Apoteose Fantasma Brasileira

Autor(a): Alexandre Henrique


Volume 1

Capítulo 5: Corvo (3)

Um clima ameno envolvia o local onde Leon estava, olhando de boca aberta, ele percebia a discrepância entre as classes a que ele e Celina pertenciam. Caminhou em direção à grande casa que parecia uma mansão, engolindo em seco a cada pensamento negativo e batida acelerada do coração. 

A ansiedade tomava sua mente enquanto ele se encontrava diante da porta da princesa, e agora respirava fundo enquanto pensava:

“Eu pareço um menino da quinta série agora.”

Apertou a campainha enquanto arrumava seu cabelo para trás da orelha, e, sem dar tempo para que a porta se abrisse, deparou-se com uma espécie de anjo. A beleza estonteante de Celina brilhava como se fosse a única estrela na escuridão.

— Estava te esperando. Pode entrar — ela sorriu brilhantemente.

Ela balançou a cabeça ao se afastar da porta. Leon, novamente, engoliu em seco e apressou-se para entrar, não querendo prolongar a situação constrangedora.

— Desculpe pelo atraso, tive alguns casos importantes para resolver.

— Não se preocupe, você vai fazer hora extra hoje, já que não vou te deixar ir sem tomar pelo menos metade daquela garrafa — disse Celina enquanto apontava para uma mesa no meio da sala.

Havia uma garrafa de vodka em cima da mesa, junto de diferentes salgados e guloseimas. Leon ficou assustado e apertou o estômago, sabendo que aquilo não era um bom sinal. 

Quando olhou para Celina, que sorria de maneira estranha, percebeu que era uma armadilha para ambos beberem até o amanhecer.

— Bem, querido príncipe, me conte como foi seu dia enquanto bebe um pouco comigo.

Sentou-se perto da mesa e fez um gesto para ele fazer o mesmo. Respirando fundo e colocando um sorriso no rosto, ele obedeceu. Enquanto servia a vodka, percebeu que ela já tinha uma cerveja em mãos, Leon fez uma expressão de dúvida.

— Acho que você confundiu algo. Não vou beber isso, você vai — disse Celina com uma expressão presunçosa.

Ela deu um gole na cerveja. Leon não pôde deixar de sentir medo e apreensão, mas mesmo assim bebeu.

— Haha, então você me convidou apenas para beber? — perguntou Leon enquanto tentava não fazer uma careta.

— Não, na verdade, queria ouvir como foi seu dia.

Leon tomou outro gole de vodka, percebendo que aquela bebida infeliz poderia ser sua salvação naquele momento. Por um instante, começou a ficar desatento, talvez devido ao álcool fazendo seu efeito. Foi então que percebeu o ambiente ao seu redor.

A casa de Celina tinha poucos móveis, apenas uma TV relativamente grande, um sofá branco que ocupava boa parte da sala e a mesa repleta de bebidas e comidas. O mais perceptível era um cinzeiro de cristal.

— Eu trouxe para você — disse Celina enquanto olhava os movimentos de Leon.

— Hmm? Ah, perdão, não queria que se incomodasse em trazer algo do tipo — respondeu Leon enquanto balançava as mãos em negação.

— Não foi incômodo. Era do meu pai, uma lembrança, posso dizer.

Leon olhou para Celina, que fazia uma expressão de indiferença, mas ele pôde perceber a tristeza em seus olhos, ele estendeu a mão e segurou a dela, sorrindo suavemente.

— Bem, então vou aproveitar.

Leon pegou o cigarro do bolso e o acendeu com o isqueiro de seu pai. Sentiu a fumaça sair de seus pulmões, mas de repente, o cigarro desapareceu de sua boca. Num movimento rápido, viu Celina com o cigarro em sua boca, e quando ela tragou, tossiu.

— Como… você, consegue fazer isso? — exclamou Celina enquanto tossia a fumaça para fora de seus pulmões.

