Apoteose Fantasma Brasileira

Autor(a): Alexandre Henrique


Volume 1

Capítulo 20: Morte(1)

A chuva caía torrencialmente. As pessoas iam e vinham do bar, até a noite cair e elas desaparecerem lentamente. O lugar era calmo; poucas pessoas estavam presentes, sendo o próprio barman conversando com um homem de terno e cabelos lisos e pretos. O homem parecia entusiasmado com a conversa.

O barulho da porta se abrindo e do pequeno sino ecoou por todo o bar. Duas figuras que chamavam atenção entraram. Um homem alto com roupas e chapéu escuros, seu sobretudo cobria metade de seu rosto, sendo o próprio escondido por uma máscara partida. Ao lado do homem, uma mulher com roupas de empregada da era vitoriana, ela carregava uma grande mala preta com detalhes em vermelho.

Os dois caminharam até o balcão, e a cada passo que davam, pingos de chuva caíam de suas roupas, deixando um pequeno rastro de água. O barman limpou a garganta com uma tosse e pegou dois copos. Em todos os seus anos trabalhando, ele sabia exatamente o que aquelas figuras queriam. Geralmente, pessoas que vão a um bar tarde da noite daquele jeito precisam de algo forte. A empregada foi a primeira a falar.

— Desculpe-me pelo chão molhado, mas não tínhamos nenhum jeito de conseguir proteção.

O barman sorriu gentilmente.

— Não se preocupe, vocês são os últimos que irei atender hoje. E então, o que querem?

O homem se sentou enquanto a empregada estava de pé ao seu lado. A presença diferente dos dois fez todos grudarem seus olhares neles. O barman ficou um pouco em dúvida se teria que ter ajuda com aqueles dois, mas após receber uma resposta satisfatória da empregada, ele se aliviou.

— Gostaria de uma bebida forte para essa noite difícil — disse a empregada, enquanto tocava no balcão.

— Certo, algo mais? — respondeu o barman.

O clima frio e o silêncio deixavam todos no bar um pouco desconfortáveis, ainda mais após as luzes serem apagadas sem aviso. O barman gritou para acenderem as luzes de emergência, mas só podia ouvir grunhidos e coisas sendo quebradas. Temendo pela própria vida, ele pegou uma lanterna e apontou para onde os barulhos vinham. Ele podia ver a empregada com adagas cortando a cabeça de um dos guardas do local.

Logo as luzes foram acesas novamente, e o local estava totalmente destruído e sujo pelo sangue dos fantasmas que ali estavam. O barman e o homem que estava ao seu lado sentiram um arrepio em suas espinhas quando viram a mulher que, um segundo atrás, estava feliz e parecia gentil. Agora, coberta por sangue e com duas adagas em sua mão.

O homem de terno pulou o balcão para correr para a saída, mas foi impedido e segurado pela empregada. Assim, o homem sentado no balcão tirou seu sobretudo e seu chapéu, mostrando parcialmente seu rosto tampado pela máscara que estava quebrada. Ela era branca e tinha um sorriso assustador estampado nela.

O barman ficou surpreso pela presença de Aidan. Ele achava que ele nunca faria um ataque daqueles, mas considerava aquilo. Estava preparado para tudo e, por isso, pegou uma garrafa de uísque e foi ao lado de Aidan. Ele colocou um copo para ele e para seu convidado.

— Noite difícil, não acha? — disse Aidan em um tom sarcástico, enquanto pegava o copo de uísque.

— Sim, e é apenas o início haha… — respondeu o Barman enquanto lembrava quando viu Aidan pela primeira vez.

O barman se lembrava daquele dia. Era irônico como as coisas funcionam naquela cidade. Ele estava estonteado pelo que havia acabado de acontecer. Agora era a hora dele de se jogar aos porcos. Era sua vez de falar sobre o seu coração.

— Como já sabe, meu nome é Otto, sou da décima terceira remessa de fantasmas, e o último que entrou na organização. Você gostaria de escutar um homem arrependido?

