A Senpai Coelhinha Japonesa

Tradução: GGGG

Revisão: Sakuta, Mon


Volume 1

Capítulo 3: Primeiros Encontros podem ser Turbulentos

Era um dia lindo. Finalmente, o domingo havia chegado, e o clima estava perfeito para um encontro. Sakuta conseguiu sair do trabalho exatamente às duas, dando-lhe tempo suficiente para correr para casa primeiro. Uma pedalada rápida de três minutos.

Kaede veio recebê-lo, e ele deu um afago em sua cabeça enquanto seguia para o banheiro. Tinha suado pedalando até em casa, então tomou um banho rápido e, só para garantir, trocou de roupa íntima. Em seguida, notou o olhar curioso de Kaede.

"Os homens precisam estar preparados para qualquer coisa," ele declarou.

"Estou indo, Kaede!"

"Ah, tá. Tchau."

Ela o acompanhou até a porta, segurando Nasuno. Já eram 2h20. Ele seguiu em direção à Estação Fujisawa a pé.

Seus passos pareciam leves. Ele andava normalmente, mas, em seu coração, estava saltitando de alegria. Como se tivesse asas nos pés. As ruas pelas quais ele passava todos os dias pareciam completamente novas. Ele notava as flores surgindo entre as rachaduras no asfalto. Ouviu os pardais nos fios de telefone.

E adorava tudo isso. Sentia-se inundado por um espírito de generosidade.

No auge de sua alegria, ouviu uma menina pequena chorando. Ele estava a uns três ou quatro minutos de casa. À sua frente, ficava a entrada de um parque. A menina estava parada em frente, chorando alto.

"O que foi?" ele disse, aproximando-se dela.

Ela olhou para ele e parou de chorar por um momento. Mas, logo em seguida, voltou a soluçar.

"Você não é a mamãe!"

"Você está perdida?"

"A mamãe não está aqui."

"Então você está perdida."

"A mamãe que está perdida."

"Uma interpretação válida." Essa garota parecia ter um futuro brilhante.

"Pronto, pronto, não chore," ele disse, ajoelhando-se e colocando a mão na cabeça dela. "Vou ajudar você a encontrar sua mãe."

"Vai mesmo?"

"Sim." Ele assentiu, sorrindo. Esperava que isso a fizesse sorrir de volta, mas ela apenas olhou confusa.

"Só vem comigo." Ele segurou a mão dela, mas antes que pudesse se levantar...

"Morra, pedófilo nojento!" alguém gritou atrás dele.

O quê? Ele tentou se virar para ver, mas, antes que pudesse ver o rosto da pessoa, uma dor aguda atravessou seu quadril.

Parecia que a ponta de uma bota dura tinha acertado bem no cóccix. O que quase certamente era o caso...

"Aughhh!" ele gritou, rolando pelo chão. Pelo canto do olho, vislumbrou uma garota mais ou menos da sua idade. Adolescente. Uma colegial.

Cabelo curto e fofo. Saia curta, também. Pernas à mostra. Maquiagem discreta, definitivamente o estilo do momento.

"Agora é sua chance! Corra!" ela insistiu, com uma expressão séria.

A criança apenas piscou para ela.

"Hã? Por quê?" perguntou, totalmente perdida.

"É óbvio! Vamos!"

Não era nada óbvio, mas a garota segurou a mão da criança e tentou puxá-la para longe.

"Antes que esse pedófilo nojento se levante!"

"Eu não sou um pedófilo nojento!" Sakuta disse, lutando para se levantar e segurando o quadril.

A dor era intensa, e ele mal tinha forças nas pernas. Elas tremiam, e ele parecia um cervo recém-nascido.

"Mas ele está me ajudando a encontrar minha mamãe."

"O quê?" A nova garota olhou surpresa para a criança e, em seguida, para Sakuta.

"Você realmente não é um pedófilo nojento?"

"Eu gosto de mulheres mais velhas."

"Então você é um nojento!"

Mas sua convicção claramente estava abalada. Agora que ele a observava, ela era bem bonita. Tinha um rosto levemente infantil e olhos grandes e redondos. A maquiagem leve dava um toque suave. Ele já tinha visto muitas garotas na escola que exageravam na maquiagem, mas pensou que essa tinha aplicado de forma bem adequada.

"Eu só encontrei essa criança e estava tentando ajudá-la a encontrar sua mãe."

"Impossível. Essa criança que está perdida."

"A mamãe que está perdida," disse a menina, com firmeza.

Dizendo isso, ela se afastou da nova garota e se aproximou de Sakuta. Agarrando-se à manga de sua camisa, a situação mudou de figura.

Nesse ponto, a nova garota teve que admitir que havia interpretado mal. Ela sorriu de forma constrangedora.

"Ugh, meu quadril dói!"

"D-desculpe. Ah-ha-ha."

"Eu acho que você partiu minha bunda ao meio!"

"O quê? Isso soa ruim, Espera um segundo, ela já era dividida!"

"Ai, ai, aiii."

"T-tá bom! Certo!" a garota gritou... e então se virou, apoiando as mãos em um poste de luz.

"Vai, faz logo!" E com aquele grito decidido, ela empinou a saia curta na direção de Sakuta.

"Faz logo o quê?"

Ela claramente queria que ele chutasse seu traseiro, mas chutar uma colegial em plena luz do dia não era bem o estilo dele.

"Vamos, faz logo! Eu preciso encontrar uma amiga!"

Sakuta também tinha alguém importante para encontrar. Um compromisso muito importante. Quanto mais tempo ele perdia ali, mais o prazo se aproximava. E ele ainda precisava ajudar a garotinha, com certeza, ele iria se atrasar nesse ritmo. Ele não podia se dar ao luxo de perder tempo com mais nada. Talvez fosse mais rápido apenas dar um chute no traseiro dela e seguir em frente.

“Certo, vamos lá.” Ele deu um leve toque. Isso deveria bastar, certamente.

“Mais forte!” ela gritou, olhando para ele com raiva por cima do ombro.

“Sério?”

Ele chutou um pouco mais forte. Houve um barulho satisfatório.

“Mais!” Ainda não era suficiente, de alguma forma.

“Tudo bem, não me culpe depois!”

Ela não deixou escolha para ele. Homens de bem tinham o dever de atender aos desejos das mulheres. Sakuta abaixou o centro de gravidade e puxou a perna para trás, carregando-a com força. Ele mirou cuidadosamente no alvo redondo e desferiu o chute mais forte que conseguia. O barulho do impacto foi bem inquietante. Um momento depois...

“A-aiiiii!” ela gritou, em dialeto de Hakata.

“Ah...” Ela caiu de joelhos, gemendo.

Ambas as mãos agarraram o traseiro com delicadeza. A dor era tão grande que ela nem conseguia falar. Sua boca se movia inutilmente, como a de um peixe dourado.

“Meu traseiro se partiu ao meio...”, ela conseguiu dizer, por fim.

“Não se preocupe! Já era assim.”

“Er... O que está acontecendo aqui?”

Ambos se viraram. Um homem de uniforme policial os observava, parecendo muito confuso.

“Receio que não posso permitir atividades desviantes em plena luz do dia, em um parque público.”

“Ela é a única desviada aqui!” Sakuta disse, apontando para a garota do ensino médio.

“N-não! Eu não sou! Há uma boa razão para isso!” Ela parecia desesperada.

“Você pode explicar essa razão na delegacia.”

Ele os segurou com firmeza, um em cada braço. Não havia como escapar disso. Policiais sabiam como lidar com pessoas. Esse em particular podia estar envelhecendo, mas ainda era muito forte. A segurança do bairro estava em boas mãos.

“Estou a caminho de algo importante! Por favor, me solte!”

