Volume 2
Capítulo 4
Uma Arca da Esperança, Rumo ao Fim
"Então, Alicia provavelmente está naquele laboratório, ou seja lá o que for?"
Em um pequeno barco navegando por um oceano agitado, conferi nosso plano de ação com a Siesta mais uma vez.
"Sim, está certo. Parece que ela está tentando se recuperar fisicamente lá", respondeu Siesta com um aceno de cabeça, dando um gole em seu chá preto favorito.
O barco já estava balançando violentamente há algum tempo, mas ela continuava aproveitando seu chá com elegância, sem derramar uma única gota. Considerando a importância da missão que estávamos prestes a enfrentar, não poderia ser fácil agir de maneira tão despreocupada... Mas isso era senso comum, e a melhor detetive do mundo não era nada convencional.
Fazia cinco dias desde a tragédia na igreja.
Estávamos a caminho de uma ilha remota sob o controle da SPES. Nosso objetivo era claro: subjugar Hel e resgatar Alicia. O problema era que as duas eram a mesma pessoa.
Derrotar Hel e salvar Alicia... Existiria uma maneira de resolver essa contradição? Eu não sabia. No entanto...
"Vai ficar tudo bem. Eu tenho um plano", disse Siesta calmamente, como se quisesse dissipar minha preocupação.
Ela não tinha contado a Charlie e a mim qual era exatamente a estratégia, mas era assim que ela sempre trabalhava. Nos últimos três anos, havíamos funcionado dessa forma perfeitamente. Eu tinha certeza de que desta vez não seria diferente, então...
"Quero que você e Charlie sigam para o laboratório."
"Eu e Charlie, hein...? Bem, tudo bem... por enquanto. Mas e você, Siesta?"
"Vou investigar esta área. De acordo com as informações, há algo parecido com um campo de treinamento militar por aqui."
Siesta desenrolou um pedaço de papel que parecia ser um mapa desbotado.
Aparentemente, ela conseguiu essas informações com Bat, que estava de volta ao Japão. Ele tinha sido nosso inimigo e, claro, tecnicamente ainda era, mas, em momentos como esse, acabava nos ajudando. Provavelmente, ele havia sido cativado pela detetive de elite. De qualquer forma, desta vez, ele realmente salvou nossa pele.
"Espere só, Alicia."
Alicia, ou Hel, estava em algum lugar naquela ilha. Será que ela já havia terminado o tratamento de que Chameleon havia falado, ou ainda estava inconsciente? De qualquer forma, precisávamos encontrá-la o mais rápido possível.
"Haaah... Eu preferia ir com você, senhora", resmungou Charlie, inflando as bochechas como uma criança.
Tínhamos discutido sobre isso há algum tempo, mas achei que já havíamos resolvido o problema...
"Bem, eu ficaria preocupada em deixar meu assistente sozinho, sabe?"
Siesta tentou convencer Charlie de um jeito maternal, mas não precisava insinuar tão diretamente que eu não era confiável. Cruel.
"Senhora, você realmente ficará bem sozinha?" Os olhos de Charlie demonstravam incerteza. Provavelmente, ela estava preocupada com a possibilidade de Hel ter completado o tratamento, recuperado suas forças e sua personalidade.
De fato, quando lutamos contra Hel em Londres pela primeira vez, Siesta quase foi encurralada. Mas...
"Vai ficar tudo bem." Siesta sorriu com serenidade.
"O coração de Hel provavelmente não está funcionando agora."
Depois de ser derrotada por Siesta, Hel roubou cinco corações como Jack, o Diabo. Por que ela precisou de tantos novos corações em tão pouco tempo? Provavelmente porque nenhum deles era compatível com seu corpo.
Isso era esperado. Transplantes de órgãos não podem ser feitos com qualquer doador. Esse caso era especial, pois Hel era uma pseudohumana.
No momento, Hel estava consumindo novos corações como se fossem baterias, um após o outro. Ela já havia usado cinco e estava prestes a buscar um sexto quando Siesta e eu a encontramos.
Ou seja, agora Hel tinha apenas aquele quinto coração, e ele já estava prestes a falhar. Se ela estava tão fraca, Siesta seria capaz de derrotá-la. Então, se houvesse uma maneira de resgatar apenas a consciência de Alicia... Não, Siesta já devia ter um plano para isso.
"Então, finalmente chegou a hora, hein?"
Fazia um mês desde que encontramos Hel e Alicia.
Três anos desde que comecei a lutar contra a SPES.
Essa longa jornada finalmente estava chegando ao fim. Esse pensamento me fez ficar mais ereto, mesmo sem querer.
"Está nervoso?" Siesta perguntou, pousando sua xícara de chá.
"Empolgado. É a adrenalina de guerreiro."
"Oh, você está tremendo mesmo."
"Mas de um jeito bom, certo?"
"Pfft!"
"Charlie, cala a boca."
"Assistente, quer que eu acaricie sua cabeça?"
"Senhora, estou com medo..."
"Você é um puxa-saco de primeira, sabia?"
Charlie correu até os joelhos de Siesta. Eu já tinha visto essa cena inúmeras vezes.
"Tem certeza de que está bem, Kimi?" Siesta inclinou a cabeça enquanto acariciava os cabelos loiros de Charlie.
"Não seja boba. Eu não vou me envergonhar dessa forma."
Não havia como eu agir tão relaxado antes da batalha final.
"...Hmph."
Charlie levantou a cabeça do colo de Siesta, sem revelar o que estava pensando.
"Vou deixar você ficar no meu lugar."
Não, não precisa fazer isso. Mesmo se você tentar me empurrar para essa situação, eu não...
"Venha."
Siesta abriu os braços, e um pequeno sorriso surgiu no canto de seus lábios.
"...Isso parece exagerado só para acariciar a cabeça de alguém."
"Pensei em aproveitar a oportunidade para te abraçar."
Olha, eu já disse, deveríamos estar nos concentrando na batalha...
Ou talvez ela estivesse fazendo isso justamente porque eu estava tenso.
Mesmo assim, ninguém pediu por isso.
"Hum? Você não vai vir?"
"Se quer ficar se esfregando em caras, pelo menos tenha um pouco de vergonha disso."
"Você realmente usa umas expressões únicas... Bem, deixa pra lá", disse Siesta, abaixando os braços.
"Fica pra outra hora, então."
"De preferência, nunca."
Depois dessa troca de palavras, rimos um pouco. Eu e Siesta estávamos bem assim, do nosso jeito.
"Parece que está quase na hora."
Siesta apertou os olhos, observando o mar e o destino final de nossa jornada de três anos.
Com o som do motor e do vento em meus ouvidos, logo chegamos ao porto da ilha, que, na verdade, era apenas uma faixa de areia, e desembarcamos, descarregando nosso equipamento.
"Bom, nós voltaremos."
"Por favor, tome cuidado, senhora."
Charlie apertou firmemente a mão de Siesta. Já eu... cedi à pressão silenciosa dela e dei um breve toque de high five.
"Até logo."
E então nos lançamos em nossa missão final.
"O vento está agradável", comentei. Mesmo com tudo que estava acontecendo, a sensação era tão boa que precisei falar algo.
O leve cheiro do oceano pairava no ar.
"Então, para chegar ao laboratório de pesquisas, basta seguir reto por aqui, certo?" perguntou Charlie, falando mais alto do que o normal.
"Sim, pelo que vi no mapa, esse caminho deve levar até lá." Também aumentei um pouco a voz.
Isso porque, no momento, estávamos os dois em cima de uma motocicleta, seguindo em alta velocidade até nosso destino.
A moto era grande o bastante para mal caber no barco, mas precisávamos dela para executar a estratégia com precisão. Afinal, aquela ilha era o covil da SPES; não podíamos perder tempo.
"...Na verdade, não deveríamos estar trocados?" Charlie, que não estava usando capacete, lançou um olhar para trás.
"Trocados como?"
"Nossas posições!" ela resmungou.
Estranho. Tenho certeza de que não estou fazendo nada errado.
"Normalmente, o homem é quem dirige nessas situações, não?!"
Ah. Então era isso que estava incomodando ela: o fato de estarmos viajando juntos na moto e eu ter deixado a direção com ela.
"Bom, eu não tenho carteira de motorista."
"Meu Deus, que patético!"
"Você já morou nos Estados Unidos, não é uma comparação justa."
Era a lei. E as leis são diferentes, certo?
"...Além disso."
"Além disso o quê?"
"N-não segura tão forte", reclamou ela, me lançando outro olhar.
"Mas é perigoso."
"Tá com medo de andar de moto com outra pessoa? Você não é um cara?"
"Te abraçar pela cintura me dá uma sensação de segurança."
"Se essa era uma tentativa de assédio, foi a pior da história."
Enquanto continuávamos essa conversa inútil, acelerávamos por uma trilha natural.
Ao nosso redor, havia apenas uma vasta planície, sem sinal de vida. No entanto, no horizonte, era possível ver uma fileira de turbinas eólicas brancas. O fato de haver energia elétrica indicava que existia algum tipo de civilização ali.
"Lá atrás", Charlie começou, sem diminuir a velocidade, "você devia ter deixado a senhora te abraçar." Ela riu.
"Se está tão desesperado para segurar uma garota..."
"Idiota. Você acha que eu faria algo tão vergonhoso?"
"Você está fazendo algo exatamente tão vergonhoso agora."
"Eu só não ligo para o que você pensa de mim, Charlie."
"Vou te jogar pra fora da moto", rebateu ela. "...Mas eu cairia junto."
Então, não mexe tanto no guidão, sério! Você realmente quer nos matar?!
"Você ainda vai se arrepender. Se continuar sendo tão teimoso..." Charlie murmurou, com um tom de advertência.
"A senhora é tudo que você tem, afinal."
Siesta é tudo que eu tenho?
