Volume 2
Capítulo 5: Donzela Banhada em Sangue (1)
Assim que a garotinha ensanguentada apareceu, Menou avançou.
Ela não hesitou ou tentou entender quem exatamente era essa garota. Ela apenas tomou a iniciativa.
Ativando o Aprimoramento Etéreo, Menou ficou envolta com o brilho de Luz Etérea conforme diminuía a distância entre elas e cortou a garganta da menina com sua adaga.
“…Mm?”
A menina, cuja garganta foi cortada, caiu para trás com uma expressão confusa em seu rosto.
Sangue fresco jorrou pelo ar.
O corpo da pequena garota caiu no chão, com sangue escorrendo de seu pescoço cortado. Um ferimento fatal. Mas claro, Menou não baixou sua guarda. A garota caiu muito facilmente comparado com a maneira bizarra que havia chegado. Matá-la não poderia ser tão simples assim.
Obviamente, havia muito mais nessa garota do que aparentava.
A razão pela qual Menou não hesitou em dar um golpe mortal imediatamente, foi porque a opção de tentar capturar a menina nem sequer passou pela sua cabeça. Qualquer um que saísse rastejando de dentro de outra pessoa não poderia ser um humano normal. Não havia como ela ser a garotinha inocente que parecia ser.
O julgamento de Menou, claro, estava correto.
A garganta da menina foi aberta. O corte que Menou deixou foi profundo. Sangue espumante borbulhou dos pulmões da menina através de sua laringe e saiu pelo ferimento.
E então, subitamente, uma mão saiu do corte.
“Ngh!” Menou arfou.
Enquanto ela observava, a segunda mão rasgou violentamente a traqueia e emergiu. Os braços emergindo da garganta da menina abriram forçadamente o ferimento como se estivessem tentando criar uma saída maior.
Com cortes e rasgos audíveis, as mãos abriram os ferimentos, empurraram a carne e perfuraram os ossos, dilacerando o cadáver até que uma garotinha exatamente como a que foi morta rastejou-se para fora.
“Mm-ah-ah, não seja apressada. Nós nem sequer começamos, não é?”
Emergindo da fenda em seu próprio cadáver, a garotinha repreendeu Menou alegremente.
Seu próprio corpo estava a seus pés, ou talvez fosse mais como uma casca descartada. Seja como for, aquele corpo estava vivo momentos atrás. Agora estava gradativamente começando a derreter, como se seu propósito tivesse sido cumprido.
Enquanto o cadáver se decompôs, a segunda garotinha, que tinha o mesmo rosto, estava perfeitamente ilesa.
Toda a exibição foi tão grotesca e surreal que teria feito qualquer um enlouquecer. Conforme o sangue era drenado de seu rosto, Menou quase se sentiu débil por um momento.
Mas isso era realidade.
Focando-se em seu coração acelerado e visão estreita, Menou lambeu os lábios. Ela respirou fundo e exalou lentamente.
Isso foi suficiente para restaurar seu estado mental. “Sinto que estou enlouquecendo…” ela resmungou.
“Não, ainda não. É a próxima parte que será muito engraçada. O gongo nem tocou ainda, sabia?”
Enquanto Menou cuidadosamente mantinha a cabeça fria e um tom uniforme, a garotinha riu, encharcada de vermelho com seu próprio sangue.
“Você não parece ser… um demônio que Manon evocou.”
“Claro que não! Eu sou uma garota humana autêntica da cabeça aos pés, está vendo?”
Embora ela tenha dito isso com um sorriso, estava claro que ela não era uma humana comum.
“Entendo… Suponho que você deve ser humana, sim.” Menou escolheu suas palavras cautelosamente, ao mesmo tempo que xingava por dentro.
Ela deveria ter percebido que havia algo errado nas imagens que Momo trouxe.
Os espinhos da armadilha da donzela de ferro que Momo disparou estavam cobertas com veneno. Logicamente falando, isso significa que a garotinha lá dentro não deveria estar viva para começar. Mas ela sobreviveu sendo empalada por espinhos venenosos porque ela era o mal encarnado.
Talvez a menina em pé diante de Menou realmente fosse humana. Mas mesmo se isso fosse verdade, ela ainda era um tabu entre tabus, mais insidiosa do que qualquer demônio ou diabo jamais poderia ser.
Seu uso dessas conjurações inacreditavelmente aterrorizantes eram prova o suficiente.
Não havia dúvida: essa garota tinha que ser uma Ádvena com um Puro Conceito. Na verdade, ela era do pior tipo de todos—um ser medonho que passou do ponto de ser chamado de perdido. Menou sombriamente murmurou o nome especial das calamidades que causaram tanto mal ao mundo.
“Um Erro Humano…!”
Parada diante dela estava a sombra do que outrora foi uma Ádvena.
Era isso que acontecia quando um Ádvena esgotava suas antigas memórias, abandonava sua humanidade e se tornava a própria encarnação de seu Conceito.
Sua aparência angelical não significava nada. Mesmo no interior, ela não passava de uma imagem falsa. Essa garotinha havia se transformado em um Puro Conceito, até os ossos.
Neste caso, o Puro Conceito que a menina estava usando provavelmente era alguma forma de conjuração baseada em invocação sacrificial. Era seguro assumir que ela usou sua própria morte como um sacrifício para invocar a si mesma. Matar essa menina era praticamente o mesmo que oferecê-la um sacrifício.
Em outras palavras, essa menina não poderia ser morta. Ela era imortal, embora por meios diferentes de Akari.
“…Isso é péssimo.” Menou apertou o cabo de sua adaga firmemente.
Francamente, o domínio dessa garota sobre seu Puro Conceito era tão minucioso que nem valia a pena comparar com Akari, que ainda recentemente chegou neste mundo. Que tipo de Erro Humano ela era? Menou tinha a sensação de que sabia a resposta, mas não queria dizer em voz alta.
Um único verso da escritura cruzou sua mente:
O Conceito de Pecado Original nasceu dos pensamentos selvagens de uma única menina e se derramou de sua carne e sangue.
Qualquer um familiarizado com o conceito de tabu conhecia essas palavras, as quais pareciam se adequar a garota diante dela muito bem. Se a intuição de Menou estivesse correta, então este era o pior cenário imaginável.
“Por que essa cara assustadora, moça? Vamos. Apenas desfrute do passeio.”
“Qual parte disso eu poderia desfrutar, monstro?”
“Mmm, monstro? Quanta crueldade. Eu pratiquei arduamente enquanto estava dentro daquela garota e finalmente peguei o jeito de falar. Então vamos conversar um pouco mais. Por favor?”
Ela deu um passo, depois dois e então três.
A garotinha entrou no alcance de Menou com passos despreocupados e se inclinou para perto.
“Diga-me, quais são seus passatempos favoritos? Eu gosto de cantar, dançar e assistir a filmes! Até dá para praticar canto e dança sozinha, mas estou tão triste por não poder assistir a filmes. E quanto a você, moça?”
“Passatempos, é? Não tenho nenhum, na realidade.”
Enquanto a garotinha realmente começou uma conversa sem sentido, Menou respondeu bem cruamente.
Surpreendentemente, ela não sentiu nenhuma hostilidade da menina diante dela. Ela não parecia zangada ou antipática, muito menos mortífera. Na verdade, ela parecia uma garotinha perfeitamente normal vindo conversar.
“Aww, isso é uma pena. Passatempos fazem a vida valer a pena, sabia? Deveria tentar aproveitar mais a vida.”
“Eu sou muito ocupada para perder tempo com lazer. Afinal, o meu trabalho é matar pessoas como você.”
“Mmm! Você? Me matar?”
“Sim, meu objetivo é matá-la. Seu Puro Conceito, no caso. Esta é a razão da minha existência.”
“Mmm, então você quer destruir meu Puro Conceito?”
Perto o suficiente para Menou poder estender sua mão e acariciá-la na cabeça, a menina supostamente inofensiva olhou para ela com olhos arregalados e redondos.
