Volume 5
Capítulo 3: Absoluto Poder Real
Parte 1
— Estou tão irritada! Que diabos, aquele garoto! Aquele estúpido! Pervertido!
Charl rapidamente desceu a rua, avançando com passos irritados.
— Fazer duas garotas tirarem a roupa… na frente de várias outras pessoas— ah, eu não estou dizendo que estaria tudo bem desde que ninguém estivesse vendo!
Seus ombros esbarraram no estudante que caminhava a sua frente, e isso fez com que este caísse para frente.
Ao ver a garota que havia o derrubado, o estudante saiu correndo o mais depressa que suas pernas conseguiam.
Sigmund, que estava sobre a boina de Charl, falou em tom de repreensão.
— Acalme-se, Charl. Se você não controlar seu comportamento, voltará a ser aquela pessoa odiada. Acho que você apenas é incapaz de engolir a ideia do Raishin saindo com outras garotas—
— Vo-vo-vo-você está enganado! Você está entendo tudo completamente errado! Eu não poderia… me importar menos…
Sua voz foi ficando cada vez mais baixa. Ao contrário de suas palavras, mesmo suas orelhas estavam ficando coradas.
— Eu não aguento mais issoooooooo!
Charl pisou no chão com força. Ela estava irritada, envergonhada e já não entendia mais nada.
Será que eles sentiam o perigo? Os estudantes que passavam por ali se afastaram de imediato.
— Espere, Charl… Veja aquilo.
O tom de voz de Sigmund havia mudado. Charl ergueu a cabeça rapidamente.
— …Aquele é o… Magnus?
Do seu lado direito, em uma rua lateral localizada no meio de um bosque. Ali ela viu a figura de dois homens caminhando juntos.
O mais próximo era um estudante que vestia uma máscara prateada. Com aquela aparência excêntrica, não restavam dúvidas de que aquele era mesmo Magnus. O outro homem, que estava um pouco mais distante, era grande e meia cabeça mais alto que Magnus. Ele usava uma roupa muito normal, e não o traje formal com o qual normalmente era visto— aquele era o Diretor.
— Ele está com o Diretor? Parece que eles estão indo para a Exposição.
— Provavelmente… para inspecionar. No entanto, isso não é um pouco estranho? Ele está saindo da Academia, mas com o Magnus, e não com seus seguranças.
— Não consigo identificar os autômatos do Magnus.
— Isso porque ele não pode levá-los para fora da Academia, certo? Mas se for este o caso, então por que ele não está levando nenhum segurança além do Magnus?
— …Charl. Talvez tenha alguma coisa acontecendo na cidade.
— Como o quê?
— Uma batalha.
— ——
— A razão pela qual ele não está levando nenhum segurança é porque eles seriam apenas um obstáculo. Os autômatos de segurança, no caso.
Quando ele disse isso, Charl finalmente se lembrou do que tinha visto na noite anterior.
A marcha dos autômatos que ela vira pela janela. E a anormalidade que ocorrera no corpo de Sigmund.
E se aquilo tivesse sido causado intencionalmente pelas mãos de alguém?
O diretor pode ter descoberto o culpado e seu objetivo.
— Levar o Magnus junto significa que ele será seu poder de ataque. Ouso dizer que— assim que as coisas começarem, ele irá mover seu [Esquadrão]. O [Esquadrão] dele tem um nível totalmente diferente de um bando de seguranças baratos. Ele pode ser capaz de lutar contra essa magia, ou seja, lá o que for.
Charl os seguiu com os olhos até que eles sumissem de vista com um sentimento indescritível.
Seu pressentimento estava dizendo… que algo inacreditavelmente perigoso estava prestes a acontecer.
— De todo modo, vamos voltar. O Magnus está ligado ao Raishin, então temos que dizer a ele— por que eu tenho que contar isso para aquele garoto!?
Charl deliberadamente perdeu a paciência e voltou a andar com passos irritados.
Os alunos abriam caminho, enquanto ela passava, sem que ninguém precisasse pedir. Sigmund suspirou e olhou para o céu.
— …A aparência do céu me diz que vai chover.
Nuvens negras surgiam no horizonte, como se embrulhassem o céu claro a medida em que se aproximavam.
Parte 2
Ionela, pasma, olhou para a sombra gigante do navio de guerra flutuando a distância.
Ele se erguia lentamente. Já estava mais alto que a maioria dos prédios vizinhos.
O navio se virou e apontou sua proa na direção de Ionela. Um longo cilindro surgiu gradualmente do enorme corpo de ferro. Um canhão de 20 cm de calibre, a principal arma do Daedalus.
