Dualidade Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 1 – Arco 4

Capítulo 40: Retorno

Olhei fundo no espelho enquanto me preparava para ir até Grace. Já preparei a cura, já estava com tudo pronto. Só preciso dá-la para Grace.

Pelo que me disseram, fiquei umas duas semanas desacordado, mas não me sentia assim. Claro, fora a ocasional dor de cabeça, consegui fazer tudo que fazia antes com facilidade.

Tinha uma mudança, no entanto, que ainda não me acostumei.

— Onde você está, espectro? — Olhei no reflexo, procurando-o em algum lugar. É estranho… eu não gosto dele, mas não o ter por perto… é quase como se eu perdesse uma parte de mim…

— Está pronto, Lewnard Hollick? — Ouvi a voz do Edwars lá fora e suspirei. Lembre-se, viva a vida.

— Estou sim — falei, ajeitando a jaqueta de couro preta por cima da camisa branca. Este era algo que meu pai deixou para mim, para eu usar após meu décimo oitavo aniversário.

Mal dá para acreditar que já sou um adulto perante a lei. Tanto do Mundo Normal quanto do Plano Astral. Algumas coisas boas aconteceram nesse meio tempo.

Notei que meus poderes aumentaram bastante desde a última vez que eu usei eles. Não era só o controle, que cresceu num ritmo absurdo enquanto estava no Jardim. Também tinha toda a questão de que minha conexão estava mais… densa? Acho que essa é a palavra.ss

Só sei que sentia que podia puxar muito mais poder de lá, e sem perder um órgão no processo.

Sinto que posso fazer qualquer coisa.

— Então vamos.

Saímos do quarto, e então do hospital. Conforme caminhava, olhei para as ruas. A cidade estava mais ativa do que o normal, mas não pude deixar de notar algo.

Havia uma tensão presente, algo que não estava ali antes… Talvez seja só eu, que não caminho por aqui já tem algum tempo, mas parecia que algo aconteceria, e que o próprio ar estava apreensivo.

Senti uma pontada na têmpora e uma carranca se formou no meu rosto. Não, ele não tentaria nada a luz do dia… Não passa de um assassino sujo, não é?

A memória do Esper de antes, de como ele entregou aquelas mulheres, voltou. O Moedor foi mencionado ali…

O que raios está havendo na minha cidade?

O silêncio permeou entre nós dois e só percebi que chegamos na base quando já tínhamos passado da barreira.

Havia um feitiço que afastava todos que não sabiam da existência da Polícia Secreta dali, algo que veio a calhar para o pessoal daqui.

Aquele era o auge da escola de Ilusão, ao menos era isso que Shiki me disse. A habilidade de manipular a mente de outros de uma forma tão sútil era algo dificílimo de se fazer, ainda mais se for para criar um campo em volta de uma área como a de uma Base da Polícia Secreta, e o fato que não se dissipou ainda só mostra a genialidade do homem que fez isso.

Quando entramos, vi pessoas das mais diversas nacionalidades ali. Desde Anjulianos até Kairianos, aquele prédio reunia o melhor que Juvicent tinha a oferecer. Todos se viraram para nós dois, ou melhor, para mim.

Muitos ali deviam saber do meu Status como Portador, mas acho que ainda era estranho ver um civil aqui.

Edwars me guiou até o elevador e colocou as coordenadas, nos teleportando para lá imediatamente.

— Onde é isso? Num Iceberg? — Quando saímos, senti o enorme frio do ar e praguejei.

— Estamos no extremo norte do globo, no local mais frio e isolado possível — disse, respondendo minha dúvida. Estreitei os olhos e ouvi um suspiro vindo do mestiço. — Ordens do líder dos Hollick.

Guiou-me pelas paredes metálicas, ignorando os vários Nors que haviam ali. Todos eram como ratos num laboratório, alguns nem ao menos se mexiam de tanta dor que sentiam.

— O dono desta instalação é um Blazé, e um pesquisador importante — comentou, e senti meu sangue ferver. Se esse maldito tocou num fio de cabelo da Grace…

— Ajuda… — Um Nor se chocou contra a porta, seus olhos mostravam o quão desesperado estava. — Você… você é um Portador, né? Por favor… me mata…

Engoli em seco com aquilo. Nors eram seres que odiavam os Portadores, então, para um implorar pela minha ajuda…

Que situação de merda.

— Vamos.

