Volume 1 – Arco 3
Capítulo 16: A Afundada Vollmond
Parte 1
O garoto saiu dos arbustos. Ele era loiro, com olhos amarelos bem claros. Usava roupas pretas e calça jeans, ele tinha um anel dourado, que brilhava fortemente na mão esquerda. Aparentemente o clarão de antes tinha vindo de seu anel, e logo em seguida do garoto, um lobo de pedra saiu do arbusto também, com a língua para fora. Sua língua era de rochas também, e era tão seca quanto as pedras no chão. Hifumi apontou sua espada para o garoto e ficou em silêncio.
— Identifique-se! — ordenou Arashi, tentando parecer mais intimidador.
— Olá para você também. Novos aqui? Em Nephthar. Eu também sou, é bom achar estrangeiros quando se é um também.
— Quem é você...? Por que salvou eles da água? — perguntou Hifumi, cuidadoso e ainda empunhando a espada.
— Meu nome é Milan Hoffmann, conhecido também como “Viajante da Luz" , com certeza já ouviram esse nome, não é?
— Não. Quais suas intenções? Por que ajudou eles? — perguntou Hifumi novamente, ele se estressava fácil.
— Que pena… eu devo ser tão famoso! Em todo lugar deveria ter alguém comentando sobre o Viajante da Luz ou algo assim… vocês devem ser desatualizados… — enquanto falava, Milan notou a expressão nervosa de Hifumi, que já estava perdendo a paciência.
— Bem, eu notei que San Hiroyuki estava em apuros e então o libertei. E enquanto fazia isso, notei a água congelar e fui dar uma conferida, e vi aquela outra pessoa ali também, então retirei os dois da água — explicou o garoto, orgulhoso.
— San Hiroyuki? Você conhece esse cara, San? E como assim “fui dar uma conferida”, você sequer entrou na água?
San estava com uma expressão de surpresa após o garoto citar o seu nome completo.
— Nunca o vi na minha vida… mas ele sabe o meu nome, talvez eu que seja o famoso aqui afinal — respondeu.
— É claro que é, sua alquimia é especial. Eterno diz que aquele capaz de mudar o destino um dia chegará, e o Sol reacenderá o seu brilho para sempre. Pelo menos, é o que dizem.
— O Sol?... — San queria perguntar alguma coisa, mas Hifumi falou antes dele.
— Não me interessa qualquer ligação que seu povo tenha com San, se existe algo que queira falar apenas diga, se não tem mais nada a dizer então iremos partir.
— Bom, suponho que estejam aqui por causa do problema que deu nos lobos. Ninguém costuma visitar esse planeta, e Eterno deseja que eu investigue o caso para averiguar se não tem nada a ver com Espectros… não sei porquê um Espectro estaria interessado em lobos de pedra.
Hifumi resmungou, e abaixou sua espada. O garoto realmente não parecia uma ameaça, mas ele não iria abaixar a guarda tão rápido.
— Esse cara tem um cachorro, Hifumi. É confiável — disse Arashi, apontando para o lobo de pedra ao lado de Milan. O lobo parecia feliz, com a boca bem aberta e ofegante. Se fosse um lobo comum, provavelmente o chão abaixo dele estaria todo babado.
— Você domou um deles? — perguntou Hifumi.
— Esse não parece “infectado”, Hifumi. Olhe para as rachaduras dele, tem energia amarela. É a cor comum das partículas atômicas, os outros possuem uma energia roxa. Este parece estar normal — explicou Thomas, analisando o lobo, com os dedos no óculos para ajustá-los.
— Sim, ele não está. Quando cheguei aqui, também fui atacado por uma manada. Mas por sorte posso me teleportar usando luz… então fugi facilmente. Mas então ouvi alguns gemidos e resmungos vindo de baixo da água, e decidi dar uma conferida. Era um lobo de pedra, estava preso lá no fundo do rio por não sei quanto tempo… não morrem afogados pois não possuem órgãos respiratórios, mas seus corpos são pesados demais para nadar. Não sei o porquê dele não ter sido afetado, mas talvez seja por estar embaixo d’água?
— Já pode servir como base para nossas investigações. Talvez cooperar com Milan não seja uma má ideia, ele possui um “sobrevivente” — disse Tsukasa, ao Hifumi.
— Espera… ele havia dito que pode se teleportar com a luz? — cochichou Arashi.
