Dualidade Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 1 – Arco 4

Capítulo 49: Emboscada, parte 2: O Dhampir

As explosões continuaram soando no prédio, as paredes rachando, com o calor afetando todos ali. Não que isso me importasse, visto que tinha algo mais problemático a resolver.

O que foi que disse?

Entregue sua arma e seu distintivo, capitão Edwars — repetiu o soldado, uma multidão atrás dele, prontos para me deter. Armas estavam apontadas para mim e Shiki, que olhava toda a situação com medo. Deixamos Lewnard na área da polícia comum e passamos para a parte secreta, logo, todos ali eram a elite da elite.

Isso não vai me parar.

De quem são essas ordens? — perguntei, olhando fundo nos olhos do soldado e aguardando a resposta. Estava claro que alguns estavam incomodados ali, mas a maioria parecia feliz, até mesmo ansiosa para o que viria. — Lhe fiz uma pergunta.

Com todo o respeito, senhor, não está em posição de fazer exigências — disse, sinalizando para que os recrutas atrás dele preparassem as armas. Nisso, peguei Shiki pela mão e apareci na divisa entre o lado secreto e o lado normal, abrindo a porta e jogando-o para lá, seguindo logo em seguida.

Continuei teleportando, indo até o lado de fora, usando minhas costas para quebrar a janela. Ignorei a coceira na pele e olhei para frente, estreitando os olhos.

Isso é sério?

Ali, três membros do esquadrão da meia-noite me olhavam, todos cobrindo as saídas. Junto deles havia uma quantidade considerável de Nors, revelada pela luz da lua. Enquanto a maioria ali não seria problema, fitei um em específico, que tinha um sorriso no rosto. Ainda que os olhos estivesse fechados, pude sentir a visão dele em nós dois.

Deveria ter desistido quando teve a chance, Edwars! — Jim Razer olhava para mim como uma criança que acordou na manhã de natal, um sorriso endiabrado no rosto. — Pouparia a humilhação e surra.

Suspirei, largando Shiki enquanto olhava para os outros dois Híbridos ao lado dele. Dryas tinha um olhar de aceitação enquanto Hills parecia entendiado.

Dentre aqueles três, Alicos Dryas era o mais poderoso. Contudo, o desgraçado do Razer também não era fraco, sendo o mais determinado do grupo. O maior problema, no entanto, seria Chester Hills. Ele era o médico legista do esquadrão, assim como cientista forense e responsável pelo inventário.

Nunca esperei que fosse do tipo idealista, Hills — gritei, tentando ganhar tempo para pensar num plano. — Nem você, nem Dryas. Achei que eram mais espertos.

Não me faça rir. — Pela primeira vez naquela luta ele estreitou os olhos, irritado. A névoa de Juvicent ao redor começou a assumir uma coloração verde escura, contrastando com pele anêmica e o jaleco branco. — Não sou um idealista, não tenho nenhum interesse nas propostas do Moedor. Só me interesso pela minha pesquisa.

E? Como exatamente ele te ajudaria com isso?

Me dando cobaias. — Um silêncio desagradável permeou a área, todos entendiam bem o que ele queria dizer, mas nenhum tinha coragem de fazer algo a respeito. — Há anos minha pesquisa está parada. Sempre pedi para você que me desse os presos ou os Nors, mas nunca me deu retorno. Considere isso a chance de se redimir por atrapalhar minha ciência.

Claro. Claro que seria algo do tipo. Alguém como ele só se importa com o avanço do próprio trabalho! Antes que pudesse responder, desviei de uma raiz. Olhei para frente com irritação.

Aquele ataque teria me empalado.

Chega de conversa afiada. — Várias vinhas saíram da pele de Dryas, todas prontas para me matar no primeiro descuido. — Edwars, está preso sob acusação de conspiração e traição. Tudo o que disser poderá e será usado contra você em tribunal.

Sem tempo para pensar, tive de pular para o lado, onde precisei defletir um soco de Razer com a bainha e, num único movimento, fiquei nas costas dele e cortei-as.

Merda, foi muito raso. Bloqueei um chute e usei da força do golpe para me afastar e então cortei as vinhas que foram contra mim enquanto desviava das raízes.

