Apoteose Fantasma Brasileira

Autor(a): Alexandre Henrique


Volume 1

Capítulo 31: Vinculo.

Um conforto em sua mente que ele não sentia fazia tempo, um lugar com uma água profunda e avermelhada, porém ele não afundava. Ele olhava à sua volta, lembrava-se de desmaiar, mas não de se mover. Também não se lembrava de quem era. Ele olhava para suas mãos e sentia o líquido escarlate nelas.

Foi assim que ele olhou para um espelho em sua frente que não estava lá. O ambiente estava estranho, como aquilo poderia existir? Ele estava de pé na água avermelhada e profunda. À sua volta, havia montanhas de pedras pretas como a noite. O céu estava claro, sem nenhuma nuvem. A paisagem se repetia infinitamente no vazio, e quando finalmente encarou o espelho, ele se assustou.

Aidan lembrou-se de quem era, lembrou-se do que estava fazendo e também do terror que era sua mente. O espelho mostrava alguém que não era ele. Ele não conhecia aquele rosto, por mais que fosse o dele, mas outra imagem aparecia em seu cérebro. Era confuso; mesmo que ele olhasse para o espelho e visse seu reflexo, aquilo tinha outro significado em sua mente.

Era um homem de cabelos compridos e loiros, seus olhos vermelhos e pupilas parecidas com a de um lagarto, sua pele era cinza, seus dentes eram pretos e estavam seguidos de um sorriso macabro. O homem parecia estar preso por correntes feitas de pedra preta, e havia algo perfurando seu coração: uma lança vermelha vibrante com detalhes em ouro.

Aidan respirou fundo, mas a sensação de preencher seus pulmões, não aconteceu. Isso o fez questionar aquela realidade, mas sem tempo para pensar, aquilo falou.

— Olá, garoto, parece que finalmente nos encontramos.

— Quem é você? — perguntou Aidan.

— Eu sou você, e também não sou. É complicado de explicar, porém, posso dizer que sou sua atual consciência, aquela voz irritante em sua mente que te manda fazer coisas perigosas. Haha, pode dizer também que sou alguém que você irá se tornar — disse o homem.

— Como… Por que estou aqui? — perguntou Aidan.

— Você quase morreu! De novo! E parece que aquela garota está te ajudando. Espero que consiga conquistar ela… ela parece ser alguém gentil e que te suporta o suficiente pelo menos. Haha — disse o homem, dando uma pequena gargalhada.

Aidan sentiu uma certa dor em sua cabeça, uma luz invadiu sua visão, parecia quando ele estava acordando de um sonho.

— Ah! Parece que você está acordando. Bem, isso foi rápido. Da próxima vez iremos nos encontrar e decidir algo importante. Até lá, tente não morrer de novo! — disse o homem, sorrindo de orelha a orelha.

Aidan abriu os olhos para sentir sua cabeça em um lugar quente e aconchegante. Seus olhos bateram em uma visão que ele não esperava ter ao acordar. Ele via Camélia de baixo para cima, sua visão dava diretamente para o seu busto e aquilo o fez levantar rapidamente, para cair de novo.

— Você acordou! — disse Camélia surpresa.

— Eu… o que aconteceu? — perguntou Aidan, envergonhado.

— Eu te salvei de uma enrascada, não se lembra de nada? — disse Camélia, enquanto puxava Aidan para perto dela.

Aidan olhou à sua volta e viu que estava em uma espécie de cabana. Ela era feita de madeira e não havia móveis. Camélia estava encostada na parede da cabana e tinha apenas um cobertor à sua volta. O estado dele estava destruído e sujo, mas estar ombro a ombro com a presença dela fazia Aidan se sentir aquecido. Ele olhou para o rosto dela, e ela parecia preocupada com ele. Tudo que podia lembrar era de ver um homem asiático com chapéu e roupas pretas indo em sua direção com uma espada.

— Quem era aquele cara? — perguntou Aidan.

Camélia olhou para Aidan e suspirou.

