A Última Ordem Brasileira

Autor(a): Hanamikaze


Volume 2 – Arco 1

Capítulo 53: Formação do Bosque de Gelo

Toda minha família já estava morta. Eu não tinha mais ninguém. Nem pai, nem mãe ou irmãos. Nunca conheci nenhum dos meus outros familiares como tios ou avós, mas ao mesmo tempo eu acho difícil que eu seja o último do clã Hayami vivo. Mas mesmo não querendo acreditar, era um palpite provável. Tudo que me restou foi um gato preto que encontrei em uma viela em uma noite, e o seu nome era…

— Kuro.

— Kuro? Bem diferente, para um gato — disse Akane quando revelei o nome do gato. Ela estava sentada no topo do galho de uma árvore, comendo uma laranja que tinha acabado de pegar. Tirou mais duas laranjas e jogou para mim lá embaixo, que estava sentado ao pé do tronco com Kuro esperando do lado. Peguei as duas laranjas, descasquei uma e dei ao Kuro. A outra, comi enquanto conversava.

Akane parecia bem mais alegre do que o comum naquele dia. Não sei se era apenas para me animar, mas provavelmente era. O que acabava funcionando um pouco, sua felicidade acabava sendo contagiosa.

— Então… quem teve toda aquela ideia de que você é um ser escolhido pelos céus era tudo maluquice do seu pai?

— É — respondi, dando uma bela mordida na laranja.

Akane arrancou mais um pouco da casca da laranja dela no dente e cuspiu na grama lá embaixo. Tombou o corpo para trás, quase caindo do galho que estava, mas foi apenas para se pendurar nele com as pernas e me olhar de ponta cabeça.

— Escutei a briga de vocês do lado de fora enquanto caminhava no bosque… fiquei espiando pela janela. Você tava bem irritado inclusive, nunca vi você daquele jeito…

Eu fiquei quieto, com o olhar voltado para baixo. Kuro esfregava sua cauda na minha perna, buscando atenção. Minha mente se desviou por um tempinho quando ouvi Akane falar sobre o quão irritado eu estaria no momento.

— É…

— Você disse que ele amaldiçoou um dos filhos, por isso nasceram gêmeos. Mas a maldição funcionou em um deles… que seria você, não é?

— É.

— Vai falar só isso?!

Dei mais uma mordida na laranja, e então olhei para cima. Os cabelos de Akane caíam na minha direção enquanto ela olhava para mim de ponta cabeça no alto.

— É.

Meus cabelos ficavam lentamente pretos de novo com o tempo. Eles tinham tomado uma coloração branca quando minha Alquimia tomou a forma do gelo. Meus cabelos eram catalisadores, pois o gelo veio das lágrimas da minha mãe que escorreram sobre o cabelo. Por algum motivo, Akane não questionou a mudança dos cabelos. Na verdade, ela parecia bem tranquila sobre isso.

— Faz um bom tempo que não te vejo no colégio — ela soltou as pernas do galho e caiu na minha frente, ficando cara a cara comigo. Seu olhar parecia observar a minha alma. — Então, você vai me acompanhar agora! Não vou te deixar sozinho aqui depois de tudo isso.

— O quê? Escola?!

— É! Ou você acha que só porque é o escolhido, agora vai faltar o ano inteiro?!

Quando ouvi o nome escolhido mais uma vez, senti como se nada tivesse mudado. Meu semblante mudou para tristeza, e minha cabeça ficou baixa.

— Já disse pra não me chamar assim…

Ela me abraçou, praticamente se jogando em cima de mim. Eu fiquei surpreso, Akane estava muito mais amigável naquele dia.

— Vou te chamar do jeito que eu quiser.

Akane me convenceu a atravessar o bosque e voltar para Tóquio, que ficava bem longe. Kuro nos seguia o tempo inteiro, miando às vezes. O caminho andando parecia extremamente longo. Eu não era muito acostumado a ir para a cidade, e fazia um bom tempo que não voltava para o colégio.