— Haha! Logo você perceberá que não é um bom vício. Então, passe para cá!

Ele pegou o cigarro dela novamente, notando que estava sorrindo. Os dois pareciam à vontade perto um do outro, compartilhando histórias e experiências.

Mas foi ao olhar para o pulso de Celina que Leon percebeu algo familiar. Ficou sóbrio na hora ao ver o símbolo ali. Fazendo ele engolir rapidamente o líquido, que o fez engasgar e cuspir um pouco no chão ao lembrar dos corpos das vítimas.

— Oh, meu Deus! Espere aqui, vou pegar um pano! — disse Celina enquanto se levantava rapidamente.

Leon ficou paranoico. Tentou se levantar, mas não conseguiu, caindo de joelhos. Ela voltou com um pano, mas ele estava absorto em pensamentos.

"Por que ela tem aquele símbolo em seu pulso? Como não percebi? O que ela tem a ver com aquele lugar?"

— Celina, quando fez essa tatuagem? — Perguntou Leon enquanto ele sentia uma tontura.

Ela fechou os olhos e respirou fundo.

— É algo que meu pai mandou fazer quando estava na empresa dele. Não tem muito significado.

Leon suspirou. Olhou para suas roupas molhadas de vodka e suspirou novamente, sem esperança. Enquanto Celina limpava o chão, ele se aproximou e tocou seu ombro.

— Me desculpe, Celina, mas pode me dizer onde é o banheiro?

— Sim, no final do corredor à esquerda. Está aberto.

— Ok, desculpe por tudo.

Leon correu para o banheiro, tentando controlar seu medo e ansiedade. Tentou ligar para o delegado, mas não obteve resposta. Saindo do banheiro, notou um quarto entreaberto com jornais sobre assassinatos e várias fotos riscadas, junto a papéis com desenhos de corvos.

Esforçou-se para não olhar e voltou à sala. Encontrou Celina sentada olhando para a TV. O que ele ouviu em seguida o fez tremer.

— Fomos informados de que o delegado não chegou em casa. Seu carro foi encontrado capotado e sua família está desaparecida.

"O que aconteceu? Como tudo isso pode acontecer em apenas um dia?"

Celina percebeu Leon no ambiente e, observando seu rosto pálido e suas mãos tremendo diante da boca, ela suspirou um pouco e começou a falar.

— Você pode voltar para casa, Leon. Deve estar um pouco abalado pela notícia, certo? Não se preocupe, vamos nos encontrar em um dia diferente.

Ela se levantou e encostou em Leon, que evitou um pouco o toque de Celina, mas desistiu e balançou a cabeça em afirmação. Ele se encaminhou para a saída, atento e assustado, mas não podia deixar esses sentimentos dominarem sua mente. Saiu da casa de Celina e, nem percebendo o tempo passar, já estava em frente à sua casa.

Era como se sua memória não estivesse funcionando. Já estava em frente à porta de seu quarto. Antes de abrir, percebeu os olhares de alguns moradores, seus vizinhos, para ser exato. Não se importando, entrou em seu quarto e, depois disso, não se lembrou de mais nada.

Quando acordou, percebeu algo de errado. Estava dormindo em seu sofá, na frente da porta, dando visão para todo o quarto, que antes, minimamente arrumado, agora estava totalmente revirado.

Várias coisas estavam largadas de um lado para o outro, e sua cama estava de cabeça para baixo. Não entendia a situação, e a dor de cabeça que sentia o fez ficar cada vez mais zonzo. Ele não sentia as pontas de seus dedos. Parecia que estava sufocando. Por isso, a primeira coisa que passou em sua mente foi sair do quarto.

Fora do seu quarto, respirou fundo. Sentiu as extremidades de seu corpo tremerem. Olhou para o céu e o sol estava em seu auge. Não estava com seu celular nem seu relógio. Na verdade, nem mesmo sua carteira estava consigo.

"Como assim?"

