Volume 1 – Arco 1

Capítulo 19: Três Mentes - Parte 3

Quando finalmente o estridente som do alarme ecoou pela escola, os três se encontraram novamente no centro da biblioteca, ofegantes. A moça da recepção já estava de pé, espantando os alunos restantes como um cão pastor.

— Todos para suas salas! Agora! — bradou, ajeitando os óculos no rosto.

Eles se entreolharam, frustrados. Não haviam encontrado os outros livros a tempo. Mas isso não significava que desistiriam. Antes de se separarem, concordaram em voltar à biblioteca no próximo intervalo.

Naala foi a primeira a sair, apressada, jogando um olhar significativo para Tiruli antes de desaparecer pela enorme porta da biblioteca. Ele sorriu de canto, já se acostumando com o jeito dela.

Glomme hesitou, os olhos baixos. Tiruli percebeu seu desconforto e deu um tapinha leve no ombro do garoto, ignorando o cheiro de livros velhos impregnado nele.

— Vamos achar esses livros. Eu prometo. — disse, sua voz carregada de uma confiança que fez Glomme estremecer levemente.

Ele corou, desviando o olhar rapidamente e murmurando um agradecimento quase inaudível antes de sair apressado, deixando Tiruli para trás com um sorriso satisfeito. A química entre eles estava crescendo, e aquilo tornava tudo ainda mais interessante.


Glomme entrou na sala de aula, os olhos ainda perdidos nos pensamentos sobre os livros e os símbolos misteriosos que ele, Naala e Tiruli haviam encontrado. Sentou-se ao lado de Firefy, sua melhor amiga, mas sequer conseguiu esboçar um cumprimento. Não que ele não quisesse. Pelo contrário, sentia que devia dizer algo, mas as palavras não saíam. E Firefy, por sua vez, não parecia exatamente receptiva.

Ela estava com os braços cruzados sobre a mesa, o rosto apoiado neles, e um leve suspiro de cansaço escapava de seus lábios. Seu olhar estava distante, como se estivesse presa em pensamentos muito mais densos do que qualquer coisa que pudesse acontecer naquela aula. Seu corpo parecia tenso, os ombros ligeiramente encolhidos, e Glomme percebeu o cansaço estampado no rosto dela. Ele hesitou. Talvez fosse apenas uma TPM, talvez estivesse menstruada e desconfortável. Ele nunca entendia direito como lidar com isso, então simplesmente preferiu não falar nada. Era mais fácil deixá-la quieta.

Mas o silêncio pesava entre eles.

Desde que Gumer não estava por perto para puxar conversa, tudo ficava mais difícil. Gumer era a ponte entre os dois, aquele que sempre fazia piadas, que mantinha a energia fluindo. Sem ele, Glomme e Firefy ficavam travados, presos na própria timidez, trocando olhares rápidos e desviando no instante seguinte, como se qualquer tentativa de diálogo fosse um desafio enorme. Ele queria perguntar se ela estava bem. Queria contar sobre os livros que encontrou. Mas ao invés disso, apenas mexeu no material sobre a mesa e fingiu estar ocupado.

O professor entrou, dando início à aula, e os alunos aos poucos começaram a se concentrar. Mas Glomme ainda sentia a presença de Firefy ao lado, sentia o desconforto dela, e também o próprio. O que deveria ser uma simples conversa entre amigos parecia agora uma barreira intransponível.


Depois que a aula terminou, Glomme se apressou para sair, os passos largos e desajeitados ecoando pelo corredor. Algumas risadas baixas e comentários maldosos o seguiram enquanto ele corria—zombavam do jeito que ele se movia, dos braços um pouco soltos demais, da forma como seu corpo parecia deslocado no próprio espaço. Ele fingiu não ouvir, tentando manter o foco, mas aos poucos foi diminuindo o ritmo. Respirando fundo, passou a andar calmamente, os olhos fixos no chão até alcançar a entrada da biblioteca. Sem Gumer por perto, não havia ninguém para protegê-lo, ninguém para afastar as vozes que o perseguiam.


Dentro da biblioteca, o ambiente era silencioso e acolhedor, repleto do cheiro de papel antigo e madeira polida. Entre as estantes, Naala e Tiruli estavam próximos demais, quase sussurrando um para o outro. Glomme hesitou ao vê-los assim, tão à vontade juntos, os rostos próximos, a respiração se misturando entre palavras trocadas num tom baixo e íntimo. Algo dentro dele se retesou. O modo como Naala inclinava a cabeça levemente e como Tiruli sorria para ela faziam parecer que estavam prestes a se beijar.