— Temos que fazer isso mesmo…?

Ela deu um tapa nas minhas costas, bem forte.

— Não acha que já ficou de folga demais, Tsukasa?! Você vai e pronto.

— Tá, mas...

— Mas o quê? — perguntou, com um olhar tão mortal que eu não fui capaz de formar palavras para responder na hora. — Que bom.

Foram-se minutos andando até a cidade de Tóquio, e nós dois já estávamos entediados a este ponto. Kuro também havia sumido mais uma vez, mas eu sabia que logo ele apareceria de alguma forma. Akane pareceu ter alguma ideia, um sorriso confiante apareceu em seu rosto.

— Que foi?

Ela não precisou responder. Estávamos bem ao lado da linha de trem, onde vinha um trem-bala a toda velocidade. Passou por nós, os cabelos voaram pela pressão de toda a velocidade do trem. Akane agarrou meu braço e correu ao lado do trem tentando alcançá-lo.

— Se segura, isso vai ser intenso!

— Akane! Não!

Ela se agarrou no trem e nós fomos puxados a toda velocidade. A cidade passava aos nossos olhos em uma velocidade tão grande que pareciam borrões. Aquela garota, era realmente mais maluca do que eu pensava. Continuou escalando no trem e eu agarrei o topo, assim, nós dois conseguimos subir.

Ela gritava com os braços abertos sentindo o vento passar pelo corpo. Já eu, estava impressionado demais para sequer conseguir ter alguma reação. E assim o trem seguiu por alguns segundos, era tão rápido que atravessou Tóquio em instantes. Akane percebeu que já estava perto o suficiente então me segurou pela camisa e saltou. Ela definitivamente estava com alguns neurônios do cérebro em falta. O trem passou como uma bala atrás de nós enquanto lentamente nos aproximávamos do chão, mas nunca o tocamos. Impressionantemente Akane conjurou majestosas asas de fogo em suas costas e voou pelos céus. Seu semblante tampava o sol como uma ave de fogo enorme, que carregava um pequeno garoto nas garras. Nós sobrevoamos os céus até pousarmos no topo de um shopping. Ela me largou em cima dele e então caiu nos meus braços, nós dois rolamos pelo terraço.

Eu estava sem palavras, aquilo tudo foi repentino demais. Akane ria no meu colo como uma galinha. Mas pelo menos, ela parecia bem feliz. Aquela risada, aquela felicidade, por um momento me fizeram esquecer de todos os problemas que eu tive até agora. Eu pude sorrir junto com ela, foi um momento aconchegante.

— Tsukasa! — Ela pulou do meu colo e segurou minha mão mais uma vez. — Toda essa correria me deixou com sede. Sobraram alguns ienes aqui, podemos comprar um milkshake.

— Milkshake…?

— É! Vai me dizer que nunca experimentou.

Cruzei os braços e comecei a pensar. Não me lembrava de nada com um nome parecido.

— Acho… que não.

Akane me olhou frio. Senti ela julgar o meu ser por nunca ter experimentado uma coisa que aparentemente era bem comum.

— Então, você vai provar agora!

Ela me arrastou para dentro do shopping, e nós entramos pelo terraço. Minutos depois saímos no primeiro andar, com dois milkshakes na mão. Eu experimentei, e foi uma sensação completamente nova. Era gelado, doce, refrescante… me deixava relaxado, por alguma razão.

— Isso aqui… quem foi que inventou isso aqui?!

— E eu vou saber? — Ela riu, dando um tapinha no meu ombro.

Já no colégio, Akane se separou de mim e foi para sua sala. Eu andei pelos corredores, sozinho, e os remorsos por tudo que aconteceu voltaram para me consumir mais uma vez. Pensamentos ruins, sentimentos ruins, uma atmosfera ruim. Parei para olhar a janela, e vi pessoas se divertindo na quadra. Uma coisa me deixou boquiaberto quando analisei com cuidado. Uma pessoa exatamente igual a mim estava parada lá, nas arquibancadas, com um semblante triste. Definitivamente, aquele era o Arashi. Mas como ele estava vivo depois daquele buraco aberto em seu corpo?

