A Última Ordem Brasileira

Autor(a): Hanamikaze


Volume 2 – Arco 1

Capítulo 41: Luzes Oscilantes

O leão e San estavam sentados juntos ao topo do maior prédio daquele bairro deserto de Cyberion. A lua minguante irradiando ao céu, e o vento correndo sobre seus cabelos e pelos. San estava saboreando metade de um hambúrguer, e a outra metade já tinha devorado. E o leão, estava comendo uma maçã, como se fosse a coisa mais encantadora que já viu. Aparentemente não foi muito bem alimentado enquanto estava cedendo o próprio sangue naquela fábrica.

— Por quanto tempo estavam te mantendo naquele lugar? — perguntou San, um pouco de preocupação em sua voz.

— Tempo o suficiente para eu não saber em que ano estamos — respondeu, tão naturalmente como se estivesse contando a uma criança sobre seu trabalho. E então, deu uma longa e exagerada mordida na maçã.

— Hum… — San também deu uma mordida no hambúrguer. — De qualquer forma, obrigado por ter me ajudado…

— Que nada, cê me tirou de lá, pivete. Te devo uns quatro anos da minha vida, haha!

San ficou um pouco chateado quando o leão jogou todo aquele peso em cima dele. Mesmo sendo algo bom, ele não podia deixar de sentir empatia pelo espectral.

— Ei, leão… me responde uma coisa… — San achou que este fosse o alguém perfeito para perguntar novamente. — Você sabe de alguma coisa sobre o “portador de Eón”?

— Eón… — O leão pareceu forçar a memória para se lembrar. — Oh! — exclamou de boca cheia. — Tá falando do Rahim? Rahim Khamsin? Ha! Me diga um tolo que não saiba sobre ele.

— Bom, a maioria aparentemente não sabe.

— Bando de sem cultura, essas gerações atuais aí. Mas respondendo a sua pergunta… — ele terminou de engolir o que estava mastigando. — Sei de quase tudo sobre ele.

— É sério?! — San ficou desacreditado. — Pode me dizer um pouco sobre ele?

— Não.

— O quê?!

— Infelizmente, pivete, não posso falar nada.

O olhar antes esperançoso de San murchou, ficando um pouco melancólico. Ele mordeu com amargura o último pedaço do hambúrguer, apreciando a vista da cidade abaixo.

— Mas… — o leão voltou a falar. — Tem uma forma de você saber.

O olhar esperançoso de San retornou, reacendendo como uma tocha.

— Sério?! Como?

— No entanto, é bem complicado. — O leão se levantou da beira do prédio, e se espreguiçou, soltando um largo bocejo também. — Por que tem uma condição… e não acho que você vá conseguir…

San não desanimou. Aguardou esperançoso, observando o leão, até que ele revelasse esse novo método.

“A única forma de você poder saber… seria me matando.”

O sorriso largo e ansioso de San lentamente foi afrouxando, mas dessa vez em surpresa. Definitivamente não esperava aquela resposta.

— É bem tenso, e sabe, eu não tô muito afim de morrer agora. Estou livre… acabei de ver o mundo aqui fora. Se fosse para me matar, devia ter feito isso em vez de me tirar daquela cela.

Por um momento, o silêncio tomou conta. O leão ficou um pouco desconfortável por ter deixado o clima tão pesado. Porém, suas orelhas logo se ergueram e ele ficou em alerta. Olhou para trás, e havia alguém especial no topo do prédio também. Luke Harris, empunhando uma katana negra, pronto para atacar a qualquer momento.

— Se precisa matar essa coisa para avançar em seus objetivos, San — ele apontou a katana ao leão. — Então eu te darei suporte.

— Luke… — San ficou surpreso, e um pouco animado ao mesmo tempo. — Mas por que você…

— É que diferente do Hayami, eu fui mais com a sua cara.

— Haha! — o leão se aproximou. — Que quebra de clima! Bem, se acha que vai ser tão simples… — ele se apoiou com as patas nos joelhos, e se preparou. — Então vem, tenta.