A voz clara de Eva ainda ressoava.
Seus pensamentos giravam. O discernimento da afiada e aparentemente confusa Ionela já tinha a levado a compreender o que Edmund havia feito. No entanto, sem querer aceitar a realidade, ela perguntou assim mesmo.
— Sua Alteza… o que… você fez…?
— O quê, você pergunta. Diga-me, qual foi o circuito mágico que você instalou em Eva?
— …Absoluto Poder Real.
— Eu fiquei bastante surpreso quando você trouxe esse plano.
Edmund sacudiu os ombros enquanto ria. Ele então olhou para o general, os soldados e Radcliffe, nessa ordem.
— Não importa quem eu consultasse, todos sempre diziam a mesma coisa: “É impossível”. Normalmente, magia que causa um efeito direto no oponente não é utilizada— isso para não dizer que “é impossível assumir o controle de um autômato hostil”, como todos disseram. Você sabe por qual motivo, General?
— Devido ao fato disso desrespeitar o Princípio da Dissonância da Atividade Mágica, certo?
— Correto. Duas magias não podem coexistir em um mesmo corpo— uma intervenção direta através de magia seria facilmente compensada pela magia do oponente. A magia gerada interiormente tem prioridade sobre a magia invadindo por fora— bom, essa é a razão natural.
A marionete do oponente não pode ser queimada diretamente com magia. Então você acende as chamas.
A marionete do oponente não pode ser congelada com magia. Então você reduz a temperatura.
Esse era o senso comum e o pensamento natural nas batalhas de máquinas.
A pesquisa de Ionela derrubou esse senso comum.
— Todos riram da sua pesquisa— e é por isso que eu aposto em você.
Os olhos negros de Edmund brilharam. Ionela começou a tremer e afastou seu olhar da direção de Edmund.
Arrependimento dominava todo o seu corpo.
Será que cometi um erro que não pode ser desfeito…?
— Mas, Sua Alteza… Sua Alteza elogiou minha ideia!
— Sim, você mesma disse isso. “Eu quero acabar com as disputas, deter guerras, e desarmar os oponentes— Eu quero acabar com o poder dos oponentes sem precisar matá-los”.
— Isso mesmo!
— E eu concordei com você. Eu a elogiei. Porque este também é meu ideal. Se eu puder vencer sem lutar, então eu serei o rei do mundo sem precisar me sujar com uma gota de sangue sequer.
Os joelhos de Ionela perderam a força. Ela estava prestes a desabar no chão.
— Sua pesquisa é maravilhosa. Mas não pode ser usada porque você demonstra resistência? Se é o caso, então você não deveria demonstrar resistência. Eu a forçarei a ceder através do meu poder esmagador— do jeito que eu realmente gosto.
Edmund abraçou Eva e sussurrou.
— E agora, com o poder mágico de controlar qualquer marionete, eu posso controlar a Cidade das Máquinas.
Como se para confirmar as palavras dele, um tumulto ocorreu na praça abaixo.
Autômatos estavam se reunindo na praça, chegando um após o outro.
De duras bonecas mecânicas a criaturas vivas. Gigantes e fadas, anjos e demônios. Havia uma grande variedade de autômatos. Não apenas aqueles ofertados para venda, mas também aqueles que não estavam sendo vendidos. As mercadorias em exposição, das quais todos os países ali representados tanto se orgulhavam, estavam todas reunidas no centro da Autômato Expo.
Marionetistas, mercadores e guardas estavam desesperadamente tentando parar os autômatos.
No entanto, aquilo era inútil. Eles não estavam mais sob seu controle.
Edmund calmamente se apoiou na cadeira e olhou para o General ao seu lado.
— O que você acha, General? Você tomou sua decisão?
— …Você fez isso de maneira bastante vistosa. Já se esqueceu? Esta é Liverpool, a Cidade das Máquinas, a cidade onde está localizada a Academia Real Walpurgis de Maquinagem— em resumo, uma fortaleza.
— Você realmente é um covarde, hein.
Ele riu do General e lançou a ele um olhar de soslaio, cheio de compostura.
— Estou prestes a conquistar o mundo, sabia? Se isso funcionar aqui, então funcionará também em qualquer parte do mundo. Além disso, fazer o que eu bem entender no lugar onde o tal do Rutherford mora… você não diria que é divertido?
— Você será desprezado pelos marionetistas da Academia. No pior dos cenários, vo—
— Fique quieto. Fazer as coisas assim é a melhor opção. Isso porque eu sou o melhor.