— Ei.

Alguém disse algo atrás de mim, no corredor. Virei-me para ver, era um jovem com cabelos alaranjados e olhos roxos. Me pareceu familiar… e então lembrei daquele jovem que invadiu a mansão Hayami, manipulador das almas. O sangue fervente subiu, mas logo me dei conta de que não poderia ser ele. Este na minha frente, era muito mais jovem.

— O que você quer?

— Akane me pediu para ver se você estava perdendo tempo nos corredores. Seu nome, é Tsukasa Hayami, né?

Olhei bem para aquele jovem, usava o mesmo cordão com pingente de coração partido que Akane usava no pescoço. Aparentemente, os dois cordões se conectariam se estivessem juntos.

— É. Hayami… — Ouvir o meu próprio sobrenome me dava desgosto. — E você é Hiroyuki, eu suponho.

Ele olhou para mim de volta com um olhar desconfiado. Estava com as mãos nos bolsos, uma expressão de indiferença. Até suas atitudes eram semelhantes às do manipulador das almas misterioso.

— Você deve saber por causa da Akane. Então sim, sou San Hiroyuki. — Ele parecia um tanto entediado, como se apenas estar naquele lugar fosse um saco. O jeito de falar também era um pouco parecido com o daquele outro jovem. — Já que cê tá aqui, viu a Kyoko por aí?

Ignorei completamente a pergunta dele, ainda tinha uma outra coisa que eu queria saber.

— Você tem algum outro irmão além da Akane?

Me lembrei de uma coisa que o manipulador das almas me disse antes de tentar me atacar naquele dia.

“Eram seus irmãos, não eram? Também tenho dois irmãos, um menino e uma menina, assim como você. São a coisa mais importante para mim, meus irmãos. Estou aqui por eles.”

— Por que quer saber isso? — San parecia um tanto desconfiado. Se virou para mim, me encarando de frente.

— Me responda. — Meu olhar ficou um pouco mais sério.

— Isso não é da sua conta.

Com aquela resposta, já pude saber que ele era irmão daquele outro jovem. Se realmente não tivesse, apenas falaria que não tem outro irmão além da Akane. Me virei e saí pelos corredores, meus olhos azuis brilhavam nas sombras enquanto San me via ir embora. Ele deu de ombros e seguiu pela direção contrária. — Que cara esquisito…

Na sala de aula, os outros me olhavam de um jeito estranho. Meu semblante frio atraía os olhares curiosos, mas eu não dava a mínima.

Quando finalmente acabou, sai junto com os outros enquanto tomava cuidado para Arashi não me ver. Talvez, ele pensasse que fui eu quem matou nossa mãe e nosso pai. O que de certa forma, foi culpa minha mesmo. Akane me encontrou na saída já colocando o braço em volta do meu pescoço.

— Aqui! Salvei mais um pra você. — Ela me deu outro milkshake. Peguei, ficando mais animado e tranquilo com aquela bebida exótica. — Você perdeu sua casa né… para onde vai agora?

— Eu me viro por aí.

— Meow.

Kuro apareceu do nada mais uma vez, e Akane se assustou com o miado. Eu o acariciei com a perna, já estava acostumado com esses sumiços e aparições repentinas.

Um dos telões no topo de um prédio exibiu uma notícia um tanto perturbadora de se assistir. Um caçador da Infinity Astra batalhando contra um adolescente em plena noite, no centro da cidade. Era identificado como Ren Suzuki, portador dos “olhos de Junshin”, uma lenda do antigo espírito da gravidade, mas nunca foi confirmada verdadeira.

— Ele caçou o Ren também?! — Deixei o milkshake cair no chão. — Por que?!

— O que o Kazuma estava fazendo ali?! — Akane parecia tão impressionada quanto eu. — E como assim também?