— Exato, posso me teleportar. Na verdade, é a única coisa que posso fazer com minha magia da luz — antes que Milan terminasse a frase, ele já estava entre todos eles em um piscar de olhos. — Por isso me chamam de Viajante da Luz.
Arashi tomou um breve susto quando notou Milan ao seu lado, mas retomou sua postura imediatamente. San estava impressionado com as habilidades do garoto da luz, e também curioso sobre o que havia escutado. Se lembrava de Tsukasa ter falado algo sobre “Sol Vermelho” antes de viajarem para Nephthar, as coisas começam a se encaixar na cabeça de San, mas ao mesmo tempo, outro quebra cabeça apareceu. “Aquele que pode mudar o destino”.
— Ahem, se me permitem juntar a sua equipe de detetives, eu consegui uma pista. Na verdade sempre a tive comigo, no reino de Nefer Ra existem várias coisas desse tipo… enfim, eu tenho um mapa do planeta Nephthar antes do dilúvio — disse Milan, erguendo o mapa entre todos, e apontando para o centro dele.
— Dilúvio? — perguntou Arashi.
— Sim, a muito tempo atrás, quando Nephthat ainda era habitável, o Reino de Vollmond dominava esse lugar. O rei Lobo era chamado dessa forma, por ter uma incrível sinergia com as pedras pela sua alquimia, e ele criou animais companheiros para os habitantes do reino. Os lobos eram como guardas leais, ou melhores amigos. Nunca te abandonariam por nada. Bom, mas de repente aconteceu um dilúvio e o reino foi por água abaixo. Não sei de onde veio essa água, até porque nem existia água neste planeta direito. Mas só sobraram os lobos e seu rei vivos, e Vollmond ficou afundada nas profundezas. Desde então chamam essa terra morta de “O Reino dos Lobos”, pois apenas sobraram lobos vagando por aí.
O garoto Hoffmann continuou contando alguns detalhes da história do dilúvio, e sobre o Rei Lobo também. Enquanto isso, Hifumi estava analisando o mapa que Milan tinha, e fazendo uma análise geral da área. Arashi estava tentando acariciar o lobo do garoto, mas o lobo pulou em cima de Arashi e ficou lambendo sua cara. Sua língua era tão dura e áspera quanto um bloco de concreto.
Quando o garoto terminou sua sessão de histórias, ele retomou a atenção de todos novamente ao mapa do planeta. Hifumi já estava o analisando, e todos se agacharam em volta do mapa que estava no chão. — Bom, se vamos investigar os lobos, precisamos saber primeiro onde encontrá-los com frequência. Se olharem bem no mapa, o antigo reino de Vollmond ficava no hemisfério Leste do planeta. Como podem ver, os rios sequer existiam no mapa… bom, se é de lá que os lobos saíram, talvez é lá que eles costumam rondar. O resto do planeta é bem deserto, acho improvável acharmos muita coisa para esses lados.
— Como o garoto disse… vamos seguir então. O hemisfério Leste não deve estar a mais que 15 quilômetros. Estamos relativamente perto. Podemos aproveitar e observar a natureza dessas criaturas no caminho…
Milan recolheu o mapa no chão e o enrolou como um pergaminho. Hifumi, que estava pendurado em sua espada fincada no chão, a retirou e guardou em suas costas. A escuridão da noite limitava a visão, tornando o horizonte completamente negro. Arashi não tinha nenhuma noção de Norte, Sul, Leste ou Oeste, ainda mais que o Sol não existia naquele lugar.
— Vocês tem certeza de que estamos indo na direção certa? Já perdi as contas de quantas vezes já me perdi andando com vocês. Principalmente com Tsukasa e San.
— Se está tão preocupado, pode pedir emprestado a nave do Hifumi e procurar por cima — disse Tsukasa. Se Arashi não se perdesse com uma nave antes, provavelmente aceitaria a oferta. Alguns trovões caíam das nuvens que começavam a nublar o céu. Uma chuva fraca caía sobre os cabelos de todos, mas era tão serena que sequer molhava seus cabelos.
Hifumi de repente parou, sentindo a chuva cair em sua pele. Mas quando olhou para trás, Milan havia desaparecido repentinamente.
— Onde é que está o… — antes que completasse, ouviram Milan gritando do alto de uma colina de pedregulhos, e fazendo gestos para que todos viessem também.
— Olhem aqui! Estão em manada, de novo!
Todos ficaram em alerta, menos Tsukasa e Thomas, que estavam observando a chuva juntos. San e Arashi subiram a colina com rapidez. Os outros acompanharam, e quanto mais subiam, mais a chuva engrossava.