— Certo…

Após andarmos mais um pouco, nos deparamos com uma enorme porta de ferro. Edwars a abriu como se não fosse nada, permitindo que visse o interior. Ali, Grace estava acorrentada, sua pele parecia porcelana e seus cabelos desgranhados mostravam o quão difícil foi para ela.

Aproximei-me dela enquanto olhava para as correntes. Estavam gastas, mas aguentaram bem. Ela me viu chegar e rosnou, como um animal enjaulado.

— Oi, irmã — disse, olhando fundo nos olhos perdidos dela. Trouxe comigo a garrafa térmica cheia do chá enquanto lembrava do quão difícil fora a jornada para conseguir a cura. Ela não me reconheceu de início, algo que foi como uma faca sem ponta cravada no peito.

Sem conseguir aguentar, abracei-a, lágrimas nos olhos. Ela tentou se debater, as mãos foram até minhas costas, as garras rasgaram minha carne enquanto suas presas perfuraram o pescoço.

Não me importei. Podia curar isso depois.

Quando sentiu o gosto de sangue descer a garganta, ela parou de se debater e senti as presas soltarem-me.

— Lew…

— Está tudo bem… estou aqui, irmã.

Afastei-me e olhei fundo nos olhos dela, vi uma expressão de pânico e arrependimento.

— Como pode estar tudo bem? Eu rompi sua jugular, seu idiota! — Sorri, deixando minha Energia curar a área que ela machucou.

Grace sempre foi estudiosa e inteligente, por isso, não me surpreendi com o pânico dela. Se tivesse outro diário, provavelmente estaria morto.

— Relaxa… — disse, forçando-a a olhar o meu pescoço. — Está tudo bem… Portador do Diário das chagas e aflições, lembra? Agora… — Tirei a garrafa térmica do meu cinto e mostrei para ela, com um sorriso. — Abre a boca grandão!

Os próximos segundos foram preenchidos pelos gritos de horror e nojo da minha irmãzinha. Senti uma pontada de tristeza quando vi ela vomitar o chá que fiz com tanto carinho.

— Qual é, Grace… Não tá tão ruim assim! Eu passei semanas aperfeiçoando essa receita.

— É a pior coisa que eu já bebi… — gritou, segurando o nariz. — O que raios é isso?

— A cura para a Licantropia.

Olhou para mim com uma expressão vazia, ainda sentindo tontura pelo gosto, e então arregalou os olhos quando percebeu que estava falando sério.

— Segundo o Xamã, precisa tomar isso uma vez por semana, ou não vai ficar bem.

— Você… Você não teria coragem!

— Abre a boca, e não vomite dessa vez!

Ela fechou a boca e os olhos, impedindo-me de dar o chá para ela. Suspirei com aquilo. Não é possível que esteja tão ruim… Talvez seja por isto ser um remédio para ela? Nunca que um remédio teria gosto bom.

Bem, não importa muito.

— Querida irmã, sabe muito bem que isso não funciona. Lembra da última vez que tivemos esse impasse? — Senti o nervosismo dela enquanto sentia um sorriso se abrir de orelha a orelha no meu rosto. — Última chance…

Vendo que ela fechou a boca ainda mais, suspirei. Bem, hora do plano B.

Cocegas.

Demorou apenas alguns segundos para ela perder o ar de tanto rir. Usei essa oportunidade para forçar o líquido na boca dela. Como antes, fez uma cara de nojo, mas, dessa vez, tentou manter o vômito dentro do estômago.

Bem, isso resolve.

A mudança era visível. Suas presas voltaram a ser unhas, os olhos tornaram-se o cinza que estava tão acostumado e a postura deixou de ser tão agressiva.

Sorri com aquilo. Parece que funcionou.

— Ela pode sair agora, não é?

— Desde que continue tomando o remédio, sim.

Sorri e abracei minha irmã enquanto ouvi o som de chaves. Após alguns segundos, ela estava livre. Senti lágrimas de alívio caírem.

Finalmente esse pesadelo acabou.

 

Quando voltamos para a cidade, senti o choque térmico imediatamente. Estava bem mais quente aqui…

Olhei para Grace, esperando ver uma reação semelhante, mas minha irmãzinha estava bem. Parece que ainda tinha um pouco de fisionomia Nor nela…

— Senhor! É urgente!

Um soldado da Polícia Secreta correu até onde estávamos. Edwars foi até ele e estreitou os olhos. Ficou quieto, esperando que ele recuperasse o fôlego.

