Volume 1

Capítulo 45: A TÍTULO DE INTERESSE

Pelydryn se lançou aos céus, sua viagem aérea causando estrondos e sons de estática chicoteando o ar.

Um plasma azul lhe envolveu e ele tirou a estranha lança das costas, girando-a compulsivamente e atingindo o chão com ela ao pousar no meio do exército inimigo.

Raios e gavinhas azuis saíram do chão quando isso aconteceu, e atingiram vários num raio de 100 metros.

Ele se ergueu, um sorriso doentio riscando sua face. Girou novamente a haste ao redor de si, rasgando carne e produzindo um estrago incalculável.

Os magos permaneciam longe enquanto gorilas cercavam-no. Ele deu uma cambalhota sobre um gorila e pousou nas suas costas; girou a haste e empurrou-a para trás. Do peito do gorila, a lâmina curvada da haste se projetou. A criatura arregalou os olhos, guinchando.

Pelydryn puxou sua arma e girou-a novamente. Raios percorreram seus braços, tinindo ao encostarem na cota de malha diamantada. Virou um borrão e continuou seu percurso até um grupo de magos que se mantinha longe.

Girou no próprio eixo, tornando-se um tufão roxo diamantado. Girou e girou, com raios estalando ao seu redor e uma catinga de fumaça saindo do solo.

Passou por entre os inimigos cortando-os, tão rápido que nada do que fizessem podia impedir seu movimento giratório.

Parou repentinamente derrapando, sorrindo. Deu um enorme salto e pousou na frente de vários magos, raios saindo de seus dedos como extensões dele. As gavinha passaram por entre os magos, cujos olhos tremularam e subiram.

– E-ele é um monstro... – segregou um deles.

– Sim... vamos, não podemos deixar que ele avance.

– E o que faremos? Somos magos de distância... droga, às vezes queria ter aprendido combate corporal.

– Isso mudaria em quê, exatamente? – Uma voz soou de trás.

Os magos se viraram e um homem de altura mediana e ombros largos deu um passo. Ele era cego de um olho e havia uma cicatriz que cruzava a ponte de seu nariz em horizontal, iniciando abaixo do olho bom e terminando no cego, que era riscado por uma outra cicatriz, em vertical.

Sua cota de malha tiniu quando as juntas se moveram. Um vento uivou e os cabelos negros do homem ondularam. Ele sorriu.

– Closter... não deveria estar babando os ovos do Jimothy? – Disse um mago, a voz carregada de sarcasmo.

Closter não o encarou, mas num movimento rápido, puxou o pomo de adão do mago, que ficou sem entender até o sangue jorrar e seu cérebro reconhecer a dor.

– Tome cuidado com o que fala, pode ser que você não fale nada por um tempo. – Closter sorriu e continuou andando pelo espaço que os magos o deram quando viram a cena. – VAMOS LÁ, ROXINHO! QUE TAL ENFRENTAR ALGUÉM FORTE?!

Sua voz foi carregada até Pelydryn, que cortou um batedor ao meio e girou no eixo, posicionando a haste atrás do braço.

Num instante ele estava ali e, após um forte clarão, apareceu bem na frente de Closter, colidindo com sua haste no martelo que o humano segurava.

Os magos arregalaram os olhos, surpresos.

– Que rapidez absurda... – Disse um deles, olhando do mago que já sangrava até morrer. Ele olhou para os outros. – Vamos embora daqui.

Bateram em retirada.

Pelydryn, por sua vez, franziu a testa.

Ele viu meu ataque? Pensou. Sim! Não só viu como acompanhou... e esse martelo...

Seus olhos examinaram a estranha arma. Era um martelo comum, com cabo de madeira. Sua cabeça era quadrada e cheia de runas azuis numa língua alheia a ele.

Notando a surpresa do vitanti, Closter sorriu, seus dentes tortos e amarelos se projetando.

– Gostou? – Indagou. – É feita de uma rocha do meu reino. Mais resistente que diamante, mais leve que uma pedra-pomes. Esse é o martelo do clã Galileu, da cidade de Falange, em Eskol. Fica ao sul do território do homem, já ouviu falar?

Pelydryn sorriu e riscou o martelo com sua haste, Closter permaneceu firme.

– Temo que não, velho. – O vitanti sorriu. – Mas reconheço a firmeza de sua arma; é interessante que ela tenha sido capaz de resistir ao corte de minha Stilk aqui.

– Ficou admirado, é? – Closter sorriu. – Então vamos de troca justa.

Closter ergueu os braços se livrando do toque de Pelydryn e buscou acertá-lo nas costelas. O vitanti recebeu o ataque enquanto golpeava com seu cotovelo no ombro do humano.

