Volume 1

Capítulo 03: Desconhecidos: Amigo ou Inimigo?!

A senhora ri e responde de forma despojada:

— Eu sou Izolna, criança.

Ray termina de comer o que tinha na boca e continua com mais perguntas.

— A senhora trabalha na ilha?

Humildemente, a senhora o alerta enquanto coloca mais comida no prato.

— Menino, não encontrará pessoas abertas a conversar, acredito que você teve um bom treinamento e um bom estudo, pois nesta ilha há uma das melhores bibliotecas de Arbidabliu, então me diga: “Quem sou eu?”.

Ray a examina rapidamente.

— Estatura baixa, cabelos brancos e longos amarrados, olhos pretos, roupa básica de outra região, sem joias, sem armas ou armadura, aparentemente uns 90 anos, se for realmente humana.

— Bom, e o que você deduz?

— Humilde, experiente. A senhora disse que estava esperando convidados, e esta sala me diz que são convidados de alta classe, a senhora também deve ser, sinto sinceridade na senhora, mas não sinto muita emoção.

— Bom… Realmente sou muito racional.

— Pela altura e o modo de se vestir, pouco provável é qualquer classe guerreira. Pela humildade, não deve ser nenhuma classe referente a ladrão, arrisco dizer que é da classe mágica, ou uma ótima cozinheira, porque na ilha não há cozinheira que cozinhe frutos do mar e ainda tão bem assim.

— Obrigada… Você já comeu frutos do mar antes?

— Sim, quando fui para a cidade vizinha.

— Entendi… Viu como você mesmo sabia das informações? Poderosos inimigos o distrairão com coisas pequenas como comida para que baixe a guarda.

— Nos conhecemos de algum lugar?

— Conhecia seu pai, Ynascar, ele era um… Qual era o nome mesmo?

— A classe mais antiga, Guerreiro Praeteritum. Essa classe tem um grande conhecimento nas artes e culturas.

— Verdade, a mais antiga, uma classe invejada, não?

— Sim, um Praeteritum tem dom em todos os estilos e sabe usar qualquer arma, qualquer magia, entre outras classes.

— Sim, uma unificação, ou melhor dizendo, ela é que se dividiu nas que existem hoje. Você é um?

— Não, quem me dera, sou só um guerreiro, não conseguiria aprender as outras classes para me tornar um, sem falar que tem que ter o dom para conseguir, não é só treinar e estudar.

— Você está certo, mas vejo que você já é um ótimo guerreiro, e de coração bom.

Os dois estão quase terminando de comer, e ela continua a conversa:

— Falando em coisas antigas e formidáveis, você conhece as armas Electi?

— Ouvi falar, são armas ou artefatos extraordinários feitos por Electi do minério de um meteoro que caiu… Zordrak é o nome.

— Sim, é mais conhecido como arma Zordrak, o minério negro.

— Eles são indestrutíveis, não?

— Acredite, Ray, nada é para sempre; é claro que cada coisa tem seu tempo, uns mais do que outros, mas tudo e todos se vão, ou, como outras culturas supõem, “se transformam”.

— Mas essas armas são incríveis, pelo que eu li.

— Sim, sim, só um Electi de grande poder pode destruí-las e um ser de grande vontade e honra pode usufruir todo o seu poder.

Izolna olha para a janela e, com um ar de preocupada, diz:

— Nossa! O sol já está se pondo, tenho que ir para casa.

— Verdade! Preciso correr até o porto.

Izolna tira de suas vestes um diário e entrega para Ray.

— Tome, achei isto na biblioteca, vai ajudá-lo, tem tudo sobre os instrumentos e sobre os Electi das gerações passadas.

— Obrigado.

— Me faça um favor.

— É claro.

— Como foram usadas poucas páginas, peço que as preencha com dados da sua aventura, aí no final terá tudo relatado para próximas gerações.

— A senhora vai querer ler também?

— Espero que sim, se eu estiver viva até lá. Agora vá, antes que chegue atrasado e perca a embarcação.

