Volume 1 – Arco 10
Capítulo 73: Expulsão
Depois do completo escândalo que ocorrera no prédio de eventos, enquanto todos esperavam pelo Representante que no fim não apareceu, Diego foi mandado para a sala dos diretores.
Ele foi levado pelo Prof. Nemo, que parecia muito nervoso e agitado. Assim que o colocou na sala, saiu para poder voltar a briga que estava acontecendo no prédio. Isso deu tempo suficiente para que o rapaz da cicatriz ficasse andando de um lado para o outro, pensativo, enquanto analisava os móveis e a decoração da sala.
De fato, ela parecia uma pequena biblioteca de tantos livros que haviam nas estantes. A mesa dos diretores era grande e redonda. Lembrava um pouco a mesa oval da casa do seu tio, aquela que Lidja havia comprado e era terrivelmente feia. Ao menos a mesa dos diretores era muito mais elegante por conta de suas bordas bem decoradas.
O rapaz andou para lá e para cá, pensativo. Depois começou a procurar por qualquer coisa que lhe ajudasse a se sentir menos ansioso, ou seja, remexer o máximo que podia. Afinal de contas, ainda era uma criança, uma que estava na ânsia por fazer algo.
Andou de um lado para o outro da sala observando se algum livro o interessava. Como não era um grande adepto da leitura, o que certamente era a maior parte de seu mau desempenho com as provas do Craveiro, acabou por não ficar procurando muito. Os livros eram enormes e não tinham nenhum título, apenas numerações. Fora que suas capas eram de um tom marrom muito sem graça, nem um pouco convidativo.
Foi até a mesa, onde os diretores se sentariam logo, logo apenas para conversar com ele, e começou a fuçar. Ali havia muitos papeis com desenhos, escritas e mais alguns livros, todos muito bem organizados. O único papel que estava desconexo de todos os outros parecia uma carta, bem no centro da mesa.
Aquilo encheu o peito do rapaz de expectativa. Se fosse uma carta de seu tio, poderia provar que o diretor estava trabalhando em conjunto com Elizel em algum plano mirabolante para controlar nocivos. Isso explicaria o veneno em sua comida, o motivo pela Sra. Bjorn ter colocado Bafo de Dragão em sua sopa.
Entretanto, se decepcionou quando leu a carta, que já estava aberta. Era apenas o Representante, Kardama, falando sobre algo relacionado a itens mágicos. Que não eram permitidos de forma alguma e que os diretores deveriam se livrar de qualquer item que estivesse no Craveiro.
Aquilo explicava as portas que não eram mais magicamente protegidas por um antirruído. Só não explicava o elevador, que ainda permanecia com o incrível poder de parar em qualquer lugar, aparentemente.
Depois a carta dava uma detalhada explicação de como eram os itens mágicos, sua aparência e os mais perigosos. Diego não deu muita bola para isso, era apenas um alerta da Organização para uma de suas sedes, o Craveiro, mas não parecia tão grave devido ao tom altamente formal da carta.
Colocou ela de lado e passou a continuar fuçando os papeis, com todo o cuidado para não desorganizar as pilhas amontoadas uma em cima das outras. Qualquer mínimo detalhe mexido e poderiam perceber a sua curiosidade. Fora que o garoto já estava suficientemente encrencado.
Antes que pudesse acabar quebrando qualquer coisa, os diretores entraram na sala. Para a sua sorte o rapaz ouviu eles chegando de longe e pôde ficar longe de qualquer evidência que incriminasse a sua curiosidade.
Os diretores o cumprimentaram, menos Augusto que estava furioso e foi logo se sentar, e por fim foram para seus lugares convidando que Diego se sentasse na frente deles. Assim que fizeram, o que parecia ser um interrogatório, começaram:
— Notas baixas, recorde de chamadas e advertência — falou Augusto. — Dormindo na sala de aula, desrespeito aos professores e autoridades. E agora roubando e invadindo o depósito do Craveiro! Explique-se!
— Parece que o senhor já está bem informado. — O rapaz franziu a testa e cruzou os braços, se afundando na cadeira. — Já disse tudo.
— Ora, pois! Quero saber como foste parar no depósito! Aquele lugar não é conhecido e nem deveria ser conhecido pelos nossos alunos.