Edmundo sorriu com fascínio. Naquele momento, os joelhos de Ionela estavam prestes a ceder. Ela acabou sendo parte daquela situação terrível. Este fato estava prestes a roubar completamente sua energia.
— …Pare.
— Ó. Você gostaria de dizer alguma coisa, Professora Eliade?
— Por favor pare, Sua Alteza! Pare a Eva! Nesse ritmo, a cidade estará em perigo— e problemas internacionais— e guerras irão começar a acontecer imediatamente!
— É isso mesmo que eu quero, então e daí?
— Você realmente está… pensando a respeito de uma invasão global… sobre algo assim tão estúpido!? Você realmente vai usar minha Eva para—
— Você é uma gênia, mas também uma idiota. Você realmente acredita que poderia deter guerras criando algo assim? Se é o caso, então você é a monarca dos idiotas mais estúpidos.
Ionela finalmente compreendeu.
Ela apressou demais sua pesquisa.
Ela acabou recebendo fundos, mas não conseguiu determinar as ambições da outra parte. Além disso, ela confiou o teste de Eva a essa outra parte.
— Agora, vamos decidir o seu destino.
Ionela abaixou a cabeça e olhou para os próprios pés.
Sua visão estava borrada devido a suas lágrimas. O chão ficou embaçado, as lágrimas estavam prestes a cair.
Ionela gritou, afastando as lágrimas dos olhos.
— Nãããão!
— Hum… mulher estúpida. Mas eu gostei desse grau de estupidez. Para expressar o meu respeito, serão as mãos de Eva a lidar com você. Eu sou gentil, não sou?
A natureza brutal de Edmund surgia através de seus olhos negros. Ele moveu a mão como se estivesse agitando o bastão de um maestro, e Eva, que recebeu a vontade de seu mestre, se aproximou de Ionela.
E lentamente, lentamente, estendeu as mãos.
Ionela olhou para Eva e, dessa vez, sem aguentar, derramou lágrimas.
Ela se lembrou do sorriso de Eva, das palavras e dos dias que passaram juntas.
O autômato que ela fez.
As pequenas peças que ela montou uma a uma.
Ela a ensinou a falar, a ensinou músicas, a ensinou a cozinhar, e a ensinou magia.
Sinto muito… Eva… isso é tudo…!
Ela fechou os olhos, sentindo-se uma mártir. Quando as mãos de Eva tocaram o pescoço de Ionela e tentaram esmagá-lo—
Algo surgiu na varanda do lado de fora, emitindo um som chamativo.
Quando ela abriu os olhos, surpreendida, Eva tinha sido golpeada por aquela coisa, e por isso tinha parado de cantar.
— …Quem é você?
Ele— Akabane Raishin, descuidadamente respondeu à pergunta de Edmund.
— O monarca dos idiotas mais estúpidos.
Parte 3
Notando que algo estava errado, ele escalou a parede externa, mas…
No momento em que conseguiu entrar, Raishin já tinha se arrependido.
Ele rapidamente correu o local com os olhos e verificou o ambiente.
Dentro do bar de teto baixo havia dez soldados condecorados. Todos eles pareciam ser marionetistas acompanhados por autômatos do tipo cão. O jovem nobre que se vestia completamente com vestes negras parecia estar sendo chamado de “Sua Alteza”. Ele era desconhecido para Raishin, mas também parecia ser um marionetista. Um antigo soldado de meia-idade estava ao lado dele. Em termos de condecorações que ele possuía, era possível dizer que ele devia ter uma patente muito alta. Ele tinha deixado seu autômato humanoide de guarda.
E então havia o Professor Radcliffe, que tinha se tornado um autômato antes que ele percebesse.
Nenhum deles parecia se mover com métodos comuns.
Por outro lado, ele estava sozinho. Para piorar, seus ferimentos ainda não estavam completamente curados.
A diferença de forças era considerável. Mas seu lado tinha uma carta na manga— e ela iria aparecer imediatamente. Ele teria uma chance de sobreviver novamente se conseguisse abrir caminho através daquela situação.
Jogando para longe a mesa quebrada, a garotinha autômato se levantou.
Evangeline…!
Sua aparência era como a de uma cópia de Ionela. Entretanto, ela não parecia muito animada.
Quando ele a conheceu ontem, ela parecia uma pessoa um pouco mecânica, no máximo. Mas hoje ela parecia mais uma máquina vestindo uma pele humana.
Raishin escondeu Ionela em suas costas e encarou o jovem nobre de vestes completamente negras.