Aidan sorriu amargamente enquanto olhava para o seu copo. Ele balançou a cabeça e respondeu:

— Estamos em um bar, o que mais podemos fazer a não ser contar histórias de lamentos?

— Sabe, eu tive uma vida boa antes da organização. Tive uma esposa e filha. Minha vida como empresário era boa. Não tinha muitas riquezas, mas tinha o suficiente para ajudar minha família. Mas a vida deu sua primeira prova para mim. Minha esposa faleceu depois de um acidente de carro. Esse momento foi terrível para minha filha, que tinha nove anos na época, e mais ainda para mim, que tive que suportar a dor da perda e também cuidar de uma criança sem a mãe. Um terrível tempo, não acha?

O homem parecia se agarrar à bebida, e logo depois de um grande gole, ele suspirou. Seus olhos pareciam vazios. Aidan observou atentamente os seus movimentos para apenas se encontrar no mesmo lugar do homem.

— Depois de alguns anos, minha filha sofreu de uma doença autoimune, e ela foi levada para o hospital. Eu não sabia na época sobre a organização, mas encontrei um médico ótimo na época. Ele veio para tratar minha filha. Ele falava gentilmente e podia atrair as pessoas com sua presença. Eu pensei ter tirado a sorte grande, mas acabei descobrindo que ela era apenas uma espécie de teste. Depois desse dia, fui levado para a organização e fui treinado para ser um fantasma. Tive que ver a minha filha morrer em minha frente. Acabei desistindo da esperança. Acabei não me importando com as pessoas que não a salvaram. Me tornei dormente sobre as coisas à minha volta, e acabei onde estou agora. Por isso tenho um pedido a ti, caçador de fantasmas.

Aidan o encarou. O homem chorava, embora seus olhos estivessem sem um sinal de tristeza; parecia esperança. Aidan se surpreendeu com aquilo e escutou atentamente o pedido do pobre homem.

— Quero que o senhor acabe com a minha miséria, uma última vez. Quero lutar por algo que realmente valha a pena.

O homem se levantou, finalizando sua bebida. Pegou uma espada de trás do balcão e se afastou de Aidan, preparando-se para a luta. Aidan se levantou logo atrás e foi para o outro lado do bar, retirando suas adagas, além de facas arremessáveis que estavam em suas coxas.

Parecia uma batalha estranha. Não havia tensão no ar, nem mesmo ódio, apenas um clima tranquilo e silencioso. A chuva às vezes atrapalhava com o barulho de trovões e as gotas de água, mas os dois estavam em sincronia. Nenhum tirou os olhos um do outro, esperando cada movimento, antecipando cada ação, e assim iniciou-se uma batalha pela esperança.

Aidan não perdeu tempo. Correu em direção ao homem, que logo deu uma estocada, errando seu alvo. Ele acabou sendo cortado em seu braço direito. Reposicionando-se, tentou cortar lateralmente, direcionando sua espada para as costelas de Aidan, mas não esperava a adaga lançada em sua perna esquerda, fazendo-o perder o equilíbrio por um momento. Momento esse que Aidan aproveitou para tentar atingir a garganta do homem, mas sendo defendido pela guarda da lâmina. O homem se recuperou e cortou de raspão o estômago de Aidan, que desviou pulando para trás.

Aidan respirou fundo e atirou duas adagas, que foram rebatidas e desviadas pelo barman, tendo sua atenção retirada de si. Ele foi perfurado em seu estômago pela adaga que Aidan empunhava e, com outra perfuração em seu ombro, o homem perdeu suas forças. Aidan aproveitou o momento e finalizou a luta com um chute em seu estômago, deixando o homem cair de costas para o chão.

O sangue saía de suas feridas, a máscara de Aidan em vermelho, pelo próprio sangue e pelo sangue de seu adversário. O homem sorriu enquanto estava morrendo. Olhou para o seu "salvador" e pediu para que ele se aproximasse.

— Espero que consiga completar sua recuperação, e não acabe como eu, um homem arrependido. Devo lhe alertar, os gêmeos são perigosos, eles têm uma espécie de droga... — a voz do homem falhou, estava sem forças para respirar direito, e apenas encarou Aidan.

