Volume 2 – Arco 1
Capítulo 46: Maldições
O céu estava tingido por um vermelho carmesim, refletindo o brilho das pontes de fogo que saíam da Bela-Casa e levavam até as três grandes arenas flutuantes. Naquele instante, o Domo da Glória continuava em andamento. No lado leste da arena, Merlin estava diante de uma das criaturas mais aterrorizantes que já havia visto na vida. O Lorde Noxlurath, a propagação do espírito do veneno, assim como a face de Órion era a propagação de uma nebulosa.
Myaku era quem havia o invocado na arena, usando o poder combinado dos seis membros da Nakamori juntos. Diziam que quando os seis criminosos mais destemidos da galáxia combinavam seus poderes, se tornavam seres comparáveis a deuses.
A arena coberta de espinhos de ferro estirados, gigantes. Ao chão, uma neblina venenosa que dava origem ao lagarto Noxlurath.
— Essa garota… quem é essa garota?! — Merlin estava à beira do desespero, não via saída da situação atual. Não tinha a menor condição para enfrentar um monstro daquele nível.
— Merlin! — berrou uma voz feminina fora da neblina, a mulher que estava lançando adagas para atrapalhar Myaku na batalha. — Você precisa sair daí, agora!
Mas Merlin não podia escutar. A respiração daquela criatura liberava calamidade pelo ar, o veneno cada vez mais próximo, cada vez mais nocivo. Myaku gargalhava do outro lado dos espinhos, uma risada exagerada e maliciosa. A raiva de Noxlurath e a satisfação de Myaku se alimentavam do desespero de Merlin, que observava inerte a garota que até então parecia pouco habilidosa, rindo do quão pequeno Merlin era comparado a ela.
— O que… aconteceu com a Myaku? — perguntou San, assistindo impressionado com a mudança repentina nas atitudes da amiga. — Ela parece arrogante… maligna.
Myaku ajustou melhor o chapéu na cabeça com uma mão, criando uma sombra em sua face risonha. Mas os olhos vermelhos como rubi ainda encaravam o fundo da alma de Merlin, assim como os de Noxlurath também encaravam.
— Eu posso matar você… eu posso esmagar você…
Ghost e Marine observavam das arquibancadas também. Ghost parecia estar adorando a situação, e Marine tinha uma certa preocupação no rosto.
— Aquele carinha despertou a ânsia de carnificina da Ruby… isso é raro. Ela é a mais difícil entre nós, exceto Phoenix, para se estressar tanto ao ponto de liberar a linha de sangue — comentou Marine, com os braços cruzados.
— Eeh, tanto faz. Ele subestimou ela. Heh… vamos ver como ele vai sair dessa agora.
Merlin deu um passo para trás em cima do espinho, à beira de cair no mar venenoso abaixo. Myaku brandiu sua foice com a mão direita, e a balançou em um corte no ar. Noxlurath recebeu o comando, e apenas com um movimento da foice de Myaku o lagarto balançou sua cauda para frente, chicoteando todos os espinhos adiante e destruindo-os com aquele simples movimento. O vento foi impulsionado com o ataque do lagarto, e os fragmentos de ferro deixados pelos espinhos destruídos voaram de volta para Merlin. Ele bloqueou o rosto com os braços por causa do forte vento que veio em sua direção.
— Ugh! — ele resmungou. — Ela consegue controlar ele?!
Restou apenas o grande espinho em que Merlin estava, todos os outros foram destruídos com a chicotada venenosa de Noxlurath. Myaku acabou caindo na neblina venenosa, mas ela não faria efeito de qualquer forma. O lagarto também entrou para dentro da neblina, com seu corpo gasoso mesclando entre o veneno. Tudo que Merlin podia ver de cima, eram os olhos vermelhos do lagarto nadando pela neblina à sua espreita.
“Vai me matar com esse veneno?” pensou, já prevendo que logo seria jogado para a neblina também. “Preciso agir rápido…”
O corpo de Merlin lentamente foi se transformando em ferro. Começando pelos braços, então pernas, tronco e cabeça. Com um corpo inteiramente de ferro, o veneno não faria efeito mesmo se o ferisse.
Agora, com aquela armadura, ele saltou na neblina. Noxlurath derrubou o espinho restante logo em seguida, e Merlin mergulhou naquele mar que facilmente poderia trazer a sua morte. Chegando ao fundo, pousou ao chão e se preparou imediatamente. O solo ainda estava coberto por ferro, então ele pôs as mãos no chão e levantou um grande muralha de ferro para separar ele próprio do lagarto e de Myaku.
