Volume 2
Capítulo 163: Mãe
Longe de onde Ranyu Sheng se encontrava por alguns milhares de quilômetros, Qin Xa jazia caída…
Seus joelhos sentiram dor ao receber o peso do seu corpo naquele chão de pedra, mas essa dor não tinha importância frente ao turbilhão de emoções que assolava sua mente. Queria ela que aquela dor lhe acordasse dessa ilusão dolorosa!
Grandes lágrimas escorriam pelo seu rosto vermelho, caiam pelo seu queixo, sobre suas palmas, cuja força desvaneceu naquele momento. Seus soluços ecoaram pelo ambiente vazio e escuro, enquanto encarava a pessoa na sua frente. Aquela pessoa a encarou de volta… um e deu um passo à frente.
Era impossível! Não tinha como ela estar aqui!
Nunca que esse encontro deveria ser possível!
— Mãe...!
A pessoa, uma mulher cujo rosto não deveria ser descrito em termos de beleza como nada mais que “comum”, tinha um sorriso ambíguo em seus lábios. Mas nunca, em mundo nenhum, Qin Xa diria que essa aparência era feia! Essa era a mulher mais bela, deslumbrante e admirável que ela já teve o prazer e a honra de conhecer em toda a sua vida! Duas vidas!
Sua pele morena, desbotada pela idade, continha rugas — e ao lado de seus olhos castanhos havia pés de galinha. Abaixo deles, uma pinta preta trouxe memórias de todas as vezes em que essa mulher ficou frente ao espelho reclamando de como aquilo era feio. Mas que sempre se recusava a tirá-la de lá com cirurgia.
Cabelos curtos — grisalhos e lisos — batiam na altura do ombro. Sempre falou que pentear cabelo era coisa de quem não tinha o que fazer da vida. Um nó se formou na garganta de Qin Xa, por cima do que já havia lá.
Quase não conseguia respirar — sentiu-se fraca demais para isso — porque até mesmo as roupas eram como as de suas lembranças…
Nisso essa mulher sempre foi vaidosa, mas humilde. Uma blusa branca, apertada, ficou por dentro da cintura de uma saia longa de 2 camadas que cobria seus tornozelos.
Era igual… o mesmo modo de se vestir… delicado e respeitável, como sempre foi, desde que Qin Xa se conhecia por gente.
A mulher chegou na sua frente, pôs as mãos em seu rosto e estava para limpar suas lágrimas…
— Como? Não tem como você ser real...! — a mulher parou os movimentos, antes de seu sorriso se abrir um pouco mais.
— Vamos, pare de chorar. Por acaso algum bicho te mordeu? Desse jeito você vai me deixar triste também. Sabia que um rostinho tão lindo não deveria estar manchado de lágrimas? — era uma pergunta, mas também não era uma pergunta. Qin Xa estava sem reação. — A última vez que eu te vi chorando foi porque aqueles meninos haviam mexido com você na escola, e mesmo assim você não chorou tanto.
A mulher passou os dedos para enxugar as lágrimas que escorriam pelo rosto dela. A sensação quente de sua mão fez o coração de Qin Xa ficar ainda mais agitado.
"É tão quente como sempre foi antes."
— Mãe!! — Qin Xa não suportou seu impulso de tristeza e felicidade que surgiu com uma intensidade arrebatadora!
Ela abraçou a mulher na sua frente o mais forte que conseguiu. Apertou não querendo soltá-la nunca mais! Ela havia esquecido completamente de sua força física monstruosa, mas isso não pareceu fazer diferença alguma nesse lugar.
A mulher sorriu e retribuiu o abraço calorosamente, apoiando o queixo no ombro de Qin Xa, que fungou.
— Que menina desesperada! Pronto, pronto! A mãe está aqui pela minha filhinha…! Nossa, isso é muito esquisito de falar…
— Mãe. — Qin Xa sussurrou.
— O que foi?
— Mãe. — apertou os olhos, falando entre dentes.
— O que foi? — repetiu a mesma pergunta, como uma afronta as frases de uma palavra da garota.