Sem nenhum aviso, o fio da katana de Luke estava quase colidindo com o pescoço do leão. Ele se curvou bem para trás, desviando por um triz. Luke estava bem à frente, tinha se movido tão rápido que ninguém foi capaz de ver. O leão sorriu, e então deixou seu corpo tombar mais para trás, caindo de cima do prédio com tudo. Luke não ficou para trás, logo saltou atrás do leão. Cravou sua lâmina nas paredes do prédio e seguiu acompanhando.

O leão ergueu as duas patas e fez pistolinhas com os dedos. Os dedos indicadores se acenderam em chamas, e começaram a disparar vários grandes tiros de fogo para o alto. Luke continuou acompanhando; desviou dos tiros de fogo com auxílio da katana presa ao prédio para se movimentar de um lado para o outro, e então saltou no ar mais uma vez. Com um rodopio, cortou um tiro de fogo no ar e caiu com a lâmina cravada no peito do leão. Porém, obviamente não foi suficiente. Uma crosta de chamas se ergueu do peito do leão pela lâmina da katana, e Luke teve que usá-la de apoio para saltar e descer até o chão sem se queimar.

Quando o leão se chocou contra o chão, caiu de pé como um verdadeiro felino deveria. Um estrondo de fogo ondulou pelo solo, causando ondas ferventes. Mas não afetaram Luke, pois estava de pé em cima da katana fincada no solo, com total equilíbrio sobre seu peso.

— Arre, moleque astuto! — exclamou o leão.

Logo, Luke desapareceu de cima da katana, deixando apenas um vulto para trás.

“Mas o bicho é rápido…” pensou o leão, antes de sentir um soco chegando por trás. Ele se virou e desviou, deixando o punho passar direto. Um chute veio seguinte do soco, e o leão o barrou com a perna. Mais um golpe, dessa vez o cotovelo, e o leão barrou com o antebraço. Só estava com uma mão livre, que logo teve que segurar mais um soco, deixando-o sem mais defesas. O último golpe foi um cabeçada, mas o leão conseguiu desviar, fazendo Luke passar direto. Quando olhou para cima, a boca do leão enchia-se de chamas, pronto para cuspir tudo em cima do jovem. Ele desapareceu sutilmente e o estrondo da rajada engoliu o solo.

Quando o leão terminou, Luke estava correndo até sua katana novamente. A segurou, e continuou seguindo pela estrada, veloz. O leão riu e começou a flutuar. Seu corpo se desfez em uma nuvem de fogo, que começou a soltar raios ferventes em direção ao garoto. Ele seguiu atravessando a estrada, desviando de um lado para o outro. Saltou em um prédio, do prédio foi para o ar, girou, e então lançou a katana na nuvem incandescente. Ela se dissipou, e o leão retornou a sua forma original, caindo na estrada.

Sequer teve tempo para respirar; Luke já apareceu bem atrás dele. Fez um corte certeiro que iria atravessar o corpo do leão, mas não foi astuto o suficiente. Com apenas um dedo em chamas erguido, o leão parou o movimento da katana com uma única garra. Luke ficou surpreso de início, mas sua expressão logo se encheu de fúria. O leão gargalhou, e Luke recuou alguns passos.

— Ninguém é capaz de me ferir lutando sozinho, pivete, haha!

— Esta é a questão… — Luke olhou para baixo. O leão pôde notar pequenas gotículas brancas seguindo o mesmo caminho pelo chão, mas já era tarde. — Eu nunca estou sozinho.

Um estrondo ecoou ao lado, e um tsunami de água branca e brilhante arrastou o leão pelas ruas. Era o poder oculto de Amélia, em seu estado Xamã.

— Eita bicho! Molhou! — berrou o leão, sendo arrastado pela intensa camada de água.

Todo aquele líquido começou a se erguer, levando o leão consigo. Tanto a água brilhante quanto o leão agora flutuavam no céu, e a água o cercou em uma pequena esfera cintilante. Mas não foi suficiente. Um ponto na lateral da esfera começou a esquentar e ficar vermelho, e logo, o leão saiu fervente na forma de uma grande bola de fogo. A água voltou a o acompanhar no ar, mas era lenta demais.