Ser interrogado seria um desastre. Mesmo que, por um milagre, durasse apenas cinco ou dez minutos, Mai dificilmente o esperaria tanto tempo. Afinal, ela era Mai Sakurajima.

“Claro, claro. Sem resistência. Por aqui. Você também, garotinha perdida. Sua mãe está esperando na delegacia.”

“Ela está? Yay!”

Enquanto o policial os arrastava, Sakuta se consolava com o fato de que pelo menos o problema da criança perdida estava resolvido. Mas até esse pequeno alívio foi imediatamente arruinado quando o policial murmurou:

“Será que as crianças de hoje em dia gostam de dor?”

Finalmente, o policial os liberou cerca de uma hora e meia depois de chegarem à delegacia. Sakuta olhou para o relógio ao saírem e ficou horrorizado ao ver que já eram quatro horas. Alguém, por favor, invente uma máquina do tempo?

“Ugh, isso foi horrível,” a garota resmungou. Ela parecia exausta.

“Essa é a minha fala, sua idiota.”

“Quem você está chamando de idiota? Você todo suspeito foi o que causou essa bagunça!”

“E você entendeu tudo errado, então você carrega a maior parte da culpa.”

“Desculpas são tão cafonas.”

“Não são desculpas. Apenas a verdade. E foi totalmente sua culpa a bronca ter durado tanto, Koga.” Os ombros dela tremeram.

“...Como você sabe meu nome?!”

“Tomoe Koga. É um nome bem fofo!”

“Você sabe o nome todo?!”

Será que ela tinha esquecido que se identificou para o policial? Ele até sabia a escola dela. Ela era, na verdade, estudante do Colégio Minegahara, como Sakuta. Um ano abaixo dele. Tecnicamente, ele era seu senpai.

“Eu sei tudo sobre você.”

“Isso é ridículo.”

“Você é de Fukuoka, certo?”

“Como você sabe disso?!” O sotaque dela escapou de novo.

“...”

“Ah!” Tomoe Koga colocou ambas as mãos sobre a boca.

“Você já deixou seu sotaque escapar antes também.”

“E-eu não falei com sotaque!” Ela se recusava a olhar para ele. Parecia querer manter isso em segredo por algum motivo. Mas agora já era tarde para tentar esconder.

“O ponto é que, no final, isso tudo foi culpa sua, Koga.”

“Me diga seu nome! Não é justo só você saber o meu.”

“Sou Ichiro Sato.”

Não havia motivo para dizer a verdade, então ele inventou um nome falso, assumindo que qualquer um saberia que era uma piada.

“Certo, Sato. Mas como isso foi minha culpa?” Tomoe insistiu, aceitando o pseudônimo sem questionar. Claramente, ela não era desconfiada. Talvez fosse realmente uma pessoa genuína. Admitir que o nome era falso agora só causaria problemas, então Sakuta decidiu manter o silêncio.

“Se você não sabe, fico feliz em explicar. Nos primeiros trinta minutos, conseguimos convencer o policial de que foi um mal-entendido. O resto foi porque você estava tão obcecada pelo seu celular que nunca levantava os olhos, claramente sem prestar atenção nele.”

A última hora da palestra do policial foi só sobre como não mexer no celular enquanto alguém estava falando. Sakuta nem tinha celular, então aquilo parecia completamente injusto.

“É verdade... mas você não precisa falar assim, desse jeito!” Ela fez um beicinho.

“Você não sente nenhum remorso?”

“É que eu continuava recebendo mensagens! Eu não tinha escolha.”

“E daí? Ignore-as.”

“Se eu não responder rápido, vou perder todos os meus amigos,” Tomoe admitiu, abaixando a cabeça.

“É por isso que você estava tão desesperada para responder?”

“Caso contrário, eu também deixaria de lado enquanto alguém grita comigo.” Ela inflou as bochechas, olhando para ele com raiva.

“Ah-ha.”

“Que atitude é essa? Você está sendo rude, não está?”

“De forma alguma.”

“Eu sei que está pensando, ‘Se você perderia eles tão facilmente, eles nunca foram seus amigos de verdade.’”

Alguém já tinha dito isso para ela antes? Parecia que ela estava imitando outra pessoa.

“Você claramente pensa assim,” disse Sakuta.

“C-cala a boca!” Sakuta colocou a mão na cabeça dela, bagunçando seu cabelo.

“Argh! Idiota! Gastei muito tempo arrumando isso!” Ela afastou a mão dele e começou a arrumar o cabelo com pressa.

“Boa sorte, garota jovem.”

“Você está tirando sarro de mim?”

“Você está se esforçando para sobreviver a essas regras idiotas de amizade, certo? Então não, não estou te zoando. Só acho isso tudo muito bobo.”

Seja e-mail ou mensagem de texto, ele não fazia ideia de quem teria criado regras assim ou quem se beneficiava delas. Talvez tenham sido criadas para manter as coisas cordiais, mas, antes que alguém percebesse, essas regras se tornaram restritivas e acabaram por fazer todos sofrerem.

Mas, uma vez que todos decidiram seguir essas regras, ficaram presos a elas. Não obedecer significava ser expulso do grupo. Você poderia facilmente perder seus amigos. E uma vez fora do grupo, não havia como voltar. Sakuta sabia disso bem demais. Sabia o quanto Kaede havia sofrido por isso.

Regras assim eram exaustivas. Ainda assim, as pessoas não conseguiam se sentir seguras sem criar regras, sem se conectar, sem criar um lugar onde pertenciam. Cada mensagem trocada era uma forma de se certificar de que tudo estava bem.

‘Você está bem?’ ‘Estou bem.’ Para muitos, era difícil dar a si mesmo essa validação, então precisavam dela dos outros. Esse vai e vem era compartilhado, sincronizado. Assim, as pessoas construíam seus espaços seguros.

Ensino fundamental ou médio, as escolas eram pequenas sociedades. Mundos à parte. E todos estavam desesperados para se encaixar.

Sakuta só começou a entender como esses mundos funcionavam quando entrou no ensino médio e conseguiu um trabalho onde passava mais tempo com estudantes universitários e adultos. Ele começou a ter uma visão de como as escolas pareciam de fora. Só então percebeu que todos só queriam pertencer.

“Então você está me zoando.”

“Você parece ser uma boa pessoa, Koga, então vou deixar pra lá.”

“Boa pessoa?”

“Precisa de coragem para salvar uma criança de um pervertido. Respeito isso. Mas da próxima vez, que tal só chamar ajuda? Se fosse um pervertido de verdade, você poderia ter se metido em um grande problema. Você é bem fofa, afinal.”

“N-não me chame de fofa!” Tomoe ficou vermelha. Será que ela não era chamada assim com frequência?

“Mantenha a justiça em seu coração! Continue lutando pelo bem!”

“Ah, tá. Obrigada.”

Ele não esperava que ela realmente aceitasse aquilo e agradecesse. Talvez ela fosse genuinamente gentil. Ou então ingênua de coração.

Um celular tocou. Sakuta não tinha um, então com certeza era o de Tomoe.

“Ah, droga! Prometi que estaria lá! Tchau!”

Tomoe saiu correndo. Naquela velocidade e com uma saia tão curta, Sakuta certamente teve uma visão privilegiada, mas gritar um aviso só chamaria mais atenção, então ele apenas a observou ir embora em silêncio.

“Branco, hein?” ele comentou.

Quando Tomoe finalmente sumiu de vista, Sakuta se virou para ir para casa. Ele deu alguns passos e então parou.

Sentiu como se estivesse esquecendo algo importante.

“......Ah!”

O rosto de Mai passou pela sua mente. Naturalmente, ela não estava exatamente sorrindo de forma agradável. Nem mesmo fazendo um biquinho adorável. Definitivamente era a expressão que ela tinha feito da única vez que ele realmente a deixou brava.

“Droga...”