Com um belo sorriso, Ray agradece.

— Muito obrigado, vovó Izolna.

Izolna ri alto e começa a limpar a mesa. Ray, ao sair da sala, esbarra em Maxmilliam, que passava pelo corredor à procura dele.

— Onde você estava? A embarcação já vai sair.

— Eu estava falando com a senhora aqui na sala.

Ray aponta para a porta de onde tinha saído, e vê que no lugar da sala há uma sacada pequena e se espanta. Maxmilliam, sem entender, o questiona:

— Sala? Nem cabem quatro pessoas em pé ali, e você chama de sala?

— Sim, mas…

— Você deve ter pegado no sono. Vamos, seus pertences já estão no barco.

Ray segue Maxmilliam, mas ainda tentando se conformar com o que ocorreu. No caminho, eles conversam.

— Existem outros seres divinos além dos Electi?

— Depende do ponto de vista, rapaz…

— Digo… sábios, outros “senhores”, anciões.

— Sim, há relatos de que na época do Zodíaco tinha alguns anciões.

— E por que só relatos? Não há confirmação da existência deles?

— Não é certeza que eles tiveram grandes poderes, existiram líderes e anciões, humanos que tiveram vidas extremamente longas, mas pode ser por usarem magia ou armas Zordrak.

— Os anciões que ajudaram o Primogênito na criação dos Electi?

— Sim, lembra-se da história?

— Anciões levaram coisas que consideravam importantes, assim foram levados um bode, um leão, um touro e um carneiro. Disseram que era importante para sua agronomia e até como defesa de seus familiares, além da reprodução dos animais e alimento. Também levaram, num cavalo, uma bela mulher, um escorpião e um caranguejo. Disseram que era importante, pois representava sua cidade, nobre, pura, perigosa quando ameaçada e resistente… Um levou seus dois filhos, um aquário com um peixe raro e uma balança. Disse que era o que ele cuidava todo o dia, pois trabalhava na beira do mar com seus filhos e usava a balança para deixar justa a troca de ouro por comida.

— Ótimo… E assim vieram os nomes do Electi do Zodíaco. A ideia original seria uma roda de animais, mas as coisas que eles julgam importantes foram o foco para a segunda era de Electi.

— Interessante como as coisas são criadas.

— E o que fez você pensar nesse ponto da história?

— Eu lembro que li algo sobre isso na biblioteca esses dias.

No caminho, Ray é cumprimentado por alguns colegas aprendizes e guardas que lhe desejavam boa sorte e para tomar cuidado.

Chegando ao porto, Maxmilliam e Ray sobem ao convés de um belo barco, grande, com capacidade de suportar até cem pessoas, feito de madeira, com mastros e velas com tons azulados e algumas marcas da Ilha da Água, como o desenho de uma lança de três pontas.

Maxmilliam observa que não há muitos passageiros e é abordado pelo capitão.

— Maxmilliam! Estão bem em cima da hora.

— Boa tarde.

— Já estamos desembarcando, por favor, se acomodem.

— Não se preocupe, nossos pertences já estão em nossas cabines.

Ray estranha haver pouca gente.

— Só vejo tripulação, só tem nós de viajantes?

— Não, antes de procurar você, eu vi alguns artistas embarcando.

— “Artistas”?

— Sim, por que a surpresa?

— É raro ver esse tipo de classe por aqui.

Enquanto Ray e Maxmilliam conversavam, os tripulantes, com seu capitão, arrumaram tudo para desembarcar, velas, cordas, entre outros itens necessários, e também algumas mesas, dando a entender que haveria um banquete ali para os passageiros.

O sol já está se pondo e as estrelas já estão iluminando o céu junto com as belas luas. Ao perceber o fato, Maxmilliam admira.

— Será uma bela noite, sem nuvens, uma brisa confortante, a companhia das estrelas e dos Filiis no céu azul e infinito.

— Por que são Filiis mesmo? Tem a ver com a nossa era?

— Nunca foi bom com histórias dos Electi, não? Ou não se interessa?

