Volume 2
Capítulo 60: A História de um Covarde
GRIS
Uso a vontade do guerreiro para ganhar velocidade. Em um piscar de olhos, alcanço o gigante e corto seus calcanhares com a espada. Ifan perde o equilíbrio cessa sua investida.
Mal sabia ele que, ao obstruir a visão do público, me possibilitaria usar meus dons de forma despreocupada também. Agora ninguém pode nos ver.
Uma lança flamejante viaja e acerta o gigante loiro nas costas. — Urgh! — ele reclama.
Aproximo-me de Ifan para finalizá-lo, porém Pur surge pelas minhas costas e bate com seu tacape em um golpe descendente. Só tenho tempo de aumentar minhas defesas e resistir com a força dos braços.
O impacto da arma é forte, meus braços latejam de dor, mas ele não é tão poderoso quanto aquele anão. Entretanto, com o impacto, meus pés afundam no chão até a altura do joelho.
Outra lança viaja perante meus olhos, mas desta vez acerta o braço de Pur. — Urgh!
A intuição de Alienor é boa. Ela consegue acertá-los mesmo sem vê-los por conta dos sons e sem risco de me pegar no fogo amigo por conta da altura deles.
Pur se recompõe e se prepara para me atacar com seu tacape. Estou cercado pelos dois gigantes.
Ainda com os pés presos no chão, apenas resisto, porém desta vez deixo a espada mirada para cima como um prego, entre minhas mãos que seguram a empunhadura, ao passo que posiciono meus braços para resistir ao golpe.
O corpo do gigante moreno brilha em verde, ao passo que ele prepara o golpe. É alguma magia de aprimoramento muscular, essa será mais forte.
Com o impacto, ele acerta a espada e meu corpo reforçados por impetus. Afundo mais ainda no chão, até a altura da cintura, na medida que o tacape se divide em dois lados e arranham minha pele.
A arma do gigante racha e se divide em duas partes ao ser cravada pela minha espada.
Meus braços e pernas latejam e doem. Sangue verte dos cortes que sofri.
Já chega dessa merda. — Aaah! — brado, na medida em que uso a vontade do guerreiro para romper e me livrar do solo.
Outra lança de fogo atravessa seu peito de Pur. A magia da ruiva é bem mais forte que daqueles compatriotas dela, que mal conseguiram transpassar a pele grossa dos gigantes.
O colosso moreno arregala os olhos, ao passo que pego a metade do tacape colossal, o empunho e o levanto do chão. Mantenho o equilíbro com o aumento de massa e o golpeio os pés de Pur.
Uma arma pesada, como a daquele anão, é eficaz contra inimigos grandes, agora entendo.
O gigante é pego desprevenido e cai no chão com a rasteira do golpe. Salto sobre ele e bato com o tacape no meio de seu peito — Urgh! — Ele urra.
Sinto cheiro de pele queimada, deve ser outra magia de fogo de Alienor, lançada contra o outro guerreiro.
Desfiro outro golpe contra o rosto de meu inimigo, até que ele para de se mover e seu corpo encolhe em um brilho esverdeado, ao passo que eu saio de cima dele.
Eles devem usar muito fluxo para manter essa forma. A transformação em gigante é poderosa, mas é menos eficiente que o impetus. Agora só falta o...
Sinto algo se mover pelas minhas costas: é Ifan. O gigante loiro prepara um golpe com seu punho direito como se fosse uma marreta.
O colosso é do tamanho daquela pedra gigante, que ficava às margens do Rio Reluzente. Já chega de só me defender. Devolverei um soco reforçado com o impetus.
Igual que há uma semana. Ao respirar, deixo o calor inundar meu corpo, concentro essa energia em meus punhos, quadril e joelhos. Um golpe com a palma da mão aberta. Igual aquele maldito me ensinou.
Esse é um soco destro de um canhoto, seu: — Desgraçado!
Meu braço afunda pela carne da mão do colosso até a altura do meu ombro. — Uargh! — O gigante loiro agoniza e remove o punho, agora com um buraco nele.
Eu me lembro do golpe que Valefar usou para matar Barathun.
Enquanto ele se distrai com o ferimento, com o tacape em minhas mãos, salto a uns cinco metros do chão, sobre o inimigo. Ao passo que uso o aumento de massa, meu corpo desacelera na altura da cabeça do colosso, já ele levanta seu braço direito para defender.
Assim que eu bato com toda a força, escuto o osso de seu antebraço romper. Parte do tacape se quebra também. Lembro-me de Malak. O gigante se torna tão pequeno quanto ele, quando visto de cima.
Mais uma lança de fogo acerta a perna de Ifan, o qual cede e cai de joelhos. Eu me aproveito e arremesso o que sobrou do tacape longe para pegar impulso no ar e cair sobre a cabeça do gigante loiro. Ele arregala os olhos, mas não tem tempo de defender. O golpeio com ambos os punhos no meio de sua testa.