Eles se afastaram, Closter sentindo mais o ataque do que o outro.

Girou o martelo e este sumiu, como num passe de mágica. Pelydryn franziu a sobrancelha, mas seguiu a deixa e prendeu Stilk nas costas.

Closter ergueu os punhos e diminuiu espaço. Tentou acertar o soco direto, mas Pelydryn desviou e se abaixou, girando e dando uma rasteira.

O humano caiu de costas, mas girou ainda caído e se afastou. Pelydryn foi atrás e acertou um soco nas costelas de Closter, que arqueou e suspirou pesadamente.

Sem perder o ritmo, Pelydryn acertou vários golpes, um mais forte que o outro, ao longo da armadura laqueada de Closter. Quando parou, haviam vários amassados na parte da frente e do esterno.

Closter bufou e ergueu as mãos: – Divine Hand: Ao Alcance das Mãos.

Mãos de 3 metros de altura feitas de terra se projetaram, seguindo Pelydryn que salteou entre elas e conjurou relâmpagos entre os dedos, destruindo-as sempre que se aproximavam demais.

Ao passo que o vitanti destruía as mãos, mais e mais apareciam, encurralando-o e impedindo que ele tivesse liberdade entre seus pulos.

Entrementes, Closter se abaixou e pegou algumas pedrinhas no chão, levando-as à boca e pronunciando algumas palavras.

Imediatamente, as pedrinhas tornaram-se translúcidas, emanando luz e calor alaranjados. Closter sorriu e observou onde Pelydryn iria pousar.

O mago arremessou as pedrinhas incandescentes exatamente onde Pelydryn pousou, e isso causou uma explosão de chamas e estilhaços cortantes.

Pelydryn protegeu o rosto com seus braços e uivou, saindo do meio das chamas para o céu numa cortina de fumaça.

Closter, que premeditara tudo, reduziu espaço e apareceu portando seu martelo sobre Pelydryn, que ainda se desvencilhava da fumaça e com o rosto todo preto.

As runas ao longo da cabeça lisa e prata do martelo iluminaram-se. O ar ao redor deles ondulou, era possível ouvi-lo uivando.

Pelydryn abriu um olho, mal enxergando direito.

Closter golpeou seu peito com a parte plana do martelo. Ouviu-se um tinir de aço contra aço. Pelydryn fora lançado para baixo, um rastro de energia sendo deixado para trás.

O vitanti quicou no chão várias vezes, levantando areia e lama. Closter pousou a poucos metros de onde o vitanti caíra por fim.

– HAHAHA! – A voz do mago humano ecoou. – ME CHAMAM CLOSTER GALILEU, O MATADOR DE GIGANTES. TENHA UMA VIDA BOA NO HELL, MOLEQUE FAJUTO.

Closter se virou para ir embora, pensando que tudo estivera acabado. Parou, no entanto.

Se virou para trás, espantado, e foi surpreendido por uma enxurrada de raios que riscaram seu peito, fazendo-o arquear, cuspir sangue e ser lançado longe.

A voz de Pelydryn ecoou de volta.

– Achei que você fosse mais sensato, Closter Galileu. – Pelydryn caminhou lentamente na direção do mago, sem qualquer evidência de que fora atacado, apenas o rosto chamuscado e alguns arranhões na armadura do braço. – Posso ser jovem e imaturo, mas não pensou que derrotaria um General só com isso, pensou?

Quando a poeira baixou, Closter estava arqueado sobre os dois braços e os dois joelhos, vomitando e se tremendo todo.

Pelydryn sorriu doentiamente: – Esse foi apenas um esquenta.



***


Corpos e corpos de batedores, caranguejos e todas as criaturas inimigas despargiam-se ao longo de 10 metros.

Estavam totalmente estilhaçados, os tecidos acima dos ossos caídos como se fossem roupas a serem dobradas.

Os magos corriam na direção oposta dali, espantados e um medo absurdo em seus rostos. Alguns foram interceptados por vitanti com o poder do éter.

– É bom tê-lo conosco, General Saanp. – Disse um vitanti, curvando-se.

Saanp sorriu do mesmo modo divertido de sempre.

– Não é necessária tanta cordialidade, jovem comandante.

– S-sim, senhor. – respondeu o vitanti, corado.

Um vento conhecido uivou e Inseyftal passou por Saanp, acertando um chute no peito de um mago, que caiu e ficou ali mesmo.

– Vamos deixar de conversa fiada, Saanp. O príncipe do éter aguarda grandes feitos de nós.

Resistindo ao charme da mulher, Saanp suspirou, a testa franzindo.