Levou um tempo para que eu explicasse tudo que aconteceu na mansão Hayami. Quando Akane entendeu, sentiu uma grande revolta pela Infinity Astra. Mas acreditava que a culpa não era de Kazuma.

— Você é irmão dele, não é? — Olhei para ela, uma espreita sombria.

— A culpa não é dele! Aquela tal de Infinity Astra é uma máfia gigante. Eu falei para ele não entrar lá… mas ele sempre foi viciado nessas coisas de espaço. E o resultado… foi esse…

— Sei… — sai de perto dela, me sentindo desconfortável naquele instante. Ela pareceu entender, mas ficou um tanto desapontada ao mesmo tempo. Nós seguimos caminhos diferentes desde então.

Andando por alguns minutos na cidade, encontrei aquele garoto de novo. San Hiroyuki, comprando alguma coisa em uma locadora. Naquele instante eu refleti… Kazuma estava disposto a tirar tudo de mim, e conseguiu. Eu já não tinha mais nada. Mas por que as coisas tinham que ficar assim? Por que deixar as coisas sempre darem certo para eles? Se eu pudesse fazê-lo sentir o mesmo que eu senti…

“Também tenho dois irmãos, um menino e uma menina, assim como você. São a coisa mais importante para mim…”

Se eu pudesse… tirar um dos seus irmãos. Estava tão perto, tão vulnerável. Lentamente eu me aproximei… ele não percebeu, estava de costas indo embora. O pequeno Hiroyuki nem desconfiava da espreita que o seguia. Um alvo fácil, uma presa com guarda baixa. A pequena adaga de gelo se formou na minha mão, um fio dos meus cabelos ficou branco por causa do uso da magia fria.

Estava prestes a atacar… ninguém iria saber, ninguém iria sequer me ver nas câmeras. Um assassinato perfeito, e San Hiroyuki estaria morto. Foi quando parti para agir… corri, como um vulto nas sombras, mas fui pego mesmo assim. Senti a lâmina negra passando bem na minha nuca, quase acertando. Em seguida veio o peso do corpo daquele que me empurrava para um beco com um ataque direto.

Cai no chão, sendo arrastado para dentro do beco, aquela lâmina negra fincada bem ao lado da minha cabeça no chão. Em cima de mim, estava aquele jovem mais uma vez.

— Nos encontramos de novo, hein?! — exclamou Kazuma, a expressão de um psicopata.

Com os pés o chutei para cima e ele recuou. Parecia furioso ao ver a tentativa de assassinado de seu irmão.

— Que foi?! Ficou irritado? É legal quando atacam alguém que você ama por trás, não é?! — me levantei, correndo na direção dele com tudo. A velocidade era alta demais e ele não teve tempo de defender.

Com o ombro o empurrei pela rua tão rápido que San não teve tempo de ver o que estava acontecendo atrás dele. Kazuma foi arrastado para o outro beco, até colidir contra uma parede que logo foi destruída enquanto eu o empurrava. Na segunda parede, nós paramos e ele me jogou para trás.

De repente, uma coluna de almas destruiu o solo e me puxou como um chafariz, atravessando cada andar daquele prédio e saindo no topo. As almas daquele “chafariz” se espalharam por todo o céu de Tóquio. Kazuma usou suas almas para subir até o topo também, e uma bela águia de gelo o acertou na barriga, levando-o pelos ares. Os ataques não cessaram; estruturas de gelo emergiram das paredes dos prédios e acompanharam a águia de gelo que o levava pelos céus. Uma das estruturas acabou o alcançando, e quando acertou, ele foi repelido para o topo de um dos prédios. A fumaça subiu com o impacto do ataque.

Eu usei meu próprio caminho de gelo no céu para avançar até ele. Eu já não tinha mais nada a perder, tudo o que me restava, era vingar meus irmãos e o único amigo que eu tinha. Mas não pude chegar até ele. Sua manipulação das almas não tinham apenas formatos pequenos, ele podia juntá-las para criar o que quisesse. Um trem fantasma azul, translúcido, me atropelou no céu e destruiu as estruturas de gelo no caminho. O trem me arrastou com ele por alguns segundos, mas logo foi destruído por uma explosão de gelo que ocorreu no ar. Foi um grande soco, carregado de magia que o destruiu.

