Apoteose Fantasma Brasileira

Autor(a): Alexandre Henrique


Volume 1

Capítulo 12: Cartas póstumas(2).

Luís não poderia estar mais desconfortável. Ao seu lado, havia uma pessoa completamente estranha. Ele não sabia como se aproximar daquela pessoa que parecia tão fechada em relação a ele. Mesmo estando no mesmo carro, um ao lado do outro, Emily não fez contato visual com Luís durante toda a viagem.

Quando finalmente chegaram ao farol, permaneceram parados dentro do carro apenas olhando para a grande estrutura e a cerca que a cercava, protegendo contra possíveis vândalos.

— Vamos encontrar uma forma de entrar — Luis falou enquanto saía do carro com uma lanterna em sua mão.

Já havia passado muito tempo desde que estavam na casa de Leon, e por isso, Luís achava ainda mais perigoso. Ele não gostava de entrar em um lugar aleatório seguindo pistas deixadas por um louco. No entanto, vendo a empolgação no rosto de sua parceira, ele respirou fundo e tentou o máximo para não desistir no meio do caminho.

— Precisamos apenas pular a cerca, não é? — perguntou Emily, apontando para o topo da cerca de ferro.

— Talvez, mas não vamos conseguir alcançar normalmente. Vamos procurar outra entrada — respondeu Luís, preocupado com a ideia.

Emily pensou por um momento e lembrou de algo.

— O que acha de tentarmos apenas abrir o portão?

— Como?

Luís olhou para Emily com dúvida, e vendo que ela já estava em direção ao portão, ele apenas a observou. Não poderia acontecer de o portão estar simplesmente aberto, certo?

Mas estava. Isso fez Luís duvidar do tipo de segurança da cidade em que vivia. Ele seguiu para dentro do portão com Emily. A lanterna que ele havia trazido não era tão forte, o que limitava sua visão. Mesmo assim, Emily foi na frente com coragem e ansiedade.

Ela não sabia o que exatamente seu irmão queria com toda aquela brincadeira. Para ser exata, ela sequer se lembrava direito de seu irmão. Ela apenas tinha algumas memórias soltas de quando havia vivido com uma mulher que parecia ser sua mãe, mas era apenas isso.

Emily parou de caminhar e olhou para o céu estrelado, respirou fundo. Ela encarou o delegado que queria prender seu irmão e duvidou de seus motivos. Para ela, ele estava muito estranho em relação a tudo aquilo, e não entendia por que seu irmão envolveria alguém que poderia facilmente achá-lo.

Assim que começaram a chegar na parte superior do farol, começaram a escutar pequenos barulhos de bipes. Luís pensou ser uma bomba, mas não era parecido com aquilo. Era como um código Morse. Quando subiram para o topo do farol, conseguiram ver o objeto que emitia aquele som.

Era uma caixa de tamanho relativamente grande, preta, com detalhes em vermelho, decorada com a mesma flor do túmulo. Em cima da caixa, havia uma boneca antiga que parecia ter sido queimada.

— Eu sei o que é essa boneca, eu tenho uma igual! — Emily exclamou com ansiedade.

Luís olhou para Emily, que havia pegado o celular. Ela começou a passar o dedo na tela até arregalar os olhos. Luís não sabia o que ela estava vendo, mas assim que ela mostrou para ele, ele compreendeu. Aquela boneca era idêntica a Emily e poderia ser idêntica a Aidan.

— Certo, então deve estar relacionada a vocês dois. Mas primeiro vamos verificar essa caixa — disse Leon, analisando a caixa.

Luís arrastou a caixa para perto de si e viu um cadeado com senha numérica. Depois de um tempo observando, ele notou que o intervalo entre os bipes do código Morse era aproximadamente 30 segundos. Por isso, começou a anotar cada bipe que escutava.

— Certo, temos aqui "−....- ..--- ---.. .-.-.- ----- ..... -.... --... ..--- / -....- ....- ----. .-.-.- ...-- -.... -.... ---.. -....". Isso parece ser algum tipo de coordenada, não tenho certeza.

Luiz estava certo de que havia traduzido corretamente o código. Mesmo assim, verificou várias vezes e a resposta era a mesma. Mas aquilo não podia ser a senha da caixa. Por isso, ele lembrou da boneca.

— Emily, me diga, quando você nasceu? — perguntou Luís.