Glomme engoliu em seco e desviou o olhar, sentindo-se um intruso. Pensou em simplesmente dar meia-volta, mas antes que pudesse decidir, Naala percebeu sua presença e deu um passo para trás, se afastando e sorrindo com naturalidade. Tiruli logo se afastou também, passando a mão nos cabelos de forma distraída, como se não houvesse nada de mais. A insegurança ainda pesava nos ombros de Glomme, mas ele a empurrou para o fundo da mente e se concentrou no motivo pelo qual estavam ali.

Sem muitas palavras, os três começaram a busca novamente. Havia pressa nos movimentos, um senso de urgência invisível os guiando. Tiruli se afastou para uma ala mais funda na direita, enquanto Naala seguiu para o outro lado. Glomme hesitou por um instante, observando a direção que Tiruli tomava. Uma parte de si queria segui-lo, queria sentir aquela presença perto, ouvir sua voz enquanto procuravam juntos. Mas algo o impediu—talvez fosse o medo de ser rejeitado, ou talvez apenas a insegurança que sempre o acompanhava.

Respirando fundo, virou-se e escolheu outro caminho. Era melhor assim. Se quisesse encontrar as respostas que tanto buscava, precisava manter o foco.

Tiruli seguiu por entre as estantes de madeira escura, percorrendo os dedos pelas lombadas desgastadas dos livros, os olhos atentos a qualquer pista. Em um momento de distração, chamou por Glomme, esperando que ele tivesse seguido seu caminho, mas, ao se virar, percebeu que estava sozinho. Soltou um suspiro e passou a mão pelo rosto, frustrado consigo mesmo. "Foco, Tiruli", murmurou, dando um leve tapa na própria testa para se recompor.

Enquanto isso, Glomme caminhava hesitante entre as prateleiras, lutando contra a sensação incômoda que insistia em perturbá-lo. Por mais que tentasse ignorar, algo dentro dele se remexia toda vez que pensava em Naala e Tiruli juntos. Ele balançou a cabeça, tentando afastar esses pensamentos. Havia algo muito mais importante para se concentrar agora. Precisavam encontrar aqueles livros.

Naala, por outro lado, movia-se com determinação, puxando livros das prateleiras com rapidez, seus olhos analisando cada capa e cada título. O tempo estava passando, e a urgência crescia. Eles não podiam falhar agora.


Quarenta minutos se passaram na biblioteca, mas o tempo parecia ter fluído sem ser notado. O ambiente seguia em silêncio, apenas o som suave de páginas virando e passos discretos ecoando entre as estantes. A luz filtrada pelas janelas mantinha o enorme salão iluminada de forma acolhedora, enquanto o ar carregava o leve cheiro de papel antigo.

Depois de buscas intensas, Glomme finalmente encontrou mais um livro escondido entre as estantes empoeiradas da biblioteca. Suas mãos tremiam de ansiedade ao segurá-lo, sentindo o peso do papel envelhecido e a capa de couro desgastada. Ele ajeitou os óculos, enxugou o suor da testa e apressou o passo em direção ao ponto de encontro. Quando chegou, Naala já estava lá, sentada no chão, batucando os dedos na capa dos livros, impaciente.

— Até que enfim — comentou ela, erguendo uma sobrancelha ao ver o estado exausto de Glomme.

Ele apenas assentiu, recuperando o fôlego. Não demorou muito para Tiruli aparecer logo depois, carregando uma pilha de anotações e respirando ofegante.

— Então, agora temos três livros — Tiruli apontou para os volumes no chão, seus olhos curiosos analisando cada capa. — Três símbolos diferentes... então são... três letras.

Os três olharam para os símbolos gravados nas capas dos livros. Naala se abaixou lentamente, seus olhos fixos nos livros espalhados sobre o chão. Ela tocou o primeiro com a ponta dos dedos, sentindo a energia que emanava de sua capa. As letras e símbolos, que antes pareciam aleatórios, agora ganhavam uma nova perspectiva. Com um movimento cuidadoso, ela colocou o primeiro livro à esquerda, o segundo no meio e o terceiro à direita, alinhando-os de forma que os símbolos pareciam se conectar visualmente.

— Se formos seguir a ordem certa... — Naala começou, sua voz calma, mas com um tom de certeza. Ela então olhou para os outros. — Esses símbolos... Eles devem revelar algo. Uma mensagem.

O problema agora era como traduzi-los. Naala franziu a testa, tentando decifrar algo apenas com o olhar.

Os três anotaram os símbolos desenhados em seus cadernos, e Glomme, ainda parecendo irritado e desconfortável, foi o primeiro a quebrar o silêncio.

— Vou pesquisar sobre esses símbolos no meu laptop — disse ele, de forma quase apressada, como se estivesse tentando evitar mais conversa. Naala e Tiruli assentiram, achando que era uma ótima ideia. Eles também se sentiam impulsionados a buscar mais informações sobre os símbolos, cada um indo atrás de suas próprias fontes.