Isso não é verdade, tentei responder, mas as palavras não saíram como eu queria.
Se Siesta desaparecesse...
Tentei pensar nessa possibilidade, mas logo parei. Eu não precisava considerar isso agora, precisava?
Neste momento, só precisava me concentrar na missão que estávamos prestes a realizar.
"Mas não é como se fosse recíproco."
E assim, tentei escapar da conversa dizendo uma besteira qualquer.
"Siesta tem você, Charlie. E seus outros aliados também. Não sou o único para ela..."
"Não, ela não tem," disse Charlie, com um tom levemente melancólico. "Você é tudo que ela tem também."
Não soube o que responder a isso, então apenas me concentrei no som do motor e do vento.
SPES
Não demorou muito para chegarmos ao laboratório. O interior estava escuro, e tentamos avançar com rapidez e cautela.
Não tínhamos um mapa da instalação, então precisávamos explorá-la às cegas. Nem sequer tínhamos certeza de que Alicia, ou Hel, estava realmente ali. Se nossa busca não desse em nada, precisaríamos voltar e nos encontrar com Siesta o mais rápido possível.
"Não tem ninguém aqui..."
Descemos um lance de escadas, e Charlie olhou ao redor.
"Pois é. Achei que teríamos que enfrentar pelo menos dois ou três combates."
Mas, se conseguimos entrar assim tão facilmente... será que era um beco sem saída?
Se fosse o caso, provavelmente Siesta é quem tinha atraído toda a atenção para si.
"Kimizuka."
Charlie puxou minha manga.
"Ali."
Ela apontou para um elevador de carga. Ao nos aproximarmos, parecia estar funcionando normalmente.
"Quer tentar?"
Charlie assentiu, e então pegamos o elevador até o subsolo.
Quando as portas se abriram, a cena diante de nós….

“...! O que é...?”
Um mar de sangue.
O chão estava coberto de cadáveres tão mutilados que senti vontade de cobrir os olhos.
“Ngh...”
Até Charlie, que deveria estar acostumada com cenas como aquela, levou a mão à boca. Era horrível.
Mas isso não significava que pudéssemos simplesmente virar as costas e ir embora. Um homem estava ali, como o rei daquela montanha de corpos.
“Você é Cerberus...?”
O homem de meia-idade, robusto, vestindo um manto negro, era idêntico ao Cerberus que eu havia enfrentado um mês antes.
“...Não, isso não pode ser.”
Eu já havia confirmado várias vezes com Siesta: Cerberus foi morto bem na nossa frente, por Hel. Nesse caso...
“Você está pensando que sou Hel, que herdou a habilidade de Cerberus e a usou para tomar sua forma?” O homem praticamente leu minha mente.
“Infelizmente, você está errado. Não sou nem Cerberus nem Hel.”
A figura do homem se distorceu e, em seguida, se estabilizou na forma de—
“Ha-hah. Lembra deste aqui?”
“...! Bat...!”
“Ei, essa é a reação que eu gosto.”
Ele falava como Bat agora. Com essa forma e a de Cerberus, era como conversar com as versões reais deles.
“Então, quem é você?!”
Charlie sacou sua arma, apontando-a para o homem.
Era exatamente isso que eu queria saber. Ele podia se camuflar como Cerberus e Bat, mas quem diabos ele realmente era?
“Sou o pai deles.”
O homem ainda usava a aparência de Bat, mas dessa vez respondeu em sua verdadeira persona.
“Pai...? De Cerberus ou de Bat?”
“De ambos.”
Ele percorreu com os olhos nublados de esmeralda a pilha de cadáveres ao nosso redor.
“...! Então... Não, você não pode estar dizendo...”
A arma nas mãos de Charlie vacilou ligeiramente.
Essa habilidade de transformação tão perfeita... Não havia dúvidas: esse homem era a verdadeira identidade da falsa Srta. Fuubi, que visitara Siesta, Alicia e eu anteriormente. E, como Siesta havia dito, essa impostora poderia muito bem ser o chefe da SPES.
“Justo quando Siesta não está aqui, damos de cara com essa coisa? Cara, que baita azar...”
Acho que era normal para mim. Era exatamente isso que minha habilidade de me meter em confusão fazia. Tive que rir de mim mesmo, ou não conseguiria parar de tremer.
“O que, então, é aceitável para um pai matar seus filhos?”
Seguindo o exemplo de Charlie, apontei minha arma para o chefe inimigo, a poucos metros de distância.
“O que você está dizendo? É exatamente meu status de pai que me dá permissão para matar meus filhos.”
“….!”
Isso era terrível. Aquele cara era tão inacessível quanto Hel, talvez até pior. Na verdade, eu nem queria estar falando com ele.
“Todos estes são meus filhos. Proles que gerei. Logo, sou livre para fazer o que quiser com eles. Estou errado?”
O falso Bat inclinou a cabeça, como se realmente não visse problema no que dizia.
“Desde quando caí num mundo onde os homens são os principais geradores de vida?”
Soltei uma piada, tentando ganhar tempo enquanto desesperadamente pensava no que deveríamos fazer a seguir. Mas...
“Você pretende me categorizar nas definições humanas de masculino ou feminino?”
“O quê? Quer dizer que é um monstro, então?”
“Não.”
Nesse momento, nosso maior inimigo, o adversário que precisávamos derrotar, nos disse diretamente o que era.
“Sou uma planta.”
Diante dessa revelação repentina, Charlie e eu trocamos olhares, mas tudo o que vimos foi confusão.
O que diabos esse cara estava dizendo?
Uma planta? Ele tinha acabado de se chamar de planta?
“Claro, isso apenas em relação às classificações com as quais vocês estão familiarizados. No entanto, não sou nem humano nem monstro. Sou Seed, uma planta que voou para este mundo das profundezas do espaço.”
Espera aí... Desde quando essa história virou intergaláctica?
Uma planta do espaço sideral? Um invasor?
Dá um tempo... O que exatamente estávamos enfrentando esse tempo todo?
“...Então, você está dizendo que os outros pseudohumanos também são, na verdade, plantas?”
“‘Pseudohumano’ é apenas o nome que vocês escolheram dar a eles. Tanto eu quanto eles sempre fomos apenas plantas. Aqui, vocês já viram isso antes, não é?”
No momento seguinte, uma longa e retorcida coisa semelhante a um tentáculo brotou da orelha direita de Seed, exatamente como o que Bat tinha no planeta, três anos atrás. Mas agora, o que antes eu achava ser um tentáculo parecia mais uma raiz grossa de uma planta.
“O que vocês estão tentando fazer? Por que a SPES está cometendo ataques terroristas?”
Charlie interrogou Seed, mantendo sua arma apontada para sua raiz enquanto falava.
SPES: a organização secreta que Siesta estava perseguindo esse tempo todo. Ela havia dito que seu nome significava “esperança” em latim. Mas esses caras só semeavam desespero. Eles acreditavam em um livro esquisito chamado “Texto Sagrado”, cometiam atos de terror e matavam pessoas inocentes.
“Responda-nos, Seed. É dominação mundial? Imortalidade? Desejo de conhecimento? Não pode ser apenas o impulso de destruir coisas, pode? Ou você vai dizer que é sua missão, como Hel disse? Vamos lá, qual é exatamente o seu objetivo? Se você é uma planta vinda de outro planeta, o que pretende fazer aqui na Terra?”
"Vamos lá, pode vir. Acabei de listar todos os motivos malignos que consigo imaginar. Mas, sinceramente, não importa qual resposta você me der; eu vou rebatê-la com argumentos sólidos... e balas."
Com uma nova determinação, apertei ainda mais a empunhadura da minha arma.
"É para sobreviver."
Por um momento, essa resposta simples e direta me pegou de surpresa. O impacto foi tanto que quase deixei minha arma cair.
"…Para sobreviver?"
"Sim. Temos apenas um objetivo."
Era impossível dizer o que ele estava pensando enquanto usava a raiz que havia brotado de sua orelha para arrancar o próprio braço direito. Ainda assim, continuou falando.
"Superfície do Planeta Explodindo Sementes, Nós cobriremos este mundo com nossas sementes."
Um verdadeiro demônio.
"Esse é o verdadeiro significado de SPES e o nosso verdadeiro objetivo."
Enquanto eu permanecia ali, atônito, o braço direito dele começou a se regenerar diante dos meus olhos. Ao mesmo tempo, um novo corpo começou a se formar a partir do braço decepado no chão. Ainda não tinha um formato humano completo, mas rapidamente adquiria os contornos de um corpo.
"É como uma estaca..."
"Sim, exatamente." Charlie assentiu.
"Charlie, ainda dá para perceber que você não entendeu."
"...Bem, achei que deveria aliviar o clima. Estava ficando sério demais, sabe?"
Não minta. Todo mundo já sabe que você é meio burrinha.
"Uma estaca é quando você corta um caule da planta-mãe, o coloca na terra para criar raízes e faz com que cresça uma nova planta a partir dele. Basicamente—"
"É um clone vegetal?"
Exatamente. Isso era o que Seed quis dizer quando se chamou de pai. Todos os membros da SPES eram seus clones. Seed era o pseudohumano original.
Era por isso que ele conseguia assumir as formas de Cerberus e Bat, e por que podia usar seus poderes. Na verdade, era o contrário: Seed havia compartilhado suas habilidades com eles.
"Sou uma planta que chegou a este mundo por acidente, uma 'semente primordial', por assim dizer. O desejo mais fundamental de todos os seres vivos, sejam eles plantas ou animais, é deixar descendentes. Eu crio clones a partir do meu próprio corpo, como demonstrei, e os espalho pela superfície do planeta na esperança de que prosperem."
"…E você acha que isso justifica matar pessoas que não fizeram nada de errado?"
"Que problema haveria em eliminar uma espécie invasora que obstrui a disseminação das minhas sementes?"
