Volume 3
Capítulo 81: Segredos Púrpuras
GRIS
Noto certos padrões a se repetir, é com frequência que a bondade de uns é recompensada com a maldade de outros.
A minha afirmação direcionada a ele foi pura retórica. Independentemente daquilo que diga, não há motivos honrosos para as ações que Diego tomou.
— Não sou mais um di Ricci! — esbraveja Diego. — Meu pai me deserdou, seu plebeu de merda! Por sua causa e daquele caçador desgraçado, eu... Ah! Claro, por causa daquela vagabunda...
Levo a mão à bainha de minha espada e o interrompo: — Se terminar essa frase, eu te mato.
— Calma, Gris. Ela não está aqui, precisamos saber antes onde está a Cintia — argumenta Conor. Ele coloca sua mão esquerda sobre meu ombro e toma a frente.
Com um sorriso simpático em seu rosto e a mão direita erguida, ele acena para os bandidos.
— Boa tarde, pessoal, viemos de longe à procura de uma amiga perdida e creio que ela esteve por aqui.
— Sim, sim, uma amiga. Conte mais... Hahaha! — caçoa o Caolho, ao passo que olha para os demais e balança a cabeça para cima e para baixo. Os outros riem junto dele, exceto por Diego.
— É uma mulher jovem, de boa aparência e cabelos negros. Dona de uma estalagem em Lumínia.
— Hum... — O Caolho lambe os próprios beiços e cutuca com o cotovelo o peito do bandido ao seu lado, cujo sorriso lembra um cavalo a mostrar os dentes. — Uma mulher assim viria a calhar. Não é mesmo, Gengiva?
— Com certeza, mas é uma pena que não tenha nenhuma assim aqui. — Ele olha para o corpo de Alienor com lascívia, enquanto esfrega suas mãos.
— Um pangaré igual a você não teria a menor chance! — esbraveja a ruiva.
— Fiquem tranquilos. — Conor estende a palma das mãos para ambos os lados. — Que tal se vocês nos revelarem onde está a mulher que nós procuramos por, sei lá, trinta moedas de ouro?
— Eu prefiro tirar do seu cadáver — responde o Maneta, enquanto aponta a espada para ele.
— É inútil, seu idiota. Eles não vão aceitar nada, agora que vocês descobriram este esconderijo — aduz Diego.
— Cala sua boca, novato. Eu estava me divertindo aqui com o cara de Adarik. — O Caolho volta sua atenção para nós. — Mas ele tem razão, vocês precisam mor...
— Superno Vincula — recita Alienor, enquanto cerra seu punho perante os próprios olhos, e o Caolho sequer termina sua frase. Ele cai no chão, duro como pedra. — Já estava cansada desse pipipi e pópópó mesmo.
— Verdade, só precisamos de um deles vivo — digo e avanço em direção a Diego.
— Gris... — Escuto a voz acanhada de Kali, mas não tenho tempo para checar.
Um gorducho se interpõe no caminho, puxa uma balestra e atira em mim. Defendo a seta com minha espada, e ela produz um som metálico ao passo que ricocheteia para o alto e rodopia sem parar. O atirador arregala os olhos, joga fora a besta e saca sua espada, todo desengonçado.
Com o impulso da corrida, inverto a empunhadura da espada e miro no pescoço do gordo. Ele tenta defender, mas o impacto contra a minha arma faz a lâmina da dele se romper próximo do guarda-mão. Corto seu pescoço em seguida, e sua cabeça se divide do restante do corpo.
Diego arregala os olhos ao ver o companheiro morrer. Ele pega uma esfera do bolso e joga contra o chão, produzindo uma cortina de fumaça.
Continuo a avançar por dentro da nuvem, mas me deparo com o Maneta. Com a espada em punho, ele aponta dois dedos para mim. — Ignis! — recita o bandido, e uma labareda surge e me cega.
Claro, esse ruivo deve ser de Galantur, um usuário do caminho da serpente igual ao Fineas.
Sinto algo pontiagudo ser pressionado contra minha barriga. Assim que minha visão retorna, olho para baixo e vejo que a espada não transpassou a defesa do impetus.
Os olhos do maneta se perdem, sem entender o que ocorreu. Soco sua têmpora com um cruzado e rombo seu crâneo, enquanto seus miolos voam na direção oposta.
O bandido com sorriso de cavalo aparece em meio a fumaça, vê seu o companheiro com a cabeça estourada e paralisa de medo. Antes que ele possa reagir, Conor surge das sombras ao seu lado e o toca no braço.
— Somnun — recita meu companheiro, e o assaltante desmaia e cai no solo. — O Diego fugiu. — Ele aponta para a direção.
— Deixe-o comigo, o pegarei — respondo e corro para o local indicado, saindo da cortina de fumaça.
Deparo-me com o fim da câmara e o início de uma longa galeria, a qual adentro sem pestanejar, e corro pelo seu corredor.
Enquanto avanço em meio à penumbra, vejo o final da galeria que leva à outra área ampla, iluminada por tochas, com uma balestra de castelo posicionada na porta e apontada para mim.
Diego se levanta de trás da arma, mira e atira. O projétil viaja em minha direção, e eu desvio para a lateral da caverna, dou alguns passos pela parede e, quando a seta gigante passa diante dos meus olhos, a coleto em pleno ar.