Enfrente-me, Edwars! — Antes que pudesse me perseguir, uma labareda azul explodiu suas costas, fazendo-o urrar de dor. Seguido disso, um soco coberto de chamas azuis atacou as costelas do desgraçado.

Sabe que, se ficar no caminho da nossa investigação, será preso, não é? — Dryas olhava para Shiki, que jogou o cigarro fora e pisou nos restos.

Sinto muito, mas Edwars é meu amigo… Além disso, não acho que seja culpado. — As mãos acenderam chamas azuis, que iluminaram o rosto do bruxo. — Um pirralho que eu conheço não iria querer ver um inocente sendo preso, sabe?

Bloqueou outro soco com os braços, sendo lançado para longe com facilidade. Razer o seguiu, tendo que bloquear chamas azuis com suas mãos escamadas. Não pude prestar atenção, visto que várias vinhas vieram atrás de mim.

Continuei desviando enquanto tentava achar uma janela para teleportar e atacar. Seguido disso, alguns Nors avançaram contra mim, enquanto balas eram disparadas do lado de dentro.

Uma delas perfurou meu ombro, outra foi meu fígado.

Certo, é assim que querem brincar então…

Guardei a espada na bainha e entrei na postura de Battoujutsu que estava tão acostumado, permitindo que minha sede de sangue preenchesse o local, afundando todos ali.

Merda, não deem tempo para ele… — Ouvi a voz de Dryas diminuir de volume conforme meu foco absoluto aumentava. Há um total de cem inimigos aqui. Cinquenta e um são Nors, quarenta e seis são policiais, três são mestiços.

Pescoço, rins, estômago, diafragma, coxas, têmpora, costelas, e tantos outros. O corpo, seja de um humano ou de um nor, tem tantos pontos fracos que chega a ser patético. Minha espada acertou um de cada inimigo ali, eliminando com facilidade os que se aproximavam enquanto era bloqueada pelas escamas, exoesqueleto e plantas dos mais problemáticos.

Todos ficaram chocados quando o corpo de mais da metade dos adversários caiu no chão, cada um fatiado além da conta.

Não fiquem surpresos — falei, olhando fundo nos olhos de Chester e Alicos enquanto limpava minha espada com um mero movimento da mão. — Deviam saber aonde estavam se metendo quando decidiram me ter como inimigo. — Direcionei meu olhar para Dryas, que tinha um corte profundo nos braços. — Da próxima vez, não vou errar.

Quem diria… não esperava que fosse encontrar um mestiço tão forte assim. Não depois de ver o que o lobinho da rainha do oeste pode fazer — disse o líder dos Nors, totalmente despreocupado. Olhei fundo nos olhos dele enquanto preparava minha espada. — Estamos em tempos realmente curiosos, com tantas irregularidades aparecendo uma após a outra.

Ele foi o único do grupo dele que bloqueou meu ataque. Além disso, também foi rápido o suficiente para me pegar no contra-ataque… Que situação problemática. Tenho dois oponentes mais fortes que eu aqui, um deles tem, provavelmente, tanta experiência de combate quanto eu.

Irregularidades? — Posicionei-me de forma a esconder o corte nas costelas que fez enquanto tentava ganhar mais tempo. — Fala como se existissem outros além de mim e Dryas…

Mas há — respondeu, caminhando para frente enquanto flexionava os punhos. — Meu mestre tem pego vários mestiços, cada um deles ficando tão forte quanto um centenário. Bem, mesmo eu, um mero decadário, já tive um crescimento absurdo nos últimos anos.

Ele é um decadário? Não pode ser… Aquelas lâminas nos braços dele surgiram rápido demais! Além disso, a carapuça é forte o suficiente para aguentar a pressão do meu golpe…

E pode ir tirando o cavalinho da chuva. Vocês dois não são os mestiços mais fortes que encontrei hoje — comentou, olhando em direção da montanha nevoenta. — Dentre os vários membros da colmeia da rainha do oeste, há um Licantropo. Ele é muito mais forte que eu… acho que é correto dizer que tem três vezes a minha força.

Três vezes? Impossível. Nenhum mestiço conseguiria chegar a um nível desses… não com o limite em nossos corpos.

