Aelum Brasileira

Autor(a): Marin


Volume 2

Capítulo 68: Tempo Congelado

GRIS

 

Ao passo que me aproximo dos nossos aposentos, escuto uma discussão cada vez mais alta e nítida entre duas garotas cujas vozes reconheço. Pelo visto, Alienor procrastinou ao máximo em contar a verdade. Eu deveria esperar por isso.

— Não acredito que você fez isso comigo!

Hey! Já pedi desculpas, sua branquela! Quer que eu me ajoelhe no milho para ficar satisfeita agora?!

— Na verdade, fez com nós dois!

— Eu sei. Eu disse que não vou mais... Você não estava me ouvindo?!

— E o pior de tudo é que ele... — Assim que eu abro a porta, as duas jovens se calam e se sentam à mesa. Kali leva ambas as mãos à boca, como se tentasse colocar as palavras ditas de volta à origem.

Ah! Então... — comenta a lumen, com o rosto todo avermelhado e a esfregar os braços com as mãos — quer dizer que vocês lutaram contra aqueles dois brutamontes e venceram...

Conor também se encontra sentado à mesa, mas muito mais relaxado, diga-se de passagem. Ele está sem camisa a exibir seus músculos, com as pernas cruzadas, seus pés sobre a mesa e um sorriso presunçoso no rosto, que só é disfarçado eventualmente à medida em que ele leva uma maça à boca.

— Por favor, gatinhas, vamos voltar à pauta principal. O assunto estava muito interessante — argumenta o rapaz moreno, antes de levar a maça à boca e fazer um barulhão com a mordida. Clack!

— Eu já disse para você vestir uma camisa, seu assanhado! — contesta a ruiva, ao passo que se levanta da mesa. Porém, ela olha para mim, abaixa a cabeça e se senta novamente.

Aproveito para me acomodar também. — Já acabei o que precisava fazer aqui em Ticandar, agora podemos...

— Gris — interrompe-me Kali, enquanto ela toca meu pulso com sua mão delicada. — V-você me perdoa? — Ela mal consegue manter contato visual.

— Perdoar pelo quê?

Clack!

— Você pode comer em silêncio, por favor?! — esbraveja a ruiva.

— É para fortalecer os músculos do maxilar — desafora o descamisado.

Kali decide ignorá-los e continua: — A Alienor me contou que ela mentiu sobre você e...

Hey! Eu disse que aumentei um pouquinho as histórias, não que menti.

— Você... — Kali se levanta e aponta o indicador na direção da ruiva, a qual se levanta também e a imita.

— Alienor — eu digo, e ambas se calam.

A ruiva se senta de novo e se encolhe em seus próprios ombros antes de dizer: — Tá bom... Eu menti.

— Humpf! — A garota de cabelos brancos cruza os braços e se senta também. Ela olha para mim e seu rosto ruboriza tanto que esconde suas sardas, mas ela junta forças e diz: — Você estava tentando me ajudar esse tempo todo, enquanto eu te tratei mal. Por favor, me perdoe.

— Mas você também me ajudou, Srta. Kali. Você poderia ter escapado, mas voltou, arriscou sua vida e me curou. — Levanto meu braço direito e arregaço a manga para mostrar a ela. — Olhe, não há sequer cicatriz, até algumas antigas sumiram. Eu não tenho porquê te perdoar, sendo que eu só te devo agradecimento.

A lumen olha para o lado e resmunga: — Mas eu poderia ter te curado antes e não fiz... Já tinha fluxo suficiente muito antes daquele dia.

— Ai! Parem, por favor, que coração de coiote é muito frágil — comenta Conor, ao passo que finge secar suas lágrimas invisíveis.

— Xiu! — alerta Alienor. — Você nem precisava estar aqui.

— Além disso — ignoro os dois faladores —, eu quase desisti de reclamar o prêmio. Foi a Alienor quem insistiu para eu pedir ao Lorde Khan. Então te devo desculpas também.

Conor finalmente retira seus pés de sobre a mesa e escora seu cotovelo no mesmo lugar. Então, ele limpa o pigarro da garganta e sugere: — Se continuarem assim, isso nunca vai acabar. Por que não fazemos de outro modo, eu conto até três e os dois dizem que se perdoam e agradecem um ao outro? Só que bem rápido! — Ele solta um sorriso presunçoso.

Kali e eu nos olhamos, mas sou eu quem digo primeiro: — Por mim tudo bem. — Ela concorda fazendo um sinal com a cabeça.

Vejo que a ruiva está toda acanhada, quase a explodir na tentativa de reprimir o que deseja falar. — Que tal nós três? Podemos dizer juntos e bem rápido.

— Ahm!? — balbucia Alienor, então ela olha para Kali em busca de aprovação, a qual balança a cabeça para cima e para baixo. — Isso! Nós três!

