Aelum Brasileira

Autor(a): Marin


Volume 2

Capítulo 64: As Masmorras dos Aquedutos

GRIS

 

Estranhamente opressor, claustrofóbico e pouco iluminado é o local que caminho. Sou guiado pelo Sr. Coiote por uma escadaria subterrânea, cuja entrada se encontra em uma guarita militar próxima ao centro do térreo de Ticandar.

As paredes, teto e escadas são feitas de blocos de pedra, como se fizessem parte de uma fortaleza ou um castelo abaixo da terra.

O Coiote leva consigo uma espécie de lampião, o qual não é alimentado por óleo, nem produz luz por meio de fogo. Em verdade, porta uma dezena de vaga-lumes prateados, presos dentro do recipiente de cristal e projetam uma quantidade de luz constante, suficiente para nos orientar em meio à escuridão.

Enquanto descemos, escuto o som de cachoeiras vindo do nosso destino. Uma brisa úmida e gelada toca minha pele e sinto o cheiro de águas doces.

— Foi uma boa luta — comenta o rapaz de pele bronzeada a minha frente, ora sem sua característica máscara de coiote, enquanto ele mantém sua atenção nos degraus da escadaria que descemos. — Aquele disparo de flecha foi poderoso. É algum tipo de magia?

— Não, Sr. Coiote, eu evito usar magia.

— Pode me chamar só de Conor agora... Aquela identidade ficou para trás — ele diz com um certo pesar em sua voz. — Enfim, mas você conjurou uma explosão outro dia, não foi?

— Eu só consigo conjurar uma fraca, foi a Alienor que me ensinou. Demorei uns cinco meses para entendê-la.

— É uma magia difícil.  Eu sei que há pessoas que, mesmo com o alinhamento correto, não conseguem conjurá-la durante a vida inteira.

— Mas não chega nem perto das explosões de Alienor.

— Quanto a isso, não posso negar, mas é incrível mesmo assim — comenta Conor. — Pesquisei no meu tempo livre a respeito da magia de explosão. Ela usa o fogo da magia de destruição combinado com o vento da magia de vida. Um único conjurador lançar duas magias combinadas com um único gesto e palavra, sem um ritual, é algo notável. Normalmente, só bestas e demônios conseguem tal feito.

— Ahm... Eu não sabia disso.

Conor detém sua caminhada, me encara, franze sua testa e diz: — Como que você não sabe? Você mesmo conseguiu lançar... Ela não te explicou tudo isso?

— Ela tentou, mas não fazia muito sentido. A Alienor disse que dava para ver as faíscas coloridas e sentir a acústica antes mesmo do fluxo se reunir, mas eu não consegui perceber nada disso até hoje. No fim, eu a vi lançar e tentei tantas vezes que, em dado momento, só deu certo.

— Hahahahaha! Vocês dois são esquisitos, mas eu gostei. Por falar nisso, se você usou essa magia, então seu alinhamento é igual ao da ruiva?

— Eu não sei.

— Ué! Você consegue ver o alinhamento de todo mundo, mas não sabe o seu?

— Não consigo saber o de todos, alguns não se encaixam. Determinadas auras são diferentes, como a do Lorde Khan e da Madame Vitari. Valefar não quis me dizer o que significa a cor da minha aura, e já não tenho mais como...

Hey! Desculpe-me por te chamar de covarde antes da luta. Eu fiquei me sentindo um lixo por causa disso depois — ele diz, e voltamos a descer pela longa escadaria.

tudo bem. Era sua missão, e eu entendo.

— Bem... — Conor coça sua própria cabeça e, sem deter sua marcha, vira seu rosto para olhar para trás e abre um sorriso acanhado. — Aquilo não era exatamente parte da minha missão, para ser sincero.

— Não era? Então você realmente acreditava que Alienor e eu perderíamos.

— Claro que não! Eu tinha certeza que vocês venceriam! — ele exclama. Depois, aproxima-se para sussurrar mais perto do meu ouvido: — Você pode guardar um segredinho?

— Posso.