E então, ela começou a rir ao ponto de berrar. A garotinha parecia maravilhada com a ameaça de ser morta.
“Nossa, você é tão engraçada! Pode me matar se quiser. Isso acontece o tempo todo. Como sou muito fraquinha, eu morro bastante. Mas tenho quase certeza que você não pode me destruir.”
Ela parecia uma criança que ganhou um brinquedo novo, aceitando a ameaça de Menou como um presente para se celebrar e brincar. Essa reação estranha apenas fez Menou ficar ainda mais tensa.
“Se acha que pode me destruir, apenas tente, está bem? Ninguém neste mundo conseguiu tal feito, nem mesmo o herói Marfim, mas vá em frente e tente!”
“O herói Marfim?” Menou franziu a testa para o título não familiar.
“Mmm, você não conhece!?” A menina levou sua mão à boca em uma exagerada exibição de surpresa. “Mas ele era tão incrível! O mais forte, maior e mais poderoso Puro Conceito de todos os tempos! O ‘Branco’ que traz pureza e normalidade ao mundo!”
A garotinha abriu os braços e levantou a voz. “Encobrindo a Estrela no norte, transformando o Dragão em sal branco no oeste! Perseguindo o Receptáculo no leste nos confins da noite branca e me selando no nevoeiro branco no sul! Marfim, o herói que nos destruiu, nos selou e salvou o mundo! Aquele que nos traiu quando tentamos descartar este mundo! Mm, mas não foi culpa daquela pessoa!”
Ela falava e gesticulava com um ar tão dramático que era um tanto descabido. A menina se portava como uma artista protagonizando a trágica heroína em uma peça de um ato enquanto prosseguia.
“Aquela pessoa era nossa amiga, nossa companheira, nossa esperança—e também a guardiã deste mundo! O Puro Conceito de Marfim ficou preso a função de proteger este estupido planeta! Os próprios desejos daquela pessoa nem importavam mais…!”
Sua voz tremeu de tristeza e ela abaixou sua cabeça.
E então, ela abruptamente olhou para cima novamente, com um sorriso brilhante sem nenhum sinal de sofrimento.
“Mas agora eu entendo. Todos esqueceram do herói. Após todo aquele trabalho árduo! Mesmo o herói tendo se esgotado completamente, vocês o esqueceram!! …Sabe, acho que é por isso que eu odiei tanto vocês.”
Menou repetiu as palavras da menina em sua mente.
A Estrela no norte, o Dragão no oeste, o Receptáculo no leste… Ela imaginou que a menina estivesse falando sobre os Quatro Principais Erros Humanos.
A Estrela no norte deveria ser o Crepúsculo. O Receptáculo no leste era a Sociedade Mecânica. Menou não tinha certeza de como a Espada de Sal no oeste se tornou um Dragão, mas tudo isso aconteceu há mil anos atrás. Fazia sentido a versão da garotinha não se alinhar com as interpretações modernas dos Erros Humanos.
Em todo caso, se o que essa menina disse fosse verdade, isso significaria que quando esses quatro infames Puros Conceitos ameaçaram destruir o mundo, eles foram impedidos por um colega portador de Puro Conceito chamado Marfim. Em outras palavras, um Ádvena salvou este mundo.
Mesmo Menou nunca tinha ouvido falar de tal informação. De acordo com os registros da igreja, os Quatro Principais Erros Humanos foram selados ou destruídos pela igreja na época.
Porém, mais premente, havia uma frase importante em sua história que continha uma pista para a identidade da menina.
“Você disse que foi selada no ‘nevoeiro branco do sul.’ Isso significa que você é…?”
“Mm, acalme-se. Você disse que vai me destruir, não é? Estou tão feliz! Faz tanto tempo desde que alguém seriamente tentou fazer isso comigo. Se estiver falando sério, vamos ter uma luta excitante e super divertida até a morte! Eu me cansei de não fazer nada além de comer minha própria espécie!”
Interrompendo a pergunta de Menou, a menina segurou a bainha de seu vestido e fez uma referência refinada.
“Obrigada por ter vindo hoje, e desejo-lhe um dia auspicioso e boa saúde! Por favor, me ataque, me quebre, me esmague ao seu bel-prazer! Há muito mais de onde isso veio, então não precisa se conter! Vamos ver você realmente enlouquecer!”
Ela ergueu os olhos de sua profunda reverência e endireitou a coluna.
Foi como a introdução de uma atriz de pé no palco enquanto a cortina subia. Ao fazer esse discurso estranho e desconhecido para Menou, a menina ergueu a cabeça mais alto. Ela colocou uma mão sob o queixo e levantou-o lentamente.
“O que você está prestes a ver é o melhor filme B de todos os tempos. Um jogo de azar no qual o diabo rola os dados.”
Claro, sua cabeça não subiu mais do que o pescoço. Mas mesmo assim, ela continuou empurrando para cima.
Logo, ouve-se o estalo de fibras carnudas se esticando. O rosto sorridente da menina subiu mais e mais conforme seu pescoço se esticava anormalmente. Fibras musculares têm uma certa elasticidade; seu pescoço se alongou lentamente, assim como o pescoço do corpo de um homem enforcado.
E não parou.
“Demônios! Monstros! Reis Demônios! Diabos e deuses misteriosos e monstruosos! O que o rolar do dado trará a seguir? Você terá que esperar para ver!”
Sua pele, veias e carne foram além dos limites, estalando e rasgando à medida que sua cabeça subia. Lentamente, sua cabeça e pescoço estavam se separando do seu corpo.
Por fim, houve um último ruído de ossos se quebrando.
No mesmo momento, a menina torceu sua própria cabeça drasticamente.
E sua cabeça saiu completamente.
Sangue jorrou do lugar onde sua cabeça foi arrancada à força bruta.
O corpo da menina, agora sem cabeça, caiu no chão. Sua cabeça decepada, ainda sorridente, rolou pelo chão como um dado grotesco sendo lançado.
Foi uma ação completamente insondável. Um suicidio que foi além do anormal.
Menou olhou para a fonte esguichando sangue, sem dizer uma palavra.
Enquanto ela observava em transe, a cabeça rolou até o limite de sua visão e aterrissou olhando para o céu.
E então, o sangue esguichando diante os olhos de Menou assumiu um brilho vermelho de Luz Etérea.
Força Etérea: Sacrificar—Conluio do Caos, Puro Conceito [Maldade]—Evocar [Posso chamar cem amigos?]
A fonte de sangue cortou o próprio espaço.
Do outro lado dessa fenda recém formada no ar havia um abismo escuro. A quantidade anormal de sangue jorrando do pescoço da menina transformou-se em um vazio que se conectava ao abismo.
O que se formou não foi nada menos do que uma entrada para a Dimensão do Conceito de Pecado Original.
Sangue, carne e o tecido do espaço se abriram, e monstros começaram a brotar do abismo.
Um após o outro, uma marcha interminável. Não havia dois monstros iguais. Mesmo Menou, uma Executora, nunca tinha visto os tipos de monstros que surgiram.
Esses monstros evocados imediatamente começaram a devorar o corpo da garotinha. Sua carne e sangue foram oferecidos como um sacrifício para eles, depois de tudo. E não havia sacrifício melhor para essas criaturas do que uma pura donzela.
O corpo da garotinha inocente foi consumido pelos monstros em instantes.
Um dos monstros de repente começou a tremer. Ele se sacudiu violentamente e abriu bem a boca, como se estivesse prestes a vomitar algo.
Da garganta do monstro, deslizou-se para fora uma garotinha ilesa.
Era uma menina de não mais de dez anos de idade, com características refinadas e um vestido branco. Ela parecia exatamente com a garotinha que havia acabado de ser comida.
Ela era uma verdadeira ameaça, acima até da mente mais diabólica. Após a garotinha renascer do corpo do monstro e pisar no chão, ela abriu seus braços e sorriu.
“Uma tripla ameaça de medo, excitação e diversão! A personificação cantante e dançante de um filme de desastre! Sim, não sou ninguém menos do que Pandæmônio—a massa de monstros!”