— Era um caçador. Ele é enviado pelo rei para matar fantasmas como você, que saem da linha, ou para fazer uma limpeza em um nobre da organização. Por acaso, ele estava perseguindo você — respondeu Camélia.

— O que ele poderia querer comigo?

— Eu não sei, mas ele dizia algo sobre você ter matado os irmãos dele, o que significa que você matou alguém da Null Platina — disse Camélia.

— Espera, você quer dizer o experimento fantasma? O que o projeto tem a ver com ele? — perguntou Aidan.

— Ele é de lá, ele é um dos sobreviventes e é obcecado com todos de lá — respondeu Camélia, enquanto segurava suas pernas.

— Isso é estranho, já que eu também sou do Projeto.

— Espera, você também é um sobrevivente? Como isso foi ocultado nos registros?

— Bem, pode-se dizer que eu não sobrevivi. Foi a primeira vez que morri, e também a vez que minha irmã virou um fantasma.

— Entendi.

Os dois ficaram em silêncio, mas não era desconfortável. Ambos estavam cansados, Camélia principalmente. Ela estava cuidando de Aidan desde o momento em que ele havia brigado com o caçador. Sua mente estava exausta, junto de seu corpo, e isso fez ela dizer algo de que talvez se arrependesse depois.

— Você teve sorte de sobreviver ao experimento, agora é um fantasma.

— Não, não foi sorte, foi uma maldição. Por causa disso, minha irmã está quase morta, e agora você também está aqui comigo, presa em uma cidade com um louco.

— Você ainda vai conseguir ajudar ela, só precisamos acabar com aquele doutor estranho e voltar para casa.

Aidan olhou para o rosto de Camélia e ela estava tranquila. Isso o irritou um pouco, mas não com ela, e sim com ele. Não conseguia sentir nenhuma esperança, ou talvez não percebesse que até agora, ele nunca sequer pensou no que estava fazendo. Aidan estava no automático, algo em sua mente o prendia a seguir as coisas. Ele não tinha um grande objetivo, ele não tinha um sentido, e aquilo fez ele sentir nojo.

— Não sei como você consegue ter tanta esperança — disse Aidan com certa rispidez.

— Talvez seja porque eu não sou um fantasma — respondeu Camélia com um sorriso no rosto.

— Haha… — Aidan não sorriu, apenas ficou triste. Sua mente estava confusa, ele não tinha objetivo, nem mesmo uma casa para voltar. Aidan não conversava com sua irmã direito, ele havia abandonado a esperança de viver uma vida normal.

Camélia olhou para aquele homem que fazia coisas incríveis. Ela não conseguia pensar como ele ainda não percebeu que estava rodeado de pessoas. Como ele era diferente daqueles fantasmas que pareciam robôs que apenas seguiam ordens. Ele era uma pessoa que todos da organização queriam conhecer, o único fantasma verdadeiro que foi contra seus criadores.

Camélia respirou fundo e pensou também em como ele ignorou completamente a existência dela. Ela olhou para suas mãos, que estavam tremendo com o frio, e as apertou. Ela tomou coragem do que iria falar, mesmo sendo vergonhoso.

— Olha, Aidan, você é uma pessoa incrível, sério. Mesmo que você me dissesse que não, eu iria discordar. Você superou muitas coisas que pessoas normais não conseguiriam. Deus, poderia dizer até mesmo que os mais altos fantasmas não conseguiriam. Mas agora você está aqui, chorando suas pitangas. Você não perdeu sua esperança, você só está pensando demais. Você tem muitas pessoas à sua volta, mesmo que não perceba. Você é mais humano do que fantasma — disse Camélia. Ela tinha suas orelhas quentes e vermelhas junto de seu rosto. Ela não conseguia acreditar que teria que alegrar um homem adulto.

Ela se colocou na frente de Aidan e o encarou. Os olhos pareciam vazios como sempre, mas talvez ela conseguisse ver um pouco de luz neles. Camélia colocou suas mãos nos olhos de Aidan.

