Volume 1
Capítulo 02: A Missão
Ray e Maxmilliam atravessam em silêncio o castelo até a sala de Úrsula. Maxmilliam pensativo e com olhar focado, e Ray observando o caminho e pensando longe. Vê detalhes que nunca parava para ver antes. Nas salas, via de relance quadros, instrumentos musicais, armas antigas, armas simples e pesadas. Ray olha e fala, baixo:
— O que levarei na minha missão? O que me aguarda? Será que eles ainda estão vivos?
Depois de passar pelos corredores e salas, chegam a uma grande e pesada porta com um alto relevo de um polvo gigante que precisa de quatro guardas fortes já ali posicionados para abri-la.
Ao entrar no salão, os guardas fecham a porta, e lá dentro Maxmilliam continua com aspecto duvidoso. Ray, bem observador, repara nos detalhes do grande salão, onde nunca havia entrado antes, um salão meio escuro com uma única janela ao fundo.
A sala é sustentada por grandes pilastras, véus grandes azuis e roxos do teto ao chão, estátuas de criaturas marinhas nas paredes e, no outro lado do salão, um grande véu com a sombra do trono e uma silhueta de uma mulher em pé atrás do véu. A cortina de tiras da janela atrás do trono está esvoaçante, fazendo sombra, parecendo que a mulher tem tentáculos. Ray fica impressionado, e eles ouvem uma voz bem calma.
— Obrigada por virem, Ray e Maxmilliam.
O véu entre eles se abre sozinho. Ray e Maxmilliam se curvam na presença da Electi Úrsula, uma mulher bonita, com aparência de uma humana de 50 anos, estatura média, peso apropriado à sua altura, pele clara meio azulada, cabelos curtos e brancos e olhos pretos. Ela está usando um vestido preto com um sobretudo transparente roxo sem manga, uma coroa de ouro de cinco pontas e um colar com uma concha de náutilos dourados como pingente.
— Levantem, não precisam de muita formalidade, os chamei aqui porque preciso de uma grande ajuda sua, Ray.
Ray, espantado, questiona:
— Desculpe… Mas o que a senhora gostaria de mim?
— Eu preciso que você leve um artefato para Libryans e que entregue para a rainha, ela conheceu seus pais e amará conhecer você… No caminho você passará por algumas cidades do Império de Cristal, e preciso que você dê uma olhada como estão as coisas por lá, pois os Electi estão com pressentimentos ruins e queremos ter certeza do que está havendo por lá… Não sei se você sabe, mas o rei do império adquiriu poder para bloquear a visão e o poder dos Electi em seus territórios. Essas informações são de grande ajuda para Libryans também.
Maxmilliam questiona, ainda com ar de dúvida:
— Senhora? Desculpe-me, mas não entendi o motivo de eu estar aqui, esta missão é do Ray, ou a senhora tem algo para mim?
— Mas é claro, Mestre Maxmilliam! Ray é um jovem aventureiro, tendo esta como primeira missão, e faz pouco tempo que ele se recuperou de uma doença grave, ele não poderá viajar sem supervisão de alguém experiente e de confiança, é claro…
Maxmilliam fica chocado, vê um grande sorriso no rosto de Ray e, perdendo a voz, tenta questionar:
— Mas, mas…
Úrsula o interrompe:
— Tem algum problema para vocês?
Ray fica sério, porém responde com um sorriso no canto da boca:
— Não senhora, para mim está tudo bem.
Maxmilliam admite o caso.
— Tudo bem… Tudo bem, minha senhora, eu o ajudarei nesta missão.
— Ótimo. Ray, vá aos seus aposentos e prepare-se, a embarcação que os levará ao Grande Continente sairá ao final da tarde.
— Não sei se estou equipado para uma aventura dessas.
— Não se preocupe, após pegar seus pertences, um dos guardas o esperará no quartel para orientá-lo e prepará-lo com nosso arsenal de armas e mantimentos.
— Certo, e o artefato?
— Até você embarcar, eu te entregarei, pode ir tranquilo…
— Senhora…
— Pode me chamar pelo nome, Ray. E você está preparado para saber de seus amigos?