— A Io está comigo. Foi por isso que eu tomei a liberdade de entrar.
O jovem nobre olhou para Raishin como se estivesse se divertindo.
— Que bravo da sua parte. Acima disso, eu me lembro do seu rosto—
Ele não ouviu a última parte. Raishin levou a mão até o cinto e tirou de lá um cilindro. Ele soltou o dispositivo de segurança e o atirou na direção do nobre. Ao mesmo tempo, ele se virou de costas com Ionela e a abraçou para protegê-la.
No instante seguinte, uma luz intensa e o som de uma explosão surgiram, sacudindo a varanda.
Mesmo Raishin, que tinha se preparado resolutamente, acabou com o cérebro tremendo em função do impacto.
Os soldados foram nocauteados pelo som da explosão, e tanto o oficial altamente condecorado quanto Radcliffe caíram de joelhos onde estavam. Não havia como perder essa chance. Raishin colocou a cambaleante Ionela nos ombros e correu para a saída do bar.
Ele correu escadas abaixo e alcançou o exterior.
Ele escapou para a praça em que estavam antes… mas havia uma grande quantidade de autômatos esperando lá.
Dos de aparência estranha aos humanoides, a formação que eles assumiam de pé em uma espécie de fila era espetacular.
Eles estavam sendo controlados por alguém? Assim que notaram Raishin, todos atacaram de uma só vez.
Raishin desviou dos braços dos autômatos, chutou com força os seus corpos e fugiu, assegurando uma rota de fuga de algum modo. Suas feridas ainda em recuperação doíam, mas aquela não era uma situação em que ele tinha tempo para reclamar de algo assim. Ele pegou um cano de ferro e escapou enquanto derrubava alguns dos autômatos.
Uma luz brilhou em seu caminho.
— O Daedalus…?
Ele podia ver a grande constituição do navio de guerra. Seu canhão principal estava fixamente focado nele.
Isso é péssimo…
Seu corpo já estava se movendo quando este pensamento surgiu em sua mente.
Ele pulou enquanto carregava Ionela. No momento em que ele saltou para um beco, algo passou voando por ele.
Seria correto dizer que um raio passou voando bem ao seu lado? O raio de destruição engoliu parte dos autômatos que os perseguiam, arrancou não apenas a superfície da estrada, mas também seguiu adiante, destruindo parte da praça.
Um líquido vermelho brilhante cobriu completamente a linha de visão de Raishin e Ionela.
A imagem de pessoas sendo atiradas para todos os lados surgiu. Vários membros foram decepados.
Eles não puderam deixar de desejar que todos os atingidos fossem autômatos.
Raishin deu as costas para aquela cena horrível e puxou o braço de Ionela.
— Vamos, Io. Nós deveríamos nos refugiar na Academia por ho—
— A… culpa… é… minha…!
Ionela não tentou se levantar, ela apenas continuou sentada como estava, com uma expressão chocada no rosto.
Ela segurou a cabeça, seu corpo inteiro tremia ininterruptamente.
— O que eu faço…? O que eu faço…?
— Acalme-se! Deixe tudo isso depois. Não pense nisso agora. Corra comigo!
— Porque… tem tantas pessoas… e sangue! Isso é tão… a Cidade das Máquinas já está… todos estão mortos… o mundo está… a Eva está…!
O que ela estava dizendo era incoerente. Ionela caiu e explodiu em lágrimas.
— Por minha causa… todos… todos! Por isso… Eu… eu já não aguento mais! Ser morta por Sua Alteza é o que eu mereço…
*Slap!*
Um som soou da bochecha de Ionela.
Ela tinha sido estapeada. Por Raishin.
— Não aja como uma criancinha mimada, sua grande idiota!
Ele rugiu. Ionela voltou a si com um sobressalto.
— Você é uma gênia e uma professora, não é!? Então me mostre que é digna disso!
— ——
— Eu não sei o que está acontecendo, mas esse caos— se você está envolvida nisso, pode entender a situação melhor que qualquer outra pessoa. Apenas você pode fazer algo quanto a isso!
Ionela baixou a cabeça e, finalmente, levantou-se de modo impressionante.
Os autômatos entraram no beco, passando uns sobre os outros, mas os dois já estavam se esgueirando para a rua adjacente. Ionela falou corajosamente enquanto corriam.
— …Obrigada. A nota do Raishin-kun aumentou para um D.
— Por que uma nota de reprovação outra vez!?
Houve um momento para Raishin responder. No entanto, e naturalmente, a situação não estava melhorando.