Diego ficou preocupado. Naquele momento teria de explicar tudo o que aconteceu, do começo ao fim. O problema era que isso não envolvia apenas ele, mas também os seus amigos, que embora não tenham tentado lhe defender enquanto jogava o Elixir do Ingênuo em Rúnica, ainda valiam a pena.
— Eu… Hm… — Começou a pensar em alguma desculpa. — Consegui uma forma de ir até lá pelo elevador. — Todos os diretores deveriam saber que o elevador levava até o depósito.
— E como o senhol sabia do código para i até o depósito? — perguntou o diretor Kim.
— Eu ouvi uma conversa de vocês uma vez — apostou o rapaz. Não queria dizer que fora o diretor Nebeque que o ajudara a entender sobre aquele elevador, até porque o diretor havia lhe ajudado no mesmo dia e isso seria injusto. — Já ouvi varias conversas de vocês. Principalmente aquela na biblioteca.
— Como pode? — perguntou Augusto.
— Bem — começou finalmente Nebeque. — É de conhecimento que o senhor Murdock tem uma excelente audição. Ele é capaz de ouvir muito bem, embora eu não estivesse tão certo quanto a isso. Quem diria que ele poderia ouvir através de portas como as nossas.
— E como entlou no plédio? — perguntou Kim, desatento com as informações de Nebeque. O diretor parecia interessado.
— Eu… — Teve de pensar melhor dessa vez. — Eu roubei um cartão de acesso e entrei de noite, depois do torneio.
Ah, não. O torneio. Será se como punição a sua tramoia o rapaz iria ser desclassificado e a vitória dada aos frios? Isso seria muito ruim. As pessoas de sua turma com toda certeza iriam matá-lo se isso acontecesse.
— Roubaste? — Augusto se espantou. — De quem?
— Do Faramir. Ele deixou cair e eu… Não devolvi.
Os diretores se encararam por alguns segundos. Kim foi o primeiro a quebrar o estranho silêncio.
— Senhol Muldock, é de nosso conhecimento que o senhol não é… Como posso dizel isso?
— Não és uma criança dotada de intelecto suficiente para ter arquitetado tamanho plano — disparou Augusto.
O rapaz não entendeu que fora chamado de idiota, por isso não ficou ainda mais irritado, apenas ficou olhando mal-humorado para o diretor português, pois tudo que ele dizia agora lhe deixava estressado.
— É — continuou Kim. — O que significa que… Bom… O senhol celtamente deve tel lecebido uma ajuda extelna.
Agora o rapaz entendeu. Era óbvio que o rapaz não era muito esperto e precisaria de ajuda de outros para elaborar um plano como esses. O que significa que Margô e Tiago eram seus cúmplices. Isso era um problema.
— Não recebi ajuda de ninguém — falou irritado. — Eu até comentei para o Tiago e para a Margô, para eles me ajudarem, mas não quiseram. Falaram para eu esquecer o assunto.
— Estás a dizer que o jovem Nebeque e a senhorita Rosa sabiam de suas intenções desde o início?
Diego engoliu em seco.
— Não. Só falaram para eu esquecer o assunto…
— Cúmplices! — exclamou Augusto. Depois se virou para os outros diretores. — Pois, está provado por A mais B que este garoto não atuou sozinho. Toda esta confusão é fruto de um complô, uma rebelião que está se instaurando dentro de nossa Instituição. Isto não pode ser tolerado.
— Diretor Augusto — falou Nebeque, calmamente. — Por mais que meu neto e a senhorita Margô soubessem dessa informação, não os encaro como cúmplices. São apenas bons amigos que deram um bom conselho, mas que Diego não seguiu. E tenho certeza que se meu neto soubesse que Diego iria mesmo invadir o depósito teria me falado.
— O que está insinuando, diretor?
— Quero dizer que Diego agiu suficientemente escondido para enganar até mesmo os próprios amigos.
— Ora! Tens certeza que este gajo é experto para esconder isto dos amigos? Tens certeza que não está apenas a tentar proteger teu neto, Ali?
— Tenho certeza de que se essa afirmação fosse verdadeira, Diego tentaria dividir a culpa, Flávio. Afinal de contas, a maioria das crianças colocariam a culpa em terceiros, falariam dos amigos e dos professores, tudo para se livrarem do castigo. E, supondo que Margô e Tiago tenham alguma coisa a ver com isso, eu duvido muito que o Jovem Diego iria se sacrificar dessa maneira para manter eles seguros.