"....Você é a espécie invasora!"
Meu dedo puxou o gatilho, disparando contra a raiz que havia crescido de Seed, mas não deu certo.
"Mesmo poucos minutos após seu nascimento, seu instinto de proteger o progenitor já está funcionando."
O pseudohumano recém-nascido, formado a partir do braço decepado de Seed, ainda parecia um boneco de barro, mas se levantou, cambaleando, e se colocou entre ele e a bala. Em seguida, caiu no chão, como se seus fios tivessem sido cortados.
"…Isso não te faz se sentir triste nem um pouco?"
Observei os companheiros de Seed espalhados pelo chão. Ele dizia que queria garantir a prosperidade de suas sementes, mas suas ações diziam exatamente o contrário.
"Esses foram sacrifícios necessários para garantir a existência contínua das minhas sementes. Não se preocupe; as sementes deles não foram desperdiçadas."
Enquanto falava, Seed pegou um pequeno objeto semelhante a uma rocha negra do clone que acabara de desabar. Era idêntico ao que Hel havia removido do peito de Cerberus anteriormente.
"Uma semente...? Você está se referindo a essa pedra?"
Se bem me lembrava, Siesta havia dito que esses objetos eram como núcleos que criavam pseudohumanos. Quando Seed se autodenominou "a semente primordial", era isso que ele queria dizer?
"Exatamente. Algumas das sementes de nossos companheiros falecidos foram herdadas por ela."
"…! Você quer dizer Hel...?"
Então esse era o "tratamento" que Chameleon mencionou. Eles transplantaram as sementes dos companheiros de Hel para ela? Não era de se admirar que não tivéssemos encontrado uma alma viva pelo caminho até aqui.
"Onde está Hel agora?"
Pelo que eu sabia, a personalidade de Hel provavelmente estava no controle. Nesse caso, precisávamos encontrar um jeito de derrotá-la e resgatar Alicia o mais rápido possível.
"Se ela não está aqui, há apenas um lugar onde ela poderia estar, correto?"
…! Com Siesta?!
"Kimizuka! A chefe está….!"
"Sim, eu sei. Vamos rápido."
Mas, assim que nos viramos para partir….
"Vocês acham que escapar será tão simples?"
Ouvi uma voz familiar, educada de forma irritante, vinda de algum lugar indetectável.
"Chameleon...!"
O mesmo desgraçado que levou Alicia bem debaixo dos nossos narizes.
Ele provavelmente estava usando sua habilidade para se tornar invisível, mas estava definitivamente ali na sala conosco.
"Ha-ha. Parece que terei entretenimento por aqui também."
Aqui também? Não me diga que...
"Kimizuka!"
Charlie, mantendo a arma apontada para o vazio, me lançou um olhar significativo.
"Sim, eu sei."
Chameleon estava falando como se já tivesse travado uma batalha em outro lugar, o que significava que ele havia lutado contra Siesta enquanto ela estava em sua missão. Mas, se ele estava aqui agora, isso queria dizer...
Não podia ser... Mas Siesta perderia para um cara como ele...?
"Não, espera. Claro. Se ele esteve com Hel, que voltou a ser como era antes, então…"
"Kimizuka, deixe isso comigo."
Charlie me instigou a ir até Siesta.
"Eu seguro eles aqui. Vá rápido."
"Eu preferiria não ser ignorado."
A voz de Chameleon parecia se mover por toda parte. Além de não conseguirmos acabar com ele, não havia como prever quando e de onde um ataque viria. A porta estava a apenas dez metros de distância. Como eu chegaria até lá—?
"Você interrompeu seu progenitor."
E então, Seed desapareceu.
"Ghaaaaaaaaaaaaaaaaah!"
O grito de Chameleon ecoou pelo ambiente.
Pela primeira vez, vi seu rosto com clareza. Ele tinha cabelo prateado e traços asiáticos bastante comuns. Seed apertava sua mão direita ao redor do pescoço do inimigo, erguendo-o no ar.
"Eu estava falando agora há pouco. Por que me interrompeu?"
"…Eu… eu s-sinto muito..."
Chameleon mal conseguiu pronunciar as palavras. Um fluido colorido escorria de sua boca.
"Eu só deixo você viver para que proteja aquilo. Não se esqueça do seu lugar."
Com um tom frio, Seed o lançou contra o chão.
Ele não fez isso para nos proteger; apenas estava punindo Chameleon por desrespeitar seu progenitor. Mas então.
"Seed, por que nos deu tantas informações sobre a SPES?"
O que você estava fazendo aqui? Por que ficou depois de massacrar seus próprios companheiros para manter Hel viva? Se você é o comandante da SPES, não deveria ser você a ir atrás de Siesta?
Diante dessas perguntas naturais, Seed simplesmente respondeu:
"Porque, se eu me aliar a qualquer um dos lados, o plano não se concretizará."
E, com essa resposta enigmática, ele desapareceu.
"Claro que ele pode usar as habilidades de Chameleon também, né...?"
Mas para onde ele foi? Só podia torcer para que não fosse até onde Siesta estava.
"Kimizuka, vá agora."
Charlie apontou sua arma para Chameleon, que ainda estava caído no chão, e me instigou a sair.
"Droga... Droga...!"
No entanto, Chameleon se levantou com dificuldade, claramente agonizando. Ele se ocultou novamente e nos atacou de todas as direções. Nem mesmo sua sombra era visível.
"Já estou cansada de ver esse truque repetido."
Charlie atirou contra o vazio.
"…Ghk! Seus instintos são aguçados."
Ouvi a voz de Chameleon. Será que aquele disparo aleatório havia o atingido de raspão?
"Instintos? Hah. Você conta boas piadas para um réptil."
Charlie retrucou. Depois, me lançou um olhar e apertou o gatilho novamente.
"O fedor da sua respiração te denuncia."
Se uma garota dissesse isso para mim, eu nunca me recuperaria.
Sorrindo de canto, comecei a correr, deixando o resto para Charlie. Mas então—
"Kimizuka!"
Algo voou pelo ar, e eu o agarrei com a mão direita. Quando abri os dedos, vi que era uma chave.
"Já disse que não tenho licença..."
"Me deixe andar na garupa algum dia."
"...É, eu vou praticar."
E se eu acabar destruindo sua moto hoje... só me dá um desconto, tá?
Se nos encontrarmos novamente, longe desta ilha…
Depois disso, subi na moto de Charlie e rumei para o lado oposto da ilha, acelerando o máximo possível.
Não havia civis por aqui, nem necessidade de obedecer às leis de trânsito, então não importava se eu nunca havia pilotado antes. Apenas segurei o guidão e me concentrei em chegar até Siesta o mais rápido possível.
Não conseguia acreditar que Siesta perderia para alguém do nível de Chameleon. Mas, se Hel estava com ele, completamente revivida, então talvez...
"...Droga."
Meus pensamentos foram para os piores cenários possíveis.
Mas, se algo acontecesse com Siesta, Charlie e eu não teríamos chance contra Hel, o que significava que o resgate de Alicia também fracassaria. Ou seja, garantir a segurança de Siesta era a prioridade.
"...Não, isso está errado."
Mesmo que Alicia não estivesse envolvida nisso, se Siesta estivesse em perigo, eu teria ido ajudá-la sem hesitar.
"Ela me treinou muito bem."
Rezando para chegar a tempo, acelerei ainda mais na moto de Charlie.
"…! Siesta!"
Quando a encontrei, cerca de duas horas depois de termos nos visto pela última vez, ela estava caída de bruços no chão.
Deixando a moto tombar de lado, corri até minha parceira.
"Siesta! Ei!"
Peguei seu corpo inerte e a apoiei em meus joelhos.
Seu rosto pequeno e pálido estava coberto de areia. Limpei-a com a ponta dos dedos e continuei chamando seu nome.
"Isso não tem graça! Você prometeu que não ia morrer sem me avisar! Lembra...?"
Não, isso não ia adiantar. Eu precisava me acalmar mais do que nunca. Respirar fundo, focar no que podia fazer. Dar os passos certos para salvar Siesta.
"Me dá um tempo, tá?"
Arregacei as mangas, deitei Siesta novamente no chão e coloquei as mãos contra seu peito.
Posicionei minha mão direita sobre a esquerda, mantive os cotovelos retos e pressionei com todo o meu peso.
"Cinco centímetros."
Compressões torácicas não funcionam se você não pressionar até essa profundidade na caixa torácica. Estranhamente, essa não era minha primeira vez fazendo RCP. Afinal, eu sempre sou arrastado para esse tipo de situação.
Eu estava grato por essa coincidência enquanto pressionava o peito de Siesta. Ela sempre foi tão forte fisicamente, e ainda assim, seu corpo parecia tão delicado que eu sentia que poderia quebrá-lo com bem menos pressão do que isso.
"Não ouse... morrer...!"
Continuei realizando as compressões torácicas no ritmo adequado.
Dez vezes, vinte... trinta.
Depois, eu precisava fazer duas respirações artificiais. Ajustei sua via aérea, apertei seu nariz entre meus dedos e respirei fundo.
"Perdoe-me."
Mantendo os olhos bem abertos para não errar, inclinei-me em direção aos lábios de Siesta, e, nesse momento.
"Eu não considerei a possibilidade de que você viria até aqui."
Seus olhos azuis piscaram, abrindo-se.
"…Heeeeeeeeeey! Sua idi…. Q-que?!?"
Dei um salto para trás tão abrupto que minhas pernas cederam, e Siesta se sentou.
"Hmm. Quem diria que você viria até mim? Isso é um problema. Você atrapalhou o meu plano."
Enquanto dizia coisas sem sentido, ela começou a tirar a areia e a poeira de seu vestido.
"Foi porque o seu amor por mim é muito mais obsessivo do que eu imaginava?"
