Volume 1 – Arco 1
Capítulo 11: Conhecendo o Monarca
Ambos caminharam em silêncio contemplativo e calmo dentro do emaranhado de tuneis que era a base da Facção Imperialista. Não precisavam falar nada um para o outro, conheciam um ao outro, por isso, tinham a certeza da lealdade.
A calma do rapaz ficou clara para Hector, que sentiu uma pequena alegria dentro de si. Não se conheciam a mais de algumas horas e já considerava o rapaz como alguém que pudesse contar, a mesma coisa era verdadeira para o outro.
O silêncio fora quebrado por um dos guardas, que pediram a identificação do guia, que prosseguiu de forma mecânica, acostumado com a segurança. Os dois caminharam mais algumas horas, passaram por diversos procedimentos de segurança, até que pudessem enfim entrar no castelo do Rei.
Assim que abriu a porta, viram-se numa masmorra. Dois guardas, que os viram entrando, guiaram-nos para o Salão do Rei. — Que tipo de pessoa é o Rei dos Ladrões? — Ethan não pôde deixar de perguntar, visto que queria causar uma boa impressão.
Olhou para trás de relance enquanto caminhava. — O tipo perigoso. — A fala ecoou, e o rapaz engoliu em seco, sentiu-se muito mais nervoso agora, porém continuou seu caminho. Não adiantaria nada voltar agora, não com o peso de tantas vidas em seus ombros.
Após alguns minutos, pararam na frente de um grande portão. Era vermelho e belo, com detalhes em ouro, dentre eles haviam runas. Com três batidas, uma pausa e então sete batidas, uma voz ordenou que entrassem.
Fizeram como ordenado e o moreno engasgou com a visão a sua frente. Vários tesouros, antigos e novos, enfeitavam o hall, a pedra polida era iluminada por candelabros, que flutuavam graças a runas. No meio disso tudo, havia um homem. Cabelos longos e ruivos, com olhos verdes que analisavam um diamante, que valia mais do que toda fortuna de Ethan.
Tinha vestes de um rei, com um colar em seu pescoço.
Hector ficou quieto por alguns instantes, pôs-se de joelhos e deu o relatório ao rei, tudo enquanto Ethan olhava a situação a frente com surpresa.
O homem não parecia prestar atenção em nada que fora dito, mas… algo ali era estranho. Sentia-se deslocado e com medo do ser a sua frente, mesmo que não houvesse nada para temer, a sensação era de uma lâmina, nas mãos de um mestre espadachim. No momento que fosse sacada, já estaria morto.
Não prestou atenção no relatório, nem nas pilhas de ouro, apenas via o homem a sua frente. Incapaz de desviar os olhos, sua mão foi para a sua espada involuntariamente. — Vejo que meu charme o afetou.
A voz doce como mel cortou seus pensamentos, o olhar esmeralda caiu em si, avaliava-o como fizera com o diamante e, após alguns segundos, acenou satisfeito. — Tens bons olhos… nunca os perca.
Lembrou de uma conversa parecida, com o reverendo que o salvou. “O que diachos eles querem dizer com isso?” O homem foi até si em um segundo, tocou em seu ombro no outro. Por mais que a distância era de mais de vinte metros, demorou apenas um instante para chegar aonde estava.
— Diga-me… o que você almeja? Riqueza material? Ou conhecimento além da vida? — Virou-se para trás, com um sorriso calmo e satisfeito ao olhar para a pilha de tesouros que tinha. — Tenha essa resposta pronta quando resolvermos essa crise.
— Não preciso. Já sei o que eu quero.
— Hoo e o que seria isso?
— Liberdade.
O Rei dos Ladrões fitou Ethan, incrédulo. Não sabia o que dizer quanto a tal coisa, mas ficou satisfeito. Feliz até. Uma risada escapou de sua garganta, o que fez o jovem estreitar os olhos. Viu tal coisa e parou de rir, um sorriso ainda estava presente nos lábios. — Peço perdão… apenas me pegaste de surpresa. Prazer, Alvaro Heliosville.
Olhou a mão estendida do homem, junto ao sorriso que tinha. Apertou-a alguns segundos depois. — Ethan. — Nisso, o rei largou a mão e virou-se para seu trono, feito de platina e ouro, a coisa mais preciosa que tinha ali.
Caminhou a passos lentos, subiu a escada para o trono com calma, elegância e tranquilidade que apenas um Monarca era capaz de mostrar. Parou em frente ao local e deixou suas mãos dançarem no trono, sua postura se tornou pesada.
— Meu rei?
— Bem, acredito que devemos começar com um plano de ação… já que agora te conheço, diga-me, Ethan… o que sugere? — O jovem, surpreso, engoliu o nervosismo. Não podia gaguejar, mas o nervosismo tomou conta de si.