— O que você vê? — Aidan perguntou.

O homem sorriu e fechou seus olhos.

— Esperança...

Aidan se aproximou e perfurou o peito do homem, cortando sua garganta logo em seguida. Ele olhava para o sorriso no rosto de Otto e suspirou. Olhou ao redor e percebeu que a empregada ainda segurava o homem de terno. Aidan foi em sua direção ainda coberto de sangue e com suas adagas na mão. Ajoelhou-se e olhou nos olhos do homem que estava apavorado.

— Quem seria você? — perguntou Aidan, sem paciência e com raiva.

— Sou um mercador! Fui contratado para entregar algumas mercadorias para o barman, só isso foi me dito! — Respondeu o homem gritando.

— E que tipo de mercadoria?

— Se você me soltar, posso te mostrar! — o homem estava suando.

Aidan olhou para a empregada e a mandou soltá-lo. Eles viram o homem se levantar com um sorriso aliviado no rosto. O homem correu para as partes de trás do bar, e Aidan pôde observar a tal mercadoria. Ele inicialmente pensou que poderia ser drogas, armas ou algo do tipo, mas nunca algo que o deixaria furioso. O homem trouxe uma garota pequena e raquítica. Ela vestia apenas um vestido rasgado e encardido, seus olhos vendados e suas mãos presas por correntes sendo guiadas pelo homem de terno. Em seu corpo, podia-se ver diversas marcas de agressões, e em sua garganta podia-se ver um grande corte. Seus cabelos estavam emaranhados e sujos.

Aidan olhou para aquela menina em uma situação péssima e não pôde conter sua raiva. Ele sentiu algo borbulhar em seu peito. A empregada pegou rapidamente as correntes e a menina das mãos do homem, que ainda tinha um sorriso confiante em seu rosto.

— Ela é nosso grande trunfo ainda! Se tirar sua venda poderá ver o valor do produto! Até mesmo as grandes famílias as querem! — disse o mercador.

A empregada retirou a venda e a garota se assustou. Ela abriu a boca e um pequeno ruído saiu, quase uma voz, mas não tinha força suficiente. Seus olhos chamaram atenção; eles tinham cores diferentes, um azul e outro castanho. A empregada mordeu seus lábios e encarou Aidan, que estava sério, sua aura estava pesada e seu semblante frio. Ele encarou o homem.

O mercador, vendo aquela reação, ficou alerta e gritou algo em outra língua. Passos podiam ser escutados vindo dos fundos; eram meninos e meninas adolescentes, todos carregando facas. Eles pareciam desnutridos e fracos, mas todos obedeceram ao que o homem os falou e atacaram Aidan, que rapidamente se defendeu e desmaiou todos. Não eram muitos, apenas dez, mas podiam fazer muito mal a pessoas desavisadas. Aidan olhou para o mercador novamente e dessa vez lançou uma adaga em sua perna.

O mercador caiu no chão e gritou de dor. Aidan se aproximou daquilo que, na sua visão, parecia um verme e o arrastou pelos cabelos. Ele o levou até a pequena garota, que se agarrava nas roupas da empregada. Aidan se abaixou para ver seus olhos; eles pareciam perdidos e desesperados.

— Me diga o que você quer? — perguntou Aidan.

A garota parecia confusa, mas após olhar para o homem de terno se debatendo embaixo do joelho de Aidan, ela correu na direção dele e o abraçou. Chegou perto de seus ouvidos e uma voz rouca e fraca saiu de seus lábios machucados.

— Por favor, me ajude a acabar com meu sofrimento.

Aidan se surpreendeu, mas sorriu diante de tal pedido. Pegou a adaga e deu para a garota. Ela pegou o objeto afiado com dificuldade, mas assim que o segurou apropriadamente, foi diretamente ao mercador. Segurou firmemente a adaga com as duas mãos e esperou o momento em que o homem estivesse olhando para o seu rosto, e assim perfurou a garganta do homem. Ela não tinha força suficiente, e a adaga não perfurou direito a carne, mas Aidan a ajudou, o que fez o homem se afogar em seu próprio sangue.