Uma bola de fogo voou por trás deles e explodiu no ar.
Eles quase foram transformados em carvão. A causa da explosão foi um feitiço conhecido como Bola de Fogo, um sinônimo para magia militar— uma magia de fogo ortodoxa. Tinha um poder comparado ao de um morteiro.
Raishin olhou por cima do ombro enquanto se esquivava de um segundo tiro.
— Droga! Onde está o marionetista!? Vou pará-lo com um golpe pesado!
— Não tem! Tudo isso está sendo feito por Eva e Sua Alteza!
— O quê!? Mas até cinco minutos atrás esses caras não estavam usando magia—
Outra Bola de Fogo voou, interrompendo as palavras de Raishin. Ele desviou com velocidade. Enquanto se esquivava de vários tiros, ele acabou encurralado em um beco sem saída.
Após confirmar que eles estavam encurralados, os autômatos pararam de atacar e começaram a cercá-los lentamente. Eles não estavam atacando de imediato para terem certeza de não atingir a parede atrás deles e abrir uma rota de fuga? Eles eram inteligentes e, além disso, estavam sendo liderados. Suor frio escorreu pela espinha de Raishin.
— Droga. Não tem por onde escapar…!
— Minha estratégia de seduzir o Raishin-kun durante um encontro, para forçá-lo a fazer tudo o que eu quisesse e tornar a troca um ato consumado… pode ter falhado.
— Por que você está pensando sobre isso?
— Porque todas aquelas garotas irritantes foram mantidas afastadas, e a importante Yaya-chan também não pode sair da Academia.
Ela havia calculado isso. Apesar de estarem naquela situação, Raishin ficou impressionado.
— Você com certeza não é descuidada.
— Embora não satisfatoriamente, eu sou uma Professora na Academia, afinal. Porém— isso acabou saindo pela culatra.
Nem Charl, nem Frey e nem Yaya estavam ali.
— Sinto muito, Raishin-kun… Até você acabou envolvido nisso…
— Isso é terrivelmente admirável. Mas é um pouco cedo para murmurar suas últimas palavras.
Raishin olhou para frente.
Em sua linha de visão, uma pessoa voava suavemente, tal qual um floco de neve.
Um cabelo azul-prateado espalhou-se suavemente na forma de um leque. Uma completa beldade em forma, exatamente como uma obra-de-arte suprema. Uma garota com um bonito rosto sem muitas expressões pousou diante deles para proteger Raishin.
— Você está seguro, Raishin-dono?
— Estávamos esperando por você, Irori.
Raishin reprimiu um sorriso e se alegrou com a chegada de sua carta na manga.
Parte 4
— Raishin!?
Yaya rapidamente ergueu a cabeça e olhou apressadamente pela janela.
Aquele era o conhecido quarto de enfermaria no primeiro andar da Faculdade de Medicina. Yaya, que foi deixada para trás por Raishin, escorregou para a cama dele e começou a chorar—
— Hum, o que há de errado…?
Na cama adjacente, Frey olhou para ela, intrigada. Ela estava terminando de descascar uma maçã para Loki.
— Rabi…?
O cão semelhante a um lobo, que estava dormindo aos pés de Frey, rosnou baixinho. Não apenas o Rabi. Os outros quatro autômatos da série Garm também ergueram as orelhas de forma tensa e viraram os rostos na direção da janela.
Loki também lançou um olhar afiado na direção da janela.
— Alguém está usando uma quantidade absurda de magia.
— Oh… quem?
— Eu não sei. Mas— isso não é algo gerado por um humano.
Frey liberou poder mágico e alinhou seus sentidos com os de Rabi.
Por alguma razão, a magia não fluiu facilmente. Após fazer um esforço muitas vezes maior que o habitual, de algum modo apenas o sentido da audição foi compartilhado— naquele momento, ela ouviu um terrível ruído estrondoso.
— Uma explosão! Não, aquilo foi… o impacto de um canhão!?
— Uma batalha está acontecendo na cidade!
— De jeito nenhum… Raishin!
Yaya levantou-se como se tivesse sido atingida por algum golpe, e tentou saltar pela janela.
— Espere!
Uma voz com tom de restrição a deteve. Yaya parou quando estava prestes a saltar, com suas pernas ainda sobre a moldura da janela.
Charl estava parada sob a porta da Enfermaria com os braços cruzados.
— Charlotte-san… por favor não me impeça!
— Você e o Sigmund não podem ir até a cidade. Já se esqueceu?
— Mas!