"...Eu não sei bem o que está acontecendo, mas vou discordar dessa análise de qualquer forma."
"E mais uma coisa, Kimi. Fazer RCP está certo, mas geralmente você deve verificar se a pessoa não está respirando naturalmente antes."
Ainda caído no chão, olhei para cima e encarei o olhar frio de Siesta.
"Espera, seu coração estava batendo o tempo todo?"
"Bem, não, não estava, mas..."
"Então ele parou?!"
Então, por que você está me dando bronca?!
"Oh, não, não."
Siesta acenou displicentemente com a mão.
"Meu coração não parou. Eu o parei."
"Você... parou ele?"
Eu estava completamente perdido. Sem ter nada melhor para fazer, apenas segurei a mão que ela me estendeu e me levantei.
"Bom, um inimigo um tanto incômodo decidiu brigar comigo, então resolvi fingir de morto."
"...Já faz três anos que eu te pergunto: O que diabos você é?"
Nem me surpreendia mais. Eu só estava tão chocado que minhas pernas tremiam.
Um inimigo um tanto incômodo... Ah, acho que entendi.
Chameleon deve ter achado que matou Siesta e presumiu que seu trabalho estava feito.
"Bem, ‘incômodo’ talvez não seja a palavra. Eu sou estranhamente incompatível com ele."
Siesta fechou um dos olhos azuis, piscando de maneira intencional.
Ainda assim, pessoas normais podiam realmente fingir de morto desse jeito?
"Que tipo de corpo você tem, afinal? Puxa..."
Sorrindo de lado, estava prestes a revidar com um golpe de karatê, quando….
"Hã?" De repente, me vi sentado no chão de novo.
"O que houve?" ela perguntou.
"Uh, eu meio que..."
Siesta me olhou sem entender. Então...
"O alívio fez suas pernas cederem?"
Ela sorriu levemente.
"Porque eu estava bem?"
"Para de sorrir. E não mexa esses lábios desse jeito."
"Posso ser sincera sobre o que estou sentindo agora?"
"Não. Não pode. Nem pense nisso. Eu não vou ouvir nada que você disser."
"Acho você adorável, Kimi."
"Aaaaaaah! Aaaaaaaah! Eu não estou ouvindooooo!"
Droga, por que eu tinha que passar por essa humilhação?
Depois de ter vindo até aqui, correndo em uma moto com uma pessoa que nem sabia pilotar.
Depois de ter feito RCP de verdade.
Isso estava estranho. Obviamente estranho...
"O que eu devo fazer? Que tal eu te fazer um carinho na cabeça?"
"De jeito nenhum!"
"Ou talvez um abraço?"
"Nem pensar!"
"Ou, para usar suas próprias palavras, ‘encostar meus seios em você.’"
"Você não pode simplesmente fazer isso. Sério. Nem comigo nem com nenhum outro cara."
"Oh, mas você já tocou meu peito há um minuto, não tocou?"
Siesta riu.
"Trinta vezes, inclusive."
"Isso não vale! Siesta, você está tentando me matar, não está? Socialmente."
"Heh-heh. Você é realmente divertido de provocar, Kimi. ….Foi realmente divertido."
"…Siesta?"
De repente, seu sorriso ficou um pouco melancólico.
Ao ver seu rosto, soube de tudo.
Passei três anos ao lado dela, vendo aquele perfil.
Não importava o quanto eu quisesse negar, eu sabia o que havia acontecido.
E o que estava prestes a acontecer.
"Siesta."
"O quê?"
"Vou aceitar aquele abraço, só desta vez."
Eu me levantei e me virei.
Uma garota solitária estava ali.
"Se sobrevivermos e nos encontrarmos novamente, longe desta ilha."
Revanche.
"Então. Quem é você?"
Perguntei à garota que estava parada atrás de mim.
"Você acha que pode dizer só de olhar para mim?"
Ela tinha olhos vermelhos e usava um uniforme militar da mesma cor.
Havia várias espadas presas à sua cintura.
Ela era, sem dúvida, a inimiga com quem lutamos até a morte em Londres.
E seu nome era.
"Hel..."
Ela não era Alicia.
A garota que estava aqui agora era Hel.
A inimiga que precisávamos derrotar.
"Acho que podemos assumir que o tratamento foi concluído, usando as vidas de seus companheiros," Siesta disse, vindo até meu lado.
Ela observava Hel com olhos penetrantes e severos.
Ela devia ter ouvido falar disso antes.
Talvez por Chameleon.
“Companheiros? Quem seriam esses?”
Hel inclinou a cabeça, como se realmente não entendesse o que estava ouvindo.
Eu já tinha visto essa expressão há pouco tempo, quando perguntei a Seed se ele sentia culpa por ter matado seus próprios filhos.
“Você realmente não sabe?”
Era essa a diferença entre humanos e plantas? Esses caras priorizavam acima de tudo a prosperidade de suas sementes?
“E quanto ao Chameleon, então? Mesmo em Londres, vocês dois estavam trabalhando juntos...”
“Eu só o usei porque ele era a camuflagem perfeita,” Hel respondeu casualmente. “Imagino que ele pense o mesmo. Chameleon não tem interesse em mim como indivíduo. Para ele, eu sou apenas um símbolo, um uniforme militar vermelho.”
…Na verdade, quando Alicia era a personalidade dominante no corpo de Hel, levou várias semanas para Chameleon encontrá-la.
Com seus ouvidos e narizes afiados, talvez Morcego e Cérbero fossem diferentes.
Será que essas pessoas simplesmente não viam umas às outras como indivíduos?
“Diferente de vocês, eu não tenho interesse em brincar de camaradagem.”
Hel zombou de mim e de Siesta com seus olhos vermelhos e gélidos.
“...Isso foi uma maneira bastante significativa de colocar as coisas.”
Siesta deu um passo à frente, ficando entre mim e Hel, a poucos metros de distância.
“O que você realmente quer dizer com isso?”
“Oh, nada. Apenas que você parecia estar em termos muito amigáveis com ela.”
‘Ela’...
Ela se referia a Alicia.
Era por isso que Hel estava falando sobre ‘brincar de camaradas’.
“Isso mesmo. É por isso que estamos aqui para salvar Alicia.”
“Eu sei. É por isso que vocês vão me matar.”
No instante seguinte, o solo se ergueu e uma rede de vinhas espinhosas emergiu violentamente da terra.
“O que diabos são essas coisas?”
“Significa que o inimigo não era burro. Tenho certeza de que plantaram a ilha inteira com suas sementes.”
Siesta analisou a situação para mim, usando um termo que eu tinha ouvido há pouco tempo.
“...Entendi. Então teremos que lutar contra a ilha inteira, hein?”
Agora, tudo nesta ilha estava se preparando para nos atacar, com seus instintos de sobrevivência no auge.
Literalmente, as sementes já haviam sido plantadas.
E, ainda assim, mesmo diante da inimiga do mundo, a grande detetive nem sequer hesitou.
“Na verdade, este é um lugar muito apropriado para nossa batalha final.”
“Não é? Para os seus últimos momentos, quero dizer.”
O mosquete de Siesta e a espada vermelha de Hel apontaram uma para a outra, formando uma linha reta.
“Eu vou vencer. E prometo que realizarei o desejo de Alicia.”
“Não, você vai morrer aqui. Você não pode salvar essa garota.”
Houve um único disparo de arma de fogo.
E o som de uma lâmina cortando o ar.
E assim, o duelo recomeçou.
"Eu só queria ser amada."
A batalha feroz entre Siesta e Hel já durava mais de dez minutos.
Quando os chicotes de espinhos atacavam, o mosquete de Siesta os destruía com precisão absoluta, e quando Hel aproveitava essas aberturas, segurando sua espada na altura da cintura e saltando para o ataque, Siesta usava seu mosquete como uma lâmina para contra-atacar.
Eu tentei recuar para fornecer cobertura, mas….
“Assistente, você está no caminho.”
“Isso não é justo...”
Com sua experiência avassaladora e instintos afiados, Siesta lutava em igualdade de condições, ou melhor, até com vantagem, contra uma inimiga suprema que tinha a própria terra ao seu lado.
“Nossa. Você está tão desesperada que chega a ser ridículo.”
Hel saltou para trás, colocando uma grande distância entre elas.
Ela sorria, mas sua frustração era evidente.
“Então você quer recuperar minha mestra tão desesperadamente assim?”
Ela zombou, soltando um riso de desprezo.
Mas o que realmente me chamou a atenção foi...
“...Sua mestra?”
Aquela expressão ficou martelando na minha cabeça.
De acordo com o que Alicia nos contou anteriormente, ela foi criada dentro da personalidade brutal de Hel.
Hel era a dominante, e Alicia era sua sombra.
Mas pelo que Hel acabara de dizer….
“Você está dizendo que tomou o corpo de Alicia?”
Afinal, Alicia era a dominante, e Hel, a sombra?
Será que Hel inverteu essa dinâmica à força?
“Eu não tomei nada.”
Hel estreitou os olhos vermelhos.
“Eu troquei de lugar com ela. Pelo bem dela.”
Ela insistia que tinha feito isso por bondade.
“Este corpo é um pouco diferente dos outros oficiais da SPES, sabe. Originalmente, ela era uma humana normal.”
“O quê...?”
De acordo com o que ouvimos no laboratório, todos os membros da SPES eram seres artificiais clonados a partir dos cortes de Seed...
Não, espera. Isso estava errado.
Eu conhecia um pseudo-humano que não se encaixava nisso.
“Morcego...”
O loiro que conheci a dez mil metros de altura, três anos atrás, era um semi-pseudo-humano que havia anexado à força uma habilidade da SPES ao próprio corpo.
Será que Hel, ou melhor, Alicia também tinha sido humana no passado, como ele?