Emily ficou surpresa pela pergunta, mas percebeu o que Luís queria dizer. Por isso, pegou a caixa e inseriu a sua data de nascimento.

— Se eu não estou enganada, a senha é 2890 — respondeu Emily com confiança.

Ela inseriu a senha e o som do cadeado se soltando foi a coisa mais satisfatória que ouviram em anos. Abriram a caixa e dentro dela havia um avião de ferro. Luís percebeu a mensagem que Aidan havia deixado. Precisavam procurar pelo endereço do código Morse, mas antes, Luís precisava esclarecer algumas coisas.

— Certo, agora vamos parar um pouco e conversar — sugeriu Luís.

— O que você quer dizer? Temos que ir para a localização! — exclamou Emily com rapidez e determinação.

— Eu sei, Emily, mas quero confirmar algumas coisas com você, e você também, certo?

Emily olhou para a figura de Luís, que parecia cansada. Ela respirou fundo e balançou a cabeça em afirmação.

— O que você quer saber?

Luís queria saber muitas coisas, mas a principal era sobre como ela parecia desconhecer o irmão.

— Me diga, você se lembra do seu irmão?

— Sim, bem, mais ou menos. Eu me lembro parcialmente dele. É como se minhas memórias fossem um pouco turvas naquela época — Emily disse nervosa.

— Certo. Por que você quer o encontrar? — Luís perguntou com seriedade e frieza.

Luís pôde ver o rosto de Emily se contrair. Ela apertou os punhos e lágrimas começaram a surgir em seus olhos, mas ela as segurou. Ela lembrou da tragédia do dia em que viu um homem saindo de dentro de sua casa e o som de um disparo.

— Eu quero saber por que ele matou o meu avô e por que está fazendo tudo isso.

Luís sabia que aquela frase iria atrapalhar seu julgamento. Ele sabia que ela poderia prejudicar a missão que ele tinha. Ele até mesmo sentiu a ironia do mundo em fazer dois irmãos procurarem pelo irmão perdido. Luís percebeu que ela e Victor tinham muito em comum e por isso sentiu um gosto amargo na boca.

— Certo, agora que sei disso, quero que você me ajude a procurar seu irmão. Eu quero saber por que ele está fazendo todas essas coisas — explicou Luís.

Emily acenou com a cabeça e, olhando seu celular, ela ficou surpresa. Luís achou estranho e perguntou o que era. Ela apenas mostrou para ele a notícia de que vários corpos foram achados, todos eles tendo cometido suicídio. Luís pensava ser apenas uma coincidência, mas era muito estranho. Eram pessoas se matando em toda a cidade, e por isso ele sentiu medo de Aidan. Ele ficou apreensivo se ele poderia matar uma pessoa apenas com palavras.

— Temos que ir rápido para a localização, e temos que parar Aidan quanto antes — exclamou Luís com pressa.

Após os dois terem firmado suas intenções, eles entraram no carro e foram para o local designado. Para a surpresa deles, ainda fazia parte da cidade. Não apenas isso, eles também já haviam visto o local. Era no hospital da cidade, onde havia uma floresta, um local que poucas pessoas iam, e por isso, perfeito para esconder coisas suspeitas.

Quando os dois chegaram lá, ainda estava de madrugada, o que fez o ambiente ainda mais desconfortável. No meio da floresta, havia uma clareira, e nessa clareira, havia duas cadeiras em forma de tronos. Os tronos eram brancos e sentados neles havia uma mulher com uma espécie de x no seu coração e um homem com um x na sua cabeça.

Luís não sabia o que significava aquilo, mas com o barulho de algo caindo ao seu lado, ele percebeu que estava relacionado com Emily. Ela havia desmaiado ao seu lado. Ela parecia sentir dor por algum motivo. Luís teve que arrastá-la para perto de uma árvore e apoiá-la no tronco. Ela respirava ofegantemente e seu rosto estava com uma expressão de dor.

Emily não sabia como, mas ela havia esquecido de quem era. Ela havia esquecido do que havia passado. Era como se tudo fosse apenas um sonho ruim. Por isso, ela lembrou quem era seu avô. Ela lembrou de seu irmão tão claramente que estava complicado não achar que era ela mesma em sua frente. Ela se lembrava de Null e dos fantasmas, o que fez ela acordar assustada. Luís estava em sua frente.