— Mãe! — quase gritou.
— O que foi? Eu estou aqui agora, não precisa mais gritar por mim! O que é que meu tem?
— Mãe… mãe…
— Sua mãe está bem aqui…
Qin Xa continuou repetindo a mesma palavra, com medo de que não fosse receber uma resposta da próxima vez que chamasse.
— Mãe, me desculpa! Por favor, me perdoe por não ter... Desculpa! Desculpa...!!
— Não ter o que? Não tem nada porquê você pedir desculpas, pare de dizer isso.
Soltando o abraço, a mãe de Qin Xa voltou a secar as lágrimas da garota que olhava para baixo, apertando os punhos, se mordendo. Mas Qin Xa não parou de chorar…
— Se eu tivesse me esforçado mais, se eu tivesse trabalhado mais e tivesse feito mais investimentos, você teria sido salva!
— Você se esforçou mais do que o suficiente, meu amor... — seus dedos não pararam. — Querida… querido… não precisa se martirizar por nada. Você trabalhou até demais. Então não se culpe por nada, meu menino… menina… agora você é uma mulher, não é? Eu estou confusa… — Qin Xa não viu a luta na expressão da mulher para falar aquelas palavras.
— Não, eu ainda poderia ter feito mais, mãe! A cura poderia ter sido encontrada se eu tivesse trabalhado mais duro! Eu não fiz o suficiente para te salvar!
— Vamos, pare com isso. Você fez mais do que o suficiente por mim… Quando eu estava naquele hospital eu sempre ouvia as enfermeiras e médicos te elogiando. Todo dia você aparecia nas notícias com uma conquista nova, sempre mudando alguma coisa no mundo. Era como se você caminhasse sem medo na direção da riqueza… mas trabalhando tanto que ninguém entendia como eu estava naquela cama e não você.
Qin Xa franziu os lábios. Podia imaginar que a mulher diante de si disse isso apenas para consolar sua dor.
Mas essa dor não era nada!
Naquela época, seu eu homem poderia ter feito mais! Assim que abriu os lábios, sua mãe os selou com um dedo, começando afalar com voz solene.
— Eu realmente fiquei e estou muito feliz pelo que você fez. Mas o que aconteceu foi inevitável, mesmo que você tivesse todo o poder do mundo, eu ainda teria morrido, mais cedo ou mais tarde.
Qin Xa queria protestar contra essas palavras, mas foi impedida de falar pela mulher que subiu seu tom.
— Não tente dizer que você poderia mudar isso, você não podia. Você não era e nem é Deus… agora pare de chorar. Você sabe que eu…
— … não gosto de ver ninguém chorando. — Quantas vezes ela ouviu aquilo para ter memorizado essa frase? Qin Xa não sabia… mas em sua vida passada, ele era um chorão.
Mas com certeza não ouviu aquilo o suficiente…
Olhando o rosto de sua mãe, Qin Xa se esforçou para conter as lágrimas… mas elas se recusaram a parar de fluir. — Ahaa… eu não consigo!
Dando mais um abraço forte, ela se pôs a chorar. E a pessoa que foi vítima daquele abraço se calou, deixando a garota pôr tudo para fora, apenas dando tapinhas nas costas, enquanto ela mesma não resistiu…
Após muitos segundos com o local sendo preenchido por fungados, a mãe falou: — Você acha bonito fazer sua mãe chorar desse jeito?
— Hmm… não…
— Então vamos parar porque já está chato. Me solta. — ao dizer isso, tentou empurrar a garota.
— Não… — mas o abraço continuou tão firme quanto antes.
— Elan, me solte.
— Não. Eu não vou te soltar mais nunca, mãe!
A mulher mordeu os lábios. E beliscou as costelas de Qin Xa, fazendo-a estremecer e se contorcer. — Ai ai ai, para! — ela pulou, querendo se afastar do beliscão, e querendo abraçar sua mãe ao mesmo tempo.
— Então me solta. Você já abraçou o suficiente.
