Volume 3
Capítulo 133: Vigésima Sétima Página do Diário (1)
Eu explodi.
Não literalmente, mas quase. Quase todo meu poder explodiu em direção aos meus inimigos, arremessando eles para longe. Larguei a proteção da minha armadura por puro impulso raivoso, mas valeu a pena.
Dois dos assassinos estavam esmagados na parede oposta. Restavam quatro, e mais a heroína.
Mas eu preferi me reorganizar, não seria saudável lutar contra cinco pessoas perigosas em um ambiente fechado, principalmente quando eu não conhecia as habilidades deles.
Então aproveitei a brecha que houve e corri para a janela, eu tinha que ser rápido ou Anne seria capaz de me impedir de fugir. Resolvi criar um escudo entre eu e ela, só por precaução, fiz um que cobria meu corpo inteiro.
O escudo voou em direção ao teto imediatamente. Foi por pouco, se não tivesse feito o escudo, seria eu a acertar o teto. Fiz outro escudo, e mais um à frente, escondendo meu corpo enquanto me desviava da mobília.
Os dois escudos voaram em direções que eu nem sequer vi, pois já estava pulando pela janela do terceiro andar. Ah merda, esqueci que estava tão alto. Pelo menos deu tempo de criar outra armadura inteira e amortecer a queda. Mas ainda doeu muito.
Quando desfiz a armadura e me levantei, os quatro guardas/assassinos de Anne, já tinham me cercado. Admito que eles eram bem competentes, talvez eu devesse ter explodido a armadura outra vez, mas nem lembrava como fiz aquilo.
Eu precisava sair dali ou acabaria morto. Mas precisava segurar eles para não irem atrás de Brogo e dos outros. Uma decisão difícil para quem tinha apenas 15 anos, e pouca experiência em missões reais.
Mas eles não precisavam saber disso, foi para momentos como esses que fui obrigado a fazer teatro. Fingir ser uma pessoa diferente é parte da missão de ser um espião do Leste, apesar de eu ainda não saber o que isso realmente significava.
— Agora que temos mais espaço, será mais fácil me livrar de vocês cinco! — Blefei.
Acho que funcionou, porque três dos guardas deram um passo para trás. Nunca mais eu ia reclamar das aulas de teatro depois disso. E nem das aulas de ginástica e dos treinos exaustivos…
Um bloco de pedra do tamanho de um boi voou em minha direção, e precisei usar toda a minha agilidade e flexibilidade para me contorcer entre o bloco e o chão, de modo a não ser acertado. Foi por pouco.
Anne tinha arremessado uma pedra da parede da mansão do Barão em mim!
Por muito pouco eu não me tornei purê de carne… Nem sei se existe purê de carne, mas teria existido se eu não fosse tão rápido. E nem deu tempo de me levantar, outra pedra veio em minha direção.
Um buraco estava se formando na parede da casa.
Mas eu fui mais esperto dessa vez e girei para o lado, desviando com facilidade. Porém, entrei na frente de um dos guardas, que já me esperava com uma adaga mirando meu pescoço.
Girei sobre os calcanhares usando o movimento que aprendi com Ladii, e consegui fugir do guarda com pouca dificuldade. Mas ainda haviam outros três, e o segundo estava quase em cima de mim.
Nem tive tempo de parar, aproveitei o meu corpo em movimento e girei mais uma vez, saindo da linha de ataque do segundo guarda. E depois do terceiro, e do quarto. Consegui pegar bastante distância, mas meu tornozelo estava doendo, e minha cabeça estava bastante zonza de tanto girar pelo jardim do Barão.
Mais uma pedra veio em direção à minha cabeça, só caí sentado e ela passou por cima de mim, acertando alguma coisa lá atrás, mas nem olhei para ver. Tinham cinco pessoas querendo me matar, não podia me distrair.
Dois assassinos vieram em minha direção. Mas para minha surpresa, mudaram rapidamente de percurso, me encurralando pelos lados. Os outros dois vinham logo atrás, pelo ponto cego criado pelos primeiros, e por cima um bloco de pedra do mesmo tamanho dos anteriores tentava me esmagar.