— Então dê uma olhada dentro da sua mochila. — Conor aponta para minhas costas.

— Ahm? Na minha...?

Assim que ele comenta, percebo que a mochila está um pouco mais pesada que de costume. Eu a retiro das costas, ao passo que escuto o tintilar de metais dentro dela. Coloco-a no chão, a abro e vasculho o seu interior.

— Moedas!? — Olho para ele.

Quando ele colocou isso aqui dentro?

Xiu! — O rapaz coloca o indicador na frente dos lábios e abana a outra mão, aflito. Fale baixo. Hehehe.

— Você... roubou isso? — cochicho.

— Não, jamais. Ganhei de forma honesta isso aí. Apostei quarenta e duas moedas e ouro em você antes da luta. Hehehe. — Ele esfrega as próprias mãos, enquanto dá suas risadinhas.

— Mas você disse para todo mundo que nós... Ah! Você induziu a todos a votarem nos...

— Xiu! — Conor tampa minha boca com sua mão, ao passo que faz um sinal de silêncio com indicador. Depois cochicha: — Eu disse para falar baixo... As apostas fecharam em um contra trinta e seis a favor da dupla de gigantes, mas eu votei nas zebras e ganhei uma bolada. Metade do que eu ganhei é seu, então só considere uma indenização pelas coisas que eu disse.

— Mas eu não posso.

— Sinto muito, Gris. Você é meu cumplice agora. — Conor me segura pelo ombro. — Se abrir o bico, é capaz de nem sairmos das masmorras. Hahahaha!

Mas você não disse que ganhou de forma honesta!?

À medida em que reflito sobre as moedas adquiridas de maneira honrada em minha mochila e da possibilidade de nunca sair desta prisão subterrânea, continuo a seguir o agora parceiro de crime, Conor, até ele comentar: — Cá estamos. As famosas masmorras dos aquedutos. Uma das prisões de maior segurança de Aelum.

Ao passar pelo fim da escadaria, deparo-me com uma passarela de pedra que atravessa uma gigantesca galeria. Há celas dois lados, abaixo do nível dos nossos pés, distribuídas em cinco andares cujos acessos se dão por dois pares de escadarias feitas da mesma rocha que todo o local.

O mistério do som das cachoeiras é, enfim, revelado. Diversas quedas de águas são expelidas de estátuas de rochas com formas de peixes e outros animais marinhos, cravadas nas paredes ao lado de gigantes cristais brancos que iluminam o ambiente.

As águas caem em uma longa queda até a parte mais profunda, abaixo da passarela que caminhamos e das celas, e formam uma camada inundada.

Na imensa piscina no fundo, há quatro estruturas douradas parecidas com pedestais, submersas, mas ainda visíveis, com pequenas esferas pretas sobre cada uma delas, aparentemente feitas por magia.

Todas as esferas estão no limite da lâmina d’água e parecem atrair as águas em pequenos redemoinhos. A magia me parece familiar, mas não sei dizer o porquê. — O que são? — decido perguntar ao Conor, enquanto aponto para elas.

— É uma espécie de dreno. As esferas impedem que a água suba para além daquele nível e inundem todo o local.

— Não seria mais fácil fazer uma prisão acima do nível do rio reluzente para não inundar?

— Creio que seria. Mas se houverem fugas ou rebeliões, bastará que selem o interior das masmorras e desativem as esferas. Assim, em poucos minutos, tudo estará debaixo d’água. É dito que ninguém conseguiu escapar daqui nos últimos dois milênios.

— Será que foi uma boa ideia entrar aqui mesmo?

— Ah! Não se preocupe, é completamente seguro para os guardas e visitantes. Nós pegaremos duas pulseiras ali na frente com os carcereiros e, se houver qualquer imprevisto, seremos enviados para a superfície por meio de magia.

— Teletransporte?

— Sim, teletransporte menor. Uma magia de fluxos opostos de criação e destruição. — Conor detém sua caminhada por um instante, coça seu queixo e se corrige: — Ou seria melhor dizer destruição e criação... Bom, acho que você entendeu. As esferas do fundo também usam uma magia parecida.