— Eu compreendo os seus sentimentos, mas— ah, não, eu não entendo! De jeito nenhum! Isso não significa que eu esteja preocupada com aquele idiota!
Com os olhos semicerrados, Yaya lançou um olhar cheio de dúvidas na direção de Charl.
— De todo modo, ele ficará bem. Um monstro terrível acabou de ir para a cidade.
— Um monstro?
— O Diretor. E também o Magnus.
Yaya engoliu em seco, alarmada. Frey fez o mesmo. E também Loki.
Charl olhou pela janela e fitou intensamente o céu, deixando um sinal perturbador flutuar sem rumo.
— Além disso, tenho certeza que ele ficará be— ah, não é isso! Não é como se eu acreditasse naquele idiota!
Parte 5
A chegada de Irori já tinha sido levada em consideração.
Raishin vindo para a cidade significava que eles tinham o apoio do Exército.
Apenas alguns meses de chegar a Grã Bretanha, Raishin já havia sido útil e também tinha sido marcado tanto pelo Exército Britânico quanto pelo Alemão.
Na cidade, os guarda-costas do Exército Japonês receberam ordens para sempre segui-lo.
Se algo acontecesse, Irori viria correndo— ele acreditava que sim.
E então, Irori apareceu. Como seria de se esperar de uma Setsugekka da artesã Karyuusai, ela não tinha perdido os sentidos como os demais autômatos ao redor deles. Se era esse o caso, então ele poderia conseguir!
Raishin deixou que seu poder mágico fluísse e o infundiu nas costas de Irori.
— Livre-se deles, Irori.
— Sim!
Todo o corpo de Irori, que havia recebido o poder mágico de Raishin, ficou frio.
Aquilo convergiu e se espalhou. O frio emitido por Irori seguiu em linha reta, aproximando-se dos autômatos— sem voar, mas caindo aos seus pés.
O gelo caía suavemente no beco de pedra.
O resultado pareceu surpreender a própria Irori. Ela mais uma vez liberou seu poder mágico, usando toda a sua força de uma só vez. A atmosfera congelou e produziu uma nevasca— com um raio de aproximadamente vinte centímetros de alcance.
— O que há de errado, Irori?
— …Sinto muito, Raishin-dono.
Os autômatos voltaram a se aproximar deles. Quando Irori recuou lentamente,
— Eu pensei que se recebesse o poder mágico do Raishin-dono… seria diferente. Mas, na verdade, desde o começo, eu não consigo usar minha magia.
— Impossível!
Ionela gritou enquanto tremia.
— Não importa o quanto você seja um autômato criado pela Karyuusai-sensei, você não será capaz de fazer nada!
— Você conhece o motivo?
— Eu explicarei mais tarde! Enfim, magia não pode ser utilizada!
No momento em que Raishin compreendeu as palavras dela, ele começou a correr.
— Vamos romper a formação deles pela frente, Irori!
Ele apertou o cano de ferro e atacou o grupo de autômatos. Irori também mergulhou nas linhas inimigas, seguindo Raishin.
Embora a magia estivesse bloqueada, as habilidades físicas de Irori eram sobre-humanas. Ela facilmente se esquivou da magia dos inimigos como se estivesse dançando, e os atingiu com golpes de sua faca congelada.
Graças ao fato de Irori estar ali, Raishin poderia lutar enquanto também protegia Ionela. Os três conseguiram vencer a barreira de inimigos à força e foram capazes de correr para o outro lado da rua.
Havia muitas pessoas ali. Pessoas que gritavam de forma imprudente, pessoas empunhando armas, pessoas disparando armas na tentativa de parar os autômatos que começaram a correr descontroladamente. Era um caos.
— Ei, fujam daqui! Vocês vão acabar sendo arrastados para essa confusão!
Assim que Raishin avisou, uma Bola de Fogo atacou as pessoas. Várias delas foram jogadas para longe pela explosão ou acabaram queimadas pelas chamas— ele se sentia mal por elas, mas não podia se dar ao luxo de ajudá-las.
Ele continuou correndo desesperadamente. Raishin chamou por Ionela enquanto corriam.
— Ei! Por que a Irori não pode usar magia!?
— Nenhum circuito mágico irá funcionar plenamente dentro do alcance da música da Eva!
— Música? Eu não estou ouvindo na—
Não, ele estava sim. Ele não estava sentindo a música com seus ouvidos, mas sim sentindo as ondas de poder mágico ressoando!
— Não, mas espere! Por que esse grupo está nos atacando com tanto vigor!?