Não fique preocupado — continuou, com duas lâminas de foice rasgando a carne dos braços e brilhando de forma perigosa. — Não vai sobreviver ao dia de hoje, de qualquer forma. — Nisso, sumiu do meu campo de visão e, no instante seguinte, pulei para frente e me virei, bloqueando o corte que quase me decapitou.

O golpe me jogou para longe, onde várias raízes pontiagudas me aguardavam. Girei o eixo do corpo e teleportei na direção de Dryas, com um corte já pronto.

Ele pulou para trás, evitando um corte profundo. Contudo, foi o suficiente para derramar sangue do peito. Seguido disso, teleportei para trás dele e, então para longe, evitando várias raízes.

Pus minha espada a frente, o metal chocando-se com o outro, que já preparava outro golpe. Novamente, tive de teleportar para longe enquanto entrava na postura de Battoujutsu e desviava das várias vinhas e raízes.

Mordi o lábio enquanto pensava. Nenhum dos dois está me dando brecha para atacar o outro… se continuar dessa forma, vou morrer.

Olhando para Shiki de relance, vi que estava tendo uma luta equilibrada contra Razer, algo impressionante para um humano. As chamas estavam mais controladas e o corpo mais forte

Saquei a espada, tentando decapitar o Nor na minha frente. Bloqueando, ele me deu um chute forte no estômago, mandando-me para longe.

Tossi um pouco e desviei de mais vinhas, sempre cortando as raízes com a espada. Teleportei para cima e então para baixo, cortando a barreira de vinhas com um único corte e derramando sangue do ombro de Dryas e, no momento seguinte, tentei tomar a cabeça dele, tendo que defletir várias raízes enquanto me afastava.

Usando minha habilidade, consegui esquivar de um corte e reapareci ao lado de Shiki.

Mais uma explosão ocorreu dentro do prédio, as paredes começavam a rachar e eu lembrei de quem ainda estava lá.

Merda! Não é hora de se preocupar com aquele idiota. Foque em si mesmo. Já tenho problemas que chega.

Olhei na direção dos dois enquanto pensava no que fazer, chegando a lugar nenhum.

Estou curioso. Mesmo que seus ex-colegas já tenham entrado nas suas formas verdadeiras, você ainda recusa a usar sua verdadeira força… Por quê? — perguntou, ficando mais relaxado enquanto abria levemente os olhos.

Senti o olhar de Shiki nas minhas costas como se quisesse dizer algo.

Memórias apareceram na minha mente, memórias da minha infância, em Corpist. Coisas que queria desesperadamente esquecer, coisas que me perseguiam mesmo agora.

Em especial, lembrei das vezes que cedi a minha natureza. É verdade que ganhei um enorme poder como resultado, mas o custo só aumentava.

Então, não vai falar nada? Continuará orgulhoso até o fim?

Senti a irritação crescer dentro de mim. Orgulho… é isso que aparenta? Coloquei a mão no cabo da espada enquanto meus olhos se perdiam em uma neblina.

A irritação deu lugar a raiva. De repente, não estava mais em Juvicent. Não estava mais em Anjus.

Como se num passe de mágica, voltei para aquele navio da expedição para Corpist, meus lábios cobertos do sangue da única pessoa que me amou de verdade, no mundo todo.

O gosto era bom. Divino, até. Eu queria provar isso de novo, queria satisfazer minha sede… mas não posso. Não é algo que deve ser feito.

Eu não… — A raiva deu lugar ao ódio e, como se possuído, avancei cegamente contra o Nor. — Eu não sou um monstro!

Os ataques estavam errantes, descoordenados. Sei disso, sei que esse merda ficou surpreso com o aumento na minha velocidade e força bruta, mas parecia ter mais facilidade em se defender do que antes. Seguido disso, senti o ar ser arrancado dos meus pulmões quando um corte for aberto no meu abdômen.

Depois disso, uma joelhada chocou contra minha testa, fazendo-me voar. Minhas forças começavam a me deixar, ainda que lentamente.

É… é isso?

Merda… Eu realmente queria… ter ido vê-la uma última vez.

Antes que perdesse a consciência, o prédio da polícia do décimo quinto distrito desmoronou.


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