Quase tropeçando nos próprios pés, Sakuta disparou em uma corrida desesperada em direção ao local onde eles haviam combinado se encontrar.

Sakuta entrou correndo na Estação Enoden Fujisawa, o mesmo lugar que ele passava todos os dias a caminho da escola. Parou na frente das catracas de entrada. Esse era o ponto onde Mai havia sugerido que se encontrassem.

Tentando recuperar o fôlego, olhou para a direita e depois para a esquerda. As catracas ocupavam apenas seis ou sete metros de largura, então não levou muito tempo para verificar tudo.

“......” Infelizmente, não havia sinal de Mai.

“É... claro...” Mai Sakurajima nunca o esperaria por uma hora e meia.

“Droga... realmente estraguei tudo.”

Um sentimento de arrependimento tomou conta dele. Mas não havia como ele ignorar a garotinha perdida, nem como prever o caos que a "garota justiceira" tinha causado. Ele não se arrependia das suas escolhas, mas, naquele momento específico, lamentava não ter um celular. Pelo menos poderia ter contado a Mai o que estava acontecendo. Mesmo que tivesse um, ela provavelmente diria algo como: “Então isso é mais importante do que um encontro comigo?” e cancelaria os planos, então...

Ele só teria que encontrar uma maneira de conseguir o perdão dela. Quando Mai percebeu que ele não apareceria, ela certamente ficou furiosa e ou foi para casa ou decidiu ficar sozinha em algum lugar. Não seria fácil reconquistar seu bom humor.

Enquanto ele se deixava abater, ouviu passos atrás de si. Eram familiares, mas havia um tom distinto de irritação no ritmo.

“Você teve a audácia de me fazer esperar noventa e oito minutos.”

“......” Ele se virou, sem acreditar no que ouvia. Lá estava Mai, em roupas casuais.

“Por que está com essa cara de quem viu um fantasma?”

“Eu nunca imaginei que você fosse do tipo que esperaria por alguém, toda fofa e pacientemente, por uma hora e meia! Você só pode ser uma impostora!”

Os olhos dela se estreitaram. Ele tinha certeza de que a temperatura ao redor deles caiu alguns graus.

“Claramente, estamos descobrindo o que você pensa de mim.” Ele basicamente pensava que ela era sexy. Será que ela sabia?!

“Você interpretou isso como um insulto?”

“Como mais eu interpretaria, querido?”

Mai parecia querer que a palavra soasse como um insulto, mas, para ele, soou mais como um prêmio. Mas, se ele dissesse isso, ela provavelmente nunca usaria esse tom de novo, então Sakuta ficou em silêncio.

“Por que está sorrindo?”

“Nada.”

Ele forçou-se a parecer sério e, finalmente, notou a roupa dela. Uma blusa de manga longa com um colete fofo de tricô e capuz por cima. A saia ia até os joelhos, com uma leve abertura na barra, dando um ar bem maduro. As botas subiam até logo abaixo dos joelhos. A roupa era elegante e refinada, mas sem ser exagerada, tudo perfeitamente equilibrado. Um visual que combinava com a aura adulta de Mai.

“......”

Mas não havia pele à mostra em nenhum lugar, exceto talvez um pouco ao redor dos joelhos. Ele soltou um suspiro.

“Isso foi rude!”

“Mai, você tem certeza disso?”

“O-o que foi?” ela perguntou, preparada para uma resposta.

“Roupas para encontros pedem minissaias e pernas à mostra!”

“Eu vou te socar,” disse Mai, cerrando os punhos.

“Suspiro.”

“Não fique com essa cara de desapontado!”

“Eu estava realmente esperando por isso.”

“Corajoso da sua parte falar isso quando chegou tão atrasado.”

“Você sempre usa meia-calça preta com seu uniforme.”

“B-bom, pensei bastante no que vestir...” ela murmurou, desviando o olhar.

“E você está absolutamente adorável!”

“......” Mai lançou um olhar para ele, claramente querendo mais elogios.

“Você está super fofa, Mai!”

“Bem melhor.”

“Meu coração está batendo tão rápido que quero te levar para casa! Decorar minhas paredes com você!”

“Agora você está sendo estranho. Pare com isso.”

“Então, vamos lá.” Ele gesticulou em direção às catracas.

“Espera. Ainda não terminamos aqui.”

“O que mais falta?” Ele esperava sair dessa situação, então tentou fingir ignorância.

“Pare de fingir.”

“Jamais ousaria fazer isso na sua presença.”

"Quero ouvir sua desculpa. E depois, você vai implorar sinceramente pelo meu perdão." Mai parecia estar se divertindo. Sua expressão estava cheia de vida.

"Se não for boa o suficiente, vou embora."

Será que Mai tinha esperado todos os noventa e oito minutos só para torturá-lo? Essa teoria estava começando a fazer sentido.

"No caminho pra cá, eu encontrei uma criança perdida perto do parque."

"Tchau."

"Eu sei que parece mentira, mas é a verdade!"

"Não há parques entre seu trabalho e aqui," ela apontou.

"Eu fui para casa antes."

"Por quê?"

"Tinha tempo sobrando e achei melhor tomar um banho e trocar de roupa íntima, por precaução."

"...Que nojo." Ela parecia genuinamente horrorizada.

"Mas vou assumir que foi o desespero inútil de um garoto patético e seguir em frente."

"Obrigado."

"Mas não permito que você chegue a menos de três metros de mim pelo resto do dia."

Isso mal poderia ser chamado de encontro. Qualquer um que os visse assumiria que Sakuta estava perseguindo-a.

"Continue com sua mentira."

"Eu realmente levei uma criança perdida até a delegacia."

"Essa criança era uma menina?"

"Sim."

"Você tem coragem de me fazer esperar enquanto passa tempo com outra garota."

"Você está contando uma criança de quatro anos?!"

"Estou," ela respondeu com ênfase.

Parecia arriscado contar toda a história. Se ele confessasse que tinha passado tempo com uma colegial fofa como Tomoe Koga, ela era realmente fof, não dava para prever quanta reprovação ele receberia.

"Mas a delegacia é logo ali," Mai apontou para a pequena delegacia do lado de fora da Estação Fujisawa.

"Depois que me envolvi, tive que ficar até encontrarmos os pais dela. Ela estava chorando!"

"Hmm." Ela lançou um olhar de profunda suspeita.

"Eu odeio mentiras."

"Que coincidência! Eu também."

"Se estiver mentindo, vou te fazer comer Pocky pelo nariz."

"Só um?"

"A caixa toda."

Essa forma de tortura parecia quase viável, e a imagem vívida que surgia em sua mente certamente não era agradável.

"Eu acho que você não deveria brincar com a comida."

"Você é quem vai estar comendo, então isso não será problema."

"......"

"......"

Mai se aproximou, estudando seu rosto. Ela estava tentando pressioná-lo a confessar a história completa. Ele conseguia sentir a respiração dela em sua bochecha. Ela cheirava bem.

"Você é tão teimoso."

"......" Agora, ele realmente não poderia contar a verdade. Não sem ganhar Pocky no nariz.

"Muito bem. Você não está perdoado, mas vamos começar esse encontro." Ele deveria ficar feliz?

"Obrigado," disse ele, aliviado, mas então….

"Oh! É o cara esquisito!"

Aquela voz soava familiar... Ele olhou em direção ao corredor que conectava as estações JR e Odakyu e viu Tomoe Koga de novo. Havia três outras garotas com ela, provavelmente as amigas com quem ela tinha combinado de se encontrar. Elas eram um grupo encantador e pareciam bem próximas. Provavelmente as meninas mais populares da turma dela.

"A mulher de Hakata!" Sakuta disse. Tomoe correu apressada até ele, tapando sua boca com as mãos.

"Não me chame assim!" sussurrou ela.

"Mulher de Hakata?" repetiu uma de suas amigas, confusa.