— Vamos lá então — anuncia o descamisado. — Todos preparados? Um, dois e três!

— Eu te perdoo! Obrigado! — gritamos todos juntos.

Todavia, o silêncio mais constrangedor da minha vida surge. Nós nos entreolhamos sem saber o que dizer, até que Conor se manifesta primeiro: — Pf! Vocês são um bando de tontos. Hahahahaha! — Ele cai na gargalhada.

— Hey! — Alienor se levanta, coloca uma mão na cintura e, com a outra, aponta o dedo para ele. — A ideia foi sua, seu tarado de uma figa!

Conor finalmente para de rir um pouco e complementa sua fala: — Vocês são tontos, mas adorei vocês. Hahahahaha!

Nós três nos encaramos novamente e caímos em uma longa gargalhada, nos unindo ao abobado do Conor.

— Ai! Minha barriga está doendo de tanto rir — reclama o moreno. — Senti até uma fisgada no peito. Acho que vou morrer, gente, é serio. — Ele leva sua mão ao peito e cai no chão fazendo cena.

Hahaha! Cure ele, por favor — digo em vão, pois a lumen está muito ocupada tentando limpar as lágrimas do rosto, enquanto se acaba de rir.

— Não olhem para mim, não vou gastar fluxo com esse tarado — defende-se preventivamente Alienor. — Hahaha!

— Pessoal, que vergonha — comenta a lumen. Ela olha para a porta da rua. — Tomara que ninguém mais tenha ouvido.

— Veja se não abre o bico sobre isso, seu pervertido — adverte Alienor, enquanto cutuca com o pé o rapaz ainda caído.

Conor se recompõe, volta para sua cadeira e diz em um tom mais sério, como se nada tivesse acontecido: — Claro que nunca contarei. É para guardar segredos que servem os amigos. — Ele manda um sorriso presunçoso de uma maneira que só um coiote saberia fazer, então olha para mim e dá uma piscada.

Às vezes, eu acordo e sinto que perdi algo, sem saber dizer o que é. Outras vezes, uma aflição toma conta de mim quando entro em lugares fechados. Eventualmente, um desejo de ferir as pessoas surge, e tenho medo que os outros descubram.

Porém, em outros raríssimos momentos, não sinto nada disso. Pelo contrário, é como se o sol tocasse minha pele em um dia de verão, enquanto estou deitado na grama e com os pés mergulhados no Rio Reluzente.

— Nossa, que algazarra — comenta uma linda mulher de cabelos loiros e encaracolados, à medida em que desce a escadaria e coça seus olhos. — Estava dormindo tão bem...

— Hahaha! — Eles voltam a rir.

— Venha, junte-se a nós, Srta. Verônica! — Conor faz um sinal para ela se sentar. — Vamos comer, pois temos uma longa viagem a seguir.

— Vocês são tão abobados quanto aqueles três. Ai, ai... — suspira a loira, ao passo que se senta na cadeira e debruça seu corpo sobre a mesa.

Não aqui, não agora e não nestes raríssimos instantes, estes são especiais. Seria tão bom se o tempo parasse em momentos assim. Se Aelum fosse perfeita, o tempo teria congelado agora.

Toc! Toc! Alguém bate à porta de entrada da casa diplomática.

— Estão esperando mais alguém? — questiona Verônica.

— Não que eu saiba — respondo, e os demais concordam balançando a cabeça.

Decido atender ao chamado. Ao abrir a porta, deparo-me com uma lumen de olhos azuis, um par de óculos em seu rosto e vestida com um terno azul-escuro com saia. Reconheço tais vestimentas, e só pode ser de um lugar.

— Bom dia, Sr. Gris, é um prazer conhecê-lo. — Ela se curva levemente. — Eu me chamo Fey, e represento, neste ato, a instituição mais antiga de Aelum.

— Bom dia. Esqueci algo no banco, Srta. Fey?

— De forma alguma. Em verdade, procuro por Verônica, filha de Arthur e Margaret de Vindervel. Fui informada que ela estaria aqui.

— Srta. Verônica, acho que é para você.

Ela vem até nós, verifica a mulher dos pés à cabeça e aduz: — Por Dara, aconteceu algo?

— Assuntos de herança, a Srta. deseja privacidade? Podemos nos dirigir a um lugar mais reservado.

Verônica arregala os olhos e tampa sua boca com a mão. Então olha para mim e responde: — Está tudo bem, pode dizer aqui.

A mulher abre uma maleta marrom, retira uma prancheta dela e diz: — Você foi indicada como única herdeira de Barathun de Fubuldjin. Além disso, a terça parte da herança de Filemon de Dákila foi designada para a senhorita.

— Ai, aqueles tolos...

— Pessoal, vamos para o quarto por um instante. Senhoritas Verônica e Fey, usem a mesa ali, por favor.

— Obrigada — responde Verônica.

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