Apenas um Sonho Brasileira

Autor(a): Hanamikaze


Volume 1

Capítulo 8: Uma Criança Atormentada

Ethan e Aria já haviam acordado a um tempo, às cinco e meia da manhã. Como eles sempre acordam ao mesmo tempo, se um acordar esse horário, automaticamente o outro acorda também, pois seus sonhos estão conectados.

O último sonho foi ao alto da montanha mais bela de Nova York. Os dois observavam as estrelas dali, assim como Aria desejava na roda gigante, com Michael Turner. Agora, a garota se via sentada na mesa de sua casa, comendo cereal com leite. Sua mãe estava por ali também, regando as plantas espalhadas pela casa.

— Então você encontrou a mãe de Emma no shopping — disse a mãe de Aria, com um pequeno regador azul em mãos. — E como ela está? Com uma cara boa?

— Sim… — respondeu Aria, pensativa. — Ela está bem sim.

Haha! Que bom, ela ainda trabalha como empregada? Ou arranjou outro ramo?

— Sim… trabalha, mãe — disse Aria, que logo após, colocou uma colher de cereal na boca. — Inclusive… ela trabalha na casa do garoto que eu lhe disse antes, mãe…

A Sra.Harper ficou boquiaberta com a informação. Olhou para a garota, espantada com a coincidência.

— O tal do Ethan Kim? — perguntou, em um tom de voz mais baixo.

— É… esse mesmo, mãe — afirmou, comendo mais um pouco de cereal em seguida. — Mas sinceramente, eu não acho que isso seja um problema… sabe, talvez eu possa… me aproximar mais dele assim.

— O que acha de fazer uma visitinha na casa dele então? Conhecendo Katherine, acho que ela não recusaria te levar até lá.

Ao ouvir isso, os olhos de Aria se arregalaram, como se aquele fosse o maior absurdo que ouviu na semana.

— Claro que não, mãe! Ele nem me conhece direito… ele acharia que eu sou uma lunática…

Ah, não é para tanto vai. Você poderia pelo menos tentar!

“Pelo menos tentar…” pensou a garota, começando a adotar a ideia.

Já na casa de Ethan, o garoto estava na cozinha, com a luz apagada, observando as gotas do pequeno filtro na porta de sua geladeira prateada pingarem dentro de um copo de vidro. O corpo enchia um pouco a cada gota, e estava prestes a transbordar. O garoto observava aquele pequeno evento atentamente, com seus olhos azuis vivos destacando-se na escuridão.

Katherine apareceu à porta da cozinha, e ligou a luz. Ethan desviou o olhar para ela na mesma hora, e a encarou. No momento em que ela ligou a luz, a água no copo transbordou de vez.

— A água está vazando do copo, Ethan. Deveria prestar mais atenção! — avisou Katherine, passando rapidamente pela cozinha e abrindo uma gaveta.

— Certo…

O garoto pegou o corpo de água, e começou a tomar lentamente.

— Inclusive… encontrei uma amiguinha da minha filha no shopping. Ela também faz parte daquele evento doido que você está, sabe?

— Amiga… da Emma? Qual o nome dela? — perguntou Ethan, começando a ficar interessado. O garoto já sabia sobre a filha de Katherine, Emma Brown, pois Katherine sempre falava sobre ela para ele.

— Nome? É Aria, já a conhece? — perguntou Katherine, pegando um pequeno pano de dentro da gaveta e colocando-o no ombro.

— A Harper… — murmurou Ethan, para si mesmo.

Naquele momento, Katherine notou a mudança na expressão de Ethan ao pensar em Aria. Seus olhos se suavizaram, suas pupilas dilataram, sua respiração parecia mais calma, e ele estava vidrado no copo de água após dizer “Harper”. Katherine deu um sorriso para ele, e posicionou uma mão em seu ombro.

— Acho que entendi… fico feliz que você tenha achado alguém importante para você, meu docinho — disse ela, com um sorriso.

— Continua boa em ler linguagem corporal, Katherine… mas não use essas palavras. Ela não é “importante” para mim.

Hahaha! Eu te conheço muito bem para saber que apenas não quer parecer frágil. Mas fique tranquilo… as vezes é bom arriscar também — disse, e então caminhou para fora da cozinha. O garoto ficou pensativo com essas palavras, mas então se recompôs.

Então, após algumas horas os dois arrumaram-se para sair de casa e ir até a Betrayal Lines. O evento daria início a noite, mas acharam melhor já ir de manhã, até porque os dois estavam entediados naquele momento.

