Dualidade Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 2 – Arco 5

Capítulo 64: O último Samurai

Foi após um dia de festas que pude enfim relaxar. Ainda que não fosse muito desse tipo de evento, pude ver o esforço que Alamar colocou nas preparações. 

O problema era outro. 

Aparentemente, estava preparado para me testar de toda a forma possível. Em meio a uma dança com uma nobre, percebi a forma como os políticos de Jabra me olhavam. 

Todos pareciam interessados no que o Portador de Davi faria. Todos interessados em ver o quão longe a maçã caiu da macieira. E, o mais importante, todos queriam um gostinho dessa maçã.

Por isso senti um alívio imediato quando um dos nobres me convidou para um outro evento, longe da mansão. Por mais que soubesse que não devia, que seria uma grosseria com Alamar, não me importava mais.

Só queria distância deste local. Queria estar o mais longe possível dali, onde ninguém me testaria. Aparentemente, o jovem nobre que me convidou parecia me conhecer de algum lugar, só que não conseguia lembrar onde nos vimos pela primeira vez.

Bem, se me esqueci é porque não deve ser importante.

Nisso, o grupo de jovens me levou para um lugar em específico, um bem famoso em Jabra, cujo renome era ouvido em todo o mundo. Um lugar cheio de atrações caras, cujo ingresso faria meu pobre bolso chorar.

O coliseu de Jabralam.

Quando entramos, fomos direto para a seção VIP. Vários ali eram como eles, nobres que não precisaram trabalhar um dia nas suas vidas. Senti uma pontada de inveja com a naturalidade que eram servidos. 

A meio ano atrás, eu seria o garçom que os servia. 

Minha vida realmente mudou da água pro vinho. E é tudo graças ao diário que carrego. Senti-o pulsar no bolso de meu sobretudo, aguardando ansiosamente o retorno da minha energia. 

Suspirei e olhei para baixo. A luta de hoje era uma entre o campeão do coliseu e um desafiante promissor, e, pelo que vi, muitos estavam interessados no que aconteceria. 

— O primeiro a sair virá do canto esquerdo. — Ouvi o nobre falar, do meu lado, tentando ser ouvido naquela multidão. — Ele é o desafiante. O da direita é o campeão.

Naquele momento, as luzes focaram-se todas num único ponto. Ouvi, ao longe, o comentarista agitando a plateia, falando das conquistas do jovem desafiante. 

No instante seguinte, passos foram ouvidos. Engoli em seco, esperando ver a figura imponente de um grande guerreiro, até que…

Senti meu queixo cair e, ainda que fosse impossível, consegui ouvir a risada incrédula do espectro, como se aquilo fosse uma piada. 

— Eu lhes apresento o desafiante… Tatsumoto Benkei! O autodeclarado último Samurai! 

Ele era… tão… 

— Que rolha de poço — disse um dos nobres, rindo conforme o desafiante ia até a arena.

Era como ele disse. Benkei era gordo, obeso até. A armadura samurai que vestia fazia pouco para esconder esse fato. A máscara no rosto também era ridícula, sendo feita de metal negro. Além de ter uma espada que parecia ser tão longa quanto era fina.

Isso é uma piada? 

Não… é tudo menos uma piada. Da forma como foi anunciado, isso será uma luta até a morte. Sem dúvidas que esse gordinho vai morrer… Tenho que fazer algo. Tenho que impedir isso. 

Quando estava para me levantar, o narrador começou a falar novamente. 

— Agora, para o nosso amado campeão. Ele, que vem de uma tribo estranha, ao extremo sul de Vislo. Um lobo em pele de cordeiro, um monstro entre os monstros! Eu lhes apresento, o nosso tão amado matador de Ursos! Gull!

Os passos foram ouvidos e a pressão que senti me pôs de volta na cadeira. 

Era um homem de mais de dois metros, musculoso, com veias pulsando num vermelho claro, quase laranja. Engoli em seco enquanto me beliscava para ter certeza que aquilo não era um sonho.

O que caralhos um ogro está fazendo aqui?

Olhei ao redor e vi como as pessoas ao redor pareciam interessadas na luta, como se fosse um espetáculo. Isso… isso não…

Vai ser um banho de sangue. 

Engoli em seco, acalmando meus nervos. Não posso fazer nada daqui. Não tenho minha conexão, não posso só pular lá e parar isso… Não sem arriscar ainda mais que as pessoas descubram a existência dos Nors.