— Houve um assalto ao Banco Central…

— Deixe que a polícia cuide disso…

— Não é só isso, senhor! Eles também… também explodiram todo o quarteirão. Não sobrou nada!

Aquilo chamou a atenção de nós dois. Estreitei os olhos enquanto pensava no porquê daquilo… e quem raios poderia ser o culpado. Não demorou muito para ligar os pontos.

O Moedor.

Senti meu corpo tremer com as memórias da minha derrota. Um homem sozinho não conseguiria fazer tudo isso, mas o desgraçado do Moedor já mostrou que não estava só. Ele tinha conseguido, de alguma forma, o apoio dos Nors.

— Não é só isso… — Uma voz familiar soou a direita e senti uma certa alegria quando confirmei quem era. — Ele também deixou um recado.

— Nick! — exclamei, com um sorriso no rosto. O velho então reparou minha presença e arregalou os olhos.

— Lewnard! A quanto tempo, meu rapaz.

Apertei a mão dele conforme observava seu rosto. Não mudou nada, desde os olhos azuis, até o bigode grisalho…

Era o mesmo Delegado que me ajudou tanto naquele período.

— Vocês se conhecem? — Edwars parecia surpreso, olhando a nossa reunião com interesse.

— Esse pirralho me deu muito problema quando anda estava na Polícia Regular, capitão. Várias vezes tive de colocar ele nos eixos.

Sorri e senti a alegria de Grace perto de mim. Ela também estava feliz em vê-lo, ainda mais sabendo tudo o que ele fez.

Quando tinha em torno de 13 anos, comecei a andar com a companhia errada e não demorou muito para me tornar um delinquente.

Várias vezes fugi da polícia e, em todas elas, Nick me prendeu de novo e de novo. Quando tinha meus 16, disse-me palavras que moldaram quem sou hoje.

— Escuta, seu idiota — disse, olhando de soslaio para mim. Tentei várias vezes me desvencilhar das algemas, mas não podia usar a Energia Astral na frente de um normal. Era uma das regras que não ousava desobedecer. — Em dois anos, será um adulto. Quando isso acontecer, não poderei mais te proteger.

Rosnei. Aquelas algemas me prendiam num poste qualquer e já estava irritado com todo aquele papinho.

— Como se você pudesse entender! Já ouvi esse seu maldito sermão várias e várias vezes!

— Sério, não tinha uma irmã? Como acha que ela reagiria vendo você atrás das grades? — Parei de me debater e olhei para o lado. Não tinha uma resposta para aquilo… — Lewnard, me escute bem. Não sei qual o seu passado, mas posso ver seu futuro. Sabe o que eu vejo? Um verme, morto em um dos distritos inferiores, baleado por não ser mais útil para seus contratantes.

— Eles são meus amigos!

— É mesmo? Então por que te abandonaram tantas vezes? Alguns até mesmo testemunharam contra você! Com amigos como esses… — Parou de falar quando olhou para mim. Suspirou e acendeu um cigarro. — Lewnard… sabe o que está na minha frente agora? Um potencial enorme sendo desperdiçado! É esperto e também é esforçado, então, ao menos, tente melhorar. Não por mim, mas por sua irmã.

Após aquela conversa, eu pensei muito no que queria fazer da vida, chegando a conclusão que queria trabalhar com a lei. Queria ter dinheiro o suficiente para ser livre e dar a minha irmã o melhor que ela podia pedir…

Não passava de um sonho, e eu sabia disso… Contudo, sempre que me imaginava por trás das grades, sem poder protegê-la, sem poder cumprir minha promessa…

Era um sentimento difícil.

Com um pesado suspiro, deixei os oficiais trabalharem e me direcionei para a saída, quando encontrei mais uma surpresa.

— Oi, pirralho. O Zozolum quer falar contigo.


Bem, estamos de volta. Como sempre, peço que entrem nos links abaixo:

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Este grupo me ajudou muito com minha escrita, peço que, se querem se tornar escritores, deem uma chance para ele.

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Este é o meu server pessoal. Se possível, deem uma olhada!

 

Além disso, um rapaz me pediu ajuda para divulgar uma vakinha. Ele tá com problemas de saúde e só ele consegue prover para a família de 3 dele. Se possível, deem uma olhada nela e deem uma ajuda: https://www.vakinha.com.br/vaquinha/ajuda-para-tratamento-e-contas



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