Aidan olhou para a garota, que estava em choque, e se aproximou dela. Viu as marcas da corrente em seus pulsos. Ela caiu em lágrimas no chão, seus olhos agora não mais desesperados, mas tranquilos e satisfeitos. Apenas grunhidos podiam ser ouvidos. Aidan a segurou em seu colo e a levantou. Ela era leve demais para aquele tamanho.

— De um jeito de ajudar qualquer outra criança que encontrar — ordenou Aidan à empregada, ele parecia com raiva — prepare o carro, estamos partindo, faça o planejado quando eu sair do lugar.

— Sim, senhor. — respondeu à empregada.

Aidan caminhou para fora do bar. Ainda estava de noite, mas a chuva havia parado. Em seu colo, uma garota dormia tranquilamente. Ele olhou para ela e sentiu seu coração pesar. Não sabia o que fazer. Mesmo assim, entrou no carro. A empregada olhou para Aidan com desconfiança e perguntou:

— O que irá fazer com a garota?

— Por enquanto cuidaremos dela. Depois decido o que fazer — respondeu Aidan, sem pensar muito sobre o assunto.

Depois que voltaram, aconteceu uma visão estranha para todos. Muitos eram pessoas que passaram e viram coisas terríveis em sua frente, mas a visão de um homem que era frio e sem coração, carregar uma garota em seus braços como se fosse a única coisa importante para ele, fez todos daquele lugar o encarar. Todos estavam surpresos pela mudança do seu chefe.

— Senhor, o médico está esperando no quarto da menina — disse a empregada.

Ela se aproximou de Aidan enquanto ele subia as escadas para o seu escritório. Ele ainda segurava a menina em seus braços, um pouco desengonçado, mas a segurava gentilmente. Entregou a menina para a mulher e seguiu para o seu escritório.

— Certo, me avise quando ela acordar, tenho algumas coisas para perguntar.

A empregada se curvou e se dirigiu para o corredor cheio de quartos. Aidan olhou para o seu escritório. Ele era monótono e frio, parecia que o calor do seu coração tinha desaparecido e apenas um frio extensivo permanecesse.

Aidan sentou-se à frente de sua mesa. Um isqueiro foi aceso, e um cigarro estava em sua boca. Ele conseguia escutar coisas que não deveria. Ouviu uma voz o chamando. Seu corpo estava dolorido, sua mente exausta. Talvez seja por causa disso que ele podia ver pessoas do passado na sua frente.

— Parece que nosso príncipe começou a salvar vidas agora.

Aidan mordeu os lábios. Uma sombra distorcida, uma voz que parecia um sussurro, mas suave. Aidan sentiu suas mãos tremerem. Ele havia concordado que sua natureza como fantasma seria o que ele desejar. Ele não precisava mais usar a máscara de fantasma. Sua irmã era a prova viva disso. Mas quanto mais ele tentava se desvirtuar de seu passado, parecia que cada vez mais ele se afundava no abismo de sua alma.

— Eu não estou tentando salvar as pessoas, apenas algumas não precisam morrer devido a outras — respondeu Aidan com seriedade.

— Seus atos têm consequências, sabia disso? Você fez coisas que agora irão chamar atenção da organização, e agora talvez sua irmã também queime, assim como eu.

Aidan pôde ver diante de si chamas, sentir seu corpo queimar, sua pele irritada, seus pulmões sem ar. Seu olho esquerdo doía, e antigas cicatrizes o faziam lembrar de coisas que não queria.

— Estou tentando o meu melhor.

Celina emergiu do fogo que estava na mente de Aidan e tocou gentilmente seu rosto. O contato parecia tão real quanto falso. Apenas um toque fez seu coração disparar em agonia. Por mais que fosse um toque suave, ele não podia deixar de ficar enojado consigo mesmo.

— Você vai enfrentar muitos perigos por causa daquela garota, Aidan, meu pobre príncipe sem reino, meu pobre fantasma esquecido. Espero que consiga esquecer essa sua atitude de tentar controlar tudo.

— Como se você pudesse ter elaborado algo de diferente! Você me arrastou para isso! Como você acha que você está na minha cabeça agora?