— O que foi?! — Myaku gargalhou mais uma vez, se perdendo na própria sede de desespero alheio. — Você tá com medo de mim?!
Merlin não deu ouvidos, estava mais preocupado com a própria sobrevivência. Era inviável continuar o combate, teria que fugir como um rato assustado. De qualquer forma, era melhor do que enfrentar a morte que lhe buscava na forma de lagarto. Merlin ergueu as mãos para o alto, soltando fibras de ferro pelo ar. As fibras estavam lotadas de Alquimia, o que lhe dava abertura para utilizar feitiços com o ferro. Canalizou toda a Alquimia nas fibras de ferro no ar na palma de suas mãos, formando uma esfera atômica que rodava, emanando energia.
— Magna Expansio! — recitou, com desespero na voz.
A esfera atômica nas mãos de Merlin explodiu em tamanho, ofuscando toda a neblina com uma luz dourada. A cortina de luz cegou Myaku e dissipou a neblina venenosa em um instante, por seis segundos ela não pôde ver mais nada. Mas ao mesmo tempo não estava preocupada; estava ciente de que Merlin usou aquilo apenas para fugir como um covarde.
— Vai fugir… todos fogem… nada pode nos destruir — disse Myaku, alucinando com o próprio poder combinado com os outros cinco.
Quando a cortina de luz desapareceu, a neblina havia sumido também, junto de Merlin. A garota das adagas também sumiu de vista, deixando Myaku sozinha naquele local onde vários haviam morrido por respirar a neblina venenosa. O lagarto Noxlurath se desfez em uma nuvem enorme de veneno, que entrou na testa de Myaku no local onde estava o pentagrama branco. Todo o veneno foi absorvido, e o pentagrama lentamente se desfez.
Ao sul da arena, Ishida havia despertado o segundo estágio de seu estado Xamã, confiando que Vorthis não teria coragem de tomar seu corpo quando o Saikai Primordial da Luz, Eterno, estava observando da plateia. O casaco de Ishida começou a se elevar para trás, e asas negras, semelhantes às asas de um dragão surgiram em suas costas. Seu corpo emanava uma aura verde amaldiçoada, e agora, estava apto para usar maldições.
Adiante, um grupo de inimigos lutava com fervor. A maioria já havia desistido pois o tempo estava próximo do fim, e logo a rodada se encerraria. Ishida mirou seus olhos neles com uma certa arrogância. Assim como Myaku, aquele poder subia um pouco a cabeça, principalmente se tratando de magia amaldiçoada.
Ishida ergueu a varinha no ar, moveu-a predefinidamente para canalizar poder. A ponta da varinha se iluminou em um brilho verde fluorescente, e quatro rajadas saíram da ponta, seguindo até os homens que estavam lutando adiante. Eles pararam o confronto de lâminas para olhar para o alto, e presenciar o ataque que vinha de Ishida. Todos viram a morte com os próprios olhos antes das rajadas atravessarem seus corpos e explodirem quando entraram em contato com o chão.
Eles morreram, e entre a fumaça da explosão, o alien do começo da rodada apareceu. Um alien verde, com uma túnica preta com retalhos brancos e uma cabeça semelhante a uma máscara de gás. Ishida fixou os olhos no alienígena, que logo avançou até ele. A cada passo, uma explosão ocorria no solo. Logo, já estava frente a frente com Ishida. Pôs as mãos no chão, e seus cotovelos se contraíram como alavancas. De repente, o solo explodiu abaixo de Ishida.
Demorou alguns segundos até que a fumaça se dissipasse o suficiente para o alien poder ver o que aconteceu ao Ishida. No fim, ele estava coberto pela suas asas de dragão, que o protegeram do impacto. Estava observando o alien pelo vão entre suas asas. Os dois se encararam por um momento, apenas um breve momento suficiente para poderem ler seus pensamentos.
Ishida abriu as asas negras, e voou acima. O alien soltou pequenas criaturas voadoras para o perseguir nos ares. De um lado para o outro, Ishida foi se esquivando das pequenas criaturas que continham dentes afiados e asas de libélula. Quando se aproximavam de Ishida, elas explodiam no ar. Mas nenhuma foi ágil o suficiente para alcançá-lo.
Por um momento, ele pensou que estaria tudo bem. Mas de repente um enxame das mesmas criaturas se ergueram à frente dele, todas se prendendo às suas vestes.
“O quê?!” ele pensou. “As de trás foram apenas distração…”
Ishida se apressou para mergulhar ao chão. Aumentou a velocidade do voo, deixou que as asas se esticassem atrás para aumentar ainda mais a velocidade. Sua face chegou tão próxima do chão que ele pôde sentir o calor vindo das pedras, mas então mudou de direção no último instante, deixando a maioria das criaturas no solo, que explodiram em seguida.