Raishin gritou quando suas costas foram queimadas pela explosão de uma Bola de Fogo.
Convergindo ainda mais, várias balas de fogo também foram atiradas na direção deles. Irori as repeliu com sua faca de gelo. A manifestação da magia foi imperfeita, mas foi capaz de desviar a trajetória dos projéteis.
— Essa é uma boa pergunta, Raishin-kun. Mas vamos discutir isso mais tarde. De qualquer modo—
— Raishin-dono! Veja a sua frente!
Irori alertou. Raishin subitamente parou, ainda carregando Ionela. Um projétil flamejante caiu bem diante de seus olhos, deslizando por alguns metros na superfície da estrada. As chamas se abriram, atirando entulho para todos os lados. Aquilo também era uma Bola de Fogo… E mais autômatos surgiram diante deles.
Eles deveriam tentar passar por eles novamente ou procurar outra rota de fuga? Hesitação seria fatal ali. O inimigo, com um movimento ordenado, cercou os três em um piscar de olhos.
Como qualquer um poderia esperar, não havia mais nada que pudesse ser feito. Suor frio escorria, ensopando a testa de Raishin. Os autômatos dispararam contra eles de uma só vez. Aquilo era péssimo. Eles não podiam mais escapar! Naquele momento…
*Rumble!*
O ar vibrou e o grupo de autômatos foi derrubado.
Os autômatos foram completamente derrotados e caíram como uma fileira de dominós. Raishin olhou admirado para a cena a sua frente. A magia de alguém— não, não era isso. Aquilo não era nada assim tão complicado.
Aquilo tinha sido a manifestação de um poder mais primordial… o próprio poder mágico de alguém era o que havia derrotado todos aqueles autômatos.
— Você está ferido, Raishin-kun?
Um homem grande de aparência robusta surgiu de um canto do cerco que havia acabado de ser derrubado.
Um sorriso amigável e refrescante estava gravado profundamente naquele rosto com um grande bigode. Aquele era—
— Diretor… Edward Rutherford!
— Você também. Professora Eliade, certo?
— Sim… sim…
— Isso é o mais importante.
Ele sorriu amplamente. Apesar daquele sorriso amigável, Raishin sentiu um poderoso ar intimidador. Os autômatos também sentiram, ao que parece, e isso fez com que todos parassem de se mover. Mesmo Irori parecia estar assustada. E, por trás de Raishin, um jovem apareceu do nada.
Raishin se virou, surpreso. Lá estava um jovem estudante vestindo uma máscara prateada.
O Diretor disse para Magnus.
— Isso é uma emergência, Magnus-kun. Eu cancelo o Protocolo Autômato para os estudantes da Academia.
O Protocolo— que dizia que não era permitido que os autômatos dos estudantes deixassem a Academia.
— Eu tomarei a responsabilidade. Naturalmente, nem o Prefeito e nem Sua Majestade irão discordar. Se essa situação foi deixada como está, o pescoço do Prefeito e a vida de Sua Majestade não terão um bom fim, irão?
Ele disse isso em tom de brincadeira. Em resposta às palavras do Diretor, Magnus disse uma única palavra.
— Kamakiri.
Naquele momento, uma fissura surgiu no espaço vazio, bem ao lado de Magnus—
Um dos autômatos de Magnus apareceu literalmente do nada.
— Kamakiri. Traga a Hotaru.
— Sim, Mestre. Como desejar.
A garota inclinou a cabeça e ativou seu circuito mágico. Novamente, o espaço se abriu verticalmente e dessa vez uma garota com cabelos de um tom claro de rosa— um autômato com o rosto de sua irmã mais nova falecida— apareceu.
Esse maldito… como foi que ele…!? Ele a invocou usando o circuito mágico daquela garota autômato chamada Kamakiri? Mas, como foi que ele conseguiu ativar um circuito mágico nessa situação?
Raishin pensou.
— Livre-se deles, Hotaru.
— Sim, Mestre. Como desejar.
A garota chamada Hotaru saltou, levantando sua saia.
Um brilho de ar quente envolvia a garota, criando um som, como se atmosfera estivesse sendo rasgada.
A garota mostrou um poder formidável e saltou em direção às linhas inimigas. Ela os chutou, os socou e os mandou voando. Ela era absolutamente esmagadora. Ela estava “livrando-se deles”, como havia sido solicitado!
O balançar de punhos temíveis. Autômatos desmontados sendo lançados ao ar. A garota mudava de posição em um instante e corria com a velocidade de um relâmpago. Antes que ele se desse conta, ela sacou duas adagas e derrubou inimigos um após o outro.
