Volume 2

Capítulo 171: Convívio Amoroso; Os Ensinamentos de Qin Xa

 

No dia seguinte após a torta ser comida, habitando naquele mundo cujo sol não se movia — Qin Xa estava sentada à mesa que havia no jardim, lendo um dos livros que sua mãe fez surgir nesse mundo.

Estranhamente não era um livro da Terra, mas sim um livro desse mundo que falava sobre as lendas de uma região que Qin Xa não conhecia.

Pluma da Terra era o título da obra, e nesse momento ela estava lendo sobre uma entidade conhecida como Morador de Barro.

Era uma criatura aterradora que ninguém sabia a origem, mesmo quando ela vagava por aquelas terras há mais de 8 mil anos. Foi tempo o suficiente para surgir coisas igualmente medonhas, e muito piores, mas que foram derrotadas — enquanto o Morador de Barro continuava existindo.

As descrições diziam que a criatura era um inseto, meio orgânico meio espírito. Magro como um esqueleto seco e grande o suficiente para causar terror numa cidade inteira, mesmo quando estava a mais de 50 quilômetros de distância. 

O que não era um número muito exato, reclamou Qin Xa achando que esse autor não gostava de calcular o tamanho das coisas. Algo desse tamanho deveria ter pelo menos uns 10 quilômetros.

— Faz sentido ele causar medo. Algo desse tamanho é realmente bizarro. 

Ela nunca viu algo vivo remotamente próximo desse tamanho, mas se criaturas com 10 metros já eram amedrontadoras, algo quilométrico deveria ser poderoso demais. 

Deve ser por isso que o autor não o descreveu bem. Ele não conseguia, mesmo que quisesse. Para protegê-lo, o mundo impedia sua mente de vislumbrar aquela coisa.

O Morador de Barro surgia no horizonte como a sombra da morte, e antes que percebessem ele já estava sobre seu alvo. Ninguém sabia como que algo daquele tamanho se escondia tão bem, como se fugisse dos olhos e sentidos de todos. Para algo desse porte ter um poder tão furtivo era no mínimo estranho. 

Mas seu aspecto aterrorizante não era a capacidade de escapar por entre a percepção das pessoas — na verdade isso era fútil comparado ao seu verdadeiro terror.

O Morador de Barro era temido principalmente pelo seu poder irracional de: transformar toda criatura viva que percebia ele, dentro de um raio de 1000 metros, em barro.

Não era olhar. Não era sentir. Era perceber. 

Apenas imaginar que ele estava perto — quando ele de fato estava — já fazia com que seu poder funcionasse com uma força assombrosa. Não havia escapatória e quem o percebeu foi transformado numa escultura.

Qin Xa franziu a testa olhando para essa característica. 

De acordo com o livro a criatura não exalava nenhuma aura ou fazia qualquer movimento. Ela apenas passava e transformava os seres vivos em lama seca. Depois, ia embora com a mesma indiferença que chegou. 

Ninguém nunca a viu comendo nada, e nunca viu ela parar para descansar. E quem tentava perseguir ela usando o Sentido Espiritual perdia a criatura de vista no mesmo momento em que ela tocava a terra.

Outros tiveram o azar de sondá-la e serem repentinamente teleportados para o lado dela. Eles se transformavam em barro e morriam imediatamente. 

Durante os 8 mil anos que se passou desde sua chegada, nunca houve ninguém e nada que conseguiu voltar do barro.

...

"Que bizarro." Ela pensou, vendo a porta da casa se abrir e de lá de dentro sair sua mãe, vestindo um longo vestido preto, justo na cintura e com alças finas que deixavam seus ombros a mostra.

Segurava outro livro, e caminhou pelo caminho de pedras até ela para sentar-se a sua frente.

— Bom dia. — Qin Xa tomou café e passou para a próxima página. 

Katarina fez o mesmo movimento e respondeu: — Bom dia.

— Dormiu bem?

— Como nunca. Foi quase como se eu tivesse morrido de novo. — um sorriso surgiu no canto dos seus lábios ao dizer isso. Mas Qin Xa não pareceu gostar do comentário. 

— É meio impossível você morrer para um desvio de Qi com o corpo que tem. 

— Por quê? — recebendo um olhar confuso, todo o vasto, minúsculo, conhecimento de Qin Xa em alquimia, controle e manipulação de Qi tiveram que ser trazidos do fundo de sua mente.