Amélia, que estava em um prédio adiante, cortou o ar com a mão, e o que antes era água começou a se expandir em uma barreira redonda e fina em volta da bola de fogo. Quando a barreira esférica se completou, a bola havia desaparecido.

Amélia arregalou os olhos e olhou em volta, procurando pela bola de fogo. Mas logo sentiu o ar quente vindo de cima. Olhou para o alto, e viu o leão, flutuando, com um punho emanando chamas incandescentes. Ele soltou uma risada bem alta, e socou o ar, jogando uma rajada tão enorme de fogo em Amélia que se parecia com um cometa.

A barreira vazia retornou a forma de água, e Amélia ergueu as mãos ao cometa de fogo. Uma onda de água brilhante se chocou contra ele, e os ataques entraram em confronto no ar. Mas não demorou muito tempo. O leão logo seguiu cortando os dois ataques como um jato, e deu uma cabeçada bem no peito de Amélia, jogando-a de cima do prédio até a estrada de metal.

O leão desceu também. Quando colidiu com o chão, mais ondas de calor se espalharam. Mas desta vez, elas voltaram e se reuniram à ele, enchendo-o de energia. O leão estrondosamente deu uma arrancada na direção de Amélia, impotente, no chão.

Ela tentou parar o leão reunindo sua água branca ao redor dele, mas não funcionou. Quando se aproximavam daquela aura escaldante a água simplesmente evaporava. Ele estava prestes a golpeá-la diretamente, mas seu punho foi barrado pelo fio da katana negra de Luke. O leão não viu problemas, continuou forçando o punho contra a katana, mas por mais que usasse muita energia, ele não podia atravessá-la.

“Que espada é essa?!” exclamou o leão, em pensamento.

A potência de seu ataque cessou, e ele recuou alguns passos. Luke o encarava com ameaça, mas logo desapareceu. O leão sentiu apenas a lâmina passar através de seus pelos uma última vez, antes de Luke passar direto e se chocar contra a parede.

Ele havia se tornado fumaça incandescente mais uma vez, e flutuou até o topo de uma sacada, ficando de pé sobre ela. Olhou para Luke e Amélia de cima, com o dedo indicador erguido em chamas.

— Forte, não? É complicado…

San logo se aproximou correndo até os três, parecendo exausto de tanto tentar acompanhar aquela batalha.

— Já está bom, já está bom!

Luke lentamente guardou sua katana na bainha, sem tirar os olhos ameaçadores do leão. Em resposta, o leão lhe dava um sorriso orgulhoso.


No salão principal da Bela-Casa, um homem de cabelos azuis bem longos e roupas pretas adornadas por utensílios de ouro estava sentado, praticamente estirado em um sofá requintado. Três mulheres andavam à frente, seminuas, trazendo comida e frutas, e despejando tudo em bandejas ao redor da mesa de vidro entre os sofás.

As garotas deram um sorriso sedutor ao Kaelan Blackwood, estirado no sofá, e aguardaram por ordens, esperando ao redor do salão. Kaelan pegou um cacho de uvas do cesto, ergueu-o no alto e começou a comer algumas uvas. Descendo as escadas, um velho vinha caminhando lentamente. Ele era bem magro, careca, com apenas uma barbicha grisalha no queixo. Uma expressão franzida, aparentemente era rabugento.

— Não acha que deveria estar fazendo algo útil, Kaelan? — bradou o velho, aproximando–se dos sofás.

— Se ainda não viu, estou descansando, velho — ele comeu mais uma uva. — Isso se chama “intervalo”.

O velho suspirou. Não se esforçou para se sentar junto de Kaelan, pois sabia que logo deixaria o local. Ele não gostava muito daquele ambiente quando Kaelan estava por perto, pois sempre chamava as garotas da casa para acompanhá-lo.

— Bom, tanto faz — o velho pegou um pequeno copo de whisky e bebeu apenas um gole.