— Agora… — Começou a contagem regressiva e me preparei para o que viria, pedindo desculpas mentalmente ao gordinho. — Comecem.

O ogro pôs-se numa pose de luta, olhando para o samurai, que meramente abaixou a cabeça um pouco, levantou-a e pôs a mão no cabo da espada.

Engoli em seco conforme se encaravam, até que o Ogro disparou com um soco pronto. Quando estava perto o suficiente, o Samurai fez algo que achei impossível para um humano normal.

Invés de desviar ou bloquear, fez o movimento mais acertado para aquela situação. Puxando a espada, usou da ponta do cabo para defletir o soco e, aproveitando do enorme tamanho do Nor, deu um rápido corte no peito, completando com um passo para a esquerda.

Engoli em seco quando percebi o que acabara de acontecer. Benkei não conseguiria desviar por completo e tentar bloquear o ataque quebraria o metal da espada na melhor das hipóteses. 

O que ele fez foi, possivelmente, a única saída que resultava em algo positivo. A habilidade dele com a espada também era tamanha que conseguiu defletir e cortar o oponente num único movimento.

O Ogro pulou para fora da luz, escondendo-se na escuridão. Ele estava preocupado com a possibilidade dos humanos descobrirem sua identidade?

O sangue de um Ogro é quente. Ele ferve numa temperatura absurda, quase como o magma derretido, por isso que seria óbvio para qualquer espectador astuto que ele não era humano.

Notei que, mesmo depois de alguns segundos, não saiu da escuridão e engoli em seco. O Samurai estava vigilante, esperando o próximo movimento da criatura.

— Anda logo! Eu paguei para ver sangue!

— Vai, gordinho! Persegue ele!

—  Quero meu dinheiro de volta!

Essa gente… Olhei para o povo abaixo de mim com irritação. Como podem agir assim numa situação dessas? Acaso não sabem o que está acontecendo? 

Não… eles sabem sim. Estão apenas curtindo o momento. Como abutres vendo um rato lutar contra um leão. 

Que piada… 

Antes que pudesse falar qualquer coisa, uma mão saiu de trás do gordo e, quando estava para agarrar a cabeça dele, o mesmo, mostrando reflexos super-humanos, pulou fora e, com um giro, cortou um dos dedos da mão fora.

O urro da besta foi ouvido e engoli em seco conforme o sangue caia. O Samurai voltou à posição inicial, aguardando que saísse da escuridão.

O que raios é você? Não tem como um humano normal chegar nesse nível sem uma conexão com o plano Astral. 

Uma memória veio e tremi, olhando para os lados.

É… mesmo sem um único grama de conexão, aquele homem ainda me derrotou como se fosse a coisa mais fácil do mundo. 

Talvez haja mais neles do que eu pensei. 

O samurai falou algo e as luzes ficaram mais intensas, permitindo que todos ali vissem o estado do campeão. 

Segurava o cotoco da mão, cuidando o machucado com todo o cuidado do mundo. Ele é bem sensível para um Nor. Um Ogro normal tem nervos mais fortes que uma pessoa. Sem dúvidas um ataque desses não o reduziria a esse estado. 

Talvez seja um mestiço?

Com um rugido de dor, tentou vários ataques, todos defletidos pela espada. O mais impressionante era que Benkei não recuava. Mesmo com a força clara dos ataques, não movia um único passo para trás.

Era quase como uma montanha. Não cairia, não sairia do lugar por influência externa. Apenas continuaria ali até que decidisse enfim agir. 

O Ogro percebeu aquilo e pulou para trás. Usando a mão boa, enfiou-a no chão e pegou um enorme pedaço dele. Usando de ambas, esmagou a pedra, criando vários pedregulhos. 

Acho que é isso. Mesmo que fosse forte, não conseguiria lidar com algo daquele tipo. Sem chance. 

Atirou uma pedra no samurai. Foi tão rápido que nem consegui ver aquilo. Era quase como uma bala… Contudo, como se fosse a coisa mais simples do mundo, foi defletida pela espada.

Seguido disso, vários outros pedaços foram lançados. Era semelhante a uma metralhadora usada na guerra do Lago Enfari. 