"Ah, sabe, aquele famoso souvenir de Fukuoka! Aquele que coloca pasta de feijão vermelho em Baumkuchen. Tem a imagem de uma mulher na embalagem, mas é para ser chamado de outra coisa."

"Ah, eu já comi isso! É bom!"

"Uau, Tomoe!" Outra amiga segurou o braço dela, puxando-a para longe de Sakuta.

"O-o que foi?"

"Esse é o cara da internação," a amiga sussurrou. Ele conseguia ouvir tudo perfeitamente.

"Hã? Mas ele é o Ichiro Sato?" Tomoe disse, confusa.

"O quê? De onde tirou esse nome? E ela... bem, você sabe."

As quatro olharam para Mai. Pelo visto, todas conseguiam vê-la.

"Vamos logo."

As amigas puxaram Tomoe em direção às catracas, e logo sumiram de vista.

Observando-as ir embora, Sakuta percebeu o grande erro que cometera. Ele nunca deveria ter respondido ao chamado de Tomoe. Deveria ter fingido não conhecê-la. Isso teria sido muito melhor.

Ele olhou para Mai. Seu rosto estava assustadoramente sem expressão.

"Sakuta."

"Você está entendendo errado."

"O nome dela é Tomoe?"

"Su-suponho que sim."

"Não se preocupe, não vou embora." Ela colocou os braços ao redor do dele.

"Vamos comprar uns Pocky!"

"Você me deixaria ficar só com os fininhos?"

"Nem pensar."

Ele já tinha passado do ponto de achar divertida a travessura em sua voz. Ou de saborear o que sentia encostado no braço.

"Piedade?"

"Sem chance, pedófilo." E assim, o primeiro encontro de Sakuta e Mai começou com uma parada na loja de conveniência mais próxima.

Houve um estalo quando um palito de Pocky quebrou. Sakuta e Mai estavam no trem Enoden. Sentados lado a lado em assentos voltados para o oceano, observavam a paisagem enquanto ela comia o Pocky que havia comprado, um palito de cada vez. A visão dos lábios dela se abrindo era extremamente fofa, e Sakuta não conseguia desviar o olhar. Mai não fazia isso intencionalmente, mas a maneira como mordiscava suavemente a ponta do Pocky antes de morder o palito era encantadora.

No entanto, ele não conseguia se concentrar plenamente nessa visão. Não havia como saber quando ela poderia tentar enfiar um palito em seu nariz, então permanecia alerta. E o momento chegou mais rápido do que ele temia. Mai estendeu um palito de Pocky em sua direção.

“Aqui” disse ela.

“Estou tão cheio!”

“Preciso cuidar do peso. Você come o resto.”

“Comer com o quê?”

“Pode comer normalmente.”   ela suspirou, lançando um olhar de lado.

“Então, obrigado.” Ele pegou a caixa dela.

“Você realmente não pensou que eu faria você comer pelo nariz, não é?

“Parecia que estava falando sério.”

“Isso se chama atuação.”

“Claro!”

“Mas poderia tentar comer um assim, sabe?”

“Você é uma demônia!”

“Sua falta de arrependimento está me fazendo reconsiderar.”

“Desculpa! Estou brincando! Você é a bela Mai Sakurajima! Por favor, mostre misericórdia!”

“Você não parece nada convincente.”

Mai voltou os olhos para a janela, com um olhar entediado. Estavam apenas a três paradas da Estação Fujisawa, nem haviam chegado ainda à vista para o oceano. Logo estariam na parte em que o trem passa entre fileiras de casas.

Naquela hora da tarde, havia poucas pessoas no trem, e muitos assentos vazios. Eles tinham verificado as reações dos passageiros próximos, mas nenhum deles parecia ter notado Mai, provavelmente não conseguiam vê-la.

“Ei.”

“Devo me ajoelhar?”

“Não. Por que insiste em se envolver comigo? Confesse. Considere isso seu castigo.”

“De onde veio isso?”

“Com o tanto de problemas que já causei, a maioria das pessoas teria desistido há muito tempo.”

“Como você é consciente disso.”

“Não é como se as pessoas ao meu redor escondessem.”

Mai nunca se encaixou na turma ou na escola. Era tratada como se fosse invisível, e ninguém interagia com ela voluntariamente.

“Essa sua rabugice é a razão pela qual não consegue fazer amigos, Mai.”

“Olha quem fala.”

Ele ignorou o comentário mordaz dela. Estava plenamente ciente disso. Yuuma e Rio lhe diziam a mesma coisa o tempo todo.

“Mas você também é totalmente desavergonhado, Sakuta.”

“Eu sou?”

“Você é o único que não tem medo de falar comigo.”

“Você pode ser meio assustadora. Isso definitivamente afasta as pessoas.”

Sua beleza, por si só, já tornava difícil para as pessoas iniciarem uma conversa, e seu status de celebridade apenas piorava a situação.

“Ah, fique quieto.” disse ela.

“Você gosta da escola?”

“Se você quer dizer “mesmo sem amigos lá”, é assim desde a escola primária, então não é como se algo tivesse mudado. Nunca pensei na escola como um lugar que você “gosta”.”

Não parecia que ela estava tentando disfarçar ou ser evasiva. Parecia sua opinião sincera. Ela não tinha uma opinião forte sobre não se encaixar na escola. A diferença entre ela e as outras pessoas ao seu redor não lhe parecia estranha. Ela havia desistido disso há muito tempo, e Sakuta quase sentia que ela havia alcançado uma espécie de iluminação sobre a vida escolar.

“Além disso, você está desviando do assunto.”  disse ela, lançando-lhe um olhar de soslaio.

“Eu te fiz uma pergunta primeiro. Você ainda não respondeu!”

“Qual era mesmo?”

“Por que está tão empenhado em me ajudar? Você até deu ao repórter uma informação que poderia te causar problemas. Deve ter algum motivo para ir tão longe.” Ela estava sendo ainda mais insistente agora.

"Eu simplesmente não consigo ignorar alguém em apuros."

"Estou perguntando sério."

"Hum."

"Você é legal, mas não é naturalmente legal."

"Não sou?"

"Você não é legal com todo mundo. Quando aquele casal universitário tentou tirar minha foto na estação de Shichirigahama, você foi bem rude."

"Acho que qualquer um faria o mesmo."

"Estou dizendo que você escolheu um jeito particularmente pouco gentil de lidar com eles. Você poderia ter sido mais sutil."

"Mesmo estando irritado?"

"Poderia, se quisesse. Você estava calmo o suficiente para escolher a maneira exata de encurralá-los."

"Quanto mais você fala, pior eu pareço..."

"Você achava que era uma pessoa boa?" perguntou Mai, parecendo espantada.

"Pelo menos, você é pior do que eu."

"Tanto faz. Apenas me diga o motivo."

Ela não o deixava escapar daquela conversa. Nunca deixava.

"Então vou te dar uma resposta séria. É melhor ouvir."

"Vai em frente."

"Pensei: aqui está minha chance de impressionar uma bela—"

"Não estou pedindo para você confessar a verdade nua e crua."

"Você que exigiu uma resposta séria!"

"Apenas me dê sua melhor desculpa agora."

Qualquer um presumiria que Mai estava tentando descobrir como ele realmente se sentia. Às vezes, ele realmente não entendia ela.

"Eu sei como é excruciante quando você não tem ninguém a quem pedir ajuda," disse ele, como se já não se importasse mais.

Desta vez ela não interrompeu. Ele devia ter passado.

"Quando Kaede teve a Síndrome da Adolescência, ninguém acreditava, mesmo quando acontecia bem na frente deles."

Sakuta deu uma mordida em um Pocky. Se falasse com a boca cheia, imaginou que Mai o repreenderia por falta de modos, então engoliu antes de continuar.