Caminhando pelas ruas de Nova York, Ethan notou algo. Uma pequena criança seguia seus passos repentinamente. Ela andava no mesmo ritmo que o garoto, e tentava permanecer ao lado dele, como se ele fosse o protetor daquela criança. Ethan achou isso meio estranho, porém ignorou. Os dois continuaram indo para frente, e o garoto decidiu aumentar um pouco a velocidade de seus passos. A criança, tentando acompanhá-lo, acelerou também. Percebendo isso, Ethan acelerou mais, e a criança agora corria para acompanhá-lo. Ela parecia um tanto desesperada.

Ethan, tentando ignorar aquela situação, ignorou os movimentos da garota. Mesmo desconfiado, talvez fosse só uma criança tentando conquistar sua atenção. Era uma alma pura, e ele acreditava que talvez aquela pequenina não fosse lhe causar nenhum mal.

Um tempo depois, Ethan se acostumou com aquela pequena enxerida o perseguindo. Ela parecia feliz, então o garoto não se importou. Mas para a sua surpresa, ela parou de acompanhá-lo. Ele olhou para trás, e a garotinha estava tentando pegar uma maçã no topo de uma árvore. Ethan a observou por um tempo, mas não quis tentar ajudá-la.

A garotinha não tentou subir na árvore após notar que não conseguiria. Posicionou as mãos em um dos galhos acima, e começou a se balançar como se estivesse presa a um cipó. Com o peso da criança a árvore inteira balançou bastante, mas ainda não era o suficiente para a maçã cair. Mas esse não era o objetivo da criança. Ela estava se balançando para ganhar velocidade e altitude, e então, com os dois elementos, ela se balançou em direção ao tronco e acertou um chute na árvore. A maçã caiu logo em seguida.

A garotinha se soltou do galho, e começou a comer a maçã. Enquanto dava uma mordida, voltou apressadamente ao lado de Ethan, e o encarou enquanto comia. O garoto encarou de volta, com um olhar de surpresa, e então voltou a caminhar. A criança ainda o perseguia.

Logo, a criança apontou a maçã na direção do garoto, com um sorriso inocente. Ethan encarou-a de volta, com um olhar de desconfiança. Mas logo foi convencido pela expressão meiga da garotinha, que demonstrava sua pureza. O garoto aceitou a maçã, e lhe deu uma mordida. Os dois não trocaram palavras, mas a garota parecia ter ganhado o dia dela.

Após morder, Ethan iria devolver a maçã para a garota, mas ela repentinamente grudou em sua perna esquerda. A expressão e postura daquela pequenina havia mudado, ela parecia assustada e estava tremendo. Agarrou a perna de Ethan e parecia se esconder de algo que logo, apareceria. Ao horizonte da estrada, um homem com postura ereta e corpo com aparência física bem forte, se aproximava com uma expressão furiosa. O homem gritava, chamando por alguém, titulando este alguém como “Merda”. Ethan logo compreendeu a situação, e aproximou-se da parede, para esconder a criança melhor.

O homem se aproximou do garoto recostado à parede, e enquanto se aproximava sua expressão lentamente se alternativa, forçando uma face tranquila.

— Ei, garoto, poderia me dizer se você viu alguma garotinha passando por aqui? Ela têm fugido de casa a um tempo… a mãe dela já está ficando maluca, haha!

Naquele momento, a criança escondida na sombra criada pelo garoto, agarrada em sua perna, apertou com muita força. Ethan ouviu bem ao fundo uma pequena fungada no nariz, que demonstrava que a criança estava chorando. Ela não estava apenas fazendo pirraça, o jeito que seu corpo tremia era incomum. Ethan logo notou que talvez, aquela criança estivesse sendo maltratada por aquele maníaco. A maneira com que ele chamava ela de “Merda” apenas comprovou suas suspeitas.

— Suponho que não. Se vi, não prestei atenção — respondeu o garoto, com a calmaria predominando em sua face. — Ela não deve ter ido longe, espero que encontre quem procura…

Hum… sei. Essa pestinha anda dando muito trabalho — o homem aumentou repentinamente o tom de voz, e em seguida, voltou a seguir em frente. Ethan esperou até que o homem virasse a esquina, e esperou mais vinte segundos, para certificar-se de que ele não voltaria. Logo, os dois voltaram a caminhar, mas Ethan decidiu fazer o percurso de volta para a sua casa, com a garotinha.

— Brigada… tio… — agradeceu a pequenina, com uma voz rouca e tímida.

Humpf… resmungou Ethan. — Por que está fugindo dele? Seu pai parecia preocupado.

— Papai… — respondeu a garota. — Papai está irritado porque Lilly não lavou as… roupas…

“Forçando-a a trabalhar…?” pensou Ethan, observando a garotinha. Suas roupas pareciam bem sujas, e seus braços estavam moles, como se tivesse feito muito esforço com eles. Ela parecia um pouco cansada, e mesmo com o homem agora longe, não para de tremer.

— Se você não lavar, o que ele faz? — perguntou, colocando as mãos no bolso, e olhando para as nuvens enquanto caminhava.