— Ficou sabendo, velho? O seu “gatinho” fugiu da coleira. Aconteceu agora há pouco. Você deveria ir procurá-lo… Sua fábrica deve falir em breve se descobrirem que não terá mais o milagroso elixir que cheira a salmão velho.

— Já está sabendo? Hum… não faz tanto tempo desde que ele fugiu. Era inevitável que alguma hora ele iria escapar, na primeira brecha ele se soltaria. Obviamente aqueles incompetentes não teriam o menor controle sobre o leão caso estivesse sem as algemas. Mas como soube disto tão rápido?

— Acredite em mim, se qualquer gota d’água cair em um lugar diferente nessa cidade, eu vou ser o primeiro a saber. Não pode fingir que ele simplesmente não fugiu. Quando o povo descobrir, a culpa vai ser sua de qualquer forma — falou Kaelan, indiferente, levando mais uma uva à boca.

O velho suspirou, e então deixou o salão com seus passos lentos de um corpo já desgastado. Mas conforme ia voltando pelo corredor, um outro vinha chegando. Trajado em imponentes roupas vermelhas, com uma bengala branca com dados estampados nela. Usava uma cartola vermelha, cabelos loiros e olhos alaranjados. O mágico se aproximou de Kaelan, e seu sorriso desapareceu, já esperando que Valaric tivesse vindo apenas para se exibir.

— Como foi com a cyborg assassina? Pegaram ela, Blackwood?

— Pegamos. Inclusive — Kaelan cansou de comer uvas e deixou o cacho sobre a bandeja. — Apareceu um moleque falando que ela era inocente. Carinha irritante… tava me segurando pra não dar um chute nas bolas dele.

Valaric ignorou completamente aquela informação, e começou a rodear o sofá com toda a imponência de um rei, como se ele fosse o dono daquele casarão.

— Apenas isso? Não tem mais nada a me dizer?

— Se quer que eu diga mais algo, acho melhor você cuidar melhor daquela sua irmã esquisita. Tiveram alguns relatos de uma espécie de sombra prateada flutuando pelo céu, acompanhando um vulto negro bem veloz. Deveria abrir o olho, podem estar se movendo bem debaixo do seu nariz.

Valaric ficou um tanto irritado com aquele aviso.

— Hah, que engraçado. Sem bobagens, você sabe que ninguém aqui é capaz de passar despercebido por mim. — Valaric abriu os braços, e riu nervosamente, tentando demonstrar autoridade. — Charlotte não tem coragem de me desobedecer, entendeu? — A expressão dele ficou mais séria.

Kaelan decidiu não responder, mas não conseguiu conter um sorriso ao ver a expressão séria de Valaric. Segundos depois, sua atenção foi voltada para a parte de cima de sua mão. Havia uma marca em V, com um grande pentagrama cercando-o. Quando Kaelan olhou para o pentagrama, ele começou a brilhar em verde.

“Ele tá aqui…” pensou.

— Acho que vou voltar pro trabalho. A gente se vê… — Kaelan fez questão de virar-se para Valaric, olhou no fundo dos olhos dele, e terminou sua frase sem dizer o nome que Valaric desejava ser chamado, e sim o nome que ele tinha desgosto; seu nome verdadeiro. — Oliver.

Valaric ficou indignado, mas decidiu não se opor. Kaelan lentamente foi caminhando para fora da Bela-Casa.

No hotel, Cornélia e Aiden discutiam, pois o cyborg havia derrubado acidentalmente um frasco de perfume de Cornélia enquanto passava no pescoço dela.

— Eu te disse para ter mais cuidado, Aiden! Esses seus dedos de plástico escorregam muito fácil com vidro! Está me ouvindo por acaso?!

— Eu posso tentar mudar o material dos meus dedos, se quiser, Srta. Cornélia.

— Aiden! Não!

O cyborg pareceu confuso. Tombou a cabeça e seus olhos piscaram repetidas vezes.

— O que vamos fazer com essa bagunça agora! Que terrível, o cheiro vai ficar grudado no chão…

Ishida Majutsu e Kyoko Yoshizawa observavam no canto do quarto. Arashi e Myaku estavam presentes ali também.