"Ninguém queria nos ouvir. Todos se afastaram. Estávamos dizendo a verdade, mas nos chamaram de mentirosos."

E ele não os culpava. Era a reação natural. Se não fosse sua própria irmã, Sakuta também não teria acreditado. Teria fechado os olhos e os ouvidos, fingindo que não tinha visto ou ouvido nada. Isso teria sido muito mais fácil. Todo mundo sabia disso.

"Posso perguntar uma coisa?" Mai inquiriu, soando ligeiramente hesitante.

Ele assentiu. Tinha uma sensação de que sabia o que estava por vir.

"Seus pais?" Ela perguntou com cuidado.

Ela tinha problemas com a própria mãe, então devia ter sido difícil para ela arriscar uma pergunta tão invasiva. Ele sentia que essa habilidade dela de se colocar em seu lugar era algo bom. Ela podia agir como uma rainha às vezes, mas também sabia entender o que os outros sentiam.

"Eles não moram com a gente."

"Eu sei disso. Já estive no seu apartamento."

Ver o lugar dele deixava isso bem claro. Não havia nenhum sinal de coisas de adultos. Apenas os sapatos de Sakuta estavam na entrada, e o clima no corredor e em seu quarto era o mesmo. Normalmente, os territórios das pessoas têm sensações diferentes, mesmo que sejam familiares.

"Estou perguntando se..."

"Eu sei."

Ele sabia o que ela queria dizer desde o começo. Como os pais haviam lidado com a situação de Kaede?

Ele comeu três Pocky de uma vez. A caixa estava vazia agora. Ele a amassou e colocou no bolso.

"A mamãe... Bem, ela tentou aceitar. No final, toda a situação foi demais para ela, e ela foi... Ela ainda está no hospital. Só o fato de a filha estar sendo intimidada já era difícil sem essa coisa absurda de Síndrome da Adolescência por cima disso. O papai está ao lado dela."

O próprio Sakuta ainda não sabia como lidar com tudo aquilo. Antes que ele pudesse fazer algo, tudo ao redor havia mudado, e, antes que percebesse, as coisas estavam como estão agora. Só restaram os resultados. Ele não havia conseguido fazer nada, e agora não havia nada que pudesse fazer.

"Kaede levou muito a sério a rejeição da mamãe, e como ela era a causa disso, foi ainda pior... e agora ela não deixa ninguém se aproximar, exceto eu."

"Quantos anos ela tem mesmo?"

"Dois anos a menos que eu. Ela deveria estar no terceiro ano do ensino fundamental. Desde que tudo aconteceu, ela se tornou extremamente reclusa e não tem ido à escola."

Ela, estritamente falando, não conseguia sair de casa. Se colocasse os sapatos e ficasse de pé na porta, suas pernas se recusavam a dar um único passo para fora. Começava a chorar como uma criança fazendo birra. Um conselheiro ia visitá-la uma vez por mês, mas, até agora, não havia sinais de melhora.

"Sua mãe... Você sente raiva dela por isso?"

"Eu costumava sentir," Sakuta admitiu.

"Achava que era o dever dela nos ajudar, acreditar em Kaede e em mim."

Mas, vivendo longe dela, ele passou a enxergar algumas coisas. Percebeu o quanto de trabalho ela realizava em casa todos os dias: cozinhando, lavando roupas, limpando o banheiro, resolvendo todo tipo de problema. E, quando moravam todos juntos, Sakuta tomava tudo isso como algo normal.

Depois que teve de fazer tudo sozinho, ele começou a notar certas coisas, a mudar certos hábitos. Especificamente, ele agora se sentava para urinar.

Ele sabia, com certeza, que sua mãe aguentava muita coisa. Com certeza havia coisas que ela gostaria que o resto da família tivesse mais consciência. Mas ela nunca disse uma palavra de reclamação na frente de Sakuta. Nunca deixou transparecer no rosto. Nunca exigiu que ninguém lhe agradecesse.

E Sakuta começou a sentir que não tinha o direito de guardar rancor dela, considerando tudo pelo que tinha a agradecer. Ao longo do último ano, esses sentimentos só cresceram.

O mesmo valia para seu pai. Eles se encontravam uma vez por mês para trocar notícias. Seu pai cuidava da esposa e ainda provia o suficiente para que Sakuta e Kaede vivessem sozinhos. Por mais turnos que Sakuta fizesse no restaurante, ele nunca ganharia o suficiente para pagar o aluguel do apartamento em que moravam. Sakuta tinha que admitir que não era capaz de sustentar sua vida atual apenas com seus próprios recursos.

"Cuidar da Kaede me ensinou que sou apenas uma criança, e que ser adulto não significa que você pode resolver tudo. Bem óbvio, eu sei."

"Uau... isso é bem perspicaz."

"Você acha mesmo que sou um idiota."

"Nem tanto. A maioria dos nossos colegas ainda não percebeu isso."

"É só porque ainda não tiveram oportunidade. Todo mundo vai entender quando for forçado a encarar os fatos."

"Então, aonde quer chegar com isso?" Mai perguntou, olhando para as janelas. O oceano logo surgiria à vista.

Ele lembrou da pergunta original dela. Por que insistia em se envolver? Foi assim que essa conversa começou.

"Houve uma pessoa que me ouviu sobre a Síndrome da Adolescência de Kaede."
Se não fosse por isso, Sakuta tinha certeza de que nunca teria superado a situação. Ele aprendeu algumas lições duras.

Estar sozinho não era a pior coisa do mundo. Estar verdadeiramente sozinho era muito, muito pior. Essa era uma verdade que todos conheciam, no fundo. E o medo profundo disso levava a regras como ‘responder mensagens imediatamente’ ou ‘nunca deixar uma mensagem sem ler’. Sem perceber que essas regras viravam laços apertados em torno do pescoço das pessoas, isso simplesmente levava a serem permanentemente excluídas.

"Encontrei alguém que acreditou em mim." Era doloroso lembrar dela. Ele se via mordendo o lábio cada vez que recordava seu nome.

"Uma garota?" perguntou Mai.

"Hã?" Sakuta se sobressaltou. Ela estava certa. O olhar frio de Mai era realmente inquietante.

"Eu vi isso no seu rosto," ela disse, claramente descontente.

O trem parou na Estação da Escola Secundária de Kamakura. A próxima parada era Shichirigahama, onde normalmente desciam. Assim que as portas se abriram, Mai se levantou.

"Vamos," ela ordenou.

O destino do encontro deles era a última parada da linha. Ainda tinham uma viagem de quinze minutos pela frente.

"Não vamos até Kamakura propriamente dita?" ele perguntou. Mai já estava fora do trem.

"Ah, espera." Ele correu atrás.

As portas se fecharam um segundo depois, e o trem partiu lentamente. Eles assistiram até que o trem saísse de vista, e então Mai voltou o olhar para a costa.

Essa estação ficava bem na beira da água. Tecnicamente, em uma colina acima dela. Não havia nada obstruindo a vista. Você podia simplesmente ficar na plataforma esperando o trem e ter a vista só para si.

Era o tipo de local usado em filmes o tempo todo. Sakuta tinha certeza de que algo já fora gravado ali, ele definitivamente vira equipes de filmagem na praia.

"Como você estava noventa e oito minutos atrasado, já é fim de tarde," explicou Mai.

O sol estava baixo sobre Enoshima, e o céu começava a ficar avermelhado.

"Vamos caminhar." Ela apontou para a água e saiu da estação sem esperar por uma resposta.

Sakuta riu disso, mas a seguiu feliz. Do lado de fora da estação, Sakuta e Mai tiveram que esperar uma eternidade para o semáforo abrir e atravessarem a Rota 134. Do outro lado, havia uma escadaria de vinte degraus que levava à praia de Shichirigahama.