“No entanto, por causa disso, eles realizaram todo tipo de experimento neste corpo.”
Experimentos.
A palavra me fez arrepiar até a espinha.
“Ela sempre gritava de dor e calor. Parece que minha mestra passou por experiências verdadeiramente torturantes.
Até que, um dia, quando ela não suportava mais a dor eu nasci.
“Minha mestra me criou.”
...Então foi isso que aconteceu.
Era um caso clássico de transtorno dissociativo de identidade.
Após anos de dor física e emocional insuportáveis, quando não pôde mais suportar, ela criou uma nova personalidade para diminuir o impacto psicológico.
Hel era a sombra que Alicia gerou para si mesma.
"Foi assim que minha mestra e eu nos conectamos. Nosso sofrimento foi dividido ao meio, nossa tristeza também. Foi assim que sobrevivemos até agora."
“Nesse caso, eu acabarei com o sofrimento e a tristeza de vocês agora mesmo.”
Um lampejo atravessou o campo de batalha; qualquer conversa adicional era inútil.
Siesta se lançou do chão, encurtando a distância entre ela e a garota de uniforme militar tão rápido que era quase impossível acompanhar.
Determinada e resoluta, apontou sua arma para ela.
“Oh, esqueci de mencionar uma coisa,” Hel murmurou suavemente, sem sequer piscar. “Sofrimento dividido ao meio, tristeza dividida ao meio e, é claro, compartilhamos a dor igualmente.”
No instante seguinte, a cabeça de Hel tombou para frente e então...
“...O quê? Onde estou?”
Ela olhou ao redor, confusa; a crueldade em seus olhos havia sumido. Então, seu olhar se fixou em….
“Hã? Kimizuka?”
Eu estava um pouco distante, e ela me avistou primeiro. Mas não percebeu a pessoa bem na sua frente, nem a arma apontada para ela.
O gatilho foi puxado.
“Eeeeeeeeeeeeeeeeeek!”
Com um grito, a garota desabou no chão. O tiro pareceu apenas tê-la de raspão; um vermelho escuro começou a se espalhar por seu ombro direito.
"Alicia...!" Eu gritei.
“Kimi...zuka...” ...! Eu estava certo.
Era realmente ela.
Convencido, tentei correr até ela, mas…
"Não se aproxime."
A pessoa que havia atirado em Alicia me alertou por cima do ombro.
"Siesta, essa é a Alicia! Nós não podemos..."
"Eu sei. Por isso não mirei em nada vital."
Siesta manteve a arma apontada para Alicia.
“Ora, ora. Que bondade da sua parte. Se tivesse atirado no coração ou na cabeça dela, vocês dois já teriam vencido.”
No instante seguinte, espinhos irromperam sob os pés de Siesta.
“...!”
Ela recuou instantaneamente, voltando para minha posição. Alguns metros além dos arbustos espinhosos, a garota de uniforme militar se levantou, segurando o ombro.
"Então minha mestra é assim tão importante para vocês."
Os olhos vermelhos sob seu boné voltaram a ser os frios e calculistas de Hel.
Não havia dúvidas: Hel estava no controle novamente.
E ela alternava com a personalidade de Alicia sempre que quisesse...!
"No entanto, eu não vou perder para alguém tão ingênuo. Desta vez, cumprirei minha missão como SPES."
Os olhos vermelhos de Hel se arregalaram, e ela avançou contra nós com sua espada. Ao mesmo tempo, uma onda de espinhos nos atacou.
Se tentássemos lutar, Hel provavelmente inverteria para Alicia de novo. Nesse caso, não poderíamos tocá-la.
"Ah... Então era mesmo uma mentira."
Siesta murmurou baixinho.
Soou exatamente como algo que ela havia dito para Morcego três anos atrás, naquele avião sequestrado.
Essa frase significava que as coisas estavam prestes a ficar sérias.
"Do que você está falando?"
Hel inclinou a cabeça, surpresa. No entanto, os espinhos não pararam de se mover.
Eles nos cercaram... e então murcharam completamente.
Uma gota d'água escorreu pela minha bochecha, e eu olhei para cima.
"Chuva?"
Havia um helicóptero sobrevoando o local, bem alto no céu.
Estava espalhando algum tipo de líquido...?
"Herbicida," Siesta disse.
"Uma versão customizada de ação super rápida. Não se preocupe, não afeta humanos."
"Sempre preparada para tudo, hein...?"
Era uma estratégia contra essa arma biológica, uma técnica que matava plantas, mas deixava humanos ilesos.
Provavelmente era a Srta. Fuubi no helicóptero.
"...!"
Hel, ainda segurando sua espada militar, avançou sozinha.
Siesta, mais uma vez, empunhou seu mosquete como uma lâmina.
"O que? O que sobre mim é uma mentira?"
Porém, as mãos de Hel tremiam levemente em torno do cabo de sua espada.
Em resposta, Siesta declarou:
"Você não tem interesse real na SPES, tem?"
Ela disse isso sem qualquer piedade.
"...Já disse várias vezes. Eu estou obedecendo ao destino... e agindo conforme a vontade da SPES. É por isso que eu…!"
Seus olhos vermelhos vacilaram.
Pela primeira vez, Hel parecia realmente desequilibrada, e não havia a menor chance de Siesta deixar essa oportunidade escapar.
"Você mesma disse," Siesta a lembrou. Sua expressão permaneceu inabalável.
"Você é um ser completamente novo, criado pelos instintos de defesa de Alicia. Isso significa que não há como os instintos da SPES terem se enraizado em você."
“...!” Então era isso...
Se o que Hel nos contou antes era verdade, a única que originalmente possuía as habilidades e instintos da SPES era Alicia.
Hel era apenas uma personalidade adquirida, criada como um mecanismo de defesa.
Por natureza, Hel não deveria ter instintos da SPES.
"Isso significa que você é apenas uma impostora que está desesperadamente tentando se aproximar da SPES olhava para o chão, em silêncio.
E Siesta a atingiu diretamente com suas palavra.
"Então..." murmurou Hel.
Quando ergueu a cabeça, seu rosto estava tomado pela fúria.
Era a segunda vez que a via assim.
"Por que eu faria isso?! Que razão eu teria para fazer tudo isso pela SPES...?!"
Isso mesmo. Ela havia ficado tão furiosa quanto naquela outra vez.
Siesta já devia ter percebido naquele instante.
Mais uma vez, a detetive falou com a garota de uniforme militar, como se estivesse tentando acalmá-la gentilmente.
"Provavelmente, você só queria que seu pai a amasse."
O monstro chora.
"—!”
"Você só queria amor. Queria que alguém a enxergasse e aceitasse. Só isso."
"Não!"
As pupilas de Hel se dilataram; ela ajustou o aperto no cabo da espada e a ergueu. A lâmina avançou contra a garganta de Siesta, mas Siesta desviou com leveza, fazendo a ponta cortar apenas o ar vazio.
Os ataques de Hel já não tinham a mesma intensidade de antes.
Siesta estava certa.
"Então por que você está tão irritada?"
Disparei contra os pés de Hel para mantê-la afastada.
"...!"
Hel franziu a testa e recuou temporariamente.
"Deixe-me reformular. Por que você trocou de personalidade com Alicia naquele momento?"
Siesta fez outra pergunta, mantendo a arma apontada para Hel.
"Porque, no fundo, esperava que eu não mirasse em algo vital se fizesse isso? ...Não. Você só queria machucá-la."
"...Bem, não vou negar."
Os olhos vermelhos de Hel tremeluziram.
"Afinal, eu nasci apenas para assumir a dor da personalidade dominante. Talvez eu tenha tido um desejo de vingança."
"Sim. Sim, exatamente. Você tem emoções. Você não é uma planta... e certamente não é um monstro," disse Siesta.
"Porém... ainda está mentindo."
"...Mentindo..."
"A verdadeira razão pela qual você força Alicia a carregar essa dor não é sede de vingança. É inveja."
" Silêncio!" Hel explodiu de raiva.
Antes que eu percebesse, ela já havia erguido sua espada, travando lâminas com Siesta.
"Você tinha inveja de Alicia. Ela lhe causou todo esse sofrimento, e ainda assim encontrou companheiros em mim e no meu assistente. Você a odiava tanto... e ao mesmo tempo a invejava."
"Não... Não, não!"
"Eu não estou errada. Você só queria ser amada. Você queria amigos."
"Cale-se!" Os olhos vermelhos de Hel brilharam.
"Você vai se matar aqui e agora...!"
No instante seguinte, Siesta sacou sua pistola do coldre e pressionou contra sua própria têmpora.
Hel usara sua habilidade, aquele poder que interferia na consciência humana e controlava ações.
Porém….
"Siesta, você não vai morrer."
Assim que falei, Siesta soltou a arma.
"O-o quê...?"
Hel nos encarou, confusa.
Siesta explicou:
"É simples. Eu confio no meu assistente mais do que em qualquer outra pessoa, mais do que em mim mesma."
Siesta olhou para mim e então se dirigiu à inimiga suprema que dominava o campo de batalha.
"Mesmo que minha mente tente abraçar a própria morte, se ele negar isso com convicção, então eu acreditarei nele sem hesitar. É só isso."
"...! Então..."
Os olhos de Hel se voltaram para mim.
Nesse momento….
"Assistente, você também não vai morrer," disse Siesta para mim. Era o feitiço que sustentava nossa estranha parceria.
Nós confiávamos um no outro mais do que confiávamos em nós mesmos.
Era só isso.
De verdade, era só isso.
Essa pequena coisa, cultivada inconscientemente ao longo de três anos, nos tornava invencíveis.
E era a única forma de anular a lavagem cerebral imposta por aqueles olhos vermelhos.
Hel poderia dizer o que quisesse para tentar assumir o controle da minha mente, mas se alguém em quem eu confiasse mais falasse comigo, eu seria livre novamente.
