Volume 1

Capítulo 14: O Sofrimento de Amon

— Mamãe... — chamou uma criança deitada em sua cama. 

A criança era um menino pequeno e magrelo. Ele tinha uma pele pálida e falava devagar, por estar aparentemente doente, além de soltar algumas tossidas vez e outra. 

— O que foi, filho? — A mãe do menino, uma mulher bem jovem, sentou-se ao seu lado, passou a mão na cabeça do menino e começou a lhe dar um carinho.

— Depois que o papai voltar e eu melhorar... podemos fazer uma viagem para a praia juntos? — Em meio as interrupções da sua tosse, ele concluiu seu pedido.

A mãe soltou um pequeno sorriso, deu um beijo na testa do filho e se levantou.

— Boa noite, amanhã conversamos. — Ela virou para partir do quarto, mas a mão gelada do garoto agarrou seu vestido.

— Mas... Você vai me levar?

Um segundo se passou no silencio da noite como também um longo suspiro da mãe.

— Sim. Quando seu pai voltar, ele vai levar nós dois.

— Você promete?

— Prome...

O rosto da mãe começou a se tornar fumaça, uma escuridão assaltou o quarto e um par de olhos vermelhos ficaram de frente para o menino, que os encarava em silêncio, sem medo. Logo, os olhos tornaram-se negros e o medo começou a fluir pela mente do doente menino.

Os olhos negros viraram sombras escuras que tomaram a forma de um homem coberto pela escuridão. Nas mãos dele, um uniforme militar se dispunha e uma aura de morte assombrava.

— Mãe... 

Amon abriu os olhos devagar, sentindo uma dor aguda no peito. Ele estava coberto de ataduras dos pés a cabeça, que cobriam o ferimento que recebeu do homem de preto. Um pouco de sangue vazava das linhas brancas e suor escorria do pescoço até a ferida.

Ele tinha um rosto infeliz, um pouco pálido, e sua expressão sádica não poderia ser vista em lugar algum. Abriu a boca levemente, levantou a cabeça e sentiu a energia do sol percorrer o seu corpo, escutou o som do mar e das gaivotas, fechou os olhos e suspirou, abaixando a cabeça devagar logo em seguida.

Ao reabrir os olhos, o suor havia desaparecido e o rosto infeliz também. Levantou-se devagar apoiado em uma das paredes do navio. Ele percorreu até chegar próximo de uma prancha que levava ao porto.

O navio estava completamente vazio, apenas Amon caminhava a passos lentos pelo convés.

Antes de alcançar a prancha de madeira, um pirata carregando alguns barris subiu até o convés e viu o seu capitão andando até a prancha.

— Capitão! O que está fazendo? — exclamou o pirata soltando o barril e indo em apoio ao seu chefe.

— Fizeram o que eu mandei? — disse friamente, dando mais alguns passos à frente. — Aonde estão os outros homens? Já acharam os dois?

Amon deu mais alguns passos e começou a ver o seu subordinado dobrado. Ele tropeçou nos próprios pés e caiu de joelhos no chão. Vendo isso, o pirata correu apresado para ajudar, mas foi interrompido por um tapa.

— Não toque em mim! — A voz alta do capitão, misturada com uma aura assassina, circulou por toda a extensão do navio. 

Uma gota de suor caiu no chão e as mãos do pirata tremiam.

— Desculpe...

— Me responda logo, o que aconteceu? — Ele voltou a se levantar.

— Colocamos a recompensa como o senhor pediu, mas ainda não houve resultados. Enviamos todos os homens disponíveis atrás da garota também. O único que ainda está aqui sou eu e o imediato Said, cuidando dos ratos dele.

— Procure um médico para mim... — Ele colocou a mão por cima da ferida — e chame o Said.

— Acho que deveríamos avisar sobre o seu ferimento ao Capitão Seth...

Outra vez o pirata começou a tremer. Amon não precisou nem falar nada desta vez, pois apenas o seu olhar foi capaz de colocar medo no coração do pirata.

— Siga minhas ordens. Depois que tudo acabar, eu lido com Seth.

Sem pensar duas vezes, o subordinado virou-se e começou a andar em busca de um médico. Contudo, antes de sair do navio, Amon lhe chamou mais uma vez.

— Ei! — Um sorriso tenebroso surgiu no rosto de Amon. — Não esqueça de sorrir!

