Volume 1

Capítulo 13: Cabeças à Venda

Sienna levantou do chão e começou a procurar por Truman. No entanto, ela não pensou muito bem nisso. Ela entrou no meio da multidão e, conforme aproximava-se do porto, o número de transeuntes aumentava em proporção.

Por ser muito baixa, Sienna mal conseguia enxergar qualquer coisa acima das pernas dos que estavam de passagem. Pelo mesmo motivo, ela acabava não sendo vista pelos que passavam. Alguns empurravam a garota de cabelos brancos sem nem mesmo perceber à sua presença.

Depois de cair no chão, pois havia sido empurrada inúmeras vezes, ela se enfureceu e buscou abrigo em um canto mais afastado da rua. Por sorte, ela encontrou uma esquina vazia, próxima de um beco. Com dificuldade, passou pelas pessoas sem ser ao menos notada e chegou na esquina.

Jogou-se no chão e grunhiu frustrada. Ela estava sozinha naquela cidade desconhecida que era completamente dominada por bandidos. Era fácil perceber um ou dois deles caminhando pelas ruas igual a bêbados devassos, pois não tinham senso algum. Eles gritavam feito macacos loucos e apenas atrapalhavam a visão pacífica da cidade. Com isso, a felicidades que sentia antes se esvaiu.

— Truman... seu idiota... — A jovem colocou a cabeça entre as pernas e segurou suas lágrimas, por causa da promessa que fez.

A pequena garota dos belos cabelos brancos estava sentada no chão sujo de terra, com roupas rasgadas, com fome, com medo e com uma solidão imensurável. A alegria das ruas tornou sua tristeza imperceptível e o medo tornou-se seu companheiro.

Ela não queria, mas não conseguia deixar de pensar na sua biblioteca confortável e com cheiro de maçã. A jovem conseguia sentir a textura de seus livros por entre os dedos que era um sentimento agradável. Lembrava das cobertas quentes, da saborosa comida e, por último, aquilo que mais lhe agradava.

— Dona Ângela... — murmurou na esperança de ser salva daquele companheiro desagradável, o medo.

— Oi. — Uma voz suava chamou-lhe. — Menina!

Ao levantar a cabeça e olhar para o lado, Sienna viu a mulher mais bonita que já testemunhou. Uma altura média para a região, roupas de cor verde claro ainda mais reveladoras que as roupas das dançarinas. Possuía uma pele de cor castanha, mas não era como as demais pessoas de região, que também possuíam uma pele dessa cor. A mulher tinha uma pele suave sem imperfeições com um tom como o da casca da castanha, um moreno escuro que brilhava ao sol. Ela também tinha um corpo esbelto, cheio de curvas e, sua característica mais marcante, um par de olhos esmeralda que combinava com as roupas.

A mulher sorriu e seus olhos piscaram, revelando um brilho incomum. Os longos cílios tornavam o sorriso dela ainda mais encantador e puro. Contudo, um sentimento permaneceu constante no peito de Sienna, desconforto. 

— Você se perdeu? Está tudo bem contigo? — disse a mulher com um sorriso e com uma voz meiga. Seu olhar demonstrava que estava preocupada com a garotinha, mas o sentimento não saiu do peito da jovem.

Ela estendeu a mão para passar na cabeça de Sienna que, inconscientemente, bateu na mão da mulher e levantou-se com rapidez. De pé, ela encarou a beldade com nervosismo.

— Você está com medo... Essa cidade é muito perigosa. Vou te ajudar a encontrar sua família. Sabe onde seus pais estão? — Apesar do tapa e do recuo de Sienna, a mulher continuava com seus avanços. — Não se preocupe, eu irei cuidar de você.

Com aquelas palavras, Sienna sentiu um calafrio e o suor frio escorreu pelas costas.

— Ah... Eu estou bem... — Sienna não queria continuar aquela conversa e, assim que disse isso, virou-se de costas, buscando uma escapatória.

— Espere... — A mulher agarrou o braço dela e puxou-a com força. — Posso te ajudar. Você não vai querer sair por aí sozinha. Venha comigo.

Sienna puxou com força, mas o aperto em seu braço era muito forte. Não importava a força que utilizava, a mão não se movia nem um milímetro para o lado, parecia rocha. Um adulto era muito mais forte que uma criança, no entanto, ao tentar fugir, pelo menos a mão se mexeria um pouco, mas os braços finos da beldade nem tremiam.

— Está me machucando... Me solte ou eu vou gritar! — exclamou Sienna com uma expressão de dor.

— Você não quer vir por bem! Então vou te levar por mal. — A mulher começou a mostrar sua verdadeira intensão.

Sem pensar duas vezes, Sienna começou a gritar:

— Socorro! Me solte sua bruxa!

— O que você disse!? — Uma veia surgiu na testa da mulher e o aperto do pulso se intensificou.