— Quanto tempo fiquei apagada? — perguntou Emily com confusão e uma leve dor de cabeça.

Luís notou a diferença na sua fala. Era como se ela tivesse um pouco de sotaque.

— Você ficou apagada por uma hora e pouco — respondeu Luís com preocupação.

— Me desculpe, delegado — disse Emily sem expressão.

— Tudo bem! Não sei o que aconteceu, mas parece estar relacionado a esses espantalhos, certo?

— Sim, esses espantalhos são meus pais.

Luís ficou chocado pela afirmação de Emily. E quando ele a viu se levantar e caminhar na direção dos bonecos, ele sentiu uma pontada em seu coração. O semblante de Emily era triste e solitário.

— Venha aqui, delegado. Parece que tem uma carta para você — disse Emily segurando um pedaço de papel.

Luís sentiu um ar diferente em volta de Emily, e por isso ele pegou a carta preta, mas não antes de descobrir outra caixa em sua frente, só que dessa vez havia apenas uma fechadura.

Luís rapidamente abriu sua carta e percebeu que era apenas um poema, só que sem conclusão. E de Emily era idêntico, só que sem um começo. Juntando os poemas, eles obtiveram o poema completo, e ele se chamava: "O Corvo Além da Fechadura".

 

“No mundo sombrio, o corvo voa,

Para a fechadura, sua jornada ecoa.

Busca segredos além da escuridão,

Desvendando mistérios com devoção.

 

A chave mágica, seu objetivo é encontrar,

Na penumbra, ele não temerá.

Voa além das limitações do ser,

Descobrindo sabedoria a florescer.

 

No voo audaz, a fechadura atravessa,

Revelando mistérios, superando pressa.

Desvenda segredos há muito guardados,

Transcende limites, destinos traçados.

 

Corvo símbolo de audácia e valor,

Inspira-nos a enfrentar o desconhecido,

Encontrar a verdade além do rumor,

Descobrir a essência escondida.”

 

Emily olhou para a fechadura e lembrou de que ainda tinha o corvo em sua bolsa. Ela pegou o pequeno objeto de madeira e o quebrou. Luís ficou assustado com a atitude de Emily, mas lembrou do avião de metal e também o pegou. 

Quebrando os dois objetos, eles conseguiram dois fragmentos da chave. Juntaram rapidamente o pedaço do avião com o do corvo de madeira, formando uma chave que se encaixava perfeitamente na caixa. Assim que ela foi aberta, puderam escutar a voz de alguém. Emily lembrava daquela voz, uma voz que poderia hipnotizar alguém, calma e sem pressa, algo que poderia ser doce e frio ao mesmo tempo. Emily e Luís sentiram arrepios em suas espinhas.

— Olá, meus queridos caçadores. Eu espero que vocês tenham aproveitado a minha pequena caça ao tesouro. Eu não tenho muito o que dizer, apenas que vocês estão na última fase, o que significa que vocês me encontrarão. Por isso, essa última parte minha irmã irá fazer. Emi, eu irei te perguntar, você está bem?

A gravação havia se encerrado e Luís ficou frustrado. Ele bateu o pé no chão e ficou pensativo sobre o que iria fazer agora, mas Emily parecia animada, ou talvez grata?

— O que você está fazendo? — perguntou Luis com surpresa.

— Ha! Aquele pestinha! Haha, eu me lembro! Nós tínhamos vidas complicadas em casa e por isso fizemos um código. Nós batíamos na porta um do outro ou em lugares da casa para perguntar se um estava bem ou não, e iríamos ao socorro se precisasse — exclamou Emily com um sorriso e lágrimas em seus olhos.

Luís viu ela começar a pisotear o chão e, decidindo acompanhá-la, ele também fez a mesma ação. Quando ele pisou na frente das bonecas, pôde ouvir um som diferente da terra, o som de madeira.

— Achei! — gritou Luís enquanto olhava para onde havia pisado.

Luís começou rapidamente a tirar a terra do local, para começar a revelar uma escotilha. Os dois se olharam e sorriram um para o outro com alegria. Eles a abriram e viram a grande escada para baixo da terra.

— Parece que não tem volta agora, preparada?— perguntou Luís com certo cuidado.

— Sim, preparada — respondeu Emily com determinação.

E assim os dois entraram naquele lugar úmido e escuro.



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