— Esses dois… — comentou Ishida.

— Nem me fale — completou Kyoko.

— Pelo tanto de perfume que ela passa por dia — começou Arashi. — Até que nem mudou muita coisa o cheiro no quarto.

Myaku parecia um pouco incomodada ao lado de Arashi. Estava de braços cruzados, esfregando o próprio braço e balançando lentamente a cabeça.

— San ainda não voltou… será que aconteceu alguma coisa?

— Falei que não devíamos ter deixado ele sozinho lá.

— Espera… — Kyoko começou a ficar estressada. — Vocês deixaram ele sozinho na fábrica?!

— Que merda, hein… — Ishida se aproximou da janela, contornando o perfume e os cacos do frasco no chão. — Fiquem aí, vou ver se acho ele.

Ishida se transformou em um pássaro negro, e saiu voando da janela até o céu noturno. Myaku continuou inquieta no canto, e Arashi tentou consolá-la.

O pássaro negro seguiu o caminho voando, passando um breve olhar em cada canto e beco presente naquela cidade gigantesca. Encontrar San ali seria completamente impossível, pois o planeta era enorme e ele poderia estar em qualquer lugar. Mas Ishida queria acreditar que ele não teria ido muito longe à procura do elixir.

Após voar por um momento, ele desistiu de gastar sua energia procurando às cegas. Logo, ele teve uma ideia. Planou até o topo de uma das quatro estruturas flutuantes acima da cidade, parando exatamente na beira da Bela-Casa. Voltou à sua forma original, e juntou as mãos, preparando-se para fazer um feitiço.

— Procurando por alguém? — perguntou uma voz próxima. Ishida olhou rápido, e era Kaelan, se aproximando acompanhado por dois cyborgs.

Quando viu Kaelan com aquele sorriso maligno no rosto, Ishida teve uma sensação de alerta. Ali jazia o perigo iminente. Retornou à sua forma de pássaro e desapareceu nos céus. Kaelan manteve seu sorriso, e desceu até a cidade de Cyberion com os cyborgs.

Minutos depois Ishida ainda voava no ar, chegando a beirar os telhados. Mas seu voo não durou muito; foi atingido por uma gota d’água que tinha uma pressão tão alta que o fez cambalear no ar, e se destransformar, caindo de bruços ao chão. Os dois cyborgs seguraram as mãos de Ishida, tornando-o incapaz de relutar.

— Te fiz uma pergunta e você me deu às costas? Essa falta de consideração com as pessoas… odeio gente ignorante.

Ishida rangeu os dentes, e o encarou com um pouco de medo e raiva misturados.

— O que você quer comigo? Me solta!

Acima das casas, nos telhados, um homem encapuzado coberto por um manto assistia toda à cena. Estava bem escondido entre os telhados, como um gato preto no meio da noite.

— Não quero nada com quem não sabe dialogar. Mas com certeza, o cavalheiro preso em você sabe perfeitamente como receber alguém bem…

Kaelan mostrou o topo de sua mão para Ishida, exibindo a marca de V contornada por um pentagrama. Os olhos do jovem bruxo se arregalaram, e lentamente foram fazendo a transição de amarelo para vermelho. O pentagrama brilhou em verde mais uma vez, e começou a girar em volta do V.

Os cabelos de Ishida ficaram negros, a pele empalideceu, os olhos se tornaram vermelhos e uma aura negra o adornou, fazendo os cyborgs o soltarem imediatamente. O sorriso de Kaelan se abriu mais ainda, ficando de orelha a orelha.

— Boa-noite, meu caro Blackwood — saudou aquele que agora estava no controle, o infame Vorthis Crepitus. — Se me permite a pergunta, por que ainda está de pé em minha presença… e não de joelhos?

— Oh, perdão, meu senhor — Kaelan ficou de joelhos o mais depressa que pôde, e lançou um olhar sério aos outros cyborgs para que se ajoelhassem também. Nenhum deles hesitou em curvar-se diante a entidade adiante.