O Erro Humano que no passado quase destruiu o mundo agora havia renascido em Libelle.
*
“Hrmm…”
Na estação dos cavaleiros em Libelle, Ashuna suspirou.
Um suspiro lânguido e deprimido, muito diferente do seu estado normal. O incidente de monstrina estava seguindo rapidamente para uma resolução. O Castelo Libelle foi isolado. Sem dúvida isso foi resultado do ataque de Momo à base deles no dia anterior. Ela conseguiu provas o suficiente para que todos pudessem agir.
Mas a hora marcada para o encontro delas veio e passou, e Momo não apareceu.
Um membro da Fourth estava sendo interrogado na estação dos cavaleiros. Era um homem velho que se entregou assim que a ilha foi isolada—uma figura central da organização.
“Estou lhe dizendo, a líder da Fourth agora é a Manon Libelle! Nós somos apenas vítimas! Aquela garota nos drogou com monstrina e nos forçou a fazer sua vontade!!”
O homem insistia com uma voz estridente que Manon Libelle estava por trás de tudo.
Ao invés de ajudar com os interrogatórios diretamente, Ashuna estava pensando em seu próximo plano de ação.
“O que devo fazer…?”
Ela estava mais preocupada com o bem-estar de Momo do que com os avanços em relação à Fourth. Conhecendo a personalidade de Momo, Ashuna assumiu que a garota viria gabar-se de seu sucesso, mesmo que tentasse agir indiferentemente. Ela era do tipo de pessoa que gosta de impor domínio sempre que possível.
Portanto, como ela não apareceu, havia uma boa possibilidade de que algo havia acontecido com Momo na noite anterior. Mas Ashuna Grisarika não era do tipo que agia só porque alguém havia potencialmente sido derrotado em batalha.
Ashuna era uma crente devota à força. O que ela almejava não era a força de um grupo, mas sim a força de um indivíduo.
Se ela havia fracassado em seu ataque na noite anterior, isso significava que Momo era fraca. Seria prova de que ela era uma decepção, e Ashuna havia encontrado alguém na noite passada que era pelo menos tão interessante quanto Momo de qualquer forma.
Mas Ashuna havia tomado gosto por Momo.
“Ashuna, venha aqui.”
No fundo de sua mente, Ashuna pensou em sua irmã mais velha, que tinha mais ou menos a mesma altura que Momo.
Poucos que a conheciam agora acreditariam, mas Ashuna adorava pintar quadros quando pequena.
Ashuna era atraída por qualquer coisa bonita. Ela sempre estava à procura de beleza. A jovem Princesa vagava pelo castelo e mais além em busca de temas para pintar, em busca de paisagens que tocassem seu coração.
Era sua irmã mais velha que ficava de olho em Ashuna, que era uma criança problemática de uma forma muito mais fofa naquela época. Ela pegou na mão da jovem Ashuna e a apresentou a um cavaleiro.
“Você já viu algo mais lindo?”
O cavaleiro mais forte do continente.
Quando ela viu aquele cavaleiro segurando uma espada, Ashuna abandonou seu pincel e teve como objetivo se tornar uma cavaleira, também. Ela queria obter a beleza da força para si mesma, em vez de retratá-la em um quadro.
Ashuna tinha talento natural. Ela rapidamente desabrochou como uma cavaleira habilidosa e passou no exame com louvor. Ela ainda se lembra claramente do que sua irmã mais velha lhe disse naquele dia.
“Você tem um verdadeiro dom. Mas não importa o quão forte você se torne sozinha, de certa forma, isso não significava nada. O verdadeiro valor da humanidade está em um grupo. Sob o líder certo, um grupo de humanos pode lidar com qualquer desastre. E por isso, Ashuna…”
A irmã mais velha de Ashuna, que era uma cabeça mais baixa que ela, sorriu arrogantemente.
“Darei à você a honra de servir sob meu comando em minha unidade.”
No fim, Ashuna ficou, de certo modo, irritada com tudo isso e fugiu da família real.
Era um simples caso de não gostar de alguém muito parecido com ela mesma. Mas as semelhanças entre Ashuna e sua irmã não eram tão próximas quanto pareciam.
Ashuna era fascinada pela beleza dos indivíduos, enquanto sua irmã era a líder de um grupo.
Segundo todas as probabilidades, a mais adequada para a realeza era sua irmã mais velha. Rebelando-se contra sua irmã e sua família, Ashuna vagou pelo reino, realizando tantos feitos que se tornou conhecida como a Princesa Cavaleira reformista do mundo.
Mas em meio a todas essas gloriosas escapadas, Ashuna notou algo estranho.
Independente de onde ela fosse, ela não encontrava vestígios dos erros de sua irmã.
Certamente não havia como sua irmã nunca ter cometido injustiça ou crime. Ashuna sabia que sua irmã era uma realeza perversa da Nobreza e uma marionetista excepcional. Ela viu por si mesma que sua irmã tinha raízes profundas com o lado negro do reino.
E mesmo assim, ela não conseguia encontrar nenhuma prova dessas atividades mais obscuras. Não parecia que elas estavam sendo encobertas, mas completamente apagadas.
As dúvidas de Ashuna finalmente cresceram ao ponto dela não poder ignorá-las.
E então, cerca de um mês atrás, algo aconteceu…
A inquisição sobre o incidente da evocação de Ádvena não visou sua irmã, mas seu pai. Mesmo quando a arcebispa foi executada na antiga capital de Garm, a irmã de Ashuna ainda foi considerada inocente. No mínimo, as inquisidoras da Faust haviam determinado que não havia provas de que sua irmã estava envolvida em atividades ilegais.
“Não sei no que ele se meteu, mas meu pobre pai sempre foi um tolo… Francamente. Com uma irmã mais velha como a minha, eu sempre desejei ter uma irmãzinha só minha.”
Soando atipicamente deprimida, Ashuna murmurou algo que provavelmente deixaria Momo furiosa caso ouvisse.
Apoiando o queixo nas mãos, ela se perguntou se conseguiria verificar a segurança de Momo se ela fosse à igreja quando algo acontecesse.
Ela sentiu uma conjuração enorme e quase peçonhenta em curso.
“…!”
Todos os poros da sua pele pareceram se abrir para deixar o suor escorrer. Seus cabelos ficaram em pé e arrepios percorreram seu corpo. Os sentidos afiados de Ashuna detectaram uma presença tão intensa, que quase a deixou enjoada, assaltando-a com um irritante desconforto que ela não conseguia ignorar.
A sensação mais próxima que ela poderia fazer uma comparação foi a sensação que ela teve no Reino de Grisarika, após cair do trem enquanto lutava com Momo.
Na ocasião, ela sentiu uma indescritível incorreção. Foi um distúrbio intenso, como se o mundo tivesse desviado de seu curso.
Seu corpo inteiro estremeceu como se um monstro horrível estivesse nascendo, rasgando e se libertando do ventre do planeta.
Não era apenas sua imaginação.
“Se Manon Libelle não for detida, eu também me tornarei um monstro. Estou lhe dando meu testemunho! Vocês devem prender aquela garota antes que—ack!?”
O homem idoso que estava exclamando furiosamente sobre Manon Libelle, de repente parou.
Ele estava sofrendo uma mudança. Seu corpo idoso começou a derreter por fora.
“M-mas o quê…?” Um dos cavaleiros murmurou horrorizado.
Não era apenas o velho. Todos os membros da Fourth que foram temporariamente restringidos estavam passando pela mesma transfiguração. As pessoas sob custódia derreteram até os ossos e perderam completamente suas formas.
Enquanto o caos se instaurava na estação dos cavaleiros, Ashuna virou seu olhar afiado para o Castelo Libelle.
“…Aquela conjuração estava vindo de lá.”
A Princesa Cavaleira agarrou sua espada e se dirigiu ao campo de batalha.
*
Não era uma piada.
Quando o Puro Conceito que saiu do estômago de Manon revelou sua aterrorizante identidade, Menou estremeceu.