Para mim, essa pessoa era Siesta e para Siesta, era eu.
Se quiser chamar isso de "desenvolvimento forçado", pelo menos diga que é o poder do nosso vínculo, certo?
Afinal, levou três anos para se formar, teimoso demais para quebrarmos, mesmo que quiséssemos.
"...! Um vínculo? Isso é apenas... Isso não..." Ela não queria admitir, mas também não conseguia encontrar palavras para negar.
Hel deixou sua espada cair e segurou a cabeça.
Esse era provavelmente o plano de Siesta.
Se fôssemos salvar Alicia, obviamente não poderíamos matar seu corpo.
Teríamos que remover a personalidade de Hel e para isso, Siesta atacou sua contradição psicológica, tentando desestabilizá-la emocionalmente.
"Isso mesmo, Hel. Você não precisa obedecer aquele texto sagrado. Não precisa matar mais ninguém. Você pode ter amigos sem nada disso. Você também pode criar laços."
Eu conseguia entender o que Siesta estava tentando fazer.
"Você não precisa se forçar a seguir as ordens daquele Seed..."
Mas antes que eu pudesse continuar…
"Eu não posso me dar ao luxo de perder."
Hel pegou novamente sua espada militar de cabo vermelho.
Quando ergueu a cabeça, seus olhos ardiam em chamas escarlates.
"Hel, você..."
"Eu admito."
Ao encarar Siesta, sua expressão não vacilava nem um pouco.
"Eu queria ser amada. Queria ser necessária. Queria que alguém dissesse que meu nascimento teve significado... Mas ninguém jamais faria isso. Não é que eu queria apenas qualquer companhia. Eu só queria que meu pai me amasse. Que ele me aceitasse."
Hel apontou a lâmina diretamente para Siesta.
"E eu vou viver, lutar e destruir o mundo por isso. Esse é o meu instinto de sobrevivência."
Era algo completamente inquebrável, um mal imenso, uma convicção.
"Tudo bem."
A única pessoa capaz de enfrentar esse inimigo do mundo era a detetive de elite. Com a arma em punho, Siesta aceitou a declaração de guerra.
"Nós matamos as plantas. Tornamos seus olhos vermelhos inúteis. Tudo o que lhe resta é essa espada. Vamos resolver isso agora, não acha?"
"Está se achando só porque é uma luta de arma contra lâmina?"
"Não. É porque essa luta é entre mim e você."
"Você é realmente irritante."
"Não importa como nos conhecemos, tenho certeza de que nunca nos daríamos bem."
"Você acertou. Então vamos acabar com isso aqui e agora."
Hel baixou seu centro de gravidade, pronta para desembainhar a espada.
Com uma velocidade relâmpago, ela avançou contra Siesta e então...
"...! Um terremoto...?"
Do nada, o chão começou a se elevar, rachando com um estrondo ensurdecedor. Será que deixamos escapar algumas raízes? pensei, preparando-me para o pior. Foi quando….
"Assistente! Cuidado!"
Siesta me empurrou com força, fazendo-me voar para trás. No instante seguinte, o solo se ergueu violentamente. Uma grande fenda abriu-se entre mim e Siesta e algo emergiu do subsolo.
Era uma criatura gigantesca, com uma coloração grotesca que me parecia familiar. No entanto, agora era muito maior do que antes, chegando a dez metros de comprimento. Enquanto a terra tremia, a criatura soltou um rugido e então fixou seu olhar em seu alvo.
"Siesta...!"
A arma biológica havia sido revivida: Betelgeuse.
Sua cabeça sem olhos se voltou para Siesta e Hel.
"Aqui, monstro...!"
Apertei o gatilho do meu Magnum até esvaziar o tambor... mas Betelgeuse sequer pareceu notar. Saliva escorria de sua mandíbula gigantesca enquanto ele encarava as duas.
"Está... com fome...?"
Betelgeuse era um monstro que devorava corações humanos.
Do outro lado, havia duas pessoas e um monstro faminto sempre priorizaria números acima de tudo.
"Siesta!"
Além da enorme criatura, consegui vislumbrar uma garota de cabelos prateados. Logo em seguida, ouvi um uivo, semelhante ao gemido de uma baleia—e então uma explosão de vermelho floresceu diante dos meus olhos.
Naquele último instante, meus olhos se encontraram com os dela, e ela parecia estar sorrindo.
"Mordida pelo meu próprio cão de caça."
Quando a poeira baixou, o que vi foi o enorme corpo de Betelgeuse. Depois de seu frenesi destrutivo, ele jazia no chão, com o pé de Hel apoiado sobre sua cabeça.
"Siesta..."
Minha parceira estava caída de costas. Sangue vermelho escorria do lado esquerdo do peito dela.
"Eles o mantinham isolado no laboratório, mas talvez o cheiro de comida o tenha atraído até aqui," comentou Hel, enfiando sua espada no pescoço de Betelgeuse. O monstro já parecia estar morto.
"Ah, quero que fique onde está por um tempo. Não se mova."
Seus olhos vermelhos brilharam... e meus pés travaram no lugar. Antes que eu percebesse, meu corpo tentava correr até Siesta, mas não conseguia me mover.
"Perdi muito sangue..."
Mantendo-me imobilizado com sua habilidade, Hel caminhou até Siesta, seus passos trôpegos. Só então percebi o lado esquerdo do peito de Hel também estava profundamente ferido, e um fluxo espesso de sangue escorria de sua frente.
"Agora então." Hel se abaixou em direção a Siesta.
"...! Não toque nela!"
Tentei correr até Hel... mas meu corpo permaneceu imóvel. Era como se eu tivesse virado pedra. Para quebrar o efeito daqueles olhos vermelhos, eu precisava de alguém em quem confiasse do fundo do meu coração ao meu lado.
E ela já não estava mais lá.
"Meu coração foi danificado de novo, sabe? Preciso trocá-lo por um novo," murmurou Hel.
É claro. Em Londres, como Jack, o Demônio, ela havia roubado coração após coração. Foi um processo de tentativa e erro, uma busca pelo coração mais compatível com seu corpo. Agora, depois do ataque de Betelgeuse, seu coração estava danificado mais uma vez. Ela precisava de um novo.
E esse novo coração seria o de Siesta.
"...! Pare! Se você precisa de um coração, pegue o meu! Mas não o dela... Qualquer um, menos Siesta!"
"Eu te disse antes, lembra?" Hel parou por um instante e me lançou um olhar.
"Um dia, você será meu parceiro. Isso significa que deve cuidar da sua vida... não é?"
Seus olhos vermelhos se estreitaram, e então ela mergulhou sua mão direita no peito ensanguentado de Siesta.
"Pare...!"
Mas meu corpo continuava imóvel. Nem mesmo piscar eu conseguia, enquanto assistia àquela cena horrenda.
"Vou levar o coração da detetive de elite. Agora, serei incomparável."
Hel retirou sua mão direita do corpo sem vida de Siesta. Na palma de sua mão, repousava um coração pulsante.
"S-Siesta..."
Tudo o que eu conseguia fazer era olhar, atordoado. Diante dos meus olhos, Hel enfiou a mão no buraco aberto no próprio peito, arrancou seu próprio coração e o esmagou sem hesitar. Em seguida, pressionou o coração de Siesta contra seu peito.
O órgão deslizou para dentro de seu corpo, como se sempre tivesse pertencido a ela.
E então, tudo acabou.
Com apenas alguns movimentos, Hel roubou o coração de Siesta.
"Finalmente encontrei um coração bom o suficiente para mim. Agora tenho certeza de que o Pai vai..." murmurou Hel, satisfeita.
Ela sequer olhou para o corpo sem vida de Siesta. Apenas ergueu os olhos para o céu. Acima dela, uma lua branca brilhava.
"Siesta..."
Entorpecido e sem forças, tropecei sobre o chão destruído em direção a Siesta. Hel já havia terminado; o efeito de sua habilidade foi desfeito. Cambaleei várias vezes antes de finalmente alcançar o corpo da minha parceira.
"Siesta."
Ajoelhado, puxei seu corpo ensanguentado para meus braços. Seu corpo era pequeno e frágil. Eu não precisava verificar sua respiração para saber que ela estava morta. Seus olhos ainda estavam abertos. Fechei-os com a palma da mão e, com os dedos, limpei o sangue que havia respingado em seu rosto pálido.
"Siesta."
Chamei por ela mais uma vez.
Não houve resposta. É claro que não houve.
A detetive já estava morta.
"......—, .........—!"
Eu tinha certeza de que não choraria. Afinal, ela não era minha amante nem minha amiga. Éramos apenas parceiros de trabalho com um interesse em comum. Siesta nunca foi especial para mim.
E, no entanto, por mais que tentasse limpar, gotas de água continuavam caindo sobre o rosto dela.
"...Me desculpe."
Com uma mão trêmula, afaguei sua cabeça, apoiada no meu braço. Como antes, Siesta não respondeu.
"Devolva."
Dessa vez, minhas palavras foram dirigidas a Hel.
Com cuidado, deitei o corpo de Siesta no chão e usei a força que me restava para me levantar.
"Devolver? Devolver o quê?" Hel se virou, parecendo confusa.
"Esse coração pertence à Siesta. Você vai devolvê-lo."
"Isso está fora de questão. Agora ele é meu." Enquanto falava, Hel pousou a mão sobre o lado esquerdo do peito.
E algo dentro de mim se rompeu.
"Não toque na Siesta com essa mão imunda!"
No instante seguinte, minhas pernas já estavam em movimento. Cada fibra do meu ser desejava matar aquela coisa, meu corpo, meus ossos, minha carne, meu sangue. Arranquei minha faca e avancei contra Hel.
"Eu não entendo."
Com um movimento rápido, ela desviou minha lâmina usando a guarda de sua espada e franziu a testa.