Vorthis esboçou um sorriso egocêntrico, e seus olhos se voltaram para o iluminado luar artificial de Cyberion.

— Coliseu, ham…

A este ponto, San já havia voltado para o hotel. Trouxe Amélia, Luke e o leão consigo. Todos ficaram impressionados de início ao verem um leão que anda e fala, mas logo entenderam quando Kali explicou que aquele era um espectral também, o Pilar do Leão.

Agora, o leão estava no barzinho do hotel, bebendo e conversando com o cyborg recepcionista na entrada. San e o resto estavam no quarto de Kali, discutindo.

— San… — começou Kyoko. — Onde diabos você achou um leão?!

— Achei ele preso lá na fábrica.

— E por que trouxe ele consigo?!

— Ele sabe de uma coisa muito importante!

— E o que é?

San estava prestes a falar sobre o portador de Eón, mas então se lembrou que apenas ele estava ciente sobre tudo aquilo. O sonho com o seu nome escrito na tumba, o demônio Aka fazendo o ritual com vários cientistas e arqueólogos. Então, decidiu não falar sobre isso agora.

— Você… vai saber depois — disse, e então caminhou para sair do quarto.

Kali, ao ver que San estava interessado naquilo, deu um sorriso meio contido, demonstrando satisfação.

Kyoko seguiu San para fora do quarto, curiosa para saber mais sobre o que ele começou a dizer.

— Ah, vamos! Não vai me deixar curiosa agora, né?

Antes que San pudesse responder, as luzes começaram a piscar e oscilar sem parar pelo corredor e pelos quartos. San e Kyoko observaram, desconfiados com o que poderia estar acontecendo.

Na recepção, o leão estava papeando com Luke enquanto bebia. De alguma forma, com seu carisma, conseguiu convencer Luke de acompanhá-lo para baterem um papo. Ele não o considerava um inimigo, e nem um amigo. Era do tipo que apenas gosta de socializar com todos, mas não confia em ninguém o suficiente para chamar de parceiro.

— Ah, não precisa ficar tão tímido só porque perdeu, haha! — rugiu o leão. — Você também é bem impressionante, moleque.

O leão deu duas palmadas no ombro de Luke, que parecia estar mais descontraído agora. Mas quando as luzes começaram a piscar na recepção também, a atenção dos dois voltou à tona.

— O que é isso? — perguntou Luke, se levantando.

As luzes não paravam de piscar.

— Não sei… que estranho.

Nos andares de cima do prédio, Kana e Kanako estavam juntas no mesmo quarto, jogando um jogo de tabuleiro bem tecnológico. Controlavam as peças com painéis holográficos, e elas seguiam o movimento como se tivessem vida. Porém, a diversão das duas acabou quando as luzes começaram a oscilar por ali também. Ficaram assustadas, e se juntaram, ficando bem perto uma da outra. No meio da transição entre a luz apagada e acesa, era possível ver olhos brilhando na escuridão do quarto, se aproximando das duas a cada vez que a luz se apagava, e quando ligava, os olhos desapareciam. Elas ficaram aterrorizadas, sem se mover, observando os olhos se aproximarem a cada piscar de luzes. Quando se aproximou o suficiente, as duas correram para fora, praticamente arrombando a porta.

No quarto de Cornélia, o mesmo evento ocorreu. Luzes piscando, com olhos brilhantes se aproximando da jovem na escuridão. Ela berrou de agonia quando viu a entidade se aproximar, e logo, Aiden entrou na frente de Cornélia, protegendo-a.

— Afaste-se! — bradou, os olhos brilhando também, mas com fúria.

A criatura continuou se aproximando sem medo, e Cornélia se agarrou na cintura de Aiden, amedrontada. Ela tinha pavor de criaturas como aquela, que apareciam no escuro, e uma lágrima escorria pelo seu rosto. Mesmo sendo uma máquina, o sistema de Aiden acelerou quando viu aquela lágrima. Não estava só seguindo um programa, estava sentindo empatia e angústia pela sua querida Cornélia. Voltou os olhos para a criatura, desta vez, com verdadeira fúria. A fúria de alguém que precisava proteger a sua família. Os olhos azuis irradiaram, e um laser ardente disparou na direção da criatura, perfurando a parede e levando o monstro consigo. O laser foi tão potente, que atravessou quatro casas adiante, e queimou os neurônios de uma mulher-peixe que estava assustada com as luzes piscando em sua casa.