“Pandemônio, criador do nevoeiro…!”
Um dos Quatro Principais Erros Humanos que quase destruiu o mundo, o lendário Pandemônio do sul, foi libertado.
Não era blefe. Isso era muito claro só de olhar para ela.
A garotinha diante de Menou era um monstro macabro que havia sido completamente dominado por um Puro Conceito. Já não era mais correto chamá-la sequer de humana.
“Mmm? Isso não soa muito certo. Eu sou Pandæmônio—a massa de monstros. Quem criou o nevoeiro foi o portador do Marfim, não eu. Não misture as coisas, está bem?”
“…Está falando do herói que você comentou antes?”
“Isso mesmo!”
A garotinha fez um círculo com seu polegar e dedo indicador para sinalizar uma resposta correta. Tudo que a garotinha com o vestido branco, a menina Pandæmônio, disse era novidade para Menou.
Menou nunca havia ouvido falar de tal herói. A palavra “marfim” a fez pensar sobre o que aconteceu com sua cidade natal, mas aquilo foi há apenas 10 anos atrás. Não poderia estar conectado com os eventos que ocorreram mil anos no passado.
Ela olhou para a garotinha novamente.
Se alguém entrasse no território maligno que as pessoas chamam de Pandemônio, essa pessoa nunca conseguiria escapar. Como se constatou, esse nevoeiro flutuando sobre o mar era na verdade uma barreira que selava a Pandæmônio, então Pandemônio era apenas o nome do local da consequência do desastre.
Pandæmônio, a garota que havia sido selada dentro da barreira de neblina, era o próprio Principal Erro Humano.
Tal como ela disse, ela era a própria encarnação do mal. Uma monstruosidade sem nome.
Diante dessa ameaça insondável, Menou rangeu os dentes.
“Hoje está se tornando um péssimo dia.”
Ela pensou que havia encurralado Manon, a mentora por trás dos incidentes em Libelle, mas olha para ela agora. O corpo de Manon já havia desaparecido sem deixar rastros. Os monstros devem tê-la consumido.
Bestas ainda estavam rastejando da fenda que Pandæmônio havia criado no espaço. Haviam mais deles em uma ampla gama de formas e tamanhos do que se poderia ver, mesmo na Fronteira Selvagem.
“Você acha? Mas o clima está tão perfeito—nem uma nuvem sequer à vista. O azul não é uma cor brilhante? Estou cansada de ver marfim.”
Pandæmônio olhou para o céu pela parte da parede que foi quebrada durante a luta com Manon. E então, ela recuou abruptamente.
“Digo, já se passaram mil anos. Mesmo você não sabe sobre o Marfim, e você usa uma túnica de sacerdotisa… Mas eu ainda posso sentir a presença dele um pouquinho. Não é estranho?”
Menou não teve tempo de responder sua pergunta.
Assim que Pandæmônio se afastou, os monstros avançaram. Sem nenhum cadáver sobrando, seu próximo alvo era a humana viva diante deles.
Um deles atacou Menou e ela enterrou sua adaga nele.
Todo o corpo de Menou estava brilhando com Luz Etérea. Usando o monstro, que havia morrido instantaneamente quando ela apunhalou seu crânio, como escudo, ela ficou mais próxima do chão e disparou para as coisas do monstro seguinte. Era difícil dizer, por conta de seu corpo bizarro, onde o coração poderia estar. Ela golpeou o que parecia ser seu pescoço com o cabo da adaga e esmagou sua vértebra cervical.
Os inimigos evocados não eram particularmente fortes; na verdade, Manon havia dado mais trabalho. Pelo menos, não era a horda de monstros poderosos das lendas.
O problema era seus números. A fenda no espaço pelo qual os monstros vinham ainda estava aberto, trazendo mais deles de todas as formas e tamanhos a cada segundo.
Em instantes, ela derrubou a horda inicial de monstros, porém seus números não mostraram sinais de decréscimo.
Sua maior prioridade era fechar o buraco que se abriu para a Dimensão do Conceito de Pecado Original.
Menou usou o Aprimoramento Etéreo e o brasão de sua adaga para continuar massacrando os monstros enquanto começava a formar uma conjuração da escritura.
Força Etérea: Conectar—Escritura, 12:1—Invocar [Martele o prego, martele o prego, tudo para dar apoio.]
Luz Etérea brotou da escritura de Menou e tomou forma de inúmeros pregos gigantes. Eles eram feitos de poder, com formas mais próximas ao do mundo espiritual que do mundo físico.
As pontas de luz que se formaram ao redor de Menou dispararam como se tivessem sido atingidas por um martelo.
Uma após a outra, elas perfuraram os monstros, formando buracos em seus corpos, almas e espíritos. Além disso, mais pregos gigantes atingiram cada extremidade da fenda espacial e a selaram.
“Mm!” Pandæmônio exclamou, surpresa com a destruição simultânea dos monstros e da fenda. Sem dizer uma palavra, Menou lançou-se em sua direção, agarrando-a e arrastando-a para o chão sem deixar brecha para resistência.
Força Etérea: Conectar—Adaga, Brasão—Invocar [Fio Etéreo]
Se ela era imortal, fazia todo o sentido restringi-la. Menou produziu Fio Etéreo com o brasão de sua adaga, segurou os pulsos da menina atrás das costas e a amarrou para que não pudesse se mover.
Nenhum humano normal conseguiria escapar dessas amarras apertadas. Mesmo os membros da Fourth, cujos corpos eram fortalecidos com monstrina, não conseguiram se livrar do fio forte e fino quando o mesmo foi enrolado em torno deles.
Menou, no entanto, não estava disposta a baixar sua guarda. Isso era um Puro Conceito concebido com uma forma humanóide. Prendê-la com fios dificilmente era suficiente.
“Oh não, não acredito que foi pega tão facilmente… mas é melhor tomar cuidado!” Pandæmônio ficou pasma por um momento, e então encarou Menou ousadamente. “Me derrotar não é o suficiente para salvar o mundo! Eu não chego aos pés dos outros três! Afinal, eu sou Pandæmônio, a mais fraca dos Quatro Principais Erros Humanos…”
Então esse é o fim?
Enquanto a garota amarrada exclamava o que poderia ser interpretado somente como frustração por sua própria derrota, Menou começou a sentir um pouco de esperança—mas isso foi rapidamente quebrado em pedaços.
“…Mas a mais maligna, também!
Essa voz veio de trás dela.
Um arrepio percorreu sua espinha. Pandæmônio estava bem diante dela, ainda presa pelo fio. Ela estava viva, respirando, falando e sorrindo.
Menou lentamente se virou para olhar na direção da origem da voz.
Pandæmônio também estava lá.
Agora haviam duas delas.
“……” Menou olhou para as duas meninas alternadamente.
A única diferença era…nenhuma. Não era uma questão de qual era falsa e qual era verdadeira. Sem nenhuma dúvida, ambas eram verdadeiras.
Enquanto Menou olhava paralisada, Pandæmônio passou por ela e caminhou em direção a si mesma.
“Não acredito que fui pega. Tenho muito o que melhorar.”
“Desculpaaa. Não pude evitar. Sou fraca.”
“Eu seeei. Afinal, eu sou você.”
As duas meninas idênticas pressionaram suas testas juntas, agindo muito felizes em sua reunião. Elas uniram as mãos e se abraçaram como gêmeas expressando amor fraternal.
Isso, no entanto, era qualquer coisa, menos uma cena reconfortante de afeição familiar.
Ouviu-se o estalo afiado de ossos se quebrando.
Uma das Pandæmônios se aproximou da clavícula da outra. Apenas alguns segundos depois de conversar alegremente com seu outro eu, ela colocou as duas mãos ao redor de sua garganta e quebrou seu pescoço fino.
A Pandæmônio cujo pescoço foi quebrado caiu morta e derreteu. A outra, ao matar ela mesma, voltou-se para Menou com um sorriso.