Ifan cai, e eu me equilibro sobre ele, na medida em que o chão treme com o peso da precipitação do gigante, o qual encolhe ao ser inundado por uma luz esverdeada até voltar a sua forma humana.
Chuto o guerreiro caído. — Ah! — ele reclama em resposta.
Seu corpo está curado, agora que voltou à sua forma original, mas ele deve estar fraco pela falta de fluxo. Desfiro outro chute na costela, a qual escuto quebrar desta vez.
— Vocês lutam até a morte no continente dos demônios? — eu pergunto, ao passo que me inclino em sua direção para ouvir a resposta.
Ifan me olha nos olhos, porém não responde. Ele não demonstra medo. Mas deve estar. Eu também era assim.
O golpeio no rosto, e ele sangra. Já sem forças, o garoto apenas me encara e lança um sorriso sádico. Seus dentes estão avermelhados por conta dos ferimentos, mas ele parece apreciar a situação.
Subo sobre seu peito e passo a esmurrá-lo. Era assim que ele se sentia ao me espancar na Floresta de Prata?
Enquanto golpeio o jovem guerreiro estirado pelo chão que já não tem forças para se defender, escuto a voz de um garoto estranho sussurrar em meu ouvido, mas não o vejo. Sua voz é gelada como a promítia que eu carregava em meus pulsos.
Não compreendo. Uma palavra me vem à mente: — Breo — eu digo. Porém não sei o que significa.
Olho em direção à voz, e a poeira já se dissipou agora. Vislumbro a plateia, e ela contempla de volta os dois gigantes caídos, ora derrotados, e a areia impregnada pela cor vermelha.
Será que ele está ali também? Ele me vê? Pode me ouvir?
— Quem é o covarde?! — eu grito, e todos se calam. O silêncio toma conta do ambiente. Passo a ouvir o som da batida do meu próprio coração. — Você é covarde!
Não importa o que eu faça aqui, não é? Basta que eu continue vivo e conte as mentiras que eu quiser quando voltar. Foi assim que você fez comigo, não foi? Eu nunca seria um caçador... Você também não é um caçador.
Eu já não sei mais o que sou. Não sei para onde ir. Por que ainda estou aqui?
Voltarei a Lumínia e contarei mentiras para a Srta. Cintia e Laura sobre um lugar mágico e brilhante, em que bestas caminham entre os homens e vivem com eles em perfeita harmonia.
Mentirei também sobre os amigos que eu fiz, sobre as aventuras que vivi e...
Sinto algo me apertar na altura do peito e um cheiro cabelos chamuscados, uma fragrância irritante que passei a gostar com o tempo. — Para! Para! Para! Por que você não me escuta?! — É a voz dela.
Quando me dou por conta, o rosto de Ifan já está irreconhecível à minha frente, inchado, todo cheio de sangue e hematomas.
Relaxo meu corpo, e a garota se joga no chão comigo. Ela me arranca de cima do guerreiro, cai sobre mim e segura minhas mãos contra o chão.
— Você não é assim, Gris! Não é igual àquele demônio! — ela esbraveja. — Se você não for mais você, como que eu poderei ser eu?!
Eu não entendo o que ela quer dizer...
— É por minha causa que você tá assim? Foi porque eu invoquei aquele wyvern, não foi? Eu prometo não... — Ela olha para os lados, como se buscasse a resposta caída em algum lugar da areia ensanguentada.
— Foi porque eu fiz você nos inscrever no campeonato? — A ruiva vira o rosto para tentar esconder, porém vejo uma lágrima escorrer em seu rosto.
— Não... — respondo.
Eu nunca a tinha visto assim. Mas ela deveria se preocupar mais consigo. Há dois dias, a ruiva quase morreu e não deve estar totalmente recuperada ainda.
— Eu tentei te ajudar, igual você me ajudou, mas... O Coiote disse para eu esperar... — Ela volta a me encarar. Um tênue brilho avermelhado reflete em seus olhos castanhos por um instante, e a ruiva esbraveja: — Mas eu não aguentei! Eles te prenderam! Eu queria te soltar...
— Do que você tá...?
— Volta a ser o Gris de novo...
Eu queria prestar mais atenção em suas palavras sem sentido, mas me perco na cor e nos movimentos dos seus cabelos cacheados, eles lembram fogo, é tão bonito. Parece que tudo está em chamas... Meus olhos deslizam até sua bochecha manchada de sangue. — Se machucou? — eu pergunto.
A ruiva franze a testa e limpa sua face com as costas da mão, depois olha para conferir. Só então percebo que fui eu que a manchei, tentando limpar suas lágrimas.
Ela soca meu rosto e esbraveja: — Seu idiota! Não tá me ouvindo?! — Alienor tem uma mão pesada.
Peço que deixem suas impressões (👍|😝|😍|😮|😢) e comentem o que acharam deste capítulo,
esse é o melhor presente que um escritor pode receber.
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