Sem mais palavras, Glomme pegou sua mochila e saiu rapidamente do local. Sua mente estava acelerada com tantas dúvidas, e, embora não soubesse exatamente o que estava acontecendo, ele sentia uma inquietação crescente. Algo estava estranho, principalmente em relação a Naala e Tiruli, que estavam se aproximando cada vez mais. Ele caminhava em direção ao dormitório, com o estômago embrulhado e um frio na barriga. 

"Preciso ficar sozinho por um tempo", pensou ele, tentando convencer-se de que esse afastamento era o melhor para si mesmo.


Na biblioteca, Naala e Tiruli ainda arrumando suas mochilas, ainda digerindo o que tinha acontecido com Glomme. O jeito que ele saiu tão apressado, nem se despedindo direito, deixou um clima estranho no ar. Tiruli olhou de canto para Naala, e ela já parecia estar pensando no mesmo assunto.

— Eu ainda não consigo entender o que aconteceu com o Glomme, ele ficou tão estranho quando nos viu juntos — Naala comentou, agachada enquanto colocava os cadernos na mochila. — Você acha que ele está com ciúmes?

— Espera... Ele tem ciúmes de mim? — ele perguntou, um tanto surpreso com a ideia, ainda não se sentindo preparado para enfrentar essa possibilidade.

Naala parou por um instante, encarando Tiruli. Ele parecia genuinamente surpreso com a própria conclusão.

— O quê? Não! — Naala disse rapidamente, tentando suavizar as palavras. — O ciúme não é de você. Ele tem ciúmes de nós dois.

Tiruli arqueou uma sobrancelha.

— Como assim?

— Você não percebeu? — Naala viu a oportunidade e rapidamente aproveitou para mudar a direção do pensamento dele. — Eu acho que ele só tem ciúmes da nossa amizade. Tipo, acabamos de nos conhecer e já estamos tão próximos, talvez ele tenha medo de ficar de lado.

Tiruli continuou pensativo.

— Tem certeza que é isso? — ele perguntou, olhando diretamente para ela, como se tentasse entender se ela estava escondendo algo.

Naala sustentou o olhar e sorriu, querendo parecer despreocupada.

— Claro! Você está pensando demais. O Glomme só não sabe lidar com mudanças, só isso.

Tiruli hesitou, mas no fundo ainda sentia que havia algo mais. Ele não sabia se acreditava totalmente no que Naala dizia, mas por ora, aceitou.

Eles pegaram suas mochilas e saíram da biblioteca juntos. Enquanto caminhavam pelo corredor de pedras antigas da escola, Naala mencionou que queria conversar com a professora Lira sobre os símbolos dos livros.

Tiruli hesitou, receoso em revelar o segredo de Glomme. Ainda assim, Naala não via problema—Lira não contaria para ninguém, e para ela, tudo pareceria apenas uma curiosidade adolescente. Após alguns instantes de indecisão, Tiruli cedeu. Queria entender aquele mistério e, se pudesse ajudar sem que os Caçadores descobrissem, melhor ainda. Com a decisão tomada, seguiram caminhos opostos, mas ambos carregavam as mesmas dúvidas inquietantes.


Glomme tomou um banho e voltou para seu dormitório depois da aula. Seu cabelo ainda estava molhado, pingando algumas gotas sobre a gola do uniforme enquanto ele se sentava de pernas cruzadas na cama de baixo da beliche. Ligou o laptop rapidamente—tinha apenas uma hora até as próximas aulas, então precisava se apressar.

Seus dedos se moviam com pressa pelo teclado, alternando entre pesquisas sobre línguas mágicas, línguas esquecidas, símbolos antigos. O caderno ao seu lado estava cheio de rabiscos e tentativas de reproduzir os mesmos desenhos que haviam visto antes. Ele folheava as páginas, comparando cada traço com as imagens na tela. Mas nada. Nenhuma correspondência. Nenhum indício do que aqueles símbolos poderiam significar.

— Não faz sentido... — murmurou para si mesmo, o olhar fixo no brilho frio da tela do computador. Ele mudou os termos da busca, abriu novas abas, revisou sites antigos de ocultismo, mas tudo parecia distante, inútil.

O desenho da criatura estranha que Marry havia feito não batia com nada. Nem em registros de bestiários mágicos, nem em arquivos sobre entidades sobrenaturais, nem mesmo em teorias sobre alienígenas. Ele tentou mais uma vez, ajustando os filtros da pesquisa, analisando textos acadêmicos, fóruns de magia avançada, até mesmo relatos de avistamentos de criaturas desconhecidas. Mas ainda assim—nada.

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