“Bom trabalho com a partida de aquecimento, moça.”
Não havia nada que Menou pudesse dizer.
Pandæmônio era a progenitora de todos os monstros e demônios.
O Puro Conceito de Maldade, o qual criou o Conceito de Pecado Original que espalhou o mal por todo o mundo.
Seus pensamentos se tornaram demônios e criaram o Pecado Original, e sua carne e sangue se tornaram monstros e se espalharam por todo o mundo. O Pecado Original provocou a destruição de uma civilização próspera há mil anos atrás. A criadora das conjurações que poderiam destruir a humanidade sorriu, parecendo inocente.
A essa altura, qualquer sacerdotisa ou cavaleiro normal teria perdido todas as esperanças e enlouquecido.
Mas Menou não hesitou. Seus olhos ainda estavam cheios de determinação enquanto ela apontava sua adaga.
“Foi você que tentou Manon a cometer esses atos malignos, não foi?”
“Mm! Essa é uma forma cruel de dizer. ‘Tentou’ faz parecer como se não fosse o que ela queria fazer por sua livre vontade! Não acho muito bonito anular os sentimentos de alguém que se esforçou e se preocupou tanto com seu lugar na vida.”
Pandæmônio não parecia culpada. Na verdade, ela tomou um tom de repreensão e apontou seu dedo advertidamente.
“Eu a ajudei, sabia? Estendi uma mão amiga para que ela pudesse viver uma vida melhor. Antes do fim, ela sabia exatamente o que queria fazer. Acho que definitivamente foi uma maneira feliz de partir.” A garotinha sorriu. “Claro, essa mão amiga era maligna, mas eu sou a Maldade. Quando as pessoas se entregam à escuridão, é aí que eu entro. Ela mesma disse, não? Ela virou-se para a escuridão e portanto eu entrei nela. Nada mais do que isso.”
“E apenas estender uma mão amiga foi o suficiente para te satisfazer?” Menou perguntou. “Eu vi o receptáculo Etéreo que você usou para criar a monstrina, então eu sei que seu sangue foi usado para criar aquelas pílulas vermelhas. Fazendo com que eles consumissem parte de você, você conseguiu entrar em outras pessoas e corroê-las por dentro, usando aqueles que tomaram a droga como sacrifícios para reviver a si mesma. Todo o caso da monstrina foi um ardil para conseguir sacrifícios para você, não foi?”
“Você está metade certa e metade errada. Não é que eu queria ser revivida—Eu só queria fazer um filme.”
“Fazer um filme…?”
“Uhum.”
Menou não conseguia esconder seu estado confuso. As palavras da menina eram tão incomuns que era difícil analisá-las adequadamente.
“Eu te disse, lembra? Meus passatempos são cantar, dançar e assistir a filmes! Mas este mundo não tem filmes, sabe? A igreja guarda todas as conjurações de gravação de imagens e sons para ela mesma. Isso significa zero entretenimento! Este planeta é simplesmente tão chato, então decidi fazer o tipo de filme que eu estava morrendo de vontade de ver.”
Fazer um filme?
Menou entendia o conceito básico da mídia de filmes. Como uma Executora, ela foi profundamente educada sobre o conhecimento de um país chamado Japão, o qual não existia aqui.
Mas filmes eram para assistir. Ela não entendia como alguém poderia “fazer” um filme.
“O que quer dizer?”
“É simples! Basicamente, eu quero fazer um desastre monstruoso acontecer nesta cidade portuária, igual em um filme. Eu esperava espalhar a monstrina e causar uma espécie de epidemia… mas vocês ficaram no caminho. Então, em vez disso, eu escalei você como a heroína de um filme de monstro. Você só precisa fugir desesperadamente de mim, o monstro grande e assustador.” Disse a garotinha com absoluta confiança de que era o predador.
Menou franziu a testa. O desejo de Manon de se tornar tabu era estranho o bastante, mas as motivações de Pandæmônio eram ainda mais impossíveis de compreender.
“Acho que não entendi. Transformar as pessoas desta cidade em monstros, causar o caos, tentar me perseguir… Como você se beneficia com tudo isso, exatamente?”
“Me beneficio?” Pandæmônio piscou seus olhos grandes e redondos. Sua expressão era de uma garotinha que recebeu uma pergunta confusa de um adulto. “Não me beneficio com isso, na verdade. Afinal, não me importo com o que você faz. Se vive ou morre, o destino de um mísero humano não importa para mim. Então como eu me beneficiaria com isso?”
O Erro Humano, que outrora mergulhou o mundo em terror, olhou para Menou como se ela não importasse. Então, ela prosseguiu com uma expressão de auto-satisfação.
“Sinceramente, moça… Você não acha que é uma pessoa super importante que o mundo não consegue viver sem, acha? Ah, ou você acha que toda e qualquer vida humana é única e preciosa? Isso seria um equívoco ainda maior.”
Ela falou como se estivesse repreendendo uma criança que era muito crescida para as calças que usa.
“Ouça—a parte divertida é assistir aos humanos lutarem desesperadamente. Então independente disso resultar na pessoa viver ou morrer, não importa. Você não entende? O importante é o processo! É assistir às pessoas arriscarem suas vidas! Vê-las lutarem por suas vidas é divertidíssimo!!” A menina estendeu as duas mãos, com seus olhos brilhando.
Ela não parecia sentir o mínimo de compaixão por humanos. Era como se ela estivesse observando o mundo do outro lado da tela. O modo como ela falava, como um corpo celestial desprezando a humanidade, era realmente aterrorizante.
“Não há benefício. Só estou faminta por entretenimento. Eu quero assistir a um filme sem diretor, no qual todo o elenco improvisa e eu possa rir até perder o ar. É apenas um jogo para mim, mas vocês humanos estão colocando suas vidas em risco, então é muito divertido assistir! Aquela garota, hm… Esqueci o nome dela, mas ela também. Foi a maneira como ela arriscou a vida que fez valer a pena vê-la morrer, sabe?”
O que exatamente ela pensava que os humanos eram? Pandæmônio foi quem tentou Manon e lhe concedeu poder, mesmo assim ela não conseguia lembrar seu nome, rindo de que sua vida não passava de uma fonte de diversão.
“Mmm, não fique brava, está bem? É assim que os filmes B são.”
Enquanto Menou fervilhava silenciosamente, Pandæmônio parecia totalmente impenitente.
“Olha, tem que haver um desastre repentino sem aviso no qual toneladas de pessoas morram, e de veeez em quando, todos os protagonistas morram também, a humanidade é destruída e tudo acaba com a vitória de alguns monstros grotescos. Você sabe, o tipo de final frustrante que faz você se perguntar qual foi o sentido do filme. Sem catarse ou desfecho, apenas auto-satisfação para quem quer que o tenha feito. Esse tipo de filme é uma verdadeira pérola que desafia o significado de entretenimento, forçando a injusta realidade sobre o público.”
A atitude da garotinha era imutável, apesar da fúria óbvia de Menou. Ela entrelaçou as mãos atrás das costas e continuou explicando sua teoria.
“Mas acho que isso faz parte da criação de um verdadeiro filme de monstro. Monstros grandes, gigantes, aparecendo em números enormes sem qualquer aviso, que são fortes demais para os humanos derrotarem! Monstros deveriam ser injustos! Essa é a realidade! Por isso as pessoas querem um monstro grande o suficiente para destruir a própria realidade!”
Pandæmônio subiu em cima de um monstro, estendeu bem as mãos e sorriu. “Porque a realidade, tal como um monstro, não se importa com o que você quer. Entende?”
Força Etérea: Sacrificar—Conluio do Caos, Puro Conceito [Maldade]—Evocar [Fantasmas também são reais!]
Corpos espirituais saem dos cadáveres dos monstros e passam a existir no mundo como fantasmas.
“Vá em frente! Tente me divertir, moça!”
“…Gostaria que não me subestimasse.”
Os monstros fantasmas atacaram Menou. Tendo se livrado dos jugos de suas formas físicas, eles não podiam mais ser considerados seres vivos, mas estavam tentando morder diretamente o espírito de Menou.