Cornélia ficou boquiaberta.

— Aiden… — ela estava sem palavras, mas não precisou dizer nada. Logo, o cyborg a abraçou.

Do lado de fora, nas ruas, Vorthis Crepitus no corpo de Ishida caminhava lentamente. A estrada estava vazia, rodeada por uma névoa negra que vinha conforme ele se aproximava, espalhando todo o peso e terror no ambiente. As luzes dos postes oscilavam também, e quando Vorthis passava pelos postes, as luzes perdiam completamente o brilho, deixando um rastro escurecido por onde ele passava.

Um pouco mais à frente, o homem encapuzado apareceu. Bem à frente de Vorthis, com o manto e o capuz se movendo com a névoa.

— Ora, um ser misterioso… será capaz de sentir medo? — questionou Vorthis, uma expressão maléfica. O encapuzado não respondeu. Continuou parado, diante de Vorthis, tomando uma posição defensiva. — Vai me encarar desse jeito?

O encapuzado parecia preparado para o combate, mas desistiu quando sentiu uma terceira presença invadir o local. Ele deu uma breve olhada para trás, e então se moveu rapidamente entre os becos, fugindo da cena. O terceiro semblante era de San, se aproximando sozinho ao longe, vindo do hotel.

— Quantas surpresas em um dia só, não acha? Já faz muito tempo, Hiroyuki.

— Vorthis! — exclamou San, o único que não era afetado pela aura de terror.

— Como vai?

San não respondeu, ergueu uma mão ao alto, canalizando sua espada de fogo nas mãos.

— Esta coisinha de novo… Sabe, esta espada me lembra bastante o formato da antiga excalibur.

— Não importa! — gritou San.

— Suponho que você… esteja aqui para resgatar seu amigo de volta — disse, referindo-se ao Ishida. — Se for assim… vamos à um lugar mais apropriado…

A realidade começou a se distorcer na visão de San. O chão se transmutou, virando apenas vácuo. A cidade começou a desaparecer, sendo substituída por várias paredes de relógios romanos, com os ponteiros se movendo escandalosamente a cada segundo.

— Então seu maior medo são relógios… intrigante.

San caiu no domínio do rei dos pesadelos. Agora, estava diante da coisa que mais temia no momento, a coisa que menos desejaria ver na vida… Que no caso, no momento, eram relógios romanos. A cabeça de San começou a arder fortemente com todos aqueles sons de ponteiros, e sua visão ficou embaçada. Ele estava prestes a cair no chão de tontura com tanta dor.

Mas ao mesmo tempo, não desistiu. Deu um passo adiante na direção de Vorthis, ainda empunhando a espada em chamas. Mas não foi capaz de continuar; a marca do X em seu pescoço brilhou, e o local da marca começou a arder tão forte que San berrou, dissipando a espada no ar e levando a mão ao cachecol. Ele não pôde suportar a dor por mais de três segundos, e desmaiou. Vorthis ficou desapontado. A ilusão desapareceu, e logo voltaram ao cenário comum da cidade.

Arashi veio correndo para socorrê-lo, junto de Kyoko. Vorthis olhou para os dois, sem emoção nenhuma com suas presenças. O jeito que eles tremiam e mal conseguia avançar já tirava toda sua excitação em ter uma batalha contra aqueles dois.

— Vieram para se juntarem à ele? Certo… — Vorthis ergueu uma mão, e a apontou para os dois. O corpo deles arrepiou da cabeça aos pés apenas com aquele movimento. — Vou me certificar que seja rápido…

Notas:

Aviso: Todas as ilustrações utilizadas na novel foram geradas por IA. Perdoe-nos se algo lhe causar desconforto visual.

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