– Creio que você tenha mais o que fazer do que ficar me atazanando, não? – Ele suspirou. – E eu já disse que o senhor Eblomdrude não gosta do termo que lhe fora associado; é pejorativo e enganoso.

Inseyftal girou no próprio eixo, riscando uma linha horizontal invisível com as mãos. As cabeças de três magos próximos caíram.

– Pejorativo e enganoso? – Ela sorriu. – Você então admite que Mael não é tão forte assim? Isso seria um ultraje passivo de condenação, Saanpzinho...

Ele suspirou, virando e acertando um forte golpe no peito de um dos magos. Pegou-o pela nuca empurrando para baixo enquanto levantava o joelho. Ouviu-se apenas o som de crânio estilhaçando.

– Você ao menos se ouve? – Saanp deixou de lado toda felicidade. – Poderia deixar de ser menos arrogante.

A sobrancelha de Inseyftal se ergueu. Ela deu uma cambalhota para trás e, no ar, gesticulou como se estivesse disparando de um arco invisível. Cinco batedores e caranguejos abaixo caíram, sem o menor sinal de terem sido atingidos.

Os dois generais se viraram um para o outro, raiva estampada no rosto.

– Arrogante? E o que você faz com o pobre Pelynzinho?

– É apenas uma competição saudável. – Bufou o vitanti.

Nas costas de cada um, vinha um gorila imenso, as mãos já projetadas para agarrá-los.

Eles passaram um pelo outro, bufando. Éter se formou em seus punhos e acertaram um soco em conjunto em seus atacantes. Um enorme buraco foi feito no abdome de cada gorila, que morreram instantaneamente.

Girando no eixo e ficando um de frente para o outro, bufaram: – Você é um saco!



***


Mael queria acabar com aquilo o mais rápido possível. Agora que os generais haviam chegado ao campo de batalha então, a batalha não se prolongaria mais do que o esperado.

Ignorando todo e qualquer conflito que só o atrasasse, Mael saltou aos céus e conjurou o vento ao redor de si, direcionando sua vontade para o voo. Era algo que tentava poucas vezes, pois tinha... medo de altura.

Era um pouco surpreendente que o melhor piloto de Fênices dentre os vitanti possuísse tal fobia. Mas era o que era. E se tivesse usado de tal regalia antes, talvez pudesse ter salvo Oren.

Mas tudo era baseado no “e se” e em “talvez”. E o talvez, no momento, não era uma ideia muito aceita; tampouco o e se.

Nada acontecia por acaso. Tudo se desenvolvia, se desenrolava, percorria, mesmo que a grosso modo, para um propósito já traçado e definido. Não era o propósito que era modificado, mas o meio. E era nisso que Mael acreditava.

E o causador de um propósito tão amargo era Jimothy Vinice, que pela experiência de Mael, era um grande risco.

Sua viagem aérea rasgou os céus em segundos quando ele chegou na base de um pedestal flutuante, rodeado por guerreiros de diversos aspectos. Haviam homens, orcs, globlins, gorilas. O que ele queria era apenas a cabeça de Jimothy e nada mais.

No pedestal flutuante, Jimothy o encarou com certo gracejo. Ao seu lado, havia um homem de olhos brancos e cabelos negros penteados para trás. Seu nariz era um pouco torto.

Do outro lado estava Pele-pétrea, arrogante como sempre. Mael pensou que ele falaria algo, mas este permaneceu calado. Alguns outros magos cercavam-nos, como uma espécie de escudo.

Com um estrondo, Pelydryn cruzou os céus, seguido por Inseyftal que veio com o uivar do vento e Saanp, que apenas apareceu lá. Permaneceram tão quietos quanto. 

– A guerra, assim como é madrasta dos covardes, é mãe dos corajosos. – Soou a voz de Jimothy. – Quem disse isso foi um romancista do século de cobre, a era dos nômades e reis jubilosos.

Os sons da batalha continuaram, alheios às falas do homem.

– Nós, como corajosos, a trouxemos ao seu quintal, Mael Eblomdrude. A guerra. Agora, para poupar-nos tempo, diga onde está Abwn.

Segundos se passaram entre a fala de Jimothy e a resposta cansada de Mael. Ele estava exausto de tudo isso.

– Que é que faz você pensar que pode algo contra o Neru’dian? – Indagou Mael.

– Ah sim, porque ele é a força absoluta dos vitanti de muitas cores, não é? – Disse, a voz cheia de cinismo. – É apenas meu dever, veja bem, como serviçal, preparar o terreno para seu amo, aquele que trará luz ao mundo.

Mael franziu os olhos levemente.