— Lá embaixo… são vários! — exclamou Hifumi, apontando para os lobos com ansiedade. Eles corriam pela ladeira abaixo, eram centenas deles novamente. Todos indo na mesma direção, com um impulso descontrolado. Não pareciam estar correndo naturalmente, pois estavam um derrubando o outro e apenas ignorando o que viam à frente.
— Não é uma atitude normal vindo de lobos… — murmurou Thomas para si mesmo.
— O que será que deu neles?... E o que estão caçando desta vez? — perguntou San, se agachando para ter uma visão melhor.
— Estão realmente sendo controlados. Notem que quando um é atingido pelo outro, não tem reação alguma. Apenas continua seguindo com os outros. É como se tivessem recebido um comando para seguir reto, e todos estão apenas seguindo reto monotonamente.
— Realmente… faz sentido — concordou, e tentou se inclinar mais para analisar. Mas San se excitou demais, e acabou caindo ladeira abaixo. Hifumi tentou o segurar pelo braço, mas o pedregulho estava muito liso pela chuva, e San apenas seguiu deslizando até a enxurrada de lobos correndo sem rumo. Ele caiu entre os lobos, e se segurou nas orelhas de um deles. Acabou sendo arrastado com a manada.
— Merda, San! — berrou Hifumi, enquanto todos apenas viam os cabelos ruivos de San no meio de inúmeras cabeças de lobo e poeira subindo com eles. Arashi e Hifumi tiveram a mesma reação, os dois pularam da colina, e se penduraram nas paredes abaixo. Arashi com sua velocidade correu verticalmente pela parede, e Hifumi seguiu atrás, deslizando com sua espada presa às pedras. Tsukasa os observou indo embora, e os outros dois estavam ao seu lado.
— Não vai mudar nada, nunca vão alcançá-lo assim. Você pode se teleportar, não é Milan?
— Sim, mas de que adianta? Se eu só aparecesse naquela aglomeração eu seria atropelado junto dele. Vamos ter que esperar os lobos cansarem de correr. Acho que se San não fizer nenhum movimento sem pensar, ele vai ficar bem.
Thomas se levantou do chão, e começou a descer a colina pela mesma direção em que subiram.
— Que saco…
Hifumi e Arashi em algum momento desistiram, e apenas acompanharam os passos dos lobos. Quando finalmente pararam, estavam todos juntos em frente a um buraco. Os lobos desciam devagar para dentro dele, e todos pegaram um pedaço de alguma pedra roxa que brilhava profundamente no fundo do buraco. E então, com bocas cheias, os lobos subiram e se dividiram.
— Ótimo… agora só precisamos achar ele — resmungou Hifumi, meio cansado. Tsukasa estava do outro lado do local, observando de longe. Thomas vinha de entre as árvores, e quando um lobo passou por baixo dele, ele o agarrou pelo pescoço, tampando os olhos do lobo. O animal ignorou, e apenas seguiu seu caminho. “Então ele realmente apenas está seguindo um caminho coordenado…” pensou ele, soltando o lobo.
Thomas continuou seguindo-o, para ver até onde o animal iria. Arashi estava junto de Hifumi, e seguiu na frente. Começou a olhar de lobo em lobo, procurando por seu amigo. Hifumi olhou dentro do buraco em que os lobos saíram, e não tinha mais nada lá. Ele retornou à superfície, e foi até Arashi.
— Precisamos de um plano, ele ainda deve estar preso a algum lobo, se não já teríamos o encontrado.
— E o que você sugere? — perguntou Arashi.
— Tenho algo em mente. Faça o que eu mandar.
Tsukasa estava sobrevoando a área, sentado em sua lua de gelo. Ele podia ver perfeitamente a superfície do planeta, e a curvatura que ele fazia. Mas enquanto se distraía com a visão, um estrondoso trovão atingiu um local próximo a ele, fazendo árvores voarem. Ele então foi até lá conferir. Ele desceu da lua de gelo, e quando se aproximou do local, Milan se teleportou para as costas de Tsukasa repentinamente.
— Você ouviu esse estrondo? O que aconteceu? — perguntou ele.
Os dois ficaram quietos por um momento quando notaram a cena. Thomas estava ensanguentado no chão, com feridas abertas nos braços e nos peitos. Aparentemente o local do estrondo acertou em cheio nele.