Não tirara sua roupa e nem mesmo tirara esses itens de seu bolso, mas antes que pudesse fazer alguma coisa, sentiu uma aguda dor atrás de sua cabeça, e logo o mundo, que estava reto, começou a girar. Sentiu o chão em seu rosto e algo quente em sua nuca. Colocou a mão e viu sangue nela.

Olhou em volta e percebeu pessoas o arrastando, não pessoas desconhecidas, mas sim os vizinhos que haviam olhado estranho para ele.

"Droga! Logo agora?"

Tentou se debater, mas outro homem bateu em seu estômago com um pedaço de madeira, o que o fez cuspir saliva. Escutou dos homens:

— É tudo culpa sua! Se você não estivesse aqui, ela teria nos visto, não você!

"Como?"

Leon estava um pouco mais acordado agora. Com certeza escutara alguém falar de alguém.

— Você arruinou meus planos, seu merda!

 

Ele sentiu seu estômago queimar com o chute que havia tomado; logo, seus braços fizeram um barulho estranho, seguido por suas pernas e, em seguida, sua cabeça, o que o deixou um pouco zonzo. Naquele momento, ele só podia ter uma certeza:

“Droga, eu vou mesmo morrer por pessoas como essas?”

Ele encarou os dois homens que estavam vidrados no corpo de Leon no chão, e apenas Leon percebeu que alguém estava se aproximando deles por trás. Era um beco pequeno onde estavam, então muitas pessoas podiam entrar ali para ver o que estava acontecendo, mas Leon não esperava que fosse aquela mulher.

Leon sentiu o sangue cair em seu rosto quando as balas de uma arma perfuraram as cabeças dos homens. Leon olhava para aquela cena como um sonho, ou como se estivesse alucinando. Ele não podia acreditar, mas o teste de realidade confirmou que não era um sonho, já que a agulha que estava em sua coxa estava tão real quanto a dor que sentia em sua cabeça e corpo.

— Durma, meu bem, e logo você entenderá tudo que está acontecendo.

Ele pôde ouvir a doce voz daquela mulher, o que causou um sentimento de medo em sua mente. Leon fechou seus olhos enquanto sua consciência adormecia.

Leon acordava em um lugar escuro e úmido, sentindo seus pés e mãos amarrados em uma cadeira. Em sua frente estava apenas uma TV ligada sem áudio. Leon respirava ofegante enquanto percebia estar apenas com suas calças.

Sua mente tentava procurar alguma coisa a sua volta, mas tudo que ele podia ver era a escuridão e uma televisão em sua frente. Mas logo que seus olhos se ajustaram, ele percebeu que não estava sozinho. Tinha alguém com ele, uma sombra de uma mulher que se aproximava e revelava seu rosto no meio da escuridão: cabelo ruivo liso e grande, batom vermelho nos lábios, pele branca e um vestido comprido preto. Em suas mãos, duas taças de vinho, com as unhas pretas como garras de um demônio.

Leon olhou para Celina e sentiu medo, ele estava se debatendo na cadeira, quando viu o sorriso assustador no rosto daquela mulher. Ela se aproximou até ela não poder mais e se abaixou no limite dos olhos de Leon.

— Ó! Meu querido príncipe, como você chegou a esse ponto?

Leon não respondia, não porque não queria, mas sim porque estava amordaçado.

— Me desculpe se está desconfortável, é que eu não tive escolha, já que você é uma pessoa muito mais forte que os outros que capturei. Deve ser por isso que está bem agora, não é? Ainda mais após ser espancado — disse Celina enquanto sorria.

Ela deu um gole no vinho que estava no copo na mão esquerda. Ela olhou para Leon novamente e deu uma gargalhada.

— Haha, não se preocupe! Não fui eu que mandou eles fazerem aquilo com você! Eu nunca iria te machucar! Claro que não é desse jeito, mas saiba que eles morreram, ok? Ah! Me deixe te dar um pouco de vinho!