Claramente, o circuito mágico estava funcionando.
— Como…!?
Ionela estava surpresa ao lado de Raishin. Irori também estava pasma. O Diretor vigiava a batalha de Magnus, mas, como esperado, ele parecia estar muito interessado.
Naquele momento, Raishin notou a postura de Magnus.
Normalmente aquele homem nem sequer virava a palma da mão na direção de seus autômatos, mas agora ele estava com as duas mãos voltadas na direção de Hotaru.
Ele podia vê-los se forçasse os olhos. Os fios de poder mágico que se estendiam dos dez dedos à esquerda e à direita.
Linhas finas, flexíveis, imperturbáveis e resistentes. Emitindo mais poder do que todos os marionetistas que ainda estavam por ali juntos, as linhas se juntaram e convergiram a distância.
Ele liberava tanto poder quanto uma dúzia de marionetistas— não, centenas deles!
E havia algo que saía na direção oposta.
Nas costas de Magnus, ao redor de suas omoplatas esquerda e direita, surgia uma coisa semelhante a uma névoa levemente avermelhada, que se abria como um par de asas. Aquilo certamente…
Raishin rangeu os dentes. Por outro lado, e parecendo confusa, Irori disse,
— Que poder…! Está… em outro nível!
— Então é ele.
Ele estava convencido, mas não havia provas conclusivas até aquele momento.
Entretanto, a prova estava bem diante de seus olhos agora.
— Apenas uma pessoa no meu Clã… pode fazer isso…!
Como esperado, Magnus era— seu irmão mais velho.
Akabane Tenzen!
Este homem estava usando aquilo. E aquilo era… a técnica secreta altamente estimada…
Aquele poder era evidentemente espantoso, como descrito no livro de técnicas secretas.
Magnus estava movendo apenas Hotaru. Ele afastava dúzias de autômatos usando apenas Hotaru, enquanto Kamakiri seguia parada ao lado dele.
E, em certo momento, os inimigos recuaram.
Um pensamento desagradável o fez franzir o cenho. Um pressentimento ruim percorreu todo o corpo de Raishin.
E esse pressentimento imediatamente se tornou realidade. Pulverizando as casas em seu caminho, um projétil gigante surgiu voando. Era o canhão principal do Daedalus!
Hotaru pegou o projétil e— uma grande explosão ocorreu. Raishin protegeu Ionela e Irori protegeu Raishin. Enquanto o rugido causado pela explosão os fazia tremer com o impacto, Raishin abriu um pouco seus olhos e olhou na direção de Hotaru.
Chamas vermelhas ardentes produziam sons estrondosos.
A explosão de chamas, que estimulavam o trauma psicológico de Raishin, foi destruída e Hotaru apareceu novamente.
Como se nada tivesse acontecido. Na verdade, ela não tinha uma única ferida sequer.
Assim como a Yaya…!
O circuito mágico dela. Embora elas devessem ser essencialmente diferentes, suas habilidades eram semelhantes.
O bombardeio era a carta na manga deles? Ou será que perceberam que não são páreo para Magnus? Os autômatos fugiram iguais a pequenas aranhas se espalhando para todos os lados.
O mestre deles— aquele jovem nobre parecia ter decidido rever sua estratégia.
Finalmente, quando os arredores voltaram a ficar em silêncio, o Diretor sorriu radiante e aplaudiu.
— Magnífico, Magnus-kun. Como a pessoa responsável pela Academia, estou orgulhoso de ter um grande marionetista como você matriculado na Academia.
— …Eu não sou digno de tais palavras.
Ele deu uma resposta indiferente. Representando seu mestre, Hotaru e Kamakiri curvaram-se respeitosamente.
— Vocês não foram feridos pelo bombardeio de agora, foram? Raishin-kun e Professora Eliade?
O Diretor os encarou com um olhar ansioso.
Raishin assentiu, apesar de vacilar com o agudo discernimento em seus olhos semicerrados.
— …Sim.
— Isso é um alívio. No entanto, preciso me desculpar de imediato.
Franzindo a testa como se lamentasse do fundo de seu coração, o Diretor disse,
— Receio que você precise ser detida, Professora Eliade.
Por um momento, Raishin não entendeu o que tinha sido dito, então sua reação foi lenta. Ele não teve tempo nem sequer de pensar em infundir poder mágico em Irori.
Kamakiri, o autômato de Magnus, desapareceu de repente. Quando ele se deu conta, a figura de Ionela já não estava mais ali.