— Desvios de Qi causam caos nas energias do seu corpo, e quanto mais fraco o corpo em comparação com o Qi, maiores são os estragos. Mas a mãe tem o corpo mortal mais resistente que eu já vi. O desvio de Qi poderia deixar sequelas, mas para matar só se tivesse uns 10 seguidos. Por falar nisso, o que a mãe sentiu?

Katarina levou a xícara aos lábios, e quando a colocou de volta a mesa, numa demora deliberada, respondeu com um pouco de incerteza: — Medo de que meu filho fosse tirado de mim por mais um erro meu.

Um certo silêncio se instaurou no local até Qin Xa, que não encarava sua mãe, passar para a próxima página do livro. 

Talvez quisesse comentar algo sobre aquelas palavras. Talvez não quisesse. Ninguém sabia.

— O descontrole emocional gera confito com as energias internas e externas, e como a mãe é iniciante e não conhece os fundamentos básicos do Qi, desvios não são estranhos. 

— Essa coisa tem fundamentos?

A pergunta de Katarina foi recebida por dois pares de olhos, tanto de Qin Xa quanto da garota que também se fazia presente. 

"Eu expliquei isso para você, *****..."

— Tem alguns. — Qin Xa sorriu, só que demorou alguns segundos para falar. — Mas o principal deles é: continue circulando seu Qi, independente do que esteja fazendo. Isso é um exercício que você aprende com o tempo, ajuda tanto a conhecer o próprio corpo como ajuda a conhecer que tipo de Dao combina mais com você. 

"Não é isso não. Essa coisa não serve para nada além de aprender a manipular suas próprias energias."

A garota balançou a cabeça, e Katarina franziu a testa. O que ela iria aprender quando as duas pessoas estavam discordando? Ela massageou a tempora com o polegar. 

— Ouvi dizer que isso só serve para aprender a manipular as energias...

— Mas é isso. — Qin Xa passou mais uma página. — O cultivo nada mais é que manipular as energias. Só de aprender a fazer isso 30 horas por dia, você consegue fazer todas as outras coisas com 99% mais facilidade. A Energia Mental precisa ser manipulada para criar essa técnica de tradução que a mãe usa, e se ninguém movesse o Qi, você não iria entender nada do que eu falo, porque eu não consigo falar português apesar de saber. Cada coisa que um cultivador faz tem como base cultivar as energias que estão dentro dele, então o mais básico na verdade é o essencial. Mas não deixa de ser o básico. 

Katarina encarou a garota no canto da mesa, que demonstrou uma expressão confusa. 

"É fácil falar quando você é um gênio."

Katarina repetiu essas mesmas palavras e Qin Xa esboçou um sorriso. 

— Mãe, esse é o básico. Imagine cantar uma música cheia de melodia quando você nunca treinou sua voz para criar essas melodias. Mas já que você é professora, vamos com um exemplo que você conhece: Como que uma criança vai ler um livro se ela nem mesmo aprendeu a reconhecer as letras? A minha genialidade só me ajudou a perceber isso e colocar em prática desde que eu comecei a cultivar... mais ou menos.

— Essa parece uma explicação muito porca para uma coisa que soa tão mística... — Qin Xa deu de ombros para esse comentário. 

— O que soa místico para a mãe, para outra pessoa soa como uma baboseira. E vice-versa. — tomou da xícara outra vez. — Todo o mistério ou clareza do mundo do cultivo depende da intenção de quem o faz. E eu não gosto muito das coisas que eu não entendo. Mas, no fim, tudo tem uma explicação. 

"*****, pense no que acabou de ouvir por alguns minutos. Não é bom apenas receber as respostas e não tentar compreender como elas vão mudar você."

...

Enquanto sua mãe afundou em pensamentos sobre o que acabou de ouvir, Qin Xa não a interrompeu e voltou a focar no Pluma da Terra.

Agora a obra falava sobre uma espada feita de fogo e raios, que surgiu naquelas terras junto com um ser conhecido como Senhor dos Demônios de Raios.

Era um nome incrivelmente único e diferente dos demais. Queria saber quem foi o gênio que pensou nesse nome! 

"Sério, Senhor dos Demônios de Raios? O Morador de Barro dá um pau nesse cara sem tirar as mãos das costas. A criatividade das pessoas morreu na hora de nomear a criatura?"

Assim que ele — o Senhor dos Demônios de Raios — apareceu naquele lugar, houve uma guerra tão intensa que os grandes imortais desapareceram do mundo um após o outro, sem ninguém conseguir entender como isso aconteceu. 