Mas quando pousou ao chão, percebeu que ainda faltava apenas uma presa à sua camisa. Não dava mais tempo de reagir; ela explodiu, queimando a pele de Ishida. Ele berrou, e então alisou a ferida com uma mão. Olhou para a própria mão ensanguentada, e os olhos se desviaram para o alien explosivo adiante, que continuava a se aproximar.
— Pequenos lacaios que explodem no tempo que ele quer… mas aparentemente, quanto mais longe estão dele, mais tempo demora para ele fazer com que explodam. Teria me feito em pedacinhos se pudesse fazê-las explodir na hora…
O alien verde ainda se aproximava, e sem tempo para pensar mais, Ishida brandiu a varinha novamente e a balançou no ar, criando pequenas mariposas amaldiçoadas. Elas voaram contra as criaturas asquerosas do alien, e quando chegaram perto das mariposas, as criaturas derreteram no ar.
“Sensíveis a magia…”
O alien segurou sua túnica e saltou para o lado, deixando as mariposas passarem direto por ele. Ishida se precipitou para mover a varinha no ar novamente, mas o inimigo conseguiu prever. Abriu sua mandíbula pela primeira vez, parecia que tinha rasgado a própria face para abrir a boca. Uma língua extremamente extensa traçou o caminho todo até a perna de Ishida, se entrelaçou a ela e o arrastou para perto do alien. Ishida girou no ar sendo arrastado pela língua, até que chegou ao alien. Ele agressivamente deu um tapa no rosto de Ishida, implantando um de seus lacaios no mesmo.
Sentindo aquela pequena criatura morder sua pele com raiva e fome, já tendo certeza de que logo ela explodiria também, Ishida levantou voo mais uma vez. Foi tão rápido que lançou o alien para os ares com o impulso. A estratégia era se afastar o máximo possível para que demorasse para explodir, então Ishida foi subindo o máximo que pôde com as asas. Até que chegou a uma barreira bem no alto da arena, que o impedia de ir mais além.
— Argh! Limitaram a distância?!
— É proibido deixar a arena com uma rodada em andamento! — avisou Valaric com o microfone.
Mas Ishida não se importou com as limitações. Arrastou a cara na barreira, deixando a criatura grudada nela, e então se deixou cair para o chão. A explosão brilhou no céu enquanto ele presenciava por baixo, caindo até o solo novamente.
O alien então mirou a ele mais desses monstros explosivos, e explodiram quando colidiram com as asas. O que felizmente, não causou dano algum. Asas amaldiçoadas repeliam aquele tipo de explosão.
Saindo da fumaça dos ataques, Ishida empunhava uma nova arma. Sua varinha estava mergulhada em magia amaldiçoada, que formava uma espada de duas lâminas: De um lado, a energia era branca como o crepúsculo do amanhecer. Do outro, era negra, como a escuridão da meia-noite. Ishida mergulhou com sua nova arma até o alien, e os dois entraram em um confronto direto.
A cada golpe que Ishida tentava acertar, o alien desviava; pulava por cima da lâmina, esquivava para os lados, agachava-se, ou então se distanciava para trás. Mas quando a lâmina finalmente passou por ele, ela não causou efeito algum. Apenas o atravessou como se fosse um jato d’água.
“Não fez efeito?!”
O alien então agarrou a oportunidade e segurou Ishida pela asa. Deu dois golpes na barriga, mas Ishida revidou com a segunda asa, segurando o alien com a extensão da asa negra e o enterrando no chão. Para finalizar, ergueu a varinha novamente, sem os efeitos da lâmina de dois lados, e lançou um raio verde no alien. Mas novamente, não fez efeito algum.
— Como isso é… — começou, mas antes de terminar a frase, o alien se ergueu e tentou golpear o rosto de Ishida, mas ele bloqueou com a asa. Mesmo assim houve uma explosão, e os dois foram repelidos para os lados opostos.
Ishida conseguiu se equilibrar do impulso da explosão, mas quando se estabeleceu no chão, sentiu algo subir pela garganta. Era sangue, ele estava vomitando sangue. A elevação do estado Xamã estava começando a lhe custar caro, ainda mais pelos ataques explosivos que estava recebendo.
O alien não perdeu tempo; avançou até Ishida com confiança, mas foi surpreendido. Ele não estava totalmente sem energia, então preparou seu ataque final. Agarrou a face desprotegida do alien, e começou a voar o mais alto que pôde com seu rosto em mãos. Chegando na barreira da arena, Ishida arrastou o alien pela barreira transparente por vários metros, e quando parou, girou o corpo para baixo e lançou o monstro para o chão novamente.