— Não… — o beliscão ficou mais forte, causando uma dor tremenda a Qin Xa, que já passou por coisas centenas de vezes piores do que isso…
Mas a dor dessa agressão era centenas de vezes pior do que as outras! Afinal... essa dor lhe trouxe memórias... memórias que há décadas estavam enterradas na sua mente.
Ela se torceu, esquecendo de chorar, quase soltando sua mãe, mordendo os lábios.
— Ahai!
— Vai soltar?
— …… não … se eu te soltar você vai desaparecer de novo! Eu não quero isso! — estava preparada para sentir aquela dor. E estava disposta a viver com isso para sempre. Se esse fosse o preço para estar junto da pessoa que ela mais amava, era um valor barato demais a se pagar.
Mas a dor não veio… pelo contrário, sentiu aquela mão aconchegante esfregar o local machucado.
— Você ainda é um idiota chorão… uma idiota chorona… — conseguiu ouvir um bufo de sorriso no seu pescoço. — Eu não vou desaparecer, Elan. Mas você deveria deixar o passado no passado, se eu não tivesse partido naquela época e me libertado do tormento de ficar naquele lugar morto, eu só ia ser um peso para você.
— Você nunca foi um peso!
— Eu era! — a mãe deu um beijo na bochecha de Qin Xa, segurou seu rosto e olhou nos seus olhos. — Eu deveria ter morrido mais de 3 anos antes… porque viver em cima de uma cama não é viver de verdade. Mesmo que eu não fosse um peso, já tinha passado da minha hora. Custa você aceitar que eu morri?
— Sim. Não era para isso ter acontecido…
— Deixe de ser chato…
— Não.
— Me deixe falar!
— Não.
— Eu vou te bater se você continuar com isso! — Qin Xa quase sorriu.
— Idiota. — sua mãe reclamou. — Eu sempre acreditei que tinha alguma coisa depois da morte, mas morrer dá medo. Só que, se eu nunca tivesse morrido, eu não saberia que depois de partir eu iria para um lugar tão maravilhoso. Nem tudo no mundo é tão ruim quanto parece.
— Lugar maravilhoso? — só agora Qin Xa se lembrou das palavras da mulher que sempre ficava sentada naquela poltrona.
Nem o céu nem o inferno existiam, e todos que morriam simplesmente renasceram limpos de suas ações e de quem foram...
Então, de que lugar maravilhoso sua mãe, aquela que foi sua mãe antes dela renascer, estava se referindo?
Isso não fazia sentido… era a palavra de uma existência equivalente a um deus, contra a da sua mãe… e até onde ela sabia, sua mãe não era capaz de fazer almas cruzarem a barreira dos universos, criar mundos ou saber de todas as coisas…
— Sim, era realmente lindo! Eu queria que você visse... Não, quanto mais longe de lá você estiver melhor... Mas é realmente lindo! — a senhora lutou para tentar encontrar uma forma de dizer o que estava intalado na garganta. Mas não conseguiu.
— O que eu faço? Como eu trato isso? Eu não quero que você morra apenas para ver aquilo, mas eu queria que você visse também...
Qin Xa sorriu vendo a confusão de sua mãe. "Espera, ela ainda é minha mãe não é? Ou isso é apenas uma alucinação minha?"
Um grande peso caiu sobre o coração dela quando pensou nisso. Não tinha como a mãe dela estar nesse lugar, elas já haviam se separado a vários anos atrás e isso não tinha mais volta!
A morte não tinha volta!
— Você é... real...? — não queria dizer essas palavras, elas saíram da boca de Qin Xa como um monte de agulhas rasgando sua garganta. Mas ela tinha que saber, sentia que precisava saber se isso era real ou não.
A mulher olhou para o rosto apreensivo de Qin Xa e sorriu gentilmente, em seus olhos, uma pitada de algo mais brilhou.
Como se acabasse de lembrar de algo, ela disse com uma voz doce: — Se eu sou real ou não, isso não importa, nada vai mudar o fato de que eu fui sua mãe. E ainda sou, não é?
