Volume 1

Capítulo 04: O Diário

Ray pega o diário sobre a mesa, analisa e se certifica de que é realmente o diário dado por Izolna. Ele senta na cama e abre-o para verificar o que há nele. Em uma prévia inicial, verifica que foi escrito no ano de 1540 e ainda hoje a capa e as páginas estão bem conservadas.

Hmmm, mil quinhentos e quarenta, cinquenta anos atrás.

Ray começa a ler o diário e verifica que é de uma mulher que treinou para lutar em uma grande guerra.

A autora registrou alguns dados de sua aventura, referências de seu treinamento e o início de uma grande guerra. Mais a fundo, Ray se surpreende com relatos de alguns personagens fortes que realizaram grandes atos em batalhas.

— Incrível! Arqueiros com flechas encantadas, com mira extraordinária, até em meio da batalha; “Artistas” sabendo enfraquecer seus inimigos através de dons simples; assassinos ficando invisíveis e andando em paredes e até em superfícies impossíveis de se manter firme...

Ray se impressiona cada vez mais.

— Guardião se defendendo de até dez homens usando só habilidades de luta; guerreiro de fé levantando a moral de seus aliados no auge da luta... E assim levando-os à vitória sobre hordas inimigas. Magico!

Ray nota que o diário da importância a todas as classes e raças também.

—  Guerreiro e ladrão náutico, líderes de frotas comandando batalha em alto-mar usando ondas e o clima e o tempo ao seu favor... Lutadores estremecendo o solo e rachando ossos dos inimigos com poucos golpes…

Ele imagina seu mestre nos momentos de destaque dos controladores de poderes e energias.

—  Mágico invocando armaduras e humanoides de pedra para seu auxílio; mágico Elemental comandando quatro elementos ao mesmo tempo; mestre arbol se unindo com a natureza, comandando animais e até plantas de grande porte; mestre de magia podendo atravessar a pele resistente de demônios com seus poderes e até se defender deles… Mestre de maldição podendo envenenar, iludir e até enfraquecer grupos de combates e até exércitos.

Ray viu até dados de outras classes que a autora conhecia, mas não teve contato direto. Leu atentamente, pois acreditava que podia encontrar alguns no Grande Continente e as informações poderiam ajudar em sua missão.

Caçador: Ótimo em rastreamento em território familiar, bom em lutas de corpo a corpo e longo alcance, empático com animais e ótimo em técnicas de sobrevivência.

Guerreiro: Tradicional conhecedor do campo de batalha corpo a corpo, habilidoso em um arsenal de armas, honroso e fiel, sendo bem liderado, e em bom número faz grandes atos.

Guerreiro Praeteritum: Primeiros guerreiros de Arbidabliu, habilidosos em todo tipo de arma, são raros, pois para atingir esse nível têm que ter conhecimento em vários tipos de culturas e técnicas de outras classes, além de nascer com um dom.

Guerreiro Oriental: Tipo ortodoxo de guerreiro, pois segue à risca as leis de seus líderes, mestre da espada de uma lâmina, usando-a como se fosse uma extensão de seu corpo. São ótimos em defesa e ataque corpo a corpo e à distância. Mestres nessa área conseguem desafiar a lei da gravidade, podendo fazer grandes coisas.

Ladrão: Ágeis, espertos, furtivos, bons em identificar objetos de valor e na “arte da adaga”, que são técnicas de ataque e esquiva com adaga, normalmente individuais e covardes.

Sacerdote: Alto nível hierárquico, respeitados por todos, são representantes de algum deus e têm grande conhecimento diplomático e estratégico, ótimos em defesas mágicas e corpo a corpo.

Ray acha fabulosas as informações do diário. Lembrando-se da senhora que lhe deu, ele o usa para aperfeiçoar suas percepções juntando as informações do passado e das classes com seu “ponto de vista” das pessoas que encontrar.

Nesse pequeno tempo de estudo, Ray adquiriu grandes informações que faltavam para suas análises, melhorando até a análise que ele mesmo fez sobre a senhora misteriosa.

— Aquela senhora deve se enquadrar numa classe… Não se enquadra em mágico, nem Elemental… Mestre arbol não poderia ter me colocado numa dimensão ou me teleportado para um lugar a outro.

Ray associa um dos poderes de grandes mestres que Maxmilliam falou, podendo levá-los a uma dimensão mental como Orbis Absolute.

— É claro… Mestre de magia. Mas eu comi frutos do mar com ela, teria como se alimentar numa outra dimensão?