— Papai pega a arma e castiga a Lilly… — respondeu a garotinha, com sua expressão murchando. — Lilly precisa ser uma boa garota…

— Entendo… — a “arma” em que Lilly se referia, provavelmente era algum cinto, ou item mais pesado para castigá-la. Ethan decidiu não perguntar o que era, para que as lembranças da garota não viessem à tona.

O garoto olhou para ela, e ela agora parecia estar triste. Ele acariciou lentamente a cabeça da garotinha, que agarrou a mão do garoto, e prendeu-a em sua cabeça. Ela não queria que Ethan parasse.

Chegando em sua casa, Ethan entrou com a pequena Lilly. Katherine olhou para o garoto, e então olhou para a pequenina.

— Trazendo visitas, Ethan? Quem é esta fofurinha?

— Ela pode ficar aqui por um tempo, Katherine? — perguntou o garoto, e Katherine fez uma cara de suspeita. Ethan normalmente não gosta de ser perturbado, e agora estava levando uma garotinha para casa, pedindo para que ela ficasse por um tempo.

— O que está aprontando, meu docinho? — perguntou, aproximando-se da garota e acariciando a cabeça dela. Lilly em resposta, acariciou o braço de Katherine.

— Aparentemente o pai dela… não é diferente do meu, Katherine. Não sei o que ele pode fazer com a garota.

Logo Katherine se ligou, e entendeu a situação na hora. Lilly, com aquela fala, olhou para Ethan com uma expressão de dúvida.

— Seu papai tem uma arma também? — perguntou, em um tom inocente. Ethan ficou pensativo com essa pergunta, e então segurou a mão de Lilly, e a levou para o seu quarto.

— Sim, ele tem. Mas meu “papai” está ocupado com as minhas… “mamães”. Suponho que… o seu também é ocupado com elas.

Oh! O meu também tem várias! Ele sempre aparecia com uma nova mamãe! E a primeira mamãe… sempre ficava irritada com ele… acho que ela queria ele só para ela. Mamãe é egoísta?

— É melhor… você parar de pensar nessas coisas — disse Ethan, e então se sentou em cima de sua cama. Olhou para a garota, e ela parecia mais confortável agora.

— O que você quer fazer? Pode escolher.

— Es… escolher? — perguntou a garotinha.

Ethan, notando que talvez a garota tenha sido maltratada desde que nasceu, teve uma nova estratégia.

— Sim, escolha qualquer coisa.

— E-eu… posso cuidar da louça…? Eu acho mais fácil…

— Claro… se é o que deseja — respondeu, e a garotinha logo correu dali até a cozinha. Katherine, que estava na porta, olhou para o garoto com um olhar confuso.

— Você deixou ela ir, Ethan?! Por que você… — antes que terminasse, o garoto já a respondeu.

— Não adianta tentarmos explicar as coisas para ela agora, Katherine. Ela foi criada desta forma, vai ser como uma quebra de realidade. Vamos deixar ela agir naturalmente, e vai entender o que estou falando… se quiser ajudá-la a lavar, fique a vontade para diverti-la.

Katherine achou isso tudo estranho, mas decidiu não intervir. Seguiu para a cozinha, e começou a lavar a louça junto da garotinha, de uma maneira divertida e pacífica. A garota parecia feliz fazendo aquilo, e era a primeira vez que fazia algo do tipo de uma forma divertida.

Após um certo tempo, as duas terminaram e Katherine acariciou a cabeça de Lilly. A garota estava alegre, mas não se deixou levar. Correu imediatamente até o quarto, para receber novas ordens de Ethan. A garota parou em frente a ele, e o observou.

— Continua entediada? Por que não come um pouco? Você já ajudou o bastante com a casa.

— Comer…? Mas, eu ainda tenho que… ajudar…

— Você quer ajudar? — perguntou, com um olhar tranquilo. A garota se sentia bem mais confiante naquele ambiente do que em sua casa original, então, não sentia medo em dizer que não queria fazer os serviços domésticos.

— Eu… não quero… — respondeu, com um tom de voz tão baixo que ela mesma quase não ouviu.

— Então não precisa mais, tudo bem? Vamos lá comer, hoje vou te ensinar a fazer uma tapioca, ok?

Um sorriso se instalou imediatamente no rosto da garota após ouvir isso, e ela deu pulinhos, eufórica.

— Vamos lá então!

Ethan observou a garotinha correr para a cozinha, alegre. Um pequeno sorriso apareceu em seu rosto. Ele sabia como era a sensação da submissão à base da força. Libertar aquela garota, era como ver a si mesmo sendo livre de tudo aquilo. Pela primeira vez em muito tempo, o garoto realmente sentia felicidade em sua alma.

Notas:

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