— Sabe, tive interesse em ti por muito tempo. Claro, principalmente devido aos boatos do fantasma que foi contra a mão que o alimentou. E mesmo que eu fosse uma humana e meu irmão não quisesse que eu me aproximasse de você, fui contra isso. Eu quis me aproximar de você por te achar uma pessoa curiosa, e mesmo que me diga que não tem esperança, Aidan, eu tenho, principalmente em você. Então — ela fez uma pausa para conseguir respirar — ainda temos que nos conhecer bem quando sairmos desse lugar, não acha? — disse Camélia, enquanto se levantava com pressa e ia em direção à porta.

Aidan não conseguia dizer nada. Ele apenas ficou feliz, não conseguia dizer nada para aquelas palavras. Ele novamente acabou desistindo antes de tentar. Ele sorriu, pensou em como aquelas palavras de Camélia eram parecidas com as de sua irmã. Ele teria que fazer alguma coisa, não poderia ficar parado agora, não poderia deixar para trás toda essa esperança que elas duas deram para ele.

Aidan se perguntou que face ele estava fazendo agora, talvez uma bem envergonhada, já que sentia suas bochechas quentes. Ele sorriu novamente, até uma pequena risada sair de sua boca. Ele viu Camélia sair da cabana com o rosto vermelho como um tomate.

— Haha, você é terrível nisso, droga… talvez eu realmente tenha me apaixonado, haha — disse Aidan, enquanto cobria a boca.

— Cala a boca, idiota — respondeu Camélia com sua voz trêmula.

Aidan se levantou e se sentiu grato pela primeira vez na vida por ter quase morrido. Ele seguiu Camélia para fora da cabana. Ele olhou para o céu e ele estava nublado. Respirou fundo e lembrou dos seus objetivos. Aidan ainda tinha uma criança para resgatar e um desgraçado para matar.

— Então, como iremos fazer esse plano? — perguntou Aidan.

— Precisamos chegar à fábrica e resgatar as crianças e Asha. Também precisamos ver como estão as coisas no castelo. Então, iremos fazer o seguinte: vamos nos separar. Você vai para o laboratório e enfrenta o doutor, enquanto eu salvo Asha. Depois, nos encontramos e voltamos para o castelo — respondeu Camélia.

— Certo — disse Aidan, enquanto se espreguiçava.

Eles tinham pouco tempo para fazer algo mais elaborado, e por isso correram para fora daquela floresta. A fábrica era uma grande construção, encravada em uma montanha, então era difícil errar o lugar. E como não havia segurança nenhuma, eles apenas precisavam entrar no lugar para conseguir o que queriam, mas eles não poderiam esperar por ver aquela cena que parecia um filme de terror, no lugar da fábrica havia apenas uma grande cratera.

Havia pedras negras saindo daquele lugar que deveria ter uma fábrica, um líquido avermelhado pulsava de dentro da terra, em cima dos destroços da fábrica estava o doutor, em seus braços, Asha ficava adormecida, Aidan sentiu um arrepio em sua espinha, ele olhou para suas costas, e assim como da primeira vez, o caçador vinha pelas ruas abandonadas da cidade, em suas mãos uma grande espada medieval.

Aidan podia sentir sua raiva de longe, mas algo parou aquele caçador, quando ele chegou perto daquele buraco no chão, pela primeira vez em muito tempo, aquele caçador sentiu um arrepio em sua pele.

— Droga! — exclamou Camélia.

— O que esse cara está fazendo aqui? — disse Aidan.

— Agora, sim, deu merda. Na nossa frente está o caçador e atrás de nós, está um maluco — disse Camélia, enquanto se preparava para lutar.

— Lia, vamos nos separar. Eu vou levar o caçador e você vai atrás de Asha. Irei te encontrar após escapar do caçador — disse Aidan.

Todas as peças estavam no lugar, e com o plano de Aidan, Camélia correu em direção do doutor, enquanto Aidan correu para a direção do caçador. 



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