Qin Xa travou por um momento. Os braços que envolviam a mulher se afrouxaram, enquanto ela mesma tentava secar as lágrimas que ameaçavam sair correndo de seus olhos e caírem no chão.
Essas palavras sem nenhum significado aparente, que deixava mais espaço para dúvidas do que para certezas, e a forma gentil de falar que sempre foi uma das maiores características de sua mãe…
Na sua vida passada essa coisa chegava a ser irritante, porquê em momentos importantes sua mãe só a forçava a encontrar suas próprias respostas, ou então a fazia duvidar das próprias certezas.
Mas ouvir aquilo, agora… foi como se a incerteza se tornasse a única certeza no universo. Se havia algo certo, era que sua mãe era uma fonte infinita de dúvidas até para as coisas mais naturais.
Não era à toa que ela se tornou professora e foi expulsa da escola por não dar aula “do jeito certo”.
— Sim, você é minha mãe! Desculpa perguntar isso…
Depois de algum tempo em um silêncio reconfortante, a mãe de Qin Xa falou: — Me disseram que o tempo que eu posso ficar com você aqui é indeterminado, então eu posso passar o resto da sua vida aqui com você.
Ao terminar de falar, ela acenou com a mão, fazendo o mundo mental de Qin Xa, um lugar cheio de escuridão, vazio e melancolia, sofrer uma mudança radical quando uma onda multicolorida de energia vazou de seus dedos!
A escuridão se afastou daquele lugar, afugentado por uma luz arrebatadora que caiu do céu, mostrando para Qin Xa um horizonte tão distante, que seus olhos sequer puderam compreender qual era o limite do quão longe aquelas terras se estendiam… mas era muito, muito longe. Tão longe que o céu e a terra se fundiram em um só, e do distante incompreensível veio uma onda de verde que inundou os 4 cantos do mundo!
Em 1 segundo a terra árida se transformou num campo cheio de mato, flores, e nuvens brancas no céu, que até mesmo tinha um sol.
— Como?? Você...! — Qin Xa ficou alarmada com isso, esqueceu como formular as palavras.
Encarou sua mãe com confusão estampada no olhar…
E a mulher sorriu, enquanto do chão subia uma árvore gigante, cujo caule ficou rosa, as folhas formaram um cone, e a ponta se curvou para frente, fazendo com que uma coisa brilhante surgisse em frente a porta cor de chocolate que apareceu… na casca da árvore, janelas redondas mostraram que por dentro havia na verdade a decoração de uma casa.
Surgiu uma estrada bonita de pedras e uma cerca de madeira rosa, junto com um lago de água azul, onde peixes nadavam calmamente, como se estivessem naquele lugar desde os primórdios do universo.
Era uma casa… no oco de uma árvore. Uma casa que pareceu sair diretamente do desenho de uma criança do fundamental…
— Hufn-hufnm — bufou, esfufando o peito. — esse é um dos privilégios de estar naquele lugar. Venha, vamos conversar um pouco como a gente fazia antigamente.
A mãe de Qin Xa puxou ela para uma pequena mesa que estava disposta no centro do jardim ao lado da casa.
Qin Xa demorou a compreender as mudanças. Teve a estranha sensação de que sua mãe estava com pressa...
Sobre a mesa branca, duas xícaras fumegantes exalavam o cheiro delicioso do líquido preto que havia dentro
— Café! Eu achei que isso não existisse nesse mundo! — Qin Xa exclamou.
— Nesse mundo tudo existe, afinal aqui é um lugar que está no centro de tudo, ligando milhões de mundos diferentes. Eu acho que é isso, foi um pouco difícil de aprender tudo com uma explicação só, as informações simplesmente não entravam. Mas agora eu entendo mais ou menos o que elas queriam dizer.
A mãe de Qin Xa sorriu ao ver seu choque.
Mas então… começando pelo começo, me diga: Por que é que o meu filho, que era um homem até debaixo d'água, está parecendo uma garota tão bonita?
O canto do lábio de Qin Xa se contraiu. “Mãe, talvez eu nunca tenha sido tão homem assim… É isso. Chegou a hora de sair do armário!”
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