Essas formas de vida imaginárias não eram afetadas pela maioria dos ataques físicos, pois só estavam sendo solidificadas no mundo por Força Etérea. Eles seriam incrivelmente difíceis de lidar para qualquer humano que pudesse usar apenas Aprimoramento Etéreo.
Mas para Menou, eles não eram problema.
Embora as almas sem receptáculos pudessem passar direto pela interferência física, elas eram muito mais fracas ao poder das conjurações.
Força Etérea: Conectar—Escritura, 9:3—Invocar [Conheça os esconderijos dos ímpios e ilumine-os.]
A conjuração da escritura ceifou os corpos espirituais. Os fantasmas se dissiparam sem nenhuma forma de resistir.
Menou encarou a garotinha que era a causa disso tudo.
Sempre havia condições para fazer sacrifícios e usar coisas vivas como materiais. Mesmo um mestre de Puros Conceitos não poderia oferecer outras pessoas como sacrifícios e usá-las como materiais sem qualquer tipo de processo. As conjurações de Pandæmônio eram certamente grotescas, mas não impossíveis de combater.
A única questão era como destruí-la.
“Pandæmônio. Se eu te deter, isso acabará com tudo.”
“Então tente me deter.” Os olhos de Pandæmônio brilharam em vermelho.
Força Etérea: Sacrificar—Conluio do Caos, Puro Conceito [Maldade]—Evocar [Os ratos vão marchando.]
As pilhas de cadáveres de monstros derreteram.
No instante seguinte, houve um tremor. Algo ressoou no subsolo.
Sentindo o chão abaixo dela estremecer, Menou ativou o Aprimoramento Etéreo e saltou para cima. Assim que ela pulou, rachaduras enormes se formaram no chão do salão de dança.
“Eu sou o deus dos monstros que espreitam eternamente na escuridão. Se você realmente acha que pode deter uma fera como eu, vá em frente e tente.”
Uma horda de monstros com forma de rato brotaram do chão.
Os cadáveres de monstros que haviam sido oferecidos como sacrifícios fizeram contato com a veia terrena abaixo do solo, absorveram poder e foram reformados com uma espécie de pseudo-alma e espírito.
Eles explodiram como um gêiser. Os monstros roeram o chão, quebrando-o e avançaram sobre Menou como uma avalanche.
Força Etérea: Conectar—Escritura, 2:5—Invocar [Regozijai-vos, pois o muro que cerca um piedoso rebanho de ovelhas jamais ruirá.]
Conforme os ratos mostravam seus dentes e atacavam, eles eram repelidos pela barreira que Menou havia conjurado.
“Mmm, uma pseudo-igreja! Que irritante!”
Força Etérea: Conectar—Conluio do Caos, Puro Conceito [Maldade]—Invocar [Pegue um monstro pelo dedo do pé.]
Os olhos de Pandæmônio brilharam em vermelho novamente. A julgar pela construção, tudo que Menou sabia era que não seria uma evocação sacrificial dessa vez.
O corpo da pequena garota ficou banhado em Luz Etérea. Composta de poder do Pecado Original, criando um efeito diferente do Aprimoramento Etéreo.
Enquanto Menou pensava cautelosamente no que faria agora, Pandæmônio estendeu sua mão esquerda, ainda brilhando em vermelho.
Um dos monstros evocados mordeu seu braço fino. Seguido de outro.
Menou arregalou os olhos. O braço esquerdo de Pandæmônio estava sendo devorado enquanto ela ainda estava viva.
Os monstros ratos que comeram o braço da menina aumentaram de tamanho. Pandæmônio havia transformado sua própria carne em um agente fortalecedor e a deu de comer aos monstros.
Com seus músculos inchados ao ponto de a pele ficar saliente, os ratos começaram a atacar novamente, mas eles ainda foram bloqueados pela barreira.
“Ah, puxa, um não foi o bastante? Então, aqui vai outro.”
Sem hesitar, ela balançou a perna direita com um sorriso.
Em um instante, a perna magra da menina foi devorada completamente, e os monstros ficaram ainda maiores. O crescimento súbito quase rasgou suas peles, e um novo par de pernas brotaram de suas costas. Desatentos à destruição causada por seus próprios aprimoramentos extremos, os monstros ratos roeram freneticamente a barreira de Menou.
“……!”
A tática era tão grotesca que era repugnante de ver. As conjurações de Pandæmônio eram acompanhadas de métodos tão horrendos que nenhuma pessoa sensata seria capaz de usá-las. Ela não sentia dor, ou apenas via isso como o último sentimento humano restante dentro dela? O mero ato de assistir a ela imprudentemente infligir-se automutilação para invocar uma conjuração atrás da outra era o suficiente para pôr em risco a sanidade de uma pessoa.
Mas novamente, Menou não tinha intenção de só ficar parada olhando.
Força Etérea: Conectar—Escritura, 3:1—Invocar [E o inimigo iminente ouviu o badalar do sino.]
Ainda mantendo o muro, ela invocou uma conjuração de ataque.
Um sino feito de luz formou-se diretamente acima de Menou. Os monstros ratos contorceram de dor com as devastadoras badaladas de poder.
O sino ressoava em todas as direções. Uma enorme onda se espalhou da conjuração em um amplo círculo, tornando quase impossível fugir. Os monstros tentando roer a parede de luz caíram de costas e bateram suas pernas em agonia.
No entanto, o som não parecia atingir Pandæmônio. Ou melhor, definitivamente estava causando algum dano. Cada vez que o poder ressoava, a pequena figura de Pandæmônio começava a quebrar, e sangue jorrava de diferentes partes do seu corpo.
E mesmo assim, ela não parecia nem um pouco preocupada com seus próprios ferimentos. Ela sorriu alegremente enquanto observava os monstros que ela evocou sofrerem.
Uma luz carmesim cobriu o corpo da menina. Com Aprimoramento Etéreo a fortalecendo, Pandæmônio, não afetada pelo som do sino, arrancou sua perna restante.
“Aqui está. Número três.”
Ela enfiou sua perna escorrendo sangue na boca de um dos monstros se contorcendo.
A essa altura, as bestas sobreviventes mal pareciam ratos. Eles tinham novos membros brotados aleatoriamente por todo o corpo. Seu couro rasgado se desfez, sendo substituído por uma armadura de fibras musculares endurecidas. Seus dentes frontais gigantes se tornaram lâminas afiadas, cortando sua própria mandíbula inferior ao meio.
Esses monstros aprimorados começaram a se reagrupar, fazendo frente contra as ensurdecedoras badaladas do sino. Seus corpos, originalmente do tamanho de um punho, cresceram tanto quanto o de um cachorro grande. Seus incontáveis membros se contorciam e agarravam o muro externo da pseudo-igreja, e a atingiam com seus dentes frontais longos e afiados, tentando roê-la.
Neste momento, eles passaram do ponto de agitação para uma fúria quase enlouquecida. Eles se chocavam contra a parede desenfreadamente, um após o outro, com novos monstros esmagando os anteriores por trás. Pisando e esmagando seus próprios companheiros, depois sendo pisados e esmagados, eles atacaram o muro em ondas.
Eventualmente, sua investida insana começou a gerar rachaduras.
Mas Menou permaneceu calma.
Força Etérea: Conectar—Escritura, 8:12—Invocar [Ajoelhe-se perante o portão, pois é a senda para o Senhor.]
Acompanhando o muro externo da igreja e a torre do sino, uma nova parede se formou com um portão principal. Enquanto isso, os ratos monstruosos se aglomeraram nas ligeiras rachaduras e começaram a tentar expandir o buraco com seus dentes frontais. O sangue e os tendões dos monstros penetravam a parede de luz como uma gosma.
Pouco antes deles conseguirem entrar, o portão de luz se abriu.
A horda de monstros soltou um guincho.