"Da primeira vez que nos encontramos, você disse que não confiava em ninguém além de si mesmo."
Balancei minha lâmina repetidamente... mas não demorou para que Hel me olhasse com desgosto e fizesse um corte profundo em meu braço direito. A faca caiu no chão.
Muito bem, então, pensei, cerrando o punho esquerdo.
"...Então chegou a esse ponto."
Os olhos vermelhos de Hel brilharam, e meu corpo congelou novamente.
"Mas agora, você está sangrando, e mesmo assim não desfaz esse punho fechado. Enquanto tenta me atingir, seus olhos injetados de sangue estão ainda mais vermelhos que os meus. Por quê?" ela perguntou.
"De onde vem essa raiva? É por causa do que mencionou antes? Esse vínculo?"
Ela não tinha terminado.
"O que você era? O que você significava para ela?"
Meu punho suspenso no ar não se movia. Talvez pela perda de sangue, meus pés já não estavam firmes. Mesmo assim, me esforcei para pensar.
O que eu fui para Siesta?
Eu não precisava que Hel me perguntasse. Já vinha pensando nisso há muito tempo.
Como ela me via?
Mas agora era tarde demais para saber.
Os mortos não dizem nada.
Eu nunca saberia o que Siesta pensava de mim, e não havia mais esperança de descobrir.
Ainda assim...
Tentei inverter a pergunta:
O que eu pensava sobre Siesta?
Naquele dia, nos encontramos no ar, a dez mil metros de altura. Desde então, viajamos juntos por três anos...
Para ser sincero, eu estava cansado daquilo.
Depois de tudo pelo que já havia passado, eu valorizava uma vida pacata mais do que qualquer um. Tudo o que queria era continuar vivendo naquela rotina tranquila para sempre.
Mas Siesta me arrastou para fora disso e aquele salto pela janela no festival cultural acabou sendo um salto direto para o extraordinário.
Você faz ideia de quantas vezes quase morri?
Quantas vezes fui ferido, puxado para tiroteios, fiquei três dias sem comida ou água, acampei em montanhas infestadas de ursos, persegui assassinos, fui sequestrado, preso, lutei contra pseudo-humanos e armas biológicas, passei por situações completamente injustas...
E depois de tudo isso, ouvi minha parceira dizer:
"Você é idiota, Kimi?"
Você faz ideia de quantas vezes sorri?
Siesta costumava agir de maneira séria, mas... sabia que era surpreendentemente fácil fazê-la rir?
Ela odiava demonstrar emoções muito genuínas. Sempre que sentia vontade de rir, virava o rosto para longe de mim, levava uns trinta segundos para recompor a expressão e só então voltava com um "Você é idiota, Kimi?".
Eu morria de rir vendo isso, o que a deixava irritada, e esse era o nosso ritual completo.
Ela era mais infantil do que aparentava.
Gostava de provocar os outros, mas não suportava ser provocada. Era péssima para mentir. Socializar também não era o seu forte.
Ela não conseguia acordar de manhã.
Na verdade, ela nem conseguia acordar ao meio-dia.
Dormia muito. Comia muito.
Quando eu comprava dois tipos de bolo, ela ficava brava se eu tentasse escolher um primeiro.
E no fim, comia os dois.
E aproveitava cada pedaço.
Então, quando me via observando e rindo porque seu comportamento era completamente inacreditável, ela pegava o garfo, escolhia um pedaço com morango e o estendia para mim.
Isso era Siesta.
Você acha que ela era apenas uma detetive de elite que lutava contra os inimigos do mundo? Isso não era tudo o que ela era.
Sim… Eu só continuei ao lado de Siesta porque me divertia.
Sim, nos últimos três anos, passei por dificuldades, dores e frustrações além do que poderia suportar.
Mas em mil situações injustas, eu havia sorrido dez mil vezes. Eu sorri com ela.
"Que tipo de relação Siesta e eu tínhamos? Como me sentia em relação a ela?" A resposta era óbvia desde o começo.
De repente, uma onda de força percorreu meu corpo, ou talvez fosse apenas um surto de adrenalina. Meus ossos estalavam, meus músculos tremiam, meu sangue fervia. Mas nada disso importava.
Mesmo que isso destruísse meu corpo, não fazia diferença. Desde que eu eliminasse o inimigo de Siesta, isso seria o suficiente.
"Você quebrou o controle mental..." Vi Hel arregalar seus olhos vermelhos.
Levantei meu braço esquerdo, ensopado de sangue, e gritei os sentimentos que minha parceira jamais ouviria:
"Ela é a pessoa mais preciosa do mundo para mim!" Meu punho cerrado avançou contra Hel. Seu rosto estava bem diante de mim.

Ele abriu os olhos novamente e ambos estavam azuis.
"Siesta, você..."
"Eu fiz você chorar, não foi?"
Não havia dúvida. Era ela.
Ela estava usando o corpo de Hel, sua inimiga mortal, mas a voz que falava comigo era de Siesta. Essa constatação fez minhas pernas fraquejarem e meus olhos arderem novamente.
Siesta ainda estava viva.
"Siesta, eu..."
"Assistente, não temos tempo, então escute com atenção."
Mas Siesta não se permitiu aproveitar a alegria do nosso reencontro. Ela apenas continuou falando.
"O fato é que meu coração é um tanto especial. Por exemplo, ao transferir minha consciência para ele, posso manter minha identidade dentro do corpo de outra pessoa."
"Isso é..."
Seria algo semelhante ao fenômeno da transferência de memória? Havia relatos no mundo todo de receptores de transplantes de órgãos herdando memórias e preferências de seus doadores.
Como Hel havia roubado o coração de Siesta, as memórias e a consciência dela haviam sido parcialmente transplantadas junto. Era assim que Siesta estava tomando o controle do corpo de Hel para falar comigo.
"Pensei em vários planos diferentes, mas teria sido extremamente difícil derrotar Hel de verdade."
"...! Siesta, está me dizendo que...?"
"Sim, essa era a única maneira. Eu precisava me infiltrar em Hel e suprimir sua mente. Só assim poderia me opor a ela."
...! Isso significava que, naquela hora, Siesta já sabia!
Ela sabia que iria morrer! Isso era... Isso era simplesmente absurdo!
"Eu te disse, não disse? Um verdadeiro detetive resolve o caso antes que ele aconteça. Eu já sabia há muito tempo que as coisas terminariam assim."
"Não... Isso não é justo... Durante todo esse tempo, você..."
Então, desde o começo, ela já sabia onde essa estrada nos levaria? Nesse caso, por quê...?
Por quê?
"Porque, se eu tivesse te contado, você teria me impedido."
Siesta, ainda no corpo de Hel, sorriu com certa melancolia.
"Tenho um favor a te pedir, Kimi."
"...Nem pensar."
"Escute."
"Não."
"Você é burro, Kimi? Esse não é momento para teimosia, e você sabe disso."
Ela estendeu a mão e acariciou minha cabeça.
"Vou me infiltrar nesse corpo e manter a personalidade cruel de Hel sob controle. Se eu fizer isso, a consciência de Alicia deve despertar novamente."
"...! Ela vai acordar?!"
"Sim. Afinal, esse corpo tem a habilidade de Cérbero... Você entende o que isso significa, não?"
...Ah, agora eu entendia.
O cão de guarda do submundo de Hades tinha três cabeças. Ela estava dizendo que esse corpo poderia abrigar até três consciências.
Alicia e Hel já estavam lá. Agora, Siesta havia se juntado a elas.
"Ela pode ter perdido a memória novamente, mas quero que você peça a ajuda dela e um dia, quero que vocês derrotem a SPES."
Esse era o verdadeiro plano secreto de Siesta.
A única estratégia possível para derrotar Hel e garantir que Alicia continuasse viva.
"! Mas e você? Se a consciência de Alicia despertar, a sua desaparecerá junto com a de Hel, não é?! Não se atreva... Eu não vou permitir!"
Sacrificar Siesta para salvar Alicia? Se essa era a solução, eu não a aceitava!
Não importava em que forma. Não importava se estivéssemos em lados opostos.
Se ao menos sua mente ainda estivesse viva em algum lugar, isso já seria o suficiente para mim. Então, eu não deixaria você fazer algo tão egoísta!"
"Eu sabia que você diria isso."
Siesta sorriu de novo, de forma quase imperceptível.
"Mas vai ficar tudo bem. Alicia tem coisas que eu não tenho. Tenho certeza de que vocês se darão bem. Lembre-se daquelas duas semanas," disse ela com doçura.
"Eu já disse, não aja como se isso estivesse decidido! Eu não concordei com..."
Foi nesse instante que o chão sob meus pés estremeceu.
Eu tinha perdido muito sangue?
Não, não era isso...
Eu senti um cheiro doce no ar.
Em um instante efêmero, uma sensação eufórica e nebulosa tomou conta da minha mente.
Através dos meus olhos turvos, vi uma enorme flor desabrochar do cadáver da arma biológica.
Era pólen.
O pólen de fragrância doce foi levado até nós pelo vento.
"...Talvez isso também seja destino. Já faz três anos desde então."
Siesta sorriu, um sorriso hesitante.
Três anos... Ah. O incidente da "Miss Hanako" no festival cultural, três anos atrás.
Esse pólen era a droga que havia causado o caos na minha escola.
"Então, ele veio da flor que cresceu no corpo dessa coisa, hein...?"
Eu sabia o que isso significava, mesmo que me recusasse a aceitar.
"Não... Eu não quero... esquecer..."
O primeiro efeito colateral da inalação desse pólen era a perda de memória.
Respirar essa quantidade... significava correr um grande risco.
Eu poderia esquecer esses três anos inteiros. Esquecer tudo sobre Siesta.
Tudo.
"Vai ficar tudo bem."