Mantendo Enoshima às suas costas, eles caminharam em direção a Kamakura. A areia puxava seus pés, dificultando a caminhada.

"Você sabia que, apesar do nome, Shichirigahama nem chega perto de ter sete ri de extensão?"

"Um ri tem cerca de quatro quilômetros, mas essa praia nem tem dois."

Era uma diferença bem distante da exagerada estimativa que o nome indicava.

"Que chato," disse Mai. Talvez ela tivesse querendo ser a primeira a contar isso.

"A praia de Kujukuri, em Chiba, também não tem noventa e nove ri."

"Você sabe muitas coisas inúteis," ela comentou, parecendo muito entediada.

"Você que tocou no assunto!"

"Então, como ela era?"

"Hm?" Ele fingiu não entender.

"A maluca que acreditou nas suas besteiras."

"Está com ciúmes?"

"Qual é o nome dela?"

"Você está com ciúmes."

"Fala logo!" Provocá-la ainda mais claramente só a deixaria irritada.

"O nome dela era Shouko Makinohara," disse Sakuta, ouvindo o som das ondas.

"Ela tinha um metro e sessenta. Menor que você em todos os aspectos. Não sei quanto ela pesava."

"Se soubesse, eu ia querer saber por quê."

"Ela me ouvia com atenção, mas nunca mudava o jeito de agir ou demonstrava pena de mim."

"Hmm." Mai havia perguntado, mas agora parecia não se importar.

"A única outra característica dela era o uniforme do Colégio Minegahara."

"......" Só então ela olhou para ele.

"Você se matriculou aqui para ir atrás dela?"

"Com tudo o que aconteceu com a Kaede, ficar onde estávamos era muito difícil, esse foi o fator decisivo. Pensamos em ir para um lugar ainda mais distante, mas a informação se espalha online, não importa para onde vá, então achamos que a distância realmente não faria diferença. Mas, bem...o motivo pelo qual escolhi esta escola foi basicamente o que você disse."

Ele preferiu admitir. Depois de tudo o que já tinha revelado, não fazia sentido esconder isso.

"Mas ela te rejeitou," Mai disse, parecendo se divertir com o infortúnio dele.

"O resultado foi o mesmo, mas... Eu nunca cheguei a convidá-la para sair."

"Mesmo tendo escolhido a escola dela?"

Havia um olhar acusador nos olhos dela, como se estivesse dizendo: "Qual foi o sentido de vir para o Colégio Minegahara, então?"

"Ela não estava aqui."

Ele pegou uma pedra da praia e a lançou no oceano. Sentia que aquele era o mesmo lugar onde tinha se livrado do celular.

"Ela se formou?"

"Eu estava no terceiro ano do ensino fundamental quando nos conhecemos. Ela disse que estava no segundo ano do ensino médio, então duvido que seja isso."

"Então ela se transferiu?"

"Isso teria sido preferível."

"Então foi outra coisa?"

"Percorri todas as turmas do terceiro ano, perguntando aos alunos."

"E?" Sakuta balançou a cabeça.

"Ninguém jamais tinha ouvido falar de uma estudante chamada Shouko Makinohara."

"......" Mai parecia incerta sobre como reagir a isso.

"Verifiquei as listas de classe da escola toda, pensei que ela poderia ter repetido um ano... até passei pelos anuários dos últimos três anos."

Mas ele não encontrou nenhum sinal dela. Não havia registros de qualquer Shouko Makinohara que tivesse estudado no Colégio Minegahara.

"Eu também não sei o que isso significa. Tudo o que sei é que conheci alguém chamada Shouko Makinohara, e ela estava lá para mim quando eu precisei dela."

"Entendo."

"E como não posso retribuir isso para ela... talvez eu esteja tentando ajudar você em seu lugar."

Sozinho, a ansiedade nunca desapareceria. Apenas ter alguém ao seu lado já poderia ser o suficiente para te fazer passar por isso. Essa foi a experiência de Sakuta dois anos atrás.

"Além disso, eu estou curioso."

"Sobre o quê?"

"Por que a síndrome da adolescência acontece? Se eu conseguisse desvendar isso..." Sua mão tocou o peito.

"As cicatrizes incomodam você?"

"Um pouco, sim."

O verão estava chegando, e as aulas de natação iam ser difíceis. Se houvesse uma maneira de se livrar das cicatrizes, ele adoraria saber como.

"E se pudermos descobrir, talvez eu consiga ajudar Kaede."

"É verdade."

Seria uma tragédia se ela nunca pudesse sair de casa novamente. Um desperdício passar o resto da vida lendo e brincando com o gato deles. Sakuta queria trazer Kaede para essa praia algum dia. Mas para isso, ele precisava aprender mais sobre  a síndrome da adolescência  e encontrar uma maneira de aplicar esse conhecimento ao caso dela. Esse foi o verdadeiro motivo pelo qual ele se interessou por Mai...

Não precisava dizer em voz alta. Um olhar para o sorriso no rosto dela tornava claro que ela havia entendido.
Sakuta pegou outra pedra e a lançou na água. Ela descreveu um arco no ar e afundou com um "ploc".

"Ei." Ele esperou em silêncio pela próxima pergunta dela.

"Você ainda está apaixonado por ela?"

Ele não podia confirmar nem negar. Tudo o que podia fazer era cobrir isso com um sorriso.

"Você está apaixonado por Shouko Makinohara?" Mai perguntou.

Mais uma vez, ele refletiu sobre isso. Ele ainda a amava? Talvez estivesse evitando essa pergunta o tempo todo. Ele amava Shouko Makinohara?

Houve uma época em que o simples pensamento nela fazia dores agudas atravessarem seu peito. Se ele ficasse pensando nela, a angústia dentro dele ficava tão forte que ele não conseguia dormir. Mas um ano havia passado. Não era mais assim.

Talvez ele já tivesse encontrado sua resposta há muito tempo e apenas estivesse evitando colocar seus sentimentos em palavras. Talvez fosse a hora de dizer.

"Eu realmente a amei."

Ele deixou as palavras flutuarem em direção ao oceano. Só isso já parecia tirar um enorme peso de seu peito. Sem que houvesse um gatilho específico, o tempo transformou seus sentimentos em lembranças. Mas uma cicatriz havia se formado na ferida de seu coração partido, e, antes que percebesse, ela também havia se desfeito. Era simplesmente assim que os seres humanos seguiam com suas vidas.

"Se você vai dizer isso, devia falar mais alto."

"Sinto que você nunca me deixaria esquecer disso."

"Eu poderia filmar para você," Mai ofereceu, levantando o celular.

"Vamos! Diga de novo!" Ele achou que percebeu uma pontada de irritação no tom dela.

"Você está, tipo, realmente brava?"

"Hã? Por que eu estaria?"

Ela estava definitivamente furiosa. Sua irritação era óbvia. Havia um olhar afiado nela, e Sakuta sentia isso o perfurando.

"É por isso que estou perguntando..."

"Quem ficaria feliz em ter seu encontro interrompido por uma declaração de amor por outra garota?"

"Eu usei o tempo passado! Detalhe importante!"

"Hmph."

Mai realmente não parecia convencida. Isso poderia demorar um pouco para passar. Mas enquanto Sakuta pensava em uma abordagem...

"O mar!" uma voz alegre chamou.

Eles olharam para cima e viram um casal parado nas escadas para a praia. O homem tinha cabelo encaracolado e um grande par de fones de ouvido ao redor do pescoço. A mulher era menor, com óculos. Quando seu namorado correu animado em direção à água, ela o observou, chateada. Seus saltos estavam afundando na areia, e ela não estava fazendo muito progresso.

Pareciam alguns anos mais velhos que Mai e Sakuta. Provavelmente estudantes universitários. Ao ver a dificuldade dela, o namorado correu de volta em sua direção.

"N-não, não faça isso!" ela gritou.