Ray fecha os olhos e imagina-se em uma dimensão cheia de comida, doces e uma enorme cama para dormir. Ele se deita na cama como se fosse relaxar com seus pensamentos, se espreguiça, e dá um pulo como um susto, olhos tristes e mãos na cabeça.

NÃO! E se ela for mestre de maldição e me envenenou, ou está usando suas ilusões em mim agora? Como isso é confuso…

Ray se desespera e levanta da cama, sussurrando para si mesmo:

— E se eu estou preso em suas ilusões até agora? Será que esta missão é verdadeira, ou estou dormindo?

Ele deixa o diário na cama e sai de seu quarto, onde vê tudo normal. Bate à porta de Maxmilliam e sussurra:

— Mestre… Mestre, preciso de ajuda.

Maxmilliam abre a porta. Ray rapidamente entra, empurrando-o, fecha a porta e, nesse desespero, Maxmilliam o questiona:

— O que houve?

— Mestre, como sei que não estou numa ilusão ou dormindo?

— Calma, vamos por partes, por que você acha que está numa ilusão ou sonhando?

— Num diário, eu li sobre classes, magias e seus poderes e vi especificamente uma com esses poderes…

— Mestre de maldição.

Ray se tranquiliza por Maxmilliam falar pacificamente e até como se já soubesse do que está acontecendo.

— Sim, mas como…

— Eu sou mestre de magia. Mestre de maldição seria o oposto, o que eu faço ele pode desfazer e vice-versa.

— Entendo.

— Ilusões são truques traiçoeiros e perigosos, já houve mestre de maldição matando um exército sozinho só com esse poder.

— Como?

— Ele os fez verem bichos no lugar de seus companheiros, assim eles se mataram achando que eram inimigos.

— Incrível, mas como saber?

— Lembrando-se de seus últimos momentos ou até dias e olhando os detalhes à sua volta.

— Como assim?

— Como agora, você sabe que não está num sonho porque não há fragmentos de memória do seu dia, num sonho você simplesmente aparece num barco em alto-mar sem saber como chegou.

— Sim, eu me lembro do meu dia todo, mas como esse dia todo não é uma ilusão?

— Ilusões não chegam a tanto, precisaria de muita concentração e tempo para focar numa só pessoa, além de montar um mundo na sua visão. Lembra que falei dos detalhes? Num sonho, você conseguiria, por exemplo, flutuar ou falar outras línguas, ou até mesmo ser outra pessoa.

Ray novamente fica com olhos tristes, boca trêmula e fala, irritando-se:

— Mesmo assim, como vou saber?

— Calma! Você já está me deixando nervoso! Tem como você sentir a presença do conjurador, já treinamos magia antes, você sabe como se defender.

Ray se tranquiliza novamente e, com ânimo, pede para seu mestre:

— Mas me ensine mais, eu sei pouco…

— Depois… Vamos comer primeiro, já saímos do segundo porto e já estamos a caminho do nosso destino.

— Mas já?

— “Já” não, ainda… Não gostei de pegar um barco com urgência, nem tem espaço para dormir direito.

— Mas sempre foi assim.

— Em grandes embarcações não, temos quartos iguais aos do castelo.

Ray entorta a boca com um ar importuno e faz uma chacota de seu mestre.

— É! Com corrimão em toda parte e comida já mastigada.

Maxmilliam entorta a boca e dá um cascudo na cabeça de Ray, respondendo à afronta.

— Não sou um velho inválido, garoto!

Ray passa a mão na cabeça e abre a porta, saindo do quarto com um sorriso sacana.

— É tão velho, que viu a roda do “Zodíaco” nascer.

Maxmilliam pega seu cajado e aponta para Ray, que, surpreso, fecha a porta e, rindo, dirige-se para o refeitório embaixo da cabine do capitão. Lá há uma mesa com comida e bebidas e outras para os passageiros se acomodarem e desfrutar do banquete.

Ray avista pela janela que há outro banquete no convés com mais pessoas e música, mas prefere ficar onde está, pois estava mais vazio e com mesas disponíveis para se acomodar. Ele se anima ao perceber que não está sendo vítima de uma ilusão e resolve comer. Pega carnes, legumes, uma bebida feita de frutas e senta a uma mesa com duas cadeiras.

Em seguida, Maxmilliam entra, cumprimenta alguns passageiros comuns com aparência de aldeões e se serve com salada, legumes, alguns pães com carne e vinho. Então se acomoda na mesa de Ray, que o questiona:

— Eu li sobre um “General de Mil Homens”.