— Um pouco dos dois.

— Lembre, depois do Zodíaco, vieram os seus filhos, não necessariamente de sangue.

— Lembrei! Cada um representando um poder já usado.

— Sim, e são dez, o mesmo número de luas no céu.

— Tem vínculo?

— É claro, veja que as luas são a maior parte do tempo alinhadas com as dez ilhas dos Electi atuais.

— Sim, lembro, foi assim que usaram o nome Filiis, pois são conhecidos como filhos de Arbidabliu, pequenos planetas que rodeiam o nosso simultaneamente.

— E assim foram designados os filhos da segunda geração para ser a terceira geração de Electi, a nossa atual.

— Muita coisa para decorar num dia.

— Já era para ter decorado, você aprendeu isso há muito tempo.

— Sei.

— Ray, aprender de onde veio ou a trajetória de algo ajuda no seu entender.

Ray demonstra que ficou um pouco confuso, e Maxmilliam resolve mudar de assunto.

— Você vai entender. O barco já desembarcou, não quer aproveitar e comer algo? Deve ter algo mais adentro para os passageiros.

— Não estou com fome.

— Como não? Falaram-me que você passou na cozinha e não tinha nada para comer.

Ray associa que antes tinha fome e que depois comeu com a senhora que sumiu misteriosamente, e fica bem sério, com um ar preocupado, e questiona Maxmilliam:

— Até onde o poder das pessoas, raça e classes pode ir? Algo a mais que eu tenha que saber antes de seguir pelo Grande Continente?

— Nada que o quartel, estudos e seus treinamentos não mostraram. Você sabe que existem vários jeitos de enfraquecer, manipular, ferir e até matar alguém, existem várias técnicas, magias, poderes e armas, mas muitos usam poder só para ajudar os outros.

— Ilusões, encantos e magias… eu gostaria de saber mais sobre elas, não sei se saberia distinguir realidade da ilusão, me defender contra esse tipo de poder ou até mesmo saber usá-lo.

— Entendi. Nessa sua missão, teremos tempo para mais um nível de treinamento.

— Ótimo, mas por que estamos contornando a Ilha da Água?

— O barco fará três paradas, uma delas é no segundo porto da ilha, onde fica o comércio e a maior parte da população, outra na cidade Coniuro, o nosso destino, e depois irá para Affectus.

— A Ilha do Gelo?

— Sim, o nome mais popular, igual Pronuntio, que é mais chamada de Ilha da Água.

— Sim…

Ray se lembra de algo e fica preocupado.

— Mestre, e o artefato? Úrsula disse que…

— Não se preocupe, eu já estou cuidando bem dele.

— Ótimo, e o que é?

— Curioso, não?

— Preciso saber, já que eu o tenho que entregar.

— Não se preocupe, eu cuido disso, você já tem muito com o que se preocupar.

— Certo, se você diz.

— Bem… Já chegaremos ao segundo porto, até os outros passageiros embarcarem eu vou aos meus aposentos verificar se está tudo nos seus conformes.

— Boa ideia! Vou aproveitar e descansar um pouco.

Ray e Maxmilliam deixam o convés e vão para as cabines dos passageiros. Veem alguns aldeões e empregados arrumando um banquete, tudo limpo e um cheiro bom de comida. Para acomodar a todos, cada passageiro tem um “quarto” próprio que possui uma cama e uma mesa pequena ao lado para colocar seus pertences. A área é pequena, mas útil para descanso.

Maxmilliam e Ray entram em seus devidos quartos. Ray verifica seus pertences em uma mochila de couro bem resistente e grande em cima da cama. Tudo que está nela é apropriado para sobreviver alguns dias longe da civilização, como coberta, faca, panela pequena, algumas poções para alguns tipos de infecções e até doenças comuns, frutas e outras coisas simples, mas úteis.

Ao verificar que as armas também estavam ali, Ray coloca a mochila embaixo da cama e se espanta com o que estava em cima da mesa.

— O diário que Izolna me deu…



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