Ray demonstra surpresa por Úrsula saber o que ele iria perguntar e, com um olhar triste, responde:
— Sim, por favor, soube pouco deles depois que partiram, era para eu estar com eles…
— Ray, não foi sua culpa ter ficado doente, “cancru” não é uma doença comum que curamos com poção ou até magia, essa doença é poderosa e levou tempo para curá-lo, muitos já morreram para essa doença, pessoas nas mesmas condições que a sua.
— Eu sei… Mas ainda me sinto culpado. Por que ainda não voltaram? Já faz três meses que partiram e dois sem notícias.
— Ray, eu não vou esconder nada de você, sei que vocês cresceram juntos. Rupert, Doug, Júlio e Meena…
— A senhora, digo, você os conheceu?
— Sim, Ray, me desculpe por não ter muito contato com vocês, mas esse cargo requer outras atividades cansativas e necessárias… Eu não designei a missão para eles, mas eu conhecia vocês de longe, infelizmente, vocês se destacavam no treinamento por estarem entre os melhores e entre os mais problemáticos…
Ray se recorda de um momento com seus amigos e sorri.
— Ray, eles foram para Copus Lithy e de lá foram para o Império de Cristal. A partir daí, não sabemos mais o que houve, nem se estão vivos.
— O império é famoso por não ter prisioneiros.
— Sinto muito, Ray… Mas te dou todo direito de procurar informações sobre eles em sua missão.
Ray demonstra-se animado e feliz.
— Posso?
— Mas não se desvie de sua missão, não importa o que aconteça, sempre siga o que lhe pedi, não posso perder mais guerreiros para o Grande Continente assim.
— Entendi, tem minha palavra, farei esta missão de ir a Libryans, investigar o império e no caminho, sem desviar do foco, saber sobre meus amigos.
— Ótimo, está decidido. Agora você pode ir…
— Obrigado.
Ray se levanta, reverencia e sai em direção ao seu próprio quarto.
— Vejo o senhor mais tarde, “Mestre”.
Maxmilliam sorri, e quando Ray sai do salão, Úrsula se aproxima.
— Obrigada por aceitar ir nesta missão.
Maxmilliam se levanta.
— Acredito que Ray sozinho ou com outro aprendiz chegaria bem em Libryans, gostaria de saber se tem algo a mais nesta aventura, ou só o império traz tanta preocupação?
— A ideia seria que só Ray fosse, para não demonstrar a intenção de “bisbilhoteiro”, mas como ele terá que atravessar o Império de Cristal, um lugar onde as leis são rígidas, além de ser um lugar hostil, eu gostaria que ele fosse supervisionado, e como você o treinou, conheceu seus pais e também tem um bom conhecimento sobre o percurso, seria uma ótima ideia que vocês dois fossem juntos.
— Entendi… E os amigos dele?
— Foi o que eu disse, infelizmente não sabemos.
— Temo que eles estejam mortos e ele descubra, ele ficou péssimo quando não pôde ir com eles, e pior quando não teve mais notícias.
— Entendi, mas agora só o futuro dirá.
— Esse pressentimento que vocês Electi tiveram eu também tive… Grandes poderes e mudanças rondam o Grande Continente.
— Sim, por isso preciso que vocês vejam o máximo possível, sigam para Libryans e contem tudo o que virem, mas não se exponham muito, em qualquer sinal de perigo saiam ou, se for preciso, voltem.
— Entendi, mas o império não está em paz com Libryans e os outros reinos?
— Por enquanto sim, mas a paz do Império de Cristal tem outro significado, e por isso nós queremos ter certeza.
— Interessante. E os outros líderes do Grande Continente?
— Eles são neutros, mas não vão contra as ordens do império, por medo do que ele pode fazer com suas cidades. Lembra-se da batalha da universidade?
— Lembro, foi nela que o pai de Ray morreu.
— Nossa! É verdade! Ynascar morreu nessa batalha, pena que o Iluminado não chegou a tempo de salvá-lo.