Dizia-se que o Senhor dos Demônios dos Raios possuía o poder de mandá-los para uma dimensão diferente, onde eles se perdiam e não conseguiam mais retornar. Foi uma explicação que permaneceu como verdade por muitos séculos. 

Até o dia em que um vidente tentou vislumbrar o futuro daquela guerra e o próprio Senhor dos Demônios de Raios surgiu na sua frente e tirou sua vida, e o fez desaparecer diante da força que aquele vidente pertencia. 

Aconteceu de uma forma tão imprevisível que ninguém mais conseguia acreditar na primeira explicação. 

A partir daquele dia, o ser incompreensível começou uma caçada brutal a todos os videntes e os matou sem piedade, fazendo com que a guerra atingisse um novo estágio. 

O que quer que fosse que os videntes tenham visto, aquela criatura não gostou nada. Isso gerou mais uma teoria, a de que ele na verdade estava se escondendo de um especialista aterrorizante que cultivava o Dao do Destino. Mas ninguém conseguiu confirmar isso... afinal, nenhum vidente sobreviveu para contar a verdadeira história. 

Parecia que o Senhor dos Demônios dos Raios era invencível com sua espada, mas um dia durante uma das batalhas ele próprio desapareceu, deixando apenas a espada para trás. 

"O que que há com essas criaturas que não seguem uma lógica?" Qin Xa não conseguia entender como que essas criaturas bizarras existiam nessas terras, mas ela nunca viu nenhuma remotamente parecida!

"Espera... um camaleão que come ataques não é uma coisa normal... além disso, ele era muito resistente e conseguia explodir o Mar de Qi dos outros. Mas eu consegui matar ele no final..."

Era uma criatura quase bizarra, porque diferente dessas do livro que ninguém entendia a fraqueza, Qin Xa conseguiu superar a resistência do camaleão com um ataque avassalador...

No fim, aquela espada caiu nas mãos de outra pessoa, e ela passou a se identificar como o Senhor dos Demônios de Raios. 

Ninguém entendeu como, afinal foi determinado que aquela espada não era uma criatura consciente, não tinha nenhum tipo de maldição, ou era um especialista que se transformou em uma arma.

Depois daquilo, a espada fugiu da batalha e ocasionalmente surgia para matar algum vidente. Ou então para fazer muitos desaparecerem sem deixar vestígios. 

Nunca houve uma explicação para suas ações ou capacidades, e até o dia em que o autor escreveu o livro, a espada permaneceu livre — apenas causando o caos no mundo.

A próxima criatura a ser descrita foi uma gota de sangue que caiu de um rasgo que surgiu no céu, durante um eclipse.

...

Após alguns minutos, a voz de sua mãe soou um pouco confusa.

— Se tudo tem uma explicação, então por que os nomes das pessoas é diferente da língua?

— Isso é porquê... — Qin Xa hesitou, sentiu que já havia ensinado muitas coisas a sua mãe, e isso poderia ser perigoso.

— Mãe. 

— O quê?

— Esse mundo pune aqueles que recebem demais sem fazer muito esforço. Então eu tirar todas as suas dúvidas só vai fazer com que a sua vida seja mais difícil. Por que não falamos de coisas mais pessoais? Enquanto você não aprender muito sobre o Dao, qualquer conversa está bem.

Katarina quis perguntar por que uma coisa dessas existia, mas o olhar da garota no canto da mesa matou suas dúvidas. 

Se Qin Xa disse que não era para fazer perguntas gerais, significava que também não era bom para ela responder a essas perguntas. 

— Certo... já que é assim, o que é que o seu nome significa, então? Qin Xa soa muito bem, mas é estranho de algum jeito. E não tem tradução. 

— Oh, meu nome representa um conceito que meu pai desse mundo pensou... Mas para deixar as coisas mais claras, meu verdadeiro nome não é Qin Xa. É Liu Qin Xa. 

Katarina encarou ela de um jeito estranho.

— Grandes diferenças. 

"Espera. Como assim esse não é o verdadeiro nome?!"

A garota do canto da mesa se inclinou para frente, deixando escapar todo seu espanto — que causou um franzir de sobrancelhas em Katarina — o que não deixou de ser percebido por Qin Xa.

Ora, o que seu verdadeiro nome poderia ter de tão importante para causar uma reação na pessoa invisível ao seu lado? Pena que ela não conseguia ver a reação genuína..

...

"Isso é impossível! O nome dela é Qin Xa!"

A garota, que apenas Katarina conseguia ver nesse momento, não estava bem. Na verdade ela de algum jeito ficou mais pálida do que já era...

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