Nunca teve a oportunidade de falar na frente de um monarca, não queria causar uma má impressão, por isso suspirou. — Por que está me perguntando isso, meu Rei? — Alvaro sorriu, sentou-se em seu trono e cruzou suas pernas.
— Porque você quer ajudar, não é? Ajudar a resolver essa crise. — Olhou com seriedade, sem desviar o olhar.
— Como sabe disso?
— Simples, eu tenho olhos em todos os lugares. Não se pode manter o trono se for pego de surpresa.
O rapaz suspirou e começou a pensar. — Que tal começarmos com as pessoas que nos atacaram? Sabem quem são? — O rei sorriu, algo que o deixou inquieto. — Sabe de algo sobre eles, não é?
— O primeiro, o elfo negro que você decapitou, era chamado de Yuga, um desertor. Tinha uma recompensa sobre sua cabeça, uma que receberá até o final do dia. — O rapaz sentiu enjoo ao ouvir isso. Ganhar com a morte de outros parecia errado… era errado. — O segundo, um Elfo da Floresta chamado de Alein, é conhecido pela alcunha de “Vento leve”. Temos boas relações com esses elfos, e, por isso, não tem uma recompensa por sua cabeça…
— E quanto ao humano? — Sua voz saiu mais agitada do que devia. Envergonhado, pediu desculpas, algo que o rei apenas suspirou, com olhos que pareciam perdidos no tempo, além de demonstrarem algo incomum no homem. Medo.
— Este seria Jack Colt, sua alcunha é “Dragão em forma humana”, algo bem verdadeiro. — O timbre demonstrou um tremor, e um calafrio percorreu a espinha. Sua pele ficou pálida, e só então percebeu o quão perto da morte esteve. — Ele é um verdadeiro monstro. Acho que já perceberam isso, mas é impossível o derrotar numa luta justa, e, mesmo que vários Ladinos fossem contra si, nunca caiu.
— Não sei se era pelo equipamento ou por outra razão… visto que todos os espiões que mandamos contra ele foram mortos. Ao menos, até hoje. — Os olhos adquiriram um certo brilho, e sorriu vitorioso. — Finalmente temos alguma informação sobre ele… foi tolo o bastante para lutar em praça pública na minha cidade… e, por isso, sei de seu verdadeiro poder.
O rapaz estreitou os olhos com a memória. Para sua irritação, fora empurrado contra a parede apenas pela liberação de um dos Ciels do homem. Um suspiro cansado e um olhar desapontado foram tudo que lhe dera.
— Ao menos, era isso que queria que ocorresse. — Levantou-se e foi em direção a outra pilha de ouro, sentiu curiosidade com o que o homem acabara de comentar, e antes que tivesse a chance, já continuava. — O esquadrão de Eleanora era, em sua maioria, composto de pessoas que já tinham Status no Nível 2. O foco geral era em Destreza mas… não tenho como negar que, alguém que os matou daquela forma deve, no mínimo, ser mais que apenas um Nível 2.
— Então? Acha que ele é um Especialista de Nível 3 ou mais?
— Quem sabe? — Sorriu com certo cansaço, algo que dizia o quão trabalhou nesse mistério. — Só sei que não é seguro atacar alguém que não sabemos até onde as verdadeiras capacidades vão, então quero que se mantenham longe dele.
O rapaz acenou, concordava com aquilo. Aquele ao seu lado abaixou a cabeça, manteve-se ajoelhado e rangeu os dentes. Estava irritado, pois não tinha força para se vingar. Mesmo forte, sentiu-se inútil pois nada que fez adiantou.
Aquela… coisa… era forte demais… e não poderia nem sequer derrotá-lo. Não podia fazer nada, algo que o lembrou do quão injusto era o mundo, controlou a raiva, evitaria que ela escapasse. Tinha que focar isso em algum outro lugar.
— Bem, se é assim, começaremos com o Vento Leve. — Um plano se formava na mente do rei, os olhos brilhavam com ambição e excitação. “Apenas mais um pouco… e poderei eliminar essa oposição tola.” — Só precisamos achar uma forma de trazê-lo para fora.
Começou a pensar em diversas formas de atrair a atenção do elfo, mas cada uma tinha uma falha. Ethan tossira em voz alta para chamar a atenção dos dois, que o olharam com dúvida. — Bem, se o problema é achá-lo, acho que sei como…
— Esplendido! — Estava feliz por ter alguém capaz de solucionar o problema. — E qual seria essa forma?