Ela se aproximou de Leon e tirou a mordaça que estava em sua boca, e no momento que fez isso, Leon gritou:

— Alguém!…

Mas logo foi calado com um chute no estômago.

— Meu amor, como você pode tentar algo do tipo? Você se esqueceu de que você é um detetive? Não percebeu que isso nunca funciona? Não estamos em um filme de suspense, agora deixe-me te ajudar com algo!

Ela se sentou no colo de Leon com uma taça de vinho em sua mão direita, seu sorriso estava de orelha a orelha, enquanto Leon tentava esquivar seu rosto. Ela segurou mais forte e tentou colocar o vinho em sua boca, ele desviou a cabeça e o vinho escorreu para o seu corpo.

— Ah, meu querido, você derramou tudo! — exclamou Celina com um tom irônico.

— Desgraçada, o que você fez? — disse Leon enquanto olhava para Celina com raiva.

— Eu? Eu não fiz nada! Quero dizer, eu ainda não fiz nada — ela se levantou e olhou para os seus dedos que estavam cheios de vinho.

— O que você tem a ver com o laboratório?

Leon gritou e tentou se soltar, mas ele estava muito preso na cadeira.

— Haha! Meu detetive estava realmente trabalhando, parece que pegou as pistas que deixei, olha foi difícil montar as coisas certinho, sabia? — disse Celina em um tom irônico enquanto gargalhava.

Leon parou um pouco para observar a pessoa louca que estava em sua frente, ele percebeu que tudo estava planejado, ele percebeu que ele caiu facilmente em seu plano.

— Exatamente o que está pensando, eu montei cada um daqueles desgraçados para você especificamente!

— O que você quer dizer? Eu nunca te vi!

— Ah! É verdade, você não se lembra, mas não se preocupe, a partir dos próximos dias você vai se lembrar. Hmm, eu acho que estou esquecendo de algo… — ela colocou a mão em sua cabeça.

Ela olhou para o teto, e logo ela bateu palmas e virou para a TV, ela caminhou na direção dela e pegou o controle que estava em cima dela, ela ligou e Leon pode ver algo passando nos jornais.

— Parece que eles encontraram os corpos daqueles outros trastes.

Um homem havia sido encontrado, desmantelado e com partes do corpo faltando, Leon acabou sentindo um enjoo forte e virou sua cabeça, ele lembrou do que tudo aquilo se tratava.

— Por que você está fazendo isso comigo? Se você apenas queria se vingar daqueles homens?

Celina olhou confusa para Leon, o que fez ele tremer um pouco.

— O quê? Eu não queria me vingar deles! Eu queria vingar você!

Ela sorriu e chegou perto dele novamente.

— Tudo que aconteceu foi devido a você, meu querido — disse Celina enquanto colocava suas mãos no rosto de Leon.

— Mas eu não tenho nada a ver com isso! — exclamou Leon com receio.

— Haha, bem, de certa forma você não está errado, mas não se preocupe, eu tenho vários planos para você se lembrar, já que também é um fantasma.

Leon escutou aquela frase e lembrou do laboratório.

— O que você quer dizer com isso?

— Não se preocupe! Você vai entender, mas por agora estou precisando de algo de você.

Ela se aproximou de Leon e ele começou a encará-la, ela sorriu e segurou o seu rosto tomando um pouco do vinho. Ela então forçou um beijo, fazendo Leon engolir um pouco do vinho. Em seguida, ela soltou o rosto dele e se afastou.

— Por enquanto, você irá ficar aqui, mas logo eu irei voltar, eu preciso ainda tenho que explicar o que tudo significa, não é?

Ela gargalhava enquanto Leon tossia o resto de vinho que estava em sua garganta. Ele encarou ela e percebeu que ela apenas sumiu entre a escuridão. Ele não podia deixar de pensar em uma forma de escapar, e por isso ele podia sentir as cordas que o amarravam se soltar pouco a pouco.



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