 ou 30 anos, roupas comuns, mesmo sobrenome, mas sem muita semelhança, deve ser parente distante da Alim. Também não usa armas, fiel, pessimista e solteira.
— Sim, mas eu uso balestra, digamos que uso por esporte.
— Lays Woman, 25 a 27 anos, roupas comuns, mas são roupas formais, você deve cuidar da social do grupo, usa bastão, deve ser competitiva, pois você olhou muito para as mulheres e moças que apareceram no convés; mal-humorada e solteira, por opção, você deve maltratar o coração dos homens por onde passa.
— Correto! E não é bem uma “competição”… E não só os homens, querido Ray.
Ray fica confuso. Alguns riem, e Jefferson faz sinal para que ele continue.
— Jefferson Kung, 27 a 29 anos, roupas comuns, deve ter treinado luta, pois se colocou para defender o grupo se posicionando bem para lutar, não usa armas e, mesmo tendo dito que todos estão solteiros, você namora.
— É isso aí, você é bem mais esperto do que eu imaginei.
— Sim, posso arriscar com quem?
Joara interfere.
— Rapazes! Já está tarde, vamos dormir e amanhã à noite voltamos a este assunto.
— Desculpe, mas chego ao meu destino amanhã no início da tarde.
— Desculpe, Ray, não sabia que…
— Não se preocupe, eu é que peço desculpas por ocupá-los e agradeço a conversa.
O grupo de artistas arruma suas coisas, e nesse momento Joara sente que se desfez da presença de Ray. Ela se aproxima dele e diz:
— Ray, ao levantar, vamos tomar café? Assim te conto mais sobre nós, grupo de artistas.
— Sim… Obrigado. Então amanhã cedo nos falamos mais.
Ray cumprimenta os artistas, que terminam de arrumar o convés junto com alguns empregados que subiram, cumprimenta os Monk, que consumiram toda a comida e bebida da mesa e vai para seu quarto, onde retira sua roupa, ficando só com a roupa de baixo, deita-se, se cobre com uma coberta fina e adormece.