– O tal xamã, não é? Mas diga-me, como fará para ir contra todas aquelas forças lá fora? Acha mesmo que tem a capacidade necessária para subjugar os homens, ou aos anões e aos elfos? Sem contar nos aasimar e nos dragões... ou quem sabe os asura?

Mael esperava descentralizar o líder, traze-lo para a realidade dura e massiva. E o que dizia não era de todo incorreto. Se com os vitanti eles tiveram tamanha dificuldade, avalie para com as outras raças.

Jimothy, no entanto, reagiu de um modo totalmente contrário do que Mael esperava. Ele começou a gargalhar compulsivamente.

– Para alguém tão viajado, você é bem inocente, Mael Eblomdrude. – Jimothy limpou uma lágrima. – O que lhe contarei é algo que não faz mais diferença se permanece ou não em segredo, já que você morrerá. Mas nós temos um apoiador muito forte e ligado às nossas causas, rapaz. Não pense que tudo é tomado por impulso.

Então era isso. Mael desconfiava... não, ele tinha a certeza de que pra invocar um xamã tinha que ser alguém no mínimo tão poderoso quanto, fosse em poder político, fosse em poder propriamente dito.

– Então esse seu... apoiador misterioso é quem conjurou o tal xamã.

– Conjurou? HAHAHAHAHA. É óbvio que não. Greylous é mais poderoso que qualquer um desses charlatões de hoje em dia. Nunca existiu nem existirá feiticeiro tão poderoso quanto ele. Sua existência transcende a própria vida, vagando pelo limbo, à espera da menor brecha possível. E o meu colaborador, digamos assim, foi alguém que anuviou essa brecha. Mas apenas em espírito meu lorde era muito fraco, ele necessitava de algo mais. Agora, no entanto, é chegada a hora.

Uma verdade lancinante abateu Mael. Era algo que ele vinha tentando a muito tempo ignorar, mas a ideia fervilhava em sua mente, dizendo que esse era o propósito imoral e Jimothy. O propósito cujo para todos os vitanti era uma afronta: lidar com espíritos.

– Então foi para isso que você precisava de Kai.

Jim ergueu as sobrancelhas.

– Sim, digamos que ele serviu ao seu propósito mui...

Antes de poder terminar sua frase, o ar fora rasgado por um barulho estrondoso.

Mael rompeu o ar em segundos, chegando na frente de Jim com sua espada emanando éter e crescendo à medida que ele apertava sua espada.

Jim, Pele-pétrea e todos os outros ergueram os olhos, assustados com tamanha velocidade.

Mael apertou o cabo da espada com tanta força que os nós de seus dedos embranqueceram. Ele desceu a arma sobre a cabeça de Jim, que não reagiria a tempo, e gritou: – Matem a todos!

Assim que sua voz caiu, sua espada também seguiu seu curso, mas ao invés de acertar Jim, Mael mudou a trajetória e arrancou a cabeça de Pele-pétrea, que nem teve tempo de reagir. Em seguida, ele rompeu a barreira da velocidade outra vez, indo de mago em mago e arrancando suas cabeças.

Não restou ninguém no pedestal além dele, Jim e o outro homem com um olhar frio.

– O que fez com esse rapaz viola as leis da vida e da morte, Jim. Não tem noção do pecado mortal em que se encontra agora.

Jimothy gargalhou, quase perdendo a compostura.

– Pecado mortal?! Você acaba de matar um punhado de homens, Mael, diga-me onde está a justiça nisso? Você é tão pecador quanto eu.

– Você é louco!

– Balela! Só fiz o que devia ser feito para salvar meu irmão.

Aquilo atingiu Mael de jeito, que olhou para o homem e de volta para Jim. Havia certa semelhança.

– Se entregue e deixe que a lei dos homens, não a nossa, caia sobre você.

Jimothy semicerrou os olhos, sorrindo amargamente.

– E quanto a estes homens que você matou agora? Não acha que eram dignos o bastante para receberem a lei de sua própria espécie?

Mael piscou, irradiando calma.

– Você não entendeu, Jim. Se optar pela lei dos homens, terá uma morte muito mais rápida do que se preferir permanecer aqui... porque se permanecer, eu te farei em tantos pedaços que você vai desejar estar morto.

– Se é desse jeito, então não há nada que possamos fazer. – Jim se pôs em pose de batalha e lançou um olhar de soslaio ao irmão. – Vamos, Tom, mostre do que é capaz.

Seguindo a deixa de Jim, Tom caminhou até parar ao lado do irmão. De repente, uma energia incolor permeou seus punhos, o ar ao redor ondulando furiosamente.

Isso... isso é éter? Pensou Mael, incrédulo, olhando do rosto frio de Tom para o sorriso desdenhoso de Jim.



Comentários