Aquilo não era uma verdade. Nebeque estava salvado a pele de Diego, mas fazendo isso da pior forma possível: dizendo que o rapaz não era nobre o suficiente para se sacrificar pelos amigos. De certa forma, isso o irritou um pouco.
Os diretores continuaram a se encarar por um tempo e fazer anotações. Kim era o que mais escrevia. Diego apenas esperava o que iria acontecer. Depois de um tempo, os diretores passaram os papeis uns para os outros, leram e por fim…
— Senhor Diego Murdock — falou Nebeque. — Devido a sua última advertência, que no caso foi o ato de roubar o depósito do Craveiro e usar o Elixir do Ingênuo em uma professora, tomamos a decisão de expulsar você de nossa instituição.
O coração do rapaz deu um pulo. Não acreditava que aquilo estava mesmo acontecendo.
— O que…? C-como assim?
— Notas baixas — cuspiu Augusto. — Advertências, mau comportamento e ainda por cima até hoje não corou. Independente de nós lhe expulsarmos ou não, certamente você não passaria para o próximo ano letivo.
— M-mas… Eu…
— Senhol Muldock… Está é a decisão final, entenda… — falou mansamente o diretor Kim.
O rapaz apertou os punhos, franziu a testa e se levantou, quase derrubando a cadeira atrás de si.
— E aquela professora? Vai ser expulsa também? E a senhora Bjorn com o veneno dela? E aquele nocivo? O que vai acontecer com tudo isso?
— Ora, pois! — Augusto se levantou de uma vez. — Do que está falando? Está começando a inventar mentiras para tentar se safar?
— Não estou mentindo! Pode usar o Elixir em mim se quiser. Tem um nocivo no Craveiro! Eu vi!
— Rhá! — riu o português. — Para mim já chega de sua petulância. Tenho mais o que fazer do que ficar ouvindo vossas mentiras. — E andou em direção a porta rapidamente, a fechando.
O diretor Kim e Nebeque também se levantaram e foram em direção a saída, arrastando Diego com eles. Embora o rapaz protestasse e exigisse explicação, ela não veio até que o diretor Kim saísse, deixando Nebeque e o rapaz da cicatriz a sós por alguns segundos.
— Jovem Diego, tenha calma. Não é o fim do mundo.
— Tem certeza? Então o que o senhor tanto planeja com meu tio não é para começar um fim do mundo?
— Do que está falando? — perguntou ele, se afastando para mais perto do rapaz.
— Do veneno que vocês colocam na minha comida. No senhor mandando mensagens para meu tio. Sobre esse nocivo bizarro me perseguindo por quase um ano!
— Diego — Nebeque colocou a mão no ombro do rapaz. — Seu tio me deixou para cuidar de você. Ele confiou em mim para isso. O veneno continua fazendo parte do seu treinamento. Toda refeição que você come tem um pouco. É assim que os Dragões Negros são treinados. — Ele retirou a mão. — O fato do meu neto ter comido aquela sopa foi um contratempo. Não era para ele ter feito aquilo.
— Então o senhor está me envenenando durante o ano inteiro? — O rapaz deu um passo para trás.
— Este é o treinamento que o seu tio confiou a mim. E veja só os resultados, você nem sente mais o gosto do veneno, tampouco consegue discernir quando tem ou não. Já se acostumou, já está quase pronto para se tornar um verdadeiro Dragão Negro.
— Eu senti… — murmurou. Então olhou para o diretor com raiva e falou alto: — Isso é mentira! Eu senti o cheiro do veneno na sopa! Aquele veneno era mais forte. Ele não era como os outros! Isso é mentira!
— Já chega! — disse Nebeque com voz de autoridade. — O senhor voltará para o seu dormitório, irá se despedir de seus amigos e voltar para casa. Já iremos informar essa decisão para o seu tio. Amanhã mesmo o senhor Morfeus deverá aparecer aqui para lhe levar de volta para casa.
Então lhe deu as costas, indo em direção ao elevador. O rapaz ficou no corredor, parado, contemplado o mais absoluto nada. Pelo visto seria realmente expulso, o maior medo que tinha.
Antes de descer, Nebeque o encarou e falou suficientemente alto para que ouvisse:
— Sinto muito.