Ela começou a arrastar Sienna para o beco com facilidade. Olhando para o seu pulso, Sienna viu que já estava roxo e se continuasse tentando fugir acabaria quebrando.

— Ei! O que está acontecendo ali?!

Um mercador percebeu os gritos desesperados próximos do beco e começou a ir até lá. Ao ver aquilo, a beldade clicou com a língua, soltou o pulso da menina e correu para o beco, injuriada. Sienna caiu no chão por ainda estar fazendo força e suspirou aliviada.

— O que está acontecendo com essa cidade? — Ela perguntou passando a mão no pulso ferido, onde um grande hematoma roxo estava presente.

Logo um grupo de homens chegou no local. Eles olharam tudo rapidamente, mas não viram vestígios de ninguém. Sienna já havia corrido da cena, buscando ficar na segurança da multidão e a mulher desapareceu no beco.

Seguindo em uma direção aleatória, Sienna percebeu que não poderia fraquejar em momento algum. E continuou a caminhar com passos rápidos, pois queria se afastar o máximo possível daquela mulher.

Desejou seguir para o porto, mas não sabia a direção correta. As ruas eram todas similares e se perder era uma tarefa fácil. Ela poderia parar do outro lado da cidade caso pegasse um único caminho errado.

Enquanto seguia em frente, deparou-se com um grande prédio ao longe. Diferente dos demais prédios da cidade, aquele possuía uma estrutura e modelo completamente desconexo da paisagem.

Ele era muito mais alto que qualquer outra estrutura nos arredores. Era feito de tijolos muito mais resistentes que o barro em sua base e, em certos pontos, madeira era utilizada, algo ainda mais incomum.

Além de tudo, Sienna notou algo em especial, vidro. Janelas, em alguns pontos mais altos, eram feitas de um vidro escurecido, um material raríssimo de se ver em todo o continente. Apesar da matéria prima do vidro ser apenas areia, o processo de criação e modelagem necessitava de uma tecnologia avançada que não era facilmente obtida.

Do lugar, muitas pessoas com roupas caras e joias entravam em saiam, soltando risos altos lotados de avareza, no entanto, também havia mendigos rondando por toda a estrutura e, vez e outra, pessoas saiam do prédio com rostos deploráveis, pareciam ter sido quebrados. Havia até algumas pessoas expulsas do prédio por piratas que serviam de seguranças.

Ao ver aquilo, Sienna nem pensou duas vezes. Ela deu meia volta, pois sabia que estava indo na direção errada e aquele lugar não era nem um pouco agradável de se estar.

Ela retornou as movimentadas ruas principais, mas dessa vez estava preparada. Movia-se sempre pelos cantos das ruas, evitando se aproximar demais do centro, onde era o verdadeiro inferno.

Aproveitando da situação, ela começou a escutar as conversas dos mercadores. Um líder popular seria eleito em outra cidade do país, um grupo de piratas novatos havia sido destruído pelos piratas mais fortes da região, uma ilha foi descoberta no leste e uma série de desaparecimentos ocorreram pela cidade, essas eram as notícias que ela escutou.

Nada lhe interessou muito, até que ouviu um mercador citar um evento incomum.

— Você escutou a última? — falou um mercador baixinho com um longo bigode para o seu companheiro magrelo.

— Não, me conte a nova. — O magrelo pediu animado.

— O navio do comandante Amon chegou no porto há algumas horas. Aquele navio enorme deve ter mais de 40 canhões!

— E? Qual o problema?

— Escutei rumores de que todas as bolas de canhão do navio foram utilizadas! Não havia uma única bola de canhão restante... — O baixinho mexia em seu bigode parecendo pensativo.

— Hahaha — riu o colega erguendo uma das caixas. Ele se virou para o seu colega e cético declarou: — São apenas rumores, acalme-se.

— Isso não é tudo! — Ao escutar o que o de bigode disse, o magrelo levantou uma sobrancelha e prestou atenção, Sienna também usou tudo o que podia para escutar a conversa. — Amon voltou ferido! E, além disso tudo, uma notícia foi enviada pela cidade.

— Amon... Ferido?  Notícia?! Conte logo, homem! 

— Uma recompensa! — Sienna tremeu ao escutar a palavra “Recompensa” — 10 Moedas de ouro... Grana o suficiente para que eu possa me aposentar, essa foi a quantia oferecida para quem pegar uma menina de cabelos brancos e um marujo jovem.

— 10!? Meu deus, Amon enlouqueceu!

— Quando ele não foi louco?! Hahaha... — exclamou o baixinho de bigode.

Os homens continuaram em sua conversa, Sienna, por outro lado, estava muito longe dali.

— Não posso ir para o porto de maneira alguma... O que eu faço agora? — A jovem estava outra vez jogada no chão em suspiros. 



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