Eu estava totalmente cercado. Só que não…
O que tornava tudo tão chato era lutar a noite e em um lugar mal iluminado. Talvez fosse por isso que Anne se mantinha mais distante. Quanto aos assassinos, é óbvio que tinham algum treinamento para situações noturnas. Mas eu também tinha.
Aproveitei a escuridão e lancei mais da névoa negra do Rancor, deixando tudo ainda mais escuro, tudo que podia ser visto eram apenas silhuetas. Então criei também uma armadura completa exatamente onde eu estava, ao passo que me atirei no chão e rolei pela grama.
A pedra gigante atingiu a armadura, que se desfez. Os assassinos se aproximaram para atestar a minha morte, mas Anne manteve a distância. A névoa parecia ser poeira levantada pela pedra ao, teoricamente, me esmagar. Um erro.
Duas lanças de Rancor surgiram por trás, atravessando os dois assassinos que agora estavam de costas para mim. Não tiveram tempo para gritar, e nem eu para respirar. Antes que os dois caíssem, corri em direção a Anne.
Foi muito gratificante a expressão de surpresa dela ao me ver saindo das sombras a poucos metros de onde ela estava, com uma espada em cada mão e um sorriso de vitória. Eu não precisava matar os outros assassinos, apenas quem os contratou.
Então um grito de angústia ecoou pelo jardim.
Não era o que eu esperava ouvir. Aquilo foi de congelar os ossos e parar o coração, uma voz aguda e triste a ponto de fazer até os dois assassinos que sobraram pararem de vir atrás de mim para ver o que era.
Iffy, a filha do Barão. Ela estava assistindo a cena de quase execução de Anne pelo buraco na parede. Foi ela quem gritou para que eu parasse, e pelo visto funcionou.
— Está resolvido! — Iffy passou com dificuldade pelo buraco na parede enquanto falava — Eu mandei meu mordomo pessoal soltar os escravos da mansão e indicar uma rota de fuga segura. Agora, por favor, não a mate!
Minha mão tremeu. Senti a ponta da espada tocar o queixo de Anne. Droga, eu estava nervoso agora. Se matasse a heroína, estaria fazendo mal a alguém que poderia estar me ajudando. Mas se fosse mentira da garota ali na minha frente, eu estaria arriscando pôr tudo a perder.
Por isso política é tão complicada.
É bem mais fácil, simplesmente, duas pessoas lutarem até a morte e quem vencer decide o que deve ser feito. Mas as pessoas preferem complicar e por um monte de detalhezinhos chatos que exigem que a gente pense demais antes de tomar qualquer decisão importante.
— Capturem os escravos fugitivos! — Anne ordenou aos dois assassinos — Se precisar, matem eles…
Oh! Isso me surpreendeu. Ela acabou de confirmar que as palavras de Iffy eram verdadeiras? Ótimo, menos coisa para eu pensar.
Deixei a heroína trêmula e de calças molhadas sentada no chão do jardim. Tinham dois problemas que eu precisava lidar entes dela. Se eu estava ali apenas para garantir que meus parceiros teriam tempo para fugir, não adiantaria manter ela enquanto dois assassinos iam atrás dos escravos.
Mas eu estava longe. Eles já estavam quase sumindo na penumbra da noite. Para tentar atrasar os dois, fiz uma espada longa com duas pontas e um cabo no meio surgir girando ao meu lado, e arremessei.
A ideia era apenas assustar eles enquanto me aproximava. Mas… na escuridão da noite, um som de baque seco foi ouvido, e um corpo caiu. Eu nem tinha mirado, e o assassino esquivou para o lado errado. Foi por acaso, mas o matei.
É claro que eles não precisavam saber que não foi intencional.
— Vai se render ou prefere morrer também? — Eu perguntei para o último dos assassinos que ainda estava vivo.
Depois dei uma olhadinha para Anne e sorri, tenho quase certeza que ela se molhou de novo. O assassino restante finalmente disse algo, coisa rara para pessoas daquele ramo de trabalho:
— V-você… é um monstro?