Mai observava o casal na água, refletindo sobre seus próprios sentimentos em relação a Sakuta e ao reencontro iminente com sua mãe. O casal de universitários agia de forma tão natural, expressando afeto de um jeito despreocupado, mas ainda assim significativo. Quando Mai olhou para Sakuta, ele comentou brincando que estava "tão frio," tentando uma desculpa para algo mais. Ela revirou os olhos, decidida a não ceder à provocação.

À medida que o casal se afastava de mãos dadas, Sakuta notou um leve sorriso no rosto de Mai e murmurou algo como “Parece bom, né?”.

Ela respondeu com um  “É...,” quase sem perceber que havia falado em voz alta.

Ele então se ofereceu para segurar sua mão. Apesar do tom descontraído, havia um gesto sincero na oferta, mas Mai simplesmente entregou a ele seu celular.

Sakuta ficou confuso, até que notou que a tela do celular mostrava um e-mail que Mai enviara à sua mãe. O conteúdo do e-mail o surpreendeu: era um pedido de encontro à beira-mar, marcado para hoje às 17h. Ele olhou para ela, percebendo a tensão em seu rosto, e perguntou se ela realmente pretendia encontrá-la. Ela suspirou e admitiu que não queria, mas sabia que precisava resolver essa pendência.

Mai e sua mãe haviam se afastado desde uma briga sobre um livro de fotos lançado quando ela ainda estava no ensino fundamental. Sakuta, compreendendo a relutância dela, ofereceu uma perspectiva: ele acreditava fortemente que as pessoas não deveriam fazer coisas que não queriam, a menos que fosse algo inevitável. E, neste caso, Mai parecia entender que ignorar essa situação não ajudaria em nada.

Sabendo que o encontro era inevitável, Sakuta apoiava Mai em seu próprio jeito, oferecendo-se para segurar a mão dela e estar lá para o que viesse.

Mai ficou parada, derrotada, os ombros caídos e os braços ao lado do corpo. Sakuta observava à distância, sentindo um frio na espinha ao ver a cena desoladora diante dele. Ele entendia o que estava acontecendo: de alguma forma, Mai se tornará invisível para sua própria mãe, uma manifestação dolorosa e surreal da síndrome da adolescência.

Ele resistiu ao impulso de correr até ela, lembrando-se das instruções de Mai para manter distância. Mas ao ver sua expressão de desespero enquanto sua mãe seguia em frente sem ao menos percebê-la, ele se sentiu impotente e aflito. Parecia que o mundo inteiro a estava ignorando.

Depois que sua mãe se afastou, Mai permaneceu imóvel, como se não conseguisse absorver o que acabara de acontecer. A praia, normalmente cheia de vida e movimento, parecia agora um lugar solitário e frio. Sakuta sentiu uma necessidade urgente de reconfortá-la.

Finalmente, ele se levantou e foi até onde ela estava. Quando chegou perto, ele chamou seu nome, baixinho, mas firme.

"Mai."

Ela se virou lentamente, os olhos perdidos e vazios. Ao ver Sakuta, uma sombra de alívio passou por seu rosto. Parecia que ela estava prestes a desmoronar, mas ele estendeu a mão, e ela a segurou, como se aquilo fosse a única âncora que a mantinha ali.

“Ela não pode me ver, Sakuta,” disse ela, a voz trêmula.

"Eu posso," ele respondeu, apertando sua mão levemente.

"Eu estou aqui com você."

Aquele simples ato de segurar sua mão parecia dar a ela algum consolo. Estavam sozinhos na praia, mas, ao menos, estavam juntos.

 

 

 

 

 

Sakuta encontrou-se caminhando diretamente em direção a Mai e sua mãe. Quando estava a cerca de dez metros, a mulher o avistou. Quando se aproximou mais, a cerca de cinco metros, ela pareceu ter certeza.

“Foi você?” perguntou, com um tom irritado que lembrava Mai, deixando Sakuta um tanto desconcertado.

“Por que me chamou para um lugar como este? Quem é você? Parece estar no ensino médio, mas não me lembro de termos nos conhecido.”

As perguntas continuaram surgindo em rápida sucessão.

“Sou Sakuta Azusagawa. Sim, estou no ensino médio. Aquele ali.”

Ele acenou na direção da Minegahara High, que ficava ao longo da Rota 134.

“E o que você quer comigo, Sakuta Azusagawa? Sou uma mulher muito ocupada.”

“Não sou eu quem quer algo de você.”

Ele trocou um olhar com Mai, que estava atrás de sua mãe. Ela hesitou por um momento, mas logo assentiu devagar. Parecia que ela já esperava que algo assim pudesse acontecer e trouxe Sakuta como uma espécie de preparação para o pior. Usar o “encontro” como isca.

“Então, quem quer?”  perguntou a mãe, de forma estranha.

“Mai. Você já sabe disso, certo?”

Ela estava ali porque havia lido o e-mail. Esse fato não mudava, mesmo que ela não pudesse ver Mai. A mãe de Mai o avaliou com um olhar crítico.

“Quem me chamou aqui? Diga isso novamente.”

“Mai.”

“Certo.”

“Sim.”

O vento soprou, bagunçando o cabelo da mulher, que o afastou do rosto com um gesto rápido.

“Quem é essa?’  perguntou.

“?!” Os olhos de Mai se arregalaram, misturando choque e horror. Que tipo de mãe falava desse jeito?

“Ela é sua filha!”  gritou Sakuta, deixando-se levar pelas emoções. Eles podiam estar sem se falar, mas esse tipo de comportamento era inaceitável para uma mãe.

“Eu não tenho uma filha. Você acha que isso é algum tipo de piada?”

“E você acha?!” Quanto mais exaltado Sakuta ficava, mais fria a mãe de Mai parecia.

“Do que isso se trata? Você quer que eu seja sua empresária ou algo assim?”

“Claro que não! O que você...?!”

Ele olhou diretamente nos olhos dela, e as palavras morreram em seus lábios. Havia um olhar de pena ali. Finalmente, ele percebeu que o “Quem é essa?” havia sido uma pergunta genuína. Ela realmente não fazia ideia de quem era Mai Sakurajima.

Os olhos daquela mulher mostravam que ela não estava mentindo.

“Certo, o e-mail! Você recebeu um e-mail da Mai dizendo que se encontrariam aqui?”

“Se eu mostrar isso a você, isso acaba com essa farsa?”  Ela tirou o celular da bolsa e o mostrou a Sakuta.

“...Por quê?”  perguntou Mai, inclinando-se para olhar. Naturalmente, sua mãe não podia ouvi-la ou vê-la.

O corpo do e-mail era o mesmo que Mai havia mostrado a Sakuta minutos antes:
"Venha para a praia de Shichirigahama às 17h no dia 25 de maio (domingo)."

E o campo remetente dizia “Mai”. Nada parecia fora do normal. No entanto, sua mãe disse:

“Remetente desconhecido. Mas adicionei ao meu calendário e lembro-me de ter ajustado minha agenda para estar aqui. Não faço ideia do porquê.”

Sakuta estava tão confuso quanto ela. Apesar de o e-mail claramente dizer “Mai”, parecia que a mãe dela nem sequer via o nome.

Pelo que ela acabara de dizer, ficava evidente que, ao receber o e-mail três dias antes, ela sabia que era de sua filha. Foi por isso que ajustou sua agenda e veio até ali. Mas, antes do dia combinado, ela havia esquecido completamente de Mai. Não era apenas uma questão de não vê-la ou ouvi-la, ela não se lembrava de sua existência.

Era difícil acreditar, mas era a única explicação para seu comportamento.

“Isso é mesmo possível?!”  As palavras escaparam de seus lábios, sua voz carregando um tom oco e assustador até para ele próprio.