Abri meus braços enquanto caía para direcionar a queda, caindo exatamente no prédio em que Kazuma estava. Ele não esperava que eu chegasse tão rápido, e nós dois erguemos nossas lâminas. Avancei, meus ataques eram velozes demais, ele não podia acompanhar mas podia tentar fugir. De prédio em prédio, saltamos enquanto continuávamos em um combate de lâminas, onde um atacava e o outro tentava repelir com sua arma.

No próximo salto ele conseguiu se distanciar um pouco, mas foi suficiente para preparar um ataque mais potente. Arrastei minha espada de gelo no chão enquanto corria até ele, e subi verticalmente para atacá-lo. Ele tentou repelir colocando sua lâmina negra na frente, mas o movimento vertical foi suficiente para ativar a magia e moldar uma estrutura de gelo, no formato do corte, embaixo de Kazuma. Por causa do ataque ele teve que saltar do prédio, mas enquanto caía usou suas almas para criar uma base. Uma ave azul que voou entre os prédios e becos até retornar na altura dos céus.

Ele pensou que estava seguro, até olhar para trás e me ver montado em uma estrutura diferente. Uma lua minguante de gelo que o seguia, carregando aquele jovem que ele deveria estar caçando, e não fugindo dele.

— Que merda! — Kazuma deu um soco em sua própria ave, indignado. — Kenny não brincou quando disse que ele era bom.

Kazuma inclinou sua ave para baixo e deu uma volta para trás, ficando bem embaixo de mim. Subiu com tudo na intenção de destruir a lua de gelo de baixo para cima, mas errou por alguns metros. Acertar um corpo em movimento com uma arrancada em vertical era um tanto complicado.

Agora, ele me perseguia atrás, o que me deixava vulnerável a acertar ataques se quisesse tentar.

Alguns pequenos flocos de neve caíram da lua enquanto sobrevoávamos Tóquio. Quando o caminho de flocos de neve caíram ao chão, uma sequência de espinhos de gelo gigantescos se ergueram em linha reta, na direção da ave e de Kazuma. Os prédios se abriram no meio para que os espinhos se levantassem nessa altura absurda. Era uma grande muralha de gelo formada no meio de Tóquio.

Kazuma quase foi acertado pelos espinhos, mas eles não cresceram o suficiente para acertá-lo no céu. Ele sorriu e abriu um corte no próprio braço com a lâmina. O sangue escorreu, e marcações negras adornaram sua pele.

Ele começou a movimentar as mãos no ar enquanto voávamos. Não entendi o gesto de primeira, mas as coisas ficaram difíceis quando vi as imensas mãos moldadas por almas me seguindo de baixo. As mãos cruzaram o ar de baixo para cima, fizeram curvas e piruetas para tentarem alcançar a lua de gelo em movimento. Mesmo nunca tendo feito isso antes, por algum motivo, o voo com a lua era muito simples de controlar.

Uma das mãos gigantes controladas por Kazuma se estendeu até o chão mais uma vez e segurou um prédio inteiro, desconectou-o do chão, e jogou no ar. Ele veio como um grande bastão na direção da lua.

— Não vai ter mais pra onde você fugir! — gritou Kazuma, rindo.

Sem muitas opções, eu saltei da lua. Ela se conectou com o prédio que foi atirado, congelando lentamente o terraço, as paredes, as janelas, e então a parte de baixo. O prédio ficou mais pesado e perdeu velocidade, acabou caindo no bosque do outro lado da cidade. Nós atravessamos toda Tóquio apenas voando sobre ela.