O pirata engoliu em seco e lentamente abriu um sorriso forçado. Amon acenou com a cabeça e deu um passo para trás. O subordinado só parou de sorrir quando ele não estava mais à vista.

 “Eu tenho que ir para outro comandante logo, ou vou acabar perdendo a cabeça”, pensou ele.

Amon moveu seu corpo destruído até uma sombra e jogou-se no chão, logo depois o som de baque ressoou. O sorriso enorme se desfez e apenas uma expressão de dor e raiva restou.

 

 

— Sienna?! — Truman corria pelas ruas preocupado com o sumiço da menina. Ela estava logo atrás dele, mas, um momento depois, havia desaparecido em meio à multidão. Correu entre as dezenas de pessoas, buscando a menina, contudo, não encontrou nada.

“Será que ela está bem?”, pensou com imensa preocupação. “Apesar de tudo, ela é mais inteligente que eu... É claro que ela vai estar bem.”

Tentou retirar esses pensamentos da sua cabeça e continuou a procurar pelas ruas. Em um certo momento, escutou alguns gritos vindo de um beco escuro. Era um voz aguda, característica de uma criança, uma menina.

— Sienna... — Truman correu na direção do beco, virando em uma viela pequena. Ele passou por alguns pedaços de madeira, que formavam uma parede quebrada e conseguiu escutar os gritos com clareza.

— Eu não quero ir! Socorro! — Era realmente uma voz feminina.

— Sienna! Estou chegando! — gritou o jovem terminando de passar pela madeira. Ao passar por ela, tropeçou caindo com o peito no chão, mas logo levantou a cabeça, deparando-se com uma cena incomum.

Uma mulher alta, com cerca de 20 anos, agarrava uma menina pelo braço. A pequena garota não era Sienna, mas estava desacordada e possuía a mesma idade de sua amiga. A jovem mulher tinha uma pele acastanhada, feito a madeira de uma árvore cheia de vivacidade. A profundeza dos olhos esmeraldas da mulher quase encantaram Truman, combinando com a roupa verde dela.

A mulher era muito parecida com aquela que abordou Sienna a caminho do porto, mas era um pouco mais velha e possuía outro ponto divergente. Ela carregava consigo uma pequena joia da mesma cor dos olhos, que estava presa em um cordão no pescoço dela.

Ao ver aquela cena, Truman engoliu seco e deu um passo para trás.

“O que está acontecendo aqui? Merda... preciso sair sem ser notado. Isso não é um problema meu.” 

Os pensamentos do jovem condiziam com a sua personalidade medrosa, mas as ações não foram condizentes. Apesar de pensar em fugir, ele começou a correr na direção da estranha mulher com um pedaço de madeira que encontrou atrás de si.

Em sua mente, aquela pequena menina poderia ser sua amiga, Sienna. Por isso, mesmo com medo, ele agiu sem pensar.

 — O que você está fazendo!? Solte ela agora! — esbravejou nervoso, correndo na direção da estranha mulher. 

A mulher virou a cabeça devagar, encarando, com frieza em seus olhos, o rosto do infeliz garoto.

“O que estou fazendo?” Truman só percebeu o que estava fazendo tarde demais.

A maioria das pessoas chamaria Truman de herói por tentar salvar a menina, mas havia uma pessoa que não pensaria isso. Caso Sienna o visse naquela situação, pensaria em apenas uma coisa. Truman era um verdadeiro idiota.

 

 

Sienna já havia saído do meio da multidão. Diferente de antes, qualquer pessoa poderia ser sua inimiga naquele momento.

— O que eu faço agora? — Ela buscou por opções, mas nada de realista lhe veio à mente. — A melhor opção por agora é mudar minha aparência. Droga, Truman, onde você está?

Levantou-se devagar e retirou a poeira que inundava suas roupas. Para o sudeste estava o porto, ao norte o estranho prédio cheio de piratas e ela veio do oeste. Não havia muitas opções para onde ir, então ela seguiu na direção contraria ao porto.

Enquanto caminhava, ela buscou por alguma forma de ganhar algum dinheiro. Logo, ela avistou um enorme elefante. Nas costas do animal, havia um homem, mas também múltiplas mercadorias. Entre elas, tinha frutas vermelhas e redondas.

— Maçãs... 

As vezes uma fruta ou outra caia do chão e era pisoteada pelo animal. Sienna pensou rapidamente e bolou um plano para poder ganhar um pouco de dinheiro com aquilo.

— Essa talvez seja uma boa opção. — Ela abriu um sorriso travesso.



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