O garoto do outro lado da arma tenta correr de novo, mas o alcanço antes dele dar o primeiro passo, salto por cima da balestra e agarro seu pescoço, caio por cima dele arrastando-o por alguns metros sobre algumas estalagmites espalhadas pelo chão, as quais quebram com facilidade e produzem um som semelhante a cristais.
— Seu mer...! — Soco seu rosto antes que termine de falar. Ele tenta me empurrar, mas meu aumento de massa o impede. O garoto me devolve um murro, porém é fraco. — O quê?
Com a seta da balestra, perfuro a artéria axilar dele e torço o projétil. — Aaah! Seu... — Esmurro em seu rosto.
— Agora você dirá apenas o que eu quero saber. — Removo a seta e a jogo para lado.
O ferimento do garoto verte sangue sem parar. Ele tenta se livrar de mim, mas não tem forças.
— É impetus, não é?! Nem meu pai quis me ensinar isso, mas você...
Golpeio-o no rosto e quebro seu nariz, ele sangra. — Você tem alguns minutos de vida. Se disser onde está a Cintia, te darei um poção de cura. Do contrário, morrerá de hemorragia.
— Eu...! — O rapaz olha para a gigante poça de sangue que se formou ao redor de seu ombro neste curto prazo de tempo. — Você tá falando sério?
Olho em seus olhos, seguro seu rosto com força na região das têmporas e não digo nada, enquanto a poça vermelha continua a aumentar gradualmente.
Para dizer a verdade, minha vontade é vê-lo sangrar até morrer.
— Hey, cara! Eu sou o filho do barão, se fizer isso...
Continuo a encará-lo e o seguro com mais força para não ter chances de escapar. Seu rosto fica pálido e começa a suar frio.
— Tá! Eu digo, eu digo! Ela foi levada para o Vale dos Ossos!
— Onde fica?
— Leste daqui! Nordeste de Galantur. Precisa passar por um desfiladeiro. Agora me dá a poção, por favor, cara.
— Por que vocês a sequestraram?
— Cara! Eu não sei. Foi o líder do bando que tratou com o contratante.
— Então você morrerá.
— Um domador! Isso! Um domador sombrio está guiando o líder e o restante do bando até o vale. Parece loucura, mas eu juro que é verdade! O contratante deve ser de Nila Velum, sei lá! Eles estão levando a Cintia para uma caverna, é só o que sei! Me dá a poção, cara, não quero morrer aqui...
Um cheiro forte de urina surge, e os olhos de Diego se enchem de lágrimas.
— Por que você os ajudou?
Com uma voz mais fraca, ele explica: — Eu fugi de casa depois que meu pai me deserdou e tentei entrar nesse grupo, mas os caras me disseram que eu só seria aceito se os ajudasse com isso. Foi mal, vacilei...
Solto seu pescoço e digo: — Pressione o ferimento para não sangrar mais. Não se levante, eu vou pegar a poção. — Levanto-me e dou alguns passos para trás, sem tirar os olhos dele.
Pego minha mochila das costas e a coloco no chão. Enquanto a abro e vasculho seu interior, Diego aperta o ferimento da axila com a mão e comenta: — Hey... Eu vou voltar para Lumínia e ficarei de boa por lá. Não vou falar nada disso com ninguém, eu prometo.
Solto o frasco azul e coleto o roxo em seu lugar, removo a rolha, e o entrego em suas mãos. — É amargo, mas você precisa beber tudo.
Enquanto pega o frasco, ele olha para a própria virilha e diz: — Pô, cara. Sei que você tá bravo comigo, mas poderia não contar para o pessoal que eu me mijei.
— Não contarei.
— Você é um cara legal no fim das contas... Eu nem lembro mais porquê eu impliquei com você. Você se lembra?
Balanço a cabeça para os lados.
— Eu só faço merda, verdade? — Diego toma da poção. — Não é amargo. Até que é doce... Eu... — Ele olha para todos os lados, perdido, sem conseguir me encontrar.
— Sinto muito, em Lumínia ainda há duas pessoas que eu gosto. Não posso deixar alguém como você perto delas, enquanto estarei à procura de Cintia. Se você tivesse ido só atrás de mim, eu não me importaria tanto.
Jogo o frasco manchado pelo líquido de cor púrpura em direção ao fim da câmara, enquanto Diego para de respirar para sempre.
— Conseguiu o que precisava? — pergunta Conor ao surgir da passagem da galeria.
— Sim, já sei para aonde ela foi levada — digo, sem olhar para ele.
O rapaz moreno caminha até meu lado, se agacha e analisa o corpo de Diego. Ele abre as pálpebras do cadáver para ver sua pupila. — Mortinho, mortinho...
— Sangrou até morrer, um erro de cálculo meu.
— Bom, se ele contou uma história, só precisamos confrontar com as que os outros dois bandidos narrarão. No fim, parece que o resultado foi bom.
— Sim, foi bom...
Repreendi Alienor por suas mentiras e brincadeiras, mas fiz algo pior e acabo de enganar Diego e também o meu companheiro.
Você disse para mim que homens mantém suas promessas e contam a verdade, porém eu menti de novo e não contarei a ninguém o que fiz aqui. Eu tentei, mas acho que não consigo ser a pessoa que você deseja. Sinto muito, Srta. Cintia.
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