O portão recém aberto estava produzindo um poderoso puxão para dentro. Os monstros que haviam atravessado o muro foram sugados para o portão apesar de seus dentes agarrados e foram esmagados contra a parede interna.
Essa conjuração de várias etapas criou a forma completa de uma igreja. Enquanto Menou construía e sustentava tudo isso com uma careta, a garotinha com apenas um braço, o esquerdo, observava com um sorriso.
“Uma tripla invocação de uma conjuração de escritura. Isso foi muito impressionante… Mas você não tem muita Força Etérea, tem?”
Ela percebeu.
Após a longa luta com Manon, Menou já havia invocado diversas dessas conjurações. Seu corpo e espírito à parte, a alma de Menou estava chegando ao limite do poder que podia prover. Sua Força Etérea estava prestes a se esgotar.
Força Etérea: Sacrificar—Conluio do Caos, Puro Conceito [Maldade]—Evocar [O grande e alto gigante balança o braço.]
O braço direito de Pandæmônio inchou.
Reescrevendo a estrutura do corpo humano, o braço se esticou como borracha e atacou. Embalando um soco poderoso, o enorme braço quebrou a parede de luz rachada e acelerou em direção à Menou.
Ela estava tão focada em manter sua conjuração que ela não conseguiu esquivar.
“Ngh!”
O corpo de Menou cedeu e foi arremessado para cima. Com sua concentração completamente arruinada, o sino e o portão desapareceram. Os monstros que haviam sido presos pela estrutura foram soltos.
Isso é péssimo. Um alarme disparou na cabeça de Menou. O braço de Pandæmônio e os monstros ratos—ela tinha que lidar com ambos, ou morreria.
Um monstro saltou diretamente em sua direção, com a boca aberta. O braço de Pandæmônio desceu sobre ela, tentando esmagar o crânio de Menou… até que este foi decepado.
“Mmm!” Pandæmônio arregalou seus olhos redondos.
Como um trovão, uma espada arremessada cortou o braço de Pandæmônio e aterrissou fincando no chão.
Era uma espada magnífica com um brasão elaborado no cabo. Instantes depois, a pessoa que a havia lançado aterrissou no local. Ela agarrou o cabo e a brandiu para deter os dentes frontais dos monstros ratos.
O brasão no cabo brilhou vividamente.
Força Etérea: Conectar—Espada Real, Brasão—Invocar [Rajada de Chamas]
Fogo atingiu as bocas abertas dos monstros ratos.
“Quando vi aquele povo da Fourth derreter, vim correndo até a origem da estranheza, mas isso certamente não era o que eu esperava.”
Enquanto os monstros se dispersaram, uma voz tão confiante que beirava a arrogância ressoou.
Seus cabelos dourados tingidos de vermelho esvoaçam, e suas costas nuas pareciam tão galantes que eram absolutamente lindas.
“Você…”
“Prazer em conhecê-la, sacerdotisa… pelo menos, vamos dizer que esta é a primeira vez que nos encontramos, que tal?”
A mulher que resgatou Menou do perigo ergueu sua espada e sorriu.
“Eu sou Ashuna Grisarika.”
A moleca rebelde do Reino de Grisarika, a Princesa Cavaleira, havia chegado.
*
O braço de Pandæmônio caiu no chão com um tum.
Decepado de seu corpo, ele se desintegrou e desapareceu. Tendo finalmente perdido todos os quatro membros, Pandæmônio balançou a cabeça, irritada.
“Mmm, mmm… Agora não tenho mais membros sobrando. Que pena não poder cumprimentar essa nova visitante adequadamente.”
Isso não parecia nem de longe uma reação de alguém sem membros. Ashuna encarou a criatura bizarra conhecida como Pandæmônio enquanto se dirigia a Menou.
“Parece que você está lutando com outra oponente absurdamente difícil… mas o que raios é aquela coisa perturbadora? Só de olhar sinto arrepios.”
“Aquela é Pandæmônio, um dos Quatro Principais Erros Humanos.”
“Oh-ho.” Até Ashuna parecia surpresa com a resposta de Menou. “Pois, raios me partam. Esse é praticamente o pior vilão que você poderia encontrar.”
Para não trair sua própria personalidade, os lábios de Ashuna rapidamente se ergueram em um sorriso.
“Sua Alteza, a Srta. disse que os membros da Fourth derreteram?”
“Foi o que eu disse.”
“Então esse deve ser o limite máximo da Pandæmônio.” Menou descobriu a força motriz por trás das conjurações de Pandæmônio. “Ela satisfaz os requisitos sacrificiais ao corroer a estrutura das pessoas que ingeriram uma certa quantidade de monstrina. Os corpos, espíritos e almas da Fourth, provavelmente cerca de cem pessoas—ela usou a força vital deles para ativar sua Conjuração de Pecado Original.”
“Entendo. Então só precisamos matá-la cem vezes, é? Isso torna as coisas agradáveis e simples.”
Cem vezes era provavelmente um exagero. Pandæmônio já havia drenado um pouco dessa força vital ao evocar monstros e repor seu próprio corpo. Mais importante, como ela ainda poderia efetivamente ser imortal ao usar seu próprio corpo como um sacrifício para reviver a si mesma, isso não mudava o fato de que era impossível matá-la.
Mas se elas cortassem a força que ela conseguiu com esses sacrifícios, ela não seria capaz de usar mais nenhum poder além do próprio. Como Conjurações de Pecado Original requerem sacrifícios, sua maior fraqueza era que elas não poderiam ser invocadas sem um.
Pandæmônio era uma oponente poderosa, mas como Menou assassinou muitos usuários de Puros Conceitos antes, ela estava longe de ser completamente superada. Ela ainda tinha sua escritura também, diferente da batalha contra Orwell. Ela podia continuar lutando.
Ashuna também parecia entender a situação. Ela enxergou o cerne do problema sem fazer perguntas desnecessárias.
“Então, vamos direto ao ponto.”
“Podemos resolver isso com um golpe. Tem algo que eu gostaria que a srta. fizesse, Sua Alteza. Convenientemente, já fizemos um buraco.”
“Oh-ho?”
Houve um brilho de compreensão nos olhos de Ashuna.
As rachaduras no chão em torno delas chegavam até a base do castelo fundo no subsolo. Foi de lá que os ratos monstros evocados saíram.
Então, onde elas levavam?
“Só para ser clara: Normalmente, as pessoas não conseguem controlar mais poder do que seus próprios repositórios de Força Etérea. Mesmo se extrairmos a veia terrena, não parece que você teria a capacidade de fazer muita coisa com ela. O que você acha?”
Sua voz estava carregada de desafio e antecipação. Ashuna sabia que a habilidade de Menou para manipular Força Etérea era excepcional. Mas era senso comum que a habilidade física de uma pessoa para controlar um poder era inatamente limitada. Um indivíduo só poderia controlar tanta Força Etérea quanto tivessem em suas almas.
O tom de Ashuna, no entanto, sugeriu que ela suspeitava que a pessoa diante dela seria capaz de desafiar essa regra.
Menou respondeu em hesitar. “Eu consigo.”
Quando ela foi afetada por um Erro Humano durante a infância, o corpo, alma e espírito de Menou foram todos branqueados quase que completamente. Sua noção do limite entre ela mesma e o mundo exterior praticamente desapareceu, o que causou o efeito de permitir a ela controlar um poder fora de si mesma tão naturalmente quanto se fosse dela. O poder precisa ser regulado pelo espírito do detentor ou haverá recuo, mas quando se trata de usá-lo sem um espírito ou alma, Menou pode controlar muito além dos limites normais, desde que ela possa tocá-lo.
Era uma propriedade exclusiva para uma alma branqueada—para ninguém no mundo além de Menou.
“Minha capacidade interna de Força Etérea pode ser comum para uma sacerdotisa… mas o limite máximo da Força Etérea que posso controlar absolutamente supera o seu.”
Ashuna engoliu seco. “Bom, isso é certamente intrigante. Veremos, então.”
A Princesa brandiu sua espada, apontou a ponta para o chão e carregou o brasão com poder.