“Eu não posso simplesmente aceitar isso!”  Ele expressou sua frustração diretamente à mãe de Mai.

“Certamente, uma maneira interessante de se vender, mas um pouco exagerada para mim. Aprenda um pouco mais sobre o mundo antes de tentar novamente.”

Dizendo isso, ela se virou e começou a ir embora.

“Você é a mãe dela!” gritou Sakuta, sua indignação crescendo.

“......” Ela não olhou para trás. Seu passo permaneceu firme, sem hesitar sequer uma vez.

“Como você pode esquecer sua própria filha?”  gritou Sakuta, indignado.

“...Já chega” — disse Mai suavemente.

“Mas ela...!”

“Chega.”

“Não terminamos aqui!”  rugiu Sakuta, incapaz de se conter.

“......Por favor. Não mais” implorou Mai, com a voz trêmula, como se estivesse prestes a chorar.

Um arrepio percorreu o corpo de Sakuta. Ele percebeu que estava apenas tornando tudo ainda pior para ela.

“Me desculpe” disse ele, sinceramente.

“......”

“Sinto muito mesmo.”

“......Não, tudo bem.”

“......”

O que estava acontecendo com Mai?

Desde o início, Sakuta achava que o problema era apenas o fato de ela não ser vista nem ouvida. Ele havia presumido isso. Provavelmente, Mai também.

Mas agora parecia que ambos estavam muito enganados. Nenhum deles havia compreendido a verdadeira extensão do que estava acontecendo.

Não era apenas que sua mãe não podia vê-la ou ouvir sua voz... Ela havia esquecido completamente que Mai alguma vez existiu.

“......” Quanto mais ele pensava nisso, mais terrível parecia.

“Sakuta”  chamou Mai, com os olhos tremendo de ansiedade.

Ele sabia que ela estava preocupada com a mesma coisa.

Sua mãe podia não ser a única. Talvez todos os outros também tivessem esquecido dela.

Quando isso começou? Talvez no momento em que as pessoas pararam de vê-la. Talvez antes disso.

Se ela realmente estava desaparecendo das memórias das pessoas...

Infelizmente, não demoraria muito para que confirmassem que era exatamente isso que estava acontecendo.

Sakuta e Mai seguiram pela praia até a estação que usavam para ir à escola. Nenhum dos dois sugeriu isso em voz alta; seus pés apenas os levaram naturalmente pelo caminho de sempre para casa.

No trajeto, Sakuta abordou turistas de meia-idade, crianças locais e avós, fazendo a mesma pergunta repetidas vezes:

“Você conhece Mai Sakurajima?” Mas, todas as vezes, a resposta foi a mesma:

“Nunca ouvi falar.” Nenhuma pessoa sabia quem ela era. Nenhuma conseguia vê-la.

Parte de Sakuta ainda nutria uma esperança irracional. Ele queria acreditar que tinham apenas encontrado uma sequência de pessoas que, por coincidência, não a conheciam. Mas essa esperança logo se dissipou.

Ao chegarem à estação Fujisawa, Sakuta usou um telefone público para ligar para a repórter Fumika Nanjou. Ele ficou aliviado por ter guardado o cartão de visita dela no bolso.

“Alô?” atendeu ela, com um tom profissional.

“Aqui é Sakuta Azusagawa.”

“Oh!”A voz dela imediatamente ganhou um tom mais animado.

“Uma ligação sua? Hoje é especial.”

“Não é nada disso.”

“Nenhum interesse em um relacionamento arriscado com uma mulher mais velha? Eu adoro brincar com fogo.”

“Você é um pouco velha demais para mim.”

“O que você quer, então?” Ela sabia ignorar bem qualquer coisa que não fosse a seu favor.

“É sobre Mai Sakurajima.”

“De onde isso saiu?” Oh, pensou Sakuta. Isso soou promissor.

Mas as palavras seguintes dela destruíram imediatamente qualquer esperança:

“E quem seria essa?”

“......”

“Alô?”

“Você nunca ouviu falar de Mai Sakurajima?” Ele tentou mais uma vez.

“Nunca! Quem é ela?”

“Então... a foto...?”

Uma foto das cicatrizes em seu peito fazia parte do acordo deles. Fumika ainda a tinha e prometera a Mai que não a tornaria pública em troca dos direitos exclusivos para cobrir o retorno dela ao trabalho.

“Eu prometi não usar, certo? Eu me lembro. Cumpro minhas promessas.”

“Para quem você prometeu?”

“Para você, obviamente. O que está acontecendo? Você está bem?”

Ela parecia metade preocupada, metade curiosa. Sakuta decidiu que era melhor não falar mais. Não queria que ela suspeitasse de nada.

“Estou bem. Desculpe, só fiquei preocupado com a foto... Acho que não estava fazendo sentido.”

“Confie em mim!”

“Desculpe se interrompi algo. Obrigado.”

Ele desligou antes que a conversa pudesse se aprofundar.

Após colocar o telefone de volta no gancho, Sakuta continuou segurando-o por um longo tempo. Então, virou-se lentamente, encontrou o olhar de Mai e balançou a cabeça.

Ela parecia não ter alimentado nenhuma esperança contrária. Apenas assentiu, sem qualquer emoção no rosto.

“Obrigada por hoje”  disse, virando-se para ir embora.

Sem hesitação. Sem indecisão. Apenas caminhou na direção de casa, com o mesmo andar confiante de sempre.

Sakuta a observou, sentindo o coração apertar. Uma onda de pânico tomou conta dele. Ele estava com medo de nunca mais vê-la novamente.

Seu corpo agiu por conta própria.

“Mai, espere.”

Ele correu atrás dela e segurou seu pulso. Ela parou, mas não se virou. Apenas continuou olhando para o chão à sua frente.

“Vamos juntos.”

“......” Mai ergueu a cabeça levemente.

“Ir para onde?”

“Talvez ainda exista alguém por aí que se lembre de você.

“Você fala como se todo mundo, menos você, tivesse me esquecido.”  disse Mai, soltando uma risada forçada.

“......”

Sakuta não negou. Não podia. Aquela era a única explicação possível. E Mai estava pensando o mesmo. Caso contrário, ela não teria dito aquilo.

Mas ele queria acreditar.

Acreditar que, se fossem longe o bastante, todos a reconheceriam, a veriam, apontariam e diriam: “Não é Mai Sakurajima?” Ele queria acreditar que ainda havia uma chance.

“Vamos confirmar.”

“Qual é o sentido disso? E se descobrirmos que você é o único que ainda se lembra de mim? Que diferença isso faria?”

“Então, pelo menos, eu estarei com você até descobrirmos.”

“?!”

Não havia como ela não estar com medo. Isso era impossível. O medo devia estar esmagando-a. Ela mal entendia o que estava acontecendo e, com certeza, não fazia ideia do porquê. Não havia como prever o que o amanhã traria, e ir para casa sozinha, sem ninguém esperando por ela, seria nada menos que aterrorizante.

Ele viu os ombros dela tremendo. Aquilo era prova suficiente.

“...Que presunçoso da sua parte.”  disse ela.

“E é um encontro.”

“Eu sou um ano mais velha que você, sabia?”

“Desculpe.”

“Minha mão está doendo. Solte.”

Sakuta percebeu que estava apertando o pulso dela com força demais. Ele a soltou imediatamente.

“Desculpe.”

“Só pedir desculpa não resolve.”

“Desculpe.” E, com isso, os dois ficaram em silêncio.

Um minuto inteiro se passou sem que dissessem mais uma palavra.

“...Tudo bem”  sussurrou Mai, por fim.

“Hmm?”

“Se você não quer me deixar ir para casa ainda, então eu deixo você continuar com esse encontro.”

Mai ergueu o olhar e, com um sorriso travesso, beliscou o nariz de Sakuta. Em algum momento, ela havia parado de tremer.

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