Meu corpo ainda estava no ar caindo cada vez mais rápido em direção ao bosque. Por sorte, caí bem em cima de um lago. Kazuma rangeu os dentes e jogou sua espada para o alto, ela rodopiou no ar e então ele a chutou. A espada veio à toda velocidade em direção ao bosque, como se fosse uma flecha brilhante. Ao atingir o chão, o solo foi consumido por Alquimia brilhante em uma área enorme. As árvores foram engolidas para dentro dessa magia no chão, formando um círculo dourado no meio de uma floresta imensa. Kazuma pousou delicadamente sua ave na área do grande círculo e as almas que a compunham se dissiparam.

— Acho que você nunca viu esse tipo de magia aqui. — disse ele, enquanto eu saia do lago. O círculo dourado consumiu uma boa parte do bosque, e isso era um tanto, impressionante. — É uma expansão de magia. Que nem a lua que você usa.

— Disso eu já sei. — Eu estava ofegante após toda a perseguição aérea.

— Mas acho que essa combinação, você nunca viu — ele retirou sua espada do chão, que estava cravada no meio do círculo. Ela emanava uma energia dourada, mas de repente, a energia ficou azul. — É uma fortificação de feitiço. Fortificação, junto de expansão. Uma combinação bem legal.

— Fortificação…?

— Fizemos um estrago na cidade agora, você é realmente um gênio. Com certeza deve ser capaz de usar uma.

Ele perdeu tempo demais falando, e não percebeu os espinhos de gelo que se erguiam por todo o círculo dourado. Quando ele percebeu, já era tarde. As expansões estavam misturadas.

— Você é meio estranho, tentando conversar no meio de uma luta assim. — Eu estava com raiva, mas o jeito tranquilo que Kazuma dizia aquelas coisas me fez acalmar.

— Só pode ser brincadeira. Ergueu aqueles espinhos gigantes no meio de Tóquio, e ainda tá fazendo mais dentro de um feitiço meu? Que canalha.

Eu já estava ofegante demais, e quando fui perceber, todos os fios de cabelo já estavam brancos e brilhantes. Achei isso estranho, mas resolvi ignorar. Quando tentei usar mais um pouco de magia, nada acontecia.

— Merda…

— Acabou seu estoque — disse, vindo com a espada emanando energia azul. Eu me afastei, mas já estava dentro do círculo gigante. Mas aparentemente ele me subestimou, desativou o feitiço e o círculo dourado desapareceu, restando apenas as estruturas de gelo no meio do bosque, como se fosse uma floresta de gelo. — Você mudou um pouco a paisagem. Talvez, esse bosque fique assim para sempre. Sua magia parece ser bem forte para derreter no sol.

Arranquei uma lasca de gelo das estruturas para usar como arma, o confronto ainda não havia terminado. Ele avançou, e eu recuei. Nós deslizamos pelo “bosque de gelo” enquanto colidíamos as lâminas. Não demorou muito para que voltássemos para a floresta normal, e o embate de lâminas se seguiu pelas árvores. O fim da floresta acabava em um grande penhasco com uma cascata. Eu já estava cansado, sem magia, sem mais nada restante. A pequena lasca de gelo que eu empunhava se partiu em um dos cortes, e ele usou a oportunidade para cravar sua espada negra bem na minha barriga.

— Arh! — O sangue saiu pela boca, escorrendo até cair na lâmina. A energia azul ajudava a perfurar com facilidade.

— Você é forte, até demais. Poderia ser mais interessante se seu estoque de Alquimia não fosse tão pequeno. — Ele retirou a lâmina, e meu corpo caiu ao chão, bem na beira do penhasco. Kazuma me observou com um certo remorso. — Talvez, se tivéssemos nos encontrado de outra forma, as coisas não acabariam dessa forma. No fim, ainda sinto que você não mereceu tudo isso.

Eu o observei, minha visão embaçando. Ele empurrou meu corpo com o pé e eu caí ladeira abaixo. Afundei nas águas da cascata, lá tinham pedras afiadas que perfuraram meu corpo em vários pontos ao mesmo tempo. Era impossível que eu pudesse sobreviver.