— Uau! Magia de fluxos opostos. — Eu me debruço sobre o parapeito da passarela para ver melhor. — Mas ninguém conseguiria escapar por meio das esferas?

— Dificilmente, elas são muito pequenas, e uma pessoa não passaria pela fenda. Além disso, todos os presos usam grilhões, algemas e coleiras de promítia. Então não conseguiriam assumir formas de animais pequenos ou usar magia para coisas semelhantes.

— Faz sentido o fato de ninguém conseguir escapar — respondo, enquanto observo a pequena esfera negra que se forma lá no fundo. É tão bonita, quase hipnótica.

— Na verdade, há alguém que conseguiu escapar, mas faz muito tempo.

— É? Quem foi?

— Não sei. Na verdade, eu nunca perguntei sobre o assunto.

— Você sabe como ele escapou?

— Isso eu sei, parece que o prisioneiro conseguiu se soltar da cela e abriu várias outras unidades, então os guardas inundaram todo este local. Todos os presos morreram afogados, menos o que iniciou a fuga. Ele ficou durante uma hora aqui sem ar e continuou vivo.

— Será que usou alguma magia?

— Impossível, a promítia não existia naquela época, mas não era possível usar magia por conta daquele artefato.

Conor aponta para o teto, onde há um objeto dourado, com um cristal azul preso nele, muito parecido com a pedra de magia que usávamos na cabana, só que muito maior.

— Magia de silêncio?

— Olha, você é muito esperto, Gris. Isso mesmo, quando ativada ninguém consegue conjurar dentro da área.

Que pena eu não saber do funcionamento da magia naquela época que lutamos contra Fineas. A pedra de silêncio teria evitado várias conjurações dele, enquanto não atrapalharia Alienor em sua forma de raposa. Talvez eu devesse aprender mais sobre magia no futuro.

— Não poderia ser um usuário de impetus ou um imune? — eu pergunto.

— Usuários de impetus não existiam naquela época. Essa técnica só existe há uns mil anos mais ou menos, e isso aconteceu há muito mais tempo. Mas quanto a ser um imune, é uma boa teoria.

— Interessante... Você sabe um monte de coisa, Sr. Conor.

Ain! Assim você me deixa com as bochechas rosadas, seu bobo. — Ele junta suas mãos e se contorce como uma adolescente apaixonada, de uma forma bem teatral.

Então ele repentinamente se recompõe e diz em um tom mais sério: — Hey! Ainda temos um tempo até chegarmos ao prisioneiro. Você já definiu o que quer saber e qual será a estratégia de interrogatório? — Conor se debruça no parapeito da passarela, pensativo.

— Eu quero que ele diga tudo que sabe sobre o meu passado. Mas não sei exatamente como tirarei isso dele.

— Bom, eu posso ajudá-lo, caso você queira. Medidas extremas, como tortura, estão fora de questão, então só nos restará persuadi-lo ou enganá-lo.

— Como assim?

O rapaz de pele bronzeada apoia seu queixo sobre o punho e reflete por um instante até responder: — Sabemos que ele quer sua morte. Ele está preso aqui e não conseguirá sair tão fácil. Além disso, você deixou bem claro para ele que quer respostas, então ele sabe que esse conhecimento tem valor parar você. Precisamos desconstruir essas premissas na cabeça dele.

— Sinto muito, Sr. Conor. Tudo que eu sei é sobre caçar.

— Isso já será suficiente. Você sabe ser um caçador, então te ajudarei a fingir ser uma presa. Fica tranquilo, eu te explicarei bem certinho. Só precisará confiar em mim e fazer exatamente o que eu disser.

— Tá bom, eu farei o que você disser.

— Então comece separando vinte moedas de ouro aí. Vamos subornar um guarda. Hehehe. — Ele esfrega suas mãos, enquanto dá suas risadinhas infames.

Acho que falei cedo demais. Espero não ser preso e passar minha vida inteira aqui.

 

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