Tiros rápidos, feita para abrir buracos no corpo do oponente. Era um poder avassalador, que deveria derrotar qualquer um…

Nenhum deles o atingiu. 

— Isso… é impossível — falei, incapaz de pensar em qualquer outra coisa. O jovem nobre olhou para mim, com um sorriso enquanto colocava a mão sobre meu ombro. 

— Aí que se engana, meu caro. Os homens de Jabra são fortes, feitos exclusivamente para a guerra… Vários estrangeiros vem para o coliseu, buscando uma chance de testar nossa força. Aqui, temos os melhores guerreiros. Mesmo assim… 

Olhou para o gordo com um olhar de puro desgosto, quase como se seu enorme orgulho fosse ferido. 

— Mesmo que sejamos conhecidos por nossa força, esse homem veio a nossa cidade e fez o impossível. Cansado e empobrecido, ele se vendeu para o coliseu, para conseguir comer algumas migalhas. E, um dia depois, ele lutou. E lutou. Até que, em seis meses, não havia mais ninguém no coliseu que fosse capaz de o desafiar. 

Olhou para as pessoas abaixo, desinteressado. Seguido disso, sua voz veio com um tom ainda mais venenoso que antes.

— Essa plebe é composta, em sua maioria, por estrangeiros. Pessoas que desconhecem nossa força e vieram aqui para ver o espetáculo que aquele que nos desafiou proporciona. Mesmo sem querer, Tatsumoto zomba do nosso orgulho. Ainda assim… estou aliviado. Finalmente, alguém derrotará aquela aberração que colocaram no coliseu. 

Assenti, entendendo o que queria dizer. Aparentemente não era o único que sabia da natureza do campeão. Mais relaxado, aceitei o drinque que o nobre me ofereceu, olhando na direção de Benkei. 

Estava interessado em ver o que aconteceria a seguir.

As balas acabaram e o campeão estava para pegar mais um pouco do chão quando aquele cara se moveu. 

Seu tamanho enganava. Imaginei que pudesse ser um lutador que se focava na defesa, mas aquela velocidade mostrava que seu estilo cobria ambas as partes. Era quase tão rápido quanto eu, quando me cobria da capa Telecinética.

Com um movimento de saque, o braço direito do Nor saiu voando, derramando sangue para todo o lado. O grito inumano daquela coisa me fez dar um passo para trás. 

Fechei a mão, tentando em vão achar algo dentro de mim que me desse coragem, achar algum vestígio da minha conexão. 

Nada. 

O monstro começou a crescer e engoli em seco. Agora danou-se… 

Benkei ficou em choque, olhando incrédulo para a forma como os músculos se expandiram Senti uma pontada de desespero, já esperando o que viria, quando algo interrompeu a luta.

Um jovem, que não devia ter mais de quatorze anos, de fios da mesma cor de Alamar e olhos tão afiados quanto. Colocando a mão no peito do monstro, uma enorme onda de choque enviou-o para trás. 

Tudo isso em apenas dois segundos. Engoli em seco, olhando para baixo e vendo a maioria da população murmurando, olhando surpresa para o acontecimento. 

Isso é ruim, desse jeito… 

— Atenção, todos. — A voz do apresentador soou, um tremor bem disfarçado ali. — O evento foi cancelado… mas não se preocupem. Podem pegar o reembolso na sala 3-C. 

Suspirei, indo em direção a saída e pronto para pegar o que paguei, quando o jovem nobre me puxou para perto dele.

— Aonde vai?

— Eles estão distribuindo o reembolso…

— Idiota! Aquilo é para as massas não descobrirem o que está acontecendo. Olhe! — Apontou para lá em baixo e reparei que não havia uma única pessoa que parecesse levemente importante ou diferente entre a multidão. 

Por mais que soubesse o quão bom isso era, não podia deixar de sentir um pouco de tristeza.

Não conseguiria reganhar o dinheiro que coloquei ali. 

Dessa forma, começamos a andar em direção a saída quando senti uma forte tontura. Tentei me segurar numa parede enquanto sentia o diário no meu peito tentar eliminar algo dentro de mim.

— Está tudo bem?

— Sim, só estou um pouco… — Parei de falar quando vi o rosto dele, com um sorriso nem um pouco verdadeiro. Seguido disso, senti uma agulha perfurar meu braço, quase que instantaneamente. 

Nisso, perdi a consciência.


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