Hifumi e Arashi tinham acabado de preparar suas armadilhas, e estavam esperando que algum lobo caísse nela. Era uma porta feita de alquimia, bem à caminho da ladeira em que eles estavam prestes a subir. Os lobos seguiram em direção a porta, e bateram com o focinho nela. Um deles apenas tentou empurrar, e o outro colocou a pata na porta. Mais lobos começaram a vir, e o espaço ao lado da porta era suficiente para todos passarem, mas eles queriam apenas seguir pela passagem da porta. Com o passar do tempo, já tinham uns vinte lobos em frente à porta.
A porta então se abriu, e o primeiro entrou. Ele conseguiu passar direto, e quando todos tentaram passar simultaneamente, a porta foi forçada para os lados, e ela se expandiu em um caixote de alquimia, que prendia todos um em cima do outro. Eles tentaram pular por cima, mas uma fumaça saiu do caixote de alquimia, e quando a fumaça tocou os lobos, eles ficaram desnorteados. Estranhamente giravam sem parar, como se estivessem atrás da própria cauda. A fumaça foi lentamente pegando um tom avermelhado, e os lobos ficaram imóveis com a boca aberta. De dentro da boca de um deles, San se rastejou para fora.
Arashi pulou para dentro do caixote, e pegou San. E quando saiu, lançou uma corrente elétrica na fumaça, fazendo as energias dos lobos e a eletricidade se misturarem, e o caixote explodir. Arashi caminhou até Hifumi, com San quase desacordado nos braços.
— Eu não entendi absolutamente nada do que você fez, mas funcionou. Como é que você planejou isso? — perguntou Arashi.
— Eu queria analisá-los também, então pensei nesse caixote. A porta serviu para ver se realmente seguiam apenas um caminho, e aproveitei a magia usada para criar a porta, e expandi uma “jaula”. Como a magia do caixote era minha, pude criar fumaça baseada no poder de fogo. A fumaça tampou suas visões, e tirou qualquer sentido que tivessem. Eles apenas seguiram girando, como se o destino sempre mudasse de direção, pois a fumaça distorcia as ondas de qualquer outro tipo de magia. Quando adicionei mais fogo a fumaça, eles abriram a boca e ficaram imóveis… a fumaça misturada com o fogo cortou completamente qualquer conexão externa que eles tivessem com outras energias, então ficaram parados, como se estivessem desligados.
— Continuo não entendendo nada. Mas se funcionou, então você deve ter descoberto algo — disse Arashi, soltando San no chão. Ele estava lento, e parecia que havia acabado de acordar de um sono bem profundo. Arashi e Milan vieram de entre as árvores, Tsukasa segurava o corpo de Thomas nas costas.
— Esse é… o Thomas? O que aconteceu?! — perguntou Arashi, se aproximando para ver.
— Acho que foi um trovão. Mas não era um raio comum… — respondeu Tsukasa, e Milan concordou com a cabeça.
O lobo de Milan chegou atrasado, estava com a língua para fora e uma expressão aparentemente feliz.
— Bom… não podemos cuidar dele agora. Não tem nenhum tipo de hospital aqui, ou ninguém que nos ajude. Temos que prosseguir, lidere o caminho, garoto — exclamou Hifumi, seguindo em frente e acompanhando Milan até o Reino dos Lobos.
Já haviam caminhado a um tempo, e nada ainda. Arashi parecia cansado, mesmo com o lobo de Milan tentando animá-lo empurrando-o com a cabeça. Após um tempo, avistaram algo ao horizonte. Era um campo de força, com raios roxos saindo de dentro dele.
— Arh, ótimo. O inteligente da turma ta desmaiado para falar o que seria isso aqui.
— Mantenha a calma, Arashi. Vamos achar um jeito… — consolou Hifumi, e todos se aproximaram do campo de força. San o tocou, e levou um choque nos ossos. Milan tentou atravessá-lo com teleporte, mas sequer saiu do lugar.
— Acho que magia não funciona aqui.
— Espera… essa energia roxa… acho que vi algo desse tipo embaixo d’água. Em algumas construções afundadas enquanto estava atrás de San — disse Tsukasa, com os dedos no queixo.
— Em Vollmond? Ainda existe algo naquele reino afundado? Bom, não custa nada dar uma conferida. Não podemos atravessar essa barreira de qualquer forma…
Notas:
Aviso: Todas as ilustrações utilizadas na novel foram geradas por IA. Perdoe-nos se algo lhe causar desconforto visual.
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