— Sim, depois dessa batalha nunca mais vi meu mestre.
— Mas sabemos que está vivo, deve estar no antigo mundo, ele adora as primeiras ilhas, a cultura deles é incrível.
Úrsula vai em direção à janela.
— O céu está lindo.
Maxmilliam sente um ar de preocupação.
— Algo errado?
Úrsula fala como se estivesse pensando:
— Tenha cuidado, Maxmilliam… Nós Electi perdemos muito de nossa visão de Arbidabliu, queria dizer que protegerei vocês no caminho, mas…
— Mas temos fé.
Ela sorri, ainda olhando pela janela.
— Fé… Sim… Tenho fé de que os verei novamente, Maxmilliam. Obrigada.
— Por nada.
Úrsula se vira, voltando a olhar para Maxmilliam.
— Já estava esquecendo… Eu pedi para alguns dos nossos aliados enviarem um caçador, ou pelo menos alguém com bons conhecimentos de sobrevivência nas florestas do Grande Continente, em outras palavras, um guia e guerreiro para ajudá-los.
— E quando encontraremos com ele?
— Ele os encontrará na floresta. Não se preocupe, você saberá quando ele aparecer.
Maxmilliam se reverencia.
— Obrigado por confiar-me esta missão, senhora.
Ele olha ao redor e vai em direção à porta. Antes de sair, ouve Úrsula:
— Maxmilliam… sinto desapontá-lo, mas você encontrará muito mais do que simples ladrões no caminho.
— Sim, eu sei.
Antes do fim da tarde, Ray pega seus pertences no quarto, vai até o quartel para se informar com o guarda dos possíveis perigos entre animais de pequeno a grande porte, as classes mais avançadas como mestres de luta e magia que poderia enfrentar no caminho.
Ele escolhe uma espada leve de uma mão por ter bastante experiência com esse estilo de arma, uma funda feita com um pano resistente e couro; esta arma sempre lhe atraiu por ser pouco usada, uma espada de lâmina larga e de uma mão, um peitoral feito de prata refinado que protege frente e costas.
Ao mesmo tempo, Maxmilliam foi aos seus aposentos se preparar para a missão, foi até a biblioteca do castelo e lá ficou até tarde. Ray, depois de se arrumar e preparar tudo para a missão, foi até a cozinha verificar se tinha direito de comer, pois já tinha passado do horário.
Chegando à cozinha, ele viu que não tinha mais comida pronta, pegou um pão e saiu comendo pelo acampamento até o castelo. Andando pelo castelo, avista uma senhora em uma das salas do terceiro andar com um belo banquete de frutos do mar com assento para quatro pessoas. Ao vê-la sozinha, ele se aproxima e diz:
— Me desculpe interromper, mas…
A senhora fala, sem deixá-lo terminar:
— Sente-se, menino, deve estar com fome, eu estava esperando uns convidados, mas imprevistos sempre acontecem.
Ray, sem pensar, agradece, senta e começa a se servir. Como estava com fome, não mediu comida à boca, formalidade e informalidade. Ao ver o modo como estava comendo, se desculpa com a senhora com a boca um pouco cheia.
— Me desculpe pelos meus modos, estou com muita fome.
Ela responde com um belo sorriso humilde.
— Não se preocupe, eu criei porcos por um bom tempo, são animais impressionantes.
Ray fica sem graça pelo comentário, se ajeita melhor na mesa, na forma de comer, e conversa com a senhora.
— Não é irônico estarmos comendo frutos do mar na ilha em que mais os “preservam”?
A senhora pensa na pergunta e responde com ar de esperteza.
— Não. Já imaginou que por esse motivo esta ilha tem os melhores frutos do mar?
— Nunca pensei dessa forma.
Em um jeito brincalhão e humilde, a senhora reverte o problema.
— Se olhar bem, irônico é um guerreiro abaixar a guarda para alguém que não conhece e comer de sua comida sem ao menos questionar seu nome.
Ray para de mastigar e, com um olhar de medo, pergunta:
— Quem é a senhora?