Sentindo-se culpado, Kazuma voltou para o bosque. De repente sentiu uma enorme dor no corpo. Levou as mãos à barriga e sentiu sangue, mas já era tarde. Quando olhou, havia inúmeros cortes diferentes por todo o seu corpo. Ele não percebeu nenhum deles durante a batalha pois estava sentindo muita adrenalina.

— Impossível… ele me acertou centenas de vezes e eu só acertei uma?!

Ele caiu de joelhos, soltou a lâmina na grama, e então seu corpo caiu. Sentia dor demais para tentar se levantar.

Vindo da floresta de gelo, Kenny Williams o encontrou caído na grama. Kazuma tentou observá-lo, mas sua visão também estava fraca.

— Pelo menos, você concluiu a sua missão. Mas como preço, se tornou inútil…

— Inútil…? Foram só alguns cortes!

— Então por que está caído? Se foram só alguns cortes, mas mesmo assim não consegue se manter de pé. Ele congelou os seus músculos por dentro…

Kazuma já sabia que o que vinha a seguir não era coisa boa. Provavelmente, Kenny iria aproveitar se seu estado debilitado.

"Desculpa, San... Acabei pisando na bola. Talvez... eu não vá aparecer no seu próximo aniversário..."

O pequeno gato preto observava da beira do penhasco. Embaixo da água no fim da queda, estava eu, com o corpo perfurado nas pedras. O pequeno gatinho suspirou, seu corpo cresceu e se expandiu. Estava tomando uma nova forma, um corpo completamente negro, com cabelos brancos, uma expressão demoníaca e pele dura. Tinha grandes garras acinzentadas e olhos amarelos.

— Você morreu, tão rápido… — disse o “gato”. — É uma pena, Tsukasa.

Ele parecia um tanto, triste. Sua forma era idêntica a de um demônio, mas não um demônio qualquer. Características parecidas com a de Aka, o ghoul vermelho. Aquele gato na verdade era um dos três ghoul-gêmeos, Kuro.

Seu corpo começou a evaporar e tomar um estado gasoso. Ele se transformou em uma nuvem negra que desceu pela cascata até as águas. A nuvem negra afundou, e entrou nas minhas feridas e na minha boca. Kuro, mesmo sendo um demônio, estava tentando me salvar por algum motivo.

Passou-se algum tempo, eu não sabia exatamente quanto tempo, mas acordei em uma cama. Várias faixas curativas por todo o meu corpo. Havia também um homem na minha frente, ele ainda não tinha percebido que eu acordei. Levantei um pouco a cabeça e olhei o quarto em volta. Era bem comum, como um quarto de criança. À minha frente havia um espelho, e quando eu o observei, meus olhos já não estavam azulados. Na verdade, estavam vermelhos.

— Ora, demorou hein. Pensei que você iria morrer enquanto dormia — disse o homem, que estava tomando café em um copo de starbucks.

— O quê? Onde é que eu estou?

— Cê tá na minha casa. Te encontrei na minha porta hoje de manhã… você estava caído, desacordado.

— Desacordado… — Olhei para as minhas mãos, e senti algo estranho. Uma nova energia, algo negro passando pelas minhas veias. Definitivamente não era humano. — E quem é você, afinal?

— Sou Harold Hawk, mas me chame só de Hawk... Harold é nome de velho.

— Hawk?! — exclamou Charlotte, cortando a história na metade.

— É — respondeu Tsukasa.

— Hawk não era o seu codinome?

— Quanto a isso… nós continuamos as histórinhas de dormir depois. Acho que vamos ficar um pouco ocupados agora…

Alguns passos vinham lentamente pelo corredor do calabouço, passando e verificando as celas do Bastião do Titã. Charlotte engoliu seco, e Tsukasa se preparou para começar seus planos em Cyberion.

Notas:

Aviso: Todas as ilustrações utilizadas na novel foram geradas por IA. Perdoe-nos se algo lhe causar desconforto visual.

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