Maxmilliam para de comer, encosta as costas na cadeira e, com olhar pensativo, diz:

— Já ouvi falar… Lembro… Um Tauru.

Ray se alegra em saber que os dados e relatos que estava lendo pouco a pouco se confirmam verídicos e questiona novamente seu mestre.

— Isso. O senhor o conheceu?

— De vista, mas onde você ouviu falar dele?

— Li no diário.

— Mas que diário é esse?

— Ele conta sobre classes, raças e alguns acontecimentos da Guerra D.

— É raro um relato da história por aqui.

— Por quê?

— Porque muitos relatos foram guardados na grande universidade que o Império de Cristal engoliu com seu ego.

— Nunca me contaram muito sobre a batalha da universidade.

Maxmilliam volta a comer, e Ray continua:

— Sei que meu pai morreu nessa batalha, acho justo saber como, por que e quem fez isso.

— Tudo ao seu tempo, conversaremos outra hora sobre isso, mas não coloque vingança em seu futuro, não fará bem a você.

— Entendido.

— Ótimo, mas me conte mais sobre esse diário.

Maxmilliam é interrompido por um grupo de oito homens altos, fortes, de pele escura e aparência semelhante, parecendo serem da mesma família.

Eles estão usando o mesmo padrão de roupa, faixa verde na cabeça, colete de pele, calça e bracelete de prata. Eles se aproximam e, dos oito, quatro puxam cadeiras de outras mesas, mesmo com algumas pessoas reclamando que as usariam, e sentam-se à mesa de Ray.

Os outros quatro ficam em pé puxando alegremente as roupas de Maxmilliam.

— Olha só quem saiu do buraco.

— O velho…

— Max!

— Milliam!

Todos os oito e Ray riem alto, e Maxmilliam, com sarcasmo, diz:

— A que devo a honra de encontrar vocês aqui?

— Você sabe, “mago”, adoramos uma festa, ainda mais com alguém tão animado como o senhor. Mas diz aí, esse é o “Grande Ray”?

— Vocês me conhecem?

— É claro, garoto!

— Éramos conhecidos do seu pai, Ynascar, vimos você pequeno… Algo que não mudou muito.

— Que maus modos os nossos… Eu sou Zuriel, e estes são meus irmãos Salatiel, Oziel, Nathaniel, Malquiel, Lemuel, Jaziel e Haziel.

Ray acha coincidência o “el” no final dos nomes. Maxmilliam percebe essa dúvida e lhe informa:

— Eles são os “Onze Monk”, não são irmãos do mesmo pai ou mãe, mas de sangue.

— Olha só! Viu como você nos adora?!

Os outros riem e comem o que está sobre a mesa. Maxmilliam salva alguns pães dos homens famintos e fala novamente com sarcasmo:

— É claro que vocês podem comer! Ia sobrar mesmo, tenho sorte de não estar toda a prole junta.

Ray acha tudo engraçado e questiona Zuriel:

— Vocês são onze?

— Sim, por nós sermos amigos de batalha e família, nós nos chamamos de irmãos e pegamos o nome de um mestre lutador, “Monk”, que fundou a cidade onde moramos.

Ray se lembra dos registros de lutador no diário e associa a informação, homens com grande estatura e fortes, podendo quebrar ossos de seus oponentes com poucos golpes. Pela rápida análise feita nos oito homens, Ray confirma que eles têm o perfil.

— Você também é nosso irmão, Ray, o que precisar é só chamar.

— É isso aí! Você também, Max, mesmo sendo “branquelo”, é nosso irmão.

Maxmilliam termina de comer o pão, cruza os braços e, com um ar cansado, responde:

— Obrigado por tal título, mas espero nunca precisar “incomodar” vocês com meus problemas.

— Assim disse “O Mago”…

— Mas precisamos de uma ajuda sua agora, se não se importar…

— Nosso irmão “tá mal”, e você, como um “ancião sábio”, deve saber se é algo grave.

Maxmilliam faz uma cara de brabo, e Ray os interrompe:

— É claro que vai ajudar, ele sempre me disse que tem que auxiliar e ajudar como for possível. Assim, se todos fizerem o mesmo, o mundo será um lugar melhor.

Maxmilliam esboça um sorriso.

— Ótimo, Ray, você está bem de conversa, não é mesmo? Suponho que ainda seja tímido, mas com a ajuda desses cavalheiros essa timidez será deixada de lado lá no convés, não acha?

Ray faz cara de assustado, e os Monk agitam.

— Isso aí, Ray! Vamos animar!

— Vamos, Ray!

— Vamos para a festa.



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