Talvez o corpo de Hel fosse imune ao pólen; Siesta ainda estava de pé, firme.
Enquanto eu cambaleava, ela me deixou apoiar no ombro dela.
"Talvez você esqueça um pouco. O que aconteceu aqui, por exemplo, ou algumas das coisas que eu te disse. Mas ainda assim..."
Ela sorriu.
"Você não vai me esquecer. Você não vai abandonar sua missão. Você vai suspirar, reclamar que não é justo... e continuar trabalhando com a Alicia por mim."
"Isso... não é justo... Eu não vou..."
A essa altura, eu nem conseguia mais ficar de pé.
Afundei ali mesmo, no chão.
O negro invadiu as bordas da minha visão, e minha audição começou a falhar.
"Eu sou... seu assistente... Eu não serei... parceiro de mais ninguém..."
"...Ha-ha. Isso é algo bonito de se ouvir, aqui no fim."
Eu já estava sentado no chão.
Ela colocou a mão no meu ombro e me olhou, sorrindo suavemente.
Seria outro efeito do pólen?
Eu estava alucinando?
Hel era nossa inimiga mortal, mas, agora, tudo que eu via era a parceira com quem passei três anos.
"Eu não quero... esquecer... Você vai... Eu vou... sempre..."
"Estou te dizendo, vai ficar tudo bem. Lembra o que eu disse? Esse tempo todo, confiamos um no outro mais do que confiamos em nós mesmos."
"...Então... eu deveria... acreditar... no que você diz?"
"Exatamente. Alguma vez eu estive errada?"
...Não, nunca esteve.
Você sempre estava certa. Certo demais.
Às vezes... eu queria que você estivesse errada.
Mas minha garganta não me deixava dizer essas palavras.
"Da próxima vez que você acordar, eu com certeza não estarei mais aqui. Mas..."
Viva. E prospere.
Era coisa da minha cabeça?
Siesta parecia estar chorando.
Mas Siesta não choraria.
Era porque estava em outro corpo?
Com lágrimas grossas escorrendo por suas bochechas, Siesta segurou meus ombros e gritou:
"Escute-me! Eu não vou te esquecer, Kimi! Mesmo que um inimigo cruel roube minha mente, mesmo que eu esqueça todo o resto, eu vou me lembrar de você! Pode demorar! Uma semana, talvez! Ou um mês! Ou um ano! Pode levar muito tempo! Mas mesmo assim, eu prometo! Este corpo virá te ver mais uma vez!
Eu juro, eu juro que virá!"
Depois de ouvir tudo isso, meu corpo cedeu e desabei no chão.
Na última imagem que tive de Siesta, ela sorria através das lágrimas.

VISÃO DA SIESTA
Esse momento não deveria ser triste.
E, no entanto, enquanto minha consciência se esvaía aos poucos, passei o tempo que me restava com a cabeça do meu assistente repousando em meu colo, acariciando seus cabelos.
Ele dormia como uma criança, com as marcas das lágrimas ainda visíveis em suas bochechas.
"Você é um idiota, Kimi."
Brincando, apertei sua bochecha com o dedo. Sua pele cedeu levemente ao toque antes de voltar ao lugar.
Agora, mais do que nunca, ele parecia um bebê.
"...Por isso eu queria me despedir no barco."
Porque meu assistente choraria.
Porque ele choraria por mim.
Para ser honesta, eu não pretendia deixar que ele me visse no final.
Nossa última despedida deveria ter sido a caminho da ilha.
E, no entanto, ele me perseguiu até aqui.
Charlie não tentou impedi-lo?
Sinceramente…
"Kimi, eu suspeito que você goste de mim demais."
Já fiz essa piada antes, não foi?
Afastei seus cabelos com o polegar.
Por que o rosto dele fica tão adorável quando está dormindo?
Um sentimento inexplicável de irritação me tomou, e eu ri um pouco.
"Me desculpe."
Ele não podia me ouvir.
Mas eu precisava dizer.
"Desculpe por ter morrido primeiro."
E também
"Na verdade, houve outro motivo para eu ter seguido esse plano insano."
Foi durante aquela festa que você organizou para mim, em Londres, para comemorar minha recuperação.
Você se lembra do que Alicia disse?
Ela disse que queria ir para a escola um dia.
Então, decidi realizar esse desejo.
"Eu poderia simplesmente tê-la derrotado. Matá-la teria sido fácil. Mas então... Alicia disse isso."
Ela queria viver.
Ela queria ir para a escola.
Arrisquei minha vida por esse desejo... e, ao provar o gosto da derrota, acabei vencendo.
Agora, quando Alicia acordar nesse corpo, poderei enviá-la para a escola.
Hã? Você me perguntaria por que eu fui tão longe, não é?
Bem, a resposta é simples.
"Porque o trabalho de um detetive é proteger os interesses do cliente."
Eu sabia que você perguntaria isso, Kimi.
Por isso, já deixei minha resposta.
"A questão é que... isso pode levar um tempo."
Para que Alicia possa ir à escola e levar uma vida normal, primeiro será preciso estabilizar sua mente.
Mesmo que tenha sido outra personalidade a cometer os assassinatos, a ideia de que pessoas morreram pelas mãos dela pode ser um fardo pesado demais para carregar.
Eu preciso corrigir suas memórias. Criar uma nova identidade.
Já deixei a policial ruiva encarregada disso.
Ela provavelmente está indo dar suporte ao Charlie agora, mas logo voltará para nos buscar.
"Pedi para ela mentir para você também, então não fique bravo com ela, tudo bem?"
Ela dirá que eu derrotei Hel e que a ameaça da SPES foi temporariamente neutralizada.
Que Alicia está segura e foi enviada para viver em um país distante.
Porque se soubesse a verdade, você faria algo estúpido como tentar enfrentar a SPES sozinho.
Então, até que tudo esteja resolvido...
Mesmo que seja só por um tempo, eu quero que você volte à sua vida normal.
Quero que viva aqueles dias pacíficos e comuns que tanto desejou.
"Sinto muito por ter te arrastado comigo nesses últimos três anos."
Passei a mão em seus cabelos de novo.
E de novo.
E de novo.
Tenho certeza de que esta será a última vez.
"Briguei muito com você, não foi?"
Quando penso no passado, a primeira imagem que me vem à mente é a sua expressão murmurando "Não é justo".
Fui tão injusta assim?
Só causei problemas para você?
Há pouco, deixei escapar que suspeitava que você gostava demais de mim.
Mas será que isso era realmente mentira?
Essa possibilidade me deixou um pouco nervosa.
"Ainda assim, pelo menos, eu me diverti."
Se eu dissesse isso, você riria?
Ou ficaria bravo e me diria para não quebrar o personagem?
Bem, essa é a última vez, então deixe-me aproveitar este momento.
A torta de maçã que comi com você tinha um sabor mais doce do que quando comia sozinha.
Naquele apartamento barato onde morávamos juntos, por um momento, quase parecíamos um casal.
O cassino foi divertido também... Ah, mas tenho certeza de que você perdeu tudo lá.
Pensando bem, de vez em quando, você ainda olha para aquela foto minha de vestido de noiva, não é?
Alguns dias atrás, bebemos juntos pela primeira e última vez.
Aquilo não acabou bem...
Que horas devemos acordar amanhã?
O que devemos comer?
Para onde devemos ir?
Será que receberemos algum pedido de trabalho?
Encontrar um gato perdido seria bom, algo simples.
Ah, certo.
Vi umas xícaras de chá bonitas em uma loja há pouco tempo.
Vou comprá-las na próxima vez.
Então, vamos fazer um chá especial e tomá-lo juntos.
Não se preocupe.
Haverá tempo para isso.
E então, no dia seguinte.
E na semana seguinte.
E no mês seguinte.
"Eu queria tomar chá com você daqui a um mês também."
Queria ver seu rosto enquanto você dizia "Não é justo" e suspirava.
Queria ver seu sorriso...
Acho que nunca me cansaria do seu sorriso.
"Eu não queria... morrer."
"Mas o meu trabalho é proteger. E eu vou proteger você. Essa é a minha missão. Afinal, um detetive de primeira linha é alguém que protege os interesses do cliente.
Eu prometi naquela época, lembra? Eu disse que iria proteger você. Não importa o tipo de problema que te encontrar, eu disse que te protegeria com a minha vida."
Ele olhou para a pessoa adormecida à sua frente e esboçou um sorriso melancólico.
"Então relaxe e durma, assim como está fazendo agora. Fique nesse sonho... durma desse jeito que eu talvez tenha achado um pouco fofo. Está tudo bem. Tenho certeza de que, um dia, alguém vai acordar você. E sei que ela vai te segurar perto, no meu lugar."
Ela suspirou e, depois de um momento de hesitação, retirou um pequeno objeto de seu bolso.
"Eu nunca cheguei a te entregar isso, não é? Me desculpe."
Por fim, pegou a fita vermelha, que havia deslizado sorrateiramente para dentro do uniforme militar de Hel durante a última batalha, e a amarrou em sua própria cabeça.
"Será que ela ainda estará usando isso daqui a um ano?"
Ele riu baixinho, perdido em pensamentos.
"...Isso mesmo. Vou precisar pensar em um nome também."
Esse seria o último feitiço que manteria a consciência de Hel selada.
"Hel, o nome de uma rainha fria, que dizem ter governado um país de gelo."
Mas seu novo nome deveria ser mais quente, algo que pudesse derreter os corações das pessoas. Um nome que combinasse com aquele sorriso de Alicia, tão radiante quanto o sol de verão.
Ele se virou para seu assistente pela última vez.
"Escute, Assistente."
Sua voz soou firme, mas carregada de emoção.
"Lembre-se disso. O nome daquela pessoa que irá acordar você um dia é... Nagisa. Nagisa Natsunagi."
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