A mulher se distanciou de Aidan. Antes com um sorriso, agora estava séria. Ela suspirou, e Aidan sentiu uma pontada em seu coração. Seu pulmão não respirava normalmente. O cigarro que estava em sua mão havia apagado, e agora ele estava de pé no meio da sala. A mulher sorriu sem expressão.

— Espero que não tenha culpa ou arrependimento em suas ações.

Repentinamente a porta do escritório foi aberta. A empregada correu para frente de Aidan. As chamas não mais existiam, a voz já não ressoava, e agora, ele estava se agarrando no corpo da empregada. Ele caiu de joelhos, uma tosse o fez cuspir sangue. Foi auxiliado a se sentar novamente em sua cadeira. Aidan olhou para a empregada e sorriu gentilmente.

— Obrigado, Anna, a menina já está melhor?

A mulher fez uma cara de dúvida e raiva.

— Você não acha que deveria se preocupar com você? — perguntou a empregada com certa rispidez.

— Sim, mas ela estava em uma situação mais complicada do que...

A mulher colocou sua mão na boca de Aidan. Sua expressão era de sofrimento. Ela não gostava de quando ele não se importava com sua saúde.

— Ela está bem, e logo acordará. O médico disse que ela não estava tão machucada. Eles a trataram bem por ser uma boa mercadoria — disse a empregada. Ele ainda tinha uma expressão complicada.

Aidan tirou a mão de sua boca.

— Certo, mas alguma coisa aconteceu na organização? — perguntou Aidan, levantando-se.

Anna se dirigiu para um armário de vidro na sala. Ela pegou uma caixa de primeiros socorros. Aidan olhou e pensou em como ela estava habituada a fazer aquelas ações.

— Tire a camisa, você vai precisar de pontos — disse a empregada, apontando para a poltrona que tinha no escritório.

Aidan obedeceu e tirou sua camisa. Ela estava encharcada de sangue, e os cortes no corpo de Aidan ainda estavam horríveis. Anna se aproximou dele e começou a tratar as suas feridas.

— Temos notícias apenas do Klaus, o jornalista. Parece que ele te enviou uma carta.

— E o que ele falou? — perguntou Aidan, sem interesse.

Aidan quase mordeu sua língua quando Anna puxou a linha da agulha.

— Ele quer te levar para o cemitério, para ser mais exato, na capela que tem lá. Ele quer conversar com você — respondeu Anna.

— Tudo bem, eu queria passar por lá mesmo.

Anna, após ajudar com os ferimentos de Aidan, o encarou e percebeu que ele parecia mais fraco que o normal. Seu corpo estava pálido, sua mente uma bagunça. Ela temia que ele não pudesse voltar ao normal. Sabia que ele era um fantasma completo, mas ele negava sua própria existência, não gostava de si e por isso rejeitava sua própria vida. Via que isso o estava deixando louco.

— O que houve? Tem mais alguma coisa? — perguntou Aidan.

Anna suspirou de desgosto, encarou Aidan uma última vez e eliminou as suas preocupações.

— Não. Quando a menina acordar, você será o primeiro a saber — respondeu Anna.

Aidan olhou para a data e percebeu que estava quase no dia que mais odiava. Suspirou em desgosto e se levantou. Caminhou pelo lugar que agora era sua base. Precisava de um ar fresco. Assim, andou para fora de seu quarto. A noite havia passado. A manhã estava fria e a brisa mantinha sua mente acordada. Pegou outro cigarro e o acendeu. Observou a fumaça se dissipar no ar. De repente, sentiu um peso em seu corpo. Assustou-se ao ver a garota se agarrando a ele.

A menina, que antes estava tão machucada que não podia sequer se mexer sem sentir dor, agora havia acordado e percebido que estava em um ambiente diferente. Sabia que poderia ter sido levada para outra casa pelo homem de terno. Assim, aproveitou estar desamarrada para correr. Abriu a porta e viu uma mulher com roupas estranhas a encarando. Tentando escapar, correu para o lado mais iluminado. O ambiente era frio. O lugar parecia uma casa grande, mas o teto era muito alto e de ferro. Os corredores eram amplos e de madeira. Correu mais rápido quando percebeu uma mulher correndo atrás dela.