Ele caiu com tudo e nem teve tempo para se levantar. Ishida respirou bem fundo, usou magia amaldiçoada nos pulmões, e baforou um cuspe flamejante até o chão. O fogo era verde, assim como sua energia. O solo a volta do alien foi se queimando gradualmente, e Ishida continuou a cuspir fogo até ficar sem fôlego.
Quando terminou o ataque, planou até o solo de novo. Ofegante, sem forças, curioso para ver se os esforços haviam sido úteis. Mas no fim, não mudou nada. O alien continuava intacto, sem feridas aparentes.
Do céu, pequenos meteoritos começaram a cair em direção ao Ishida. Ele só teve tempo para olhar, e então todos explodiram no ar, criando uma cortina de fumaça ao redor do jovem bruxo. Ele já não podia enxergar mais nada ali dentro, e a fumaça estava consumindo seus pulmões.
— Ele… ele me cegou… — Ishida caiu de joelhos, debilitado pelo uso excessivo da marca do Xamã.
“Acabou… acabou pra mim…”
Ele parou para ouvir o vento soprar, levando parte da fumaça mas não completamente. A tontura tomava seu corpo, ele se sentia fraco, impotente. Porém, não esperava ouvir aquela voz ressoar em sua mente mais uma vez.
“Se já acabou para ti, então durma. Já sabemos onde isso levará.”
“Vorthis…? Só quer aparecer pois ele não pode te ver na fumaça, não é?”
Uma risada irônica ecoou nas paredes da cabeça de Ishida.
“Talvez. Então, durma, garoto…”
“Não será tão simples assim. Se você dominar… vai matar todos aqui e lá fora também…”
“Já que é assim… então olhe para trás.”
O coração de Ishida praticamente parou. Ele sequer tinha percebido, mas agora já não tinha volta. O alien estava logo atrás, preparado para lhe apunhalar com um último ataque explosivo. E assim foi feito; golpeou com tanta pressão, que a explosão empurrou toda a fumaça para longe.
A vitória já era certa naquele instante, restavam apenas quinze segundos para a rodada terminar. O alien sentiu os dedos formigarem com a sensação gloriosa. Porém, quando percebeu, à sua frente não havia mais nada. Ishida desapareceu completamente.
— Procurando por alguém? — disse uma voz grave acima. O alien praticamente congelou quando ouviu aquela voz. Sua cabeça lentamente virou para trás, e viu a imagem de Ishida pairando com as asas no ar. Mas sua aparência tinha mudado: Cabelos agora negros, e olhos que refletiam um vermelho demôniaco. A propagação de Vorthis Crepitus. — Você errou o seu ataque. Bem, agora é sua vez de desviar do meu.
Com a varinha na mão direita, Vorthis desenhou um círculo verde amaldiçoado à sua frente. O rastro fluorescente seguiu o contorno, e ele posicionou a outra mão bem no centro do círculo. Com um estalo, o símbolo se energizou. O alien parecia paralizado na arena abaixo, e Valaric parou de narrar para prestar atenção no que estava acontecendo.
O símbolo circular irradiou uma última vez, e então, um feixe verde estrondoso foi lançado na direção do alien. Ele não teve reação, apenas observou aterrorizado. O feixe o atravessou e levou o chão da arena junto, atravessando tudo até chegar no solo de Cyberion. As pessoas na cidade podiam ver um feixe saindo da arena até o chão, destruindo e queimando tudo por onde passava.
Vorthis deu um sorriso de satisfação, e então percebeu o olhar fixo de Eterno em sua feição.
— Sim, eu já entendi…
Ele se livrou do controle, e Ishida caiu do céu desacordado. Seus cabelos voltaram ao castanho original, e o estado Xamã junto das asas chegou ao seu fim. Ishida ficou caído ao chão junto dos inúmeros gladiadores mortos em batalha. O vento levava seus cabelos suavemente, e o tempo da rodada acabou. Myaku estava descansando com sua foice cravada no chão, e o leão comendo uma maçã que havia guardado para mais tarde.
Valaric estava incapaz de anunciar o fim da rodada pela aparição de Vorthis. Mas o placar marcava oitenta e quatro a setenta e quatro para Aniônius, fazendo-os empatar com Elysium, que tinham dez pontos de vantagem anteriormente.
Notas:
Aviso: Todas as ilustrações utilizadas na novel foram geradas por IA. Perdoe-nos se algo lhe causar desconforto visual.
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