— Bem, na minha terra, quando íamos pescar na lagoa, tínhamos que ter algo que trouxesse o peixe até nós… — Knives percebera o plano que estava para ser anunciado, engoliu em seco e estava para falar algo, mas foi lento demais. — Vamos me usar como isca e pegar o “Vento Leve” quando for me atacar!
Três segundos se passaram, silêncio tomou conta do hall, até que… — Você é idiota, por acaso! — Knives pegou o rapaz pela gola e começara a esganá-lo.
— Hector, para… tá me… machucando…
— Seu imbecil suicida! Sabe o que está sugerindo?
Largou a camisa negra ao ver os olhos resolutos, que pareciam perfurar sua própria alma e que o assustaram. — Sei bem o que estou sugerindo. — Uma determinação tão forte como aço estava presente no rosto, olhos que queimavam como as chamas do purgatório. — E não importa se vão me apoiar ou não! Tenho que terminar esse conflito e ir pro exame. Vou me tornar um Mármore, e não me importa se são Imperialistas ou Aristocráticos, vou arrebentar a cara de qualquer um que estiver no meu caminho!
Mais silêncio. Nenhum dos dois sabia como responder aquela afirmação, pois estavam surpresos demais com a determinação pura e simples do rapaz, não conseguiam conceber como alguém era capaz de ser tão tolo aquele ponto, e, uma vez mais, Knives foi surpreendido por Ethan.
— Bem… se é assim, acho que não me dá escolha. — Foi até o rapaz, os olhos de ambos se encontraram, ambos viram algo no outro que gostaram. — Seja por coragem ou burrice, você decidiu por um plano suicida.
— Sim…
— E ninguém vai tirar você desse caminho?
— Não… eu vou até o fim.
Sorriu, e então virou-se para o Monarca. — Meu Rei, parece que não temos escolha a não ser ajudá-lo. Conhecendo-o, se tentarmos o prender, provavelmente vai cortar a língua só para se vingar de nós…
Um suspiro exasperado foi a resposta. — Certo, que seja… só tente não ser morto… e não conte sobre isso para ninguém sem minha permissão.
— Por quê?
Olhou para o assassino com cansaço e tristeza. — Acho que… depois de todos esses anos nessa guerra… pode haver um espião entre nós.
— Ei, idiota! Querem falar contigo! — Algumas horas antes, Jack Colt voltara para o Quartel General junto com o “Vento Leve”. Lá, os dois foram recebidos pelos guardas, que pediram a senha. Jack grunhira, irritado, enquanto o outro sussurrou.
Após terem acesso, foram escoltados de volta para seus quartos, quando outro membro da liga os parou. — O que eles querem? — A voz grossa fora acompanhada de um olhar sério, o que demonstrava sua irritação com o verme a sua frente.
O mesmo não se intimidou, apenas sorriu de forma arrogante. — Quem sabe… se for meu dia, podem querer te despedir. — Sabia que brincava com fogo, não se importava. Sua inimizade era demasiada e queria matá-lo de uma vez.
Rosnou, calou-se com um olhar do “Vento Leve”. Queria começar uma briga logo e os deixar escapar fizera com que sua fome aumentasse, seu dedo coçava para pegar sua espada e matar a primeira coisa na sua frente.
“Ainda não…” Mesmo com o pouco autocontrole que tinha, devia esperar. Acalmou-se ao lembrar do porquê aceitou esse trabalho. “Só mais um pouco… e conseguirei o resto do dinheiro para o Estevan.”
Caminhou enfrente, mas o outro assassino não saiu do lugar. Estava para fazer algo, quando uma adaga perfurou a garganta do coitado. Caiu morto, engasgou no próprio sangue. — Elix, já falei que nossos números estão diminuindo a cada dia…
— Quem se importa? — O Halfling se escorou na parede, seus olhos vermelhos foram até a dupla. — Temos mais dessas coisas lá embaixo. E outra, sempre podemos conseguir mais na arena e nos becos de Locust.
— Sabe que não é assim! Alguns soldados do inimigo tem lealdade o suficiente para aceitar a morte, enquanto a qualidade dos bandidos não se equipara a de um assassino.
Jack ignorou a conversa dos dois e seguiu, calmo e sem qualquer dúvida dentro de si.
— Boa sorte com os velhacos! — Sorriu com o comentário do Ruivo, enquanto o elfo olhara horrorizado para ambos. Sem nenhuma palavra, apenas levantou o braço e acenou, sem nem olhar para trás. Os dois ficaram calados por alguns segundos. — Então, o que acha dele?
Arregalou os olhos com a seriedade do tom que aquela pergunta tinha. A surpresa fora esmagada e apenas pensou de volta nos dois alvos. Sua mente convergia e muito na direção do rapaz que sobreviveu as suas flechas e sua irritação transparecia no rosto. — Acho que vou me divertir separando a cabeça de seu pescoço.