Sentiu uma brisa em seu rosto e a seguiu como uma última esperança. Encontrou uma saída e, quando finalmente achou que estava livre, percebeu um homem na saída. Não o reconheceu em sua confusão, mas após observá-lo, lembrou-se do homem que a ajudou. Por isso, foi diretamente para ele.

Aidan olhava para aquele pequeno ser humano chorando e se agarrando a ele. Sorriu e pegou a garota, que encarou seu rosto enquanto lágrimas caíam incessantemente. Sussurrou em seu ouvido:

— Onde estamos?

— Estamos na minha casa. Não se preocupe, ninguém vai te machucar. Pelo contrário, acho que irão te ajudar — respondeu Aidan com o máximo de gentileza em sua voz possível.

A garota se acalmou e observou as pessoas que a seguiram. Pôde encarar seus rostos. A mulher de roupas estranhas a havia ajudado com o homem de terno, e um homem velho a ajudou com suas feridas. Nenhum mostrava hostilidade para ela. Finalmente, percebeu que estava salva, mas não podia descansar. Virou-se para seu salvador e novamente falou em seu ouvido.

— Me ajude a acabar com a dor!

Aidan suspirou e caminhou com ela para dentro da fábrica novamente. E novamente ele se encontrava no mesmo quarto da garota. Ele a colocou na cama e se ajoelhou ao seu lado, olhando nos olhos dela. Ela exibia determinação e curiosidade. Primeiramente, apontou para o rosto de Aidan.

— Por que tem uma cicatriz?

— Bem, eu tentei salvar uma pessoa, mas não consegui — respondeu Aidan sinceramente.

— Entendo. Mas você conseguiria me ajudar? — perguntou a garota, receosa.

Aidan sorriu gentilmente.

— Sim, eu me propus a fazer isso, então irei te ajudar, independentemente do seu pedido — respondeu Aidan, confiante.

A garota sorriu.

— Preciso parar... pessoas que fizeram isso comigo! Eles trabalham no hospital! — a garota disse, lutando para falar, mas sua voz falhava aos poucos.

— Você sabe quem é sua mãe? — perguntou Aidan.

A garota balançou a cabeça em negação.

— Não tive... uma mãe ou pai... A única coisa que sei... é que nascemos de tubos de ensaio... — disse ela, com esforço.

Aidan arregalou os olhos.

— Espera, "nós"? Tem mais crianças iguais a você? — perguntou Aidan, surpreso.

— Sim! Todos estão... no hospital! — respondeu à garota com toda a sua força.

Aidan olhou para a empregada, que rapidamente correu do quarto. Eles precisavam de mais informações. A garota olhou para Aidan, surpresa, seu rosto apreensivo. Ele segurou suas mãos e sorriu novamente, mas havia tristeza em seu olhar.

— Me desculpe por tudo que sofreu. Meu nome é Aidan. Qual é o seu nome?

A garota sorriu alegremente e sussurrou em seu ouvido:

— Meu nome é Asha! Prazer, Dan!

Aidan não sabia o que fazer. Não sabia qual seria o seu final. Mas agora havia uma criança no meio de tudo aquilo, e tudo estava relacionado à organização. Ele precisava pensar, mas a dor de cabeça estava cada vez mais forte. Isso o fez fraquejar na frente de Asha. Ele tentou se segurar, mas já estava no chão, tentando respirar. Tossiu e novamente o líquido escarlate se fez presente. A garota ficou desesperada e tentou ajudá-lo, segurando seu braço. Memórias surgiram na mente dela, lembranças de outros que também estavam sangrando e não podiam fazer nada. Seu desespero era evidente para Aidan, que após se recuperar, a acalmou. Chamou Anna após a garota descansar novamente.

— Irei me retirar. Você também deveria dormir. Amanhã visitarei o jornalista. Se a garota precisar de algo, estou contando com você — disse Aidan ao sair apressadamente do quarto.



Comentários