Força Etérea: Conectar—Espada Real, Brasão—Invocar [Expansão]
A espada cresceu, estendendo-se até o fundo das rachaduras—todo o caminho até as profundezas da terra, onde a veia terrena fluía.
Não era coincidência. Pandæmônio havia interferido com a veia terrena para criar os monstros ratos primeiramente. Atenta como sempre, Menou percebeu isso e pediu a Ashuna para utilizá-la.
A espada longa e grande criada pela conjuração fez contato com a veia terrena. Elas tinham uma conexão.
“Aqui está. É toda sua!”
Força Etérea: Conectar (via Expansão de Corte)—Veia Terrena [Poder]—Invocar [Manipulação de Força Etérea]
A veia terrena curvou-se à sua vontade.
Magnífico, caótico e totalmente confiável. O poder que Ashuna distorceu com sua manipulação direta de Força Etérea atingiu Menou em cheio.
Qualquer pessoa normal indubitavelmente teria sido mandada pelos ares. Era como ser atingido por uma enchente. Sem as defesas reforçadas do Aprimoramento Etéreo, a torrente poderia ter danificado seu corpo, espírito e até sua alma.
Menou silenciosamente fechou seus olhos e confiou-se ao poder.
Ao invés de controlá-lo, ela estava aceitando-o como parte de si mesma. Seu fluxo permeou Menou. Seu corpo e alma se tornaram um com o poder da veia terrena, e o espírito de Menou se apossou de sua corrente.
Conforme seu poder jorrava para cima, ele assumiu um objetivo claro e se estendeu até os céus.
Isso era uma forma de cooperação, diferente de quando Menou se conectou diretamente com a Força Etérea de Akari e a extraiu em Garm. Tampouco igual às conjurações cerimoniais nos quais múltiplas pessoas trabalham juntas para interferir com a veia terrena por fora.
Menou estava entrando na veia terrena, assimilando-se a ela.
Era uma forma de manipulação que excedia por muito os limites de um indivíduo, e só era possível para Menou, que havia perdido o limite entre ela e o resto do mundo.
“Ha! Isso é incrível.” Ashuna observou a técnica de Menou, admirada.
Era uma beleza a se contemplar.
Geralmente, se parte da veia terrena estourasse do chão, ela se difundiria em seus arredores. Normalmente, não havia um meio de controlar seu enorme poder, mas agora ele estava sendo concentrado e disparado no ar, do chão ao céu. Mesmo o espaçoso salão de dança era pequeno demais para contê-lo. Seu poder atravessou o teto, destruindo parte do castelo com facilidade, e transformou o que antes era um ambiente fechado em um aberto, enquanto seguia a vontade do espírito de Menou.
Em instantes, um pilar de Força Etérea se formou, conectando a veia terrena à veia celeste.
“Mmm!”
Uma aorta que ligava o céu e a terra. Pandæmônio olhou para Menou, flutuando no centro do pulsante pilar de Luz Etérea, com uma expressão estranhamente melancólica.
“…Ela realmente me lembra um pouco o Marfim.”
Essas palavras não alcançaram Menou, que estava em um estado de extremo foco.
Dentro do pilar de Luz, ela abriu os olhos. Usando o poder que ela controlava como parte de si mesma, ela começou a construir uma conjuração de escritura.
Força Etérea: Conectar—Escritura, 1:2, Passagem Completa—Invocar [Além das montanhas, não havia nada a ser encontrado nas planícies abaixo. Nada além de uma terra devastada que se estende para sempre. Manhã, tarde e noite; não havia mudança nas planícies secas. As pessoas exaustas estavam perdidas. Bum. Bum. Um eco. As pessoas olharam para cima para ver uma mulher. As pessoas ficaram confusas. A mulher nada disse. Com a boca fechada, ela ergueu seu braço e bateu com o martelo. Elas se reuniram ao redor dela, maravilhados. Todos os olhos estavam focados na mulher. Ela ergueu seu braço novamente. A fim de fazer o que deve ser feito: Enterre a estaca e torne conhecida a terra onde tudo terá início.]
Era uma pseudo-igreja construída usando as veias terrena e celeste.
Era a mesma conjuração que foi usada para assassinar o Puro Conceito que uma vez destruiu a cidade natal de Menou. A ex-Arcebispa Orwell construiu essa conjuração de escritura extremamente complexa por conta própria. Dessa vez, Menou estava expandindo sua escala ainda mais.
A barreira aumentou, formando uma majestosa igreja grande e poderosa o suficiente para cobrir a ilha inteira.
“Mm-mm, incrível. Você me superou em termos de esforço—gggh!”
A voz alegre de Pandæmônio esmoreceu de repente.
Ela estava sendo imobilizada por uma força tão poderosa que ela não conseguia sequer completar seu comentário casual.
O sino ressoou de novo e de novo, solidificando a barreira de contenção. Um espaço se formou ao redor da menina que a impedia de se mover um centímetro, crucificando-a no ar vazio.
A barreira da pseudo-igreja que prendia o corpo, a alma e o espírito, era uma das conjurações mais poderosas na escritura. Uma vez que ela extraiu Força Etérea da veia terrena e se conectou à veia celeste em um ciclo sem fim, a mesma ficou permanentemente enraizada aqui.
Pandæmônio estava em silêncio agora. Seria impossível para uma garotinha mover um cílio sob o peso esmagador de todo aquele poder, quanto mais abrir a boca.
“É isso, então? Para um dos Quatro Principais Erros Humanos, isso foi surpreendentemente fácil… Suponho que sua conjuração foi simplesmente incrível.”
“Ela era uma inimiga poderosa. Para ser sincera, o fato de que não houveram muitos sacrifícios definitivamente ajudou.”
Menou e Ashuna deixaram o castelo e caminharam em direção à estrada que saía da ilha.
Suas expressões eram brilhantes enquanto conversavam levemente uma com a outra. Elas haviam acabado de derrotar um dos lendários Quatro Principais Erros Humanos após uma batalha incrivelmente difícil. Nenhuma delas era do tipo que despreocupadamente celebrava uma vitória, mas certamente estavam desfrutando da sensação de satisfação.
Uma quantidade considerável do Castelo Libelle foi destruído pela explosão da veia terrena. O local inteiro pode até precisar ser demolido.
“Tudo que preciso fazer agora é deixar a ilha tempo suficiente para fortalecer a barreira. Irei consultar a pastora sobre o que fazer com Pandæmônio a partir daí, mas a srta. foi de enorme auxílio.”
“Ah, disponha… A propósito, er, você sabe.” Atipicamente, Ashuna murmurou por um momento antes de perguntar, “A Momo está bem?”
Isso foi inesperado.
Até mesmo além do fato de que ela de alguma forma deduziu que Menou e Momo estavam conectadas, foi a atitude de Ashuna que mais surpreendeu Menou. Ela não estava interrogando ou fazendo exigências. Naquele momento, ela estava simplesmente preocupada com o bem-estar de Momo.
Menou se perguntou por um momento se deveria fingir ignorância, mas ironicamente decidiu que não tinha sentido fazer isso agora.
“Ela está bem. Ela foi envenenada e desmaiou, mas está na igreja, descansando—”
Algo interrompeu sua conversa.
Força Etérea: Sacrificar—Conluio do Caos, Puro Conceito [Maldade]—Evocar [Réplica Koi, acima do mundo tão alto.]
O chão se abriu.
Menou e Ashuna foram lançadas no ar por uma força súbita debaixo de seus pés. A pseudo-igreja construída com Força Etérea explodiu em pedaços. O que acabou de acontecer? Mesmo enquanto eram arremessadas para cima, o par rapidamente olhou ao redor, mas o que viram era difícil de acreditar.
“…Hã?”
“Mas o quê…?!”
Não foi apenas a barreira que havia sido quebrada. As duas guerreiras veteranas não teriam ficado tão alarmadas por uma vista tão simples.
Um monstro gigante havia surgido e explodido a ilha inteira que Menou havia transformado em solo sagrado.