Virou-se, com uma sobrancelha arqueada. — Céus, vocês Elfos tem mesmo um orgulho muito grande quando o assunto é eficiência. Já pensou em relaxar? — A pergunta fora respondida com um olhar, maldoso o suficiente para o calar.
— Não é só isso. Aquele cara… é perigoso.
— Em que sentido da palavra? — Agora estava intrigado, ouviu que o alvo era só um garoto normal, que nunca tinha sequer matado alguém. “Como poderia um cordeirinho ser uma ameaça para uma alcateia de lobos?”
Um calafrio percorreu a sua espinha mas pôde se conter. Não podia ter medo, nem demonstrar fraqueza, não ali. — No sentido do que pode se tornar. Do que pode ser. — Ao receber um olhar curioso, suspirou cansado. Não tinha paciência para tal. — O reino dos Elfos da Floresta sempre teve uma ligação forte com a Liga… isso se dá pelo fato de que um dos fundadores dela é também um parente distante do nosso atual rei.
— Por isso, sabemos bem de como a Guilda fora formada, tudo. Desde os outros fundadores, até os detalhes da batalha final de Amnael. Não só aquela batalha, como também detalhes da vida pessoal dele. Sabemos de seu amor com a Princesa Kujoma, assim como a descendência daquela união. Um filho teve 7, os 7 tiveram 3 ou 4 cada, assim seguiu. Mantivemo-nos um olhar atento naquela descendência… pois um dia, alguém com aquele poder surgiria. Alguém destinado a superar Amnael.
— Você acha que o tal de Ethan é essa pessoa?
Um aceno foi a resposta que recebeu, e só então lembrou-se de como os elfos eram com superstições e lendas. — Preciso levar essa notícia para o Meu Rei, mas quero levar a cabeça dele junto.
Na sala dos anciões, oito runas mostravam a forma de rostos, cada um oculto por um véu. Aqueles eram os anciões da Facção Aristocrática, assim como membros com imenso capital político dentro da guilda. Na frente deles, o “Dragão em forma humana” olhava desinteressado, enquanto recebia a bronca.
— Quer prestar atenção? Não te pagamos para ter essa atitude! — Um dos rostos rugiu, não se importou com isso. Apenas olhou impassivo para o grupo na sua frente, estava mais que claro que seus empregadores estavam putos consigo.
— Dá pra fechar a matraca… — Soltou um bocejo, entediado. Aquela reunião estava tomando tempo demais, tempo que podia usar para dormir. Aquele pensamento trouxe memórias de dias antigos, onde podia dormir o dia inteiro e sua única preocupação era escapar do seu mentor. “Puta que o pariu, essa memória de novo?” — Já ouvi vocês o bastante, então vou dormir um pouco. Boa-noite.
— Espere aí, Jack!
— Desgraçado, não está nos ouvindo? — A porta fechou, as oito projeções desapareceram uma a uma, até que sobrou apenas uma. Ela pertencia ao mais antigo dentre os sábios, alguém inteligente o bastante para entender que observar valia muito mais do que gritar como um bando de crianças mimadas.
— Sério, no que lorde Rajah pensava quando estipulou o direito de nascença. Graças a isso, temos um bando de tolos no poder… — Seus resmungos foram cortados por uma sombra, que surgiu no meio da sala. Ela era invisível para qualquer um, mesmo o ancião era incapaz de perceber o assassino.
Apenas quando tossiu em sua mão que o velho o notou. A sombra vestia o uniforme tradicional da liga, sua máscara era a mesma, mas a diferença estava nos sinos, presos no capuz. Como conseguia se mover com aquilo sem fazer nenhum barulho era um mistério. — O que deseja de mim?
A voz era calma e sem qualquer qualidade. Uma que você ouviria de qualquer um e que esqueceria depois de alguns segundos. Sim, na frente do Ancião estava o maior assassino que a Guilda já havia produzido nos últimos 500 anos. Seu estilo era a perfeição.
Silencioso, preciso e forte, era o Ladino perfeito… mas tinha algo que ninguém além do ancião sabia, algo que o tornava ainda mais perigoso. O Assassino conhecido como Sigma era inteligente, sua mente era tão disciplinada que conseguiu criar uma segunda personalidade, uma que espionava seus inimigos antes da original completar o serviço.
A mente de Sigma era sua maior arma.
— Quero que capture o tal de Ethan… algo me diz que ele não é um alvo comum… assim como suspeito que fará um movimento em breve. — Após dar a ordem, o rosto sumiu e a Runa se apagou. A sombra então desapareceu.
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