Dualidade Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 15: O Bruxo do Tempo

Olhei para o capitão a minha frente enquanto tentava me equilibrar. Minha respiração parou por uns segundos e um sorriso surgiu no meu rosto.

— Tá falando sério?

Ele acenou e ofereceu a mão para mim. Encarei-a por alguns segundos e então dei um passo doloroso até ele e selando o acordo.

— Isso não saíra de graça… quero um favor. Quando vou cobrar e como vai depender exclusivamente das circunstâncias.

Assenti e ele me ajudou a caminhar até o salão da execução.

Cada passo era doloroso e meu corpo febril fraquejava sempre que estava um metro mais próximo. Notei, com certa irritação, que estávamos fora de rota e olhei para o Capitão. Ele suspirou e então apontou para os trapos que vestia.

— Se não quiser parecer patético, é melhor aparecer da melhor forma que pode. Tenho um traje sobrando na minha sala que possivelmente te serve.

Faz sentido. Mesmo eu, um analfabeto no que tange a política, consigo ver que estar cheio de ataduras manchadas de sangue só enfraqueceria minha posição e, se o que ele falou estiver certo, vamos tentar conseguir um acordo para ganhar tempo e achar uma cura.

É… posso fazer isso funcionar. Só preciso agir como o herdeiro de John Hollick.

Ao chegar na sala de Edwars, notei a ausência de decoração. Era um quarto simples demais e que não dizia nada sobre ele. As paredes amarelas, num tom esbranquiçado, a única mesa, com diversos documentos que precisavam de uma assinatura, e um uniforme extra.

— Vista-se — disse, deixando-me só.

Assim o fiz. Notei que o uniforme era feito sob medida para acomodar um corpo ágil e rápido, com um material que o permitiria correr e usar uma espada sem se preocupar com a costura.

Era um pouco apertado para meu físico, mas acho que dá pro gasto.

Assim que abri a porta, olhei para Edwars, que assentiu.

Era hora.

Ele me levou a um elevador e apertou uma combinação de botões. Era uma tecnologia nova, que fora desenvolvida por um Marquês que ganhava notoriedade no campo exotérico de Bruxaria.

Por mais que ainda não fosse um Mestre, muitos já o chamavam de “O Mestre do Espaço”. Alguém com um talento e entendimento de Abjuração que só fora visto antes com Zozolum.

A invenção que o proporcionou esse nome era esse elevador. Criando um sistema conectado a matriz da Associação dos Bruxos, ele conseguiu uma tecnologia que dobrava o espaço e trocava um elevador de lugar com outro, desde que estivesse na rede.

Assim que digitou o último botão, senti meu peso desaparecer. Era como se flutuasse por um instante e voltasse a ser afetado pela gravidade em outro.

A porta se abriu e ele me pegou pela mão. Não demos mais de alguns passos até que tivemos nosso caminho obstruído por um jovem, de cabelo azuis e olhos roxos. Ele era caucasiano e vestia um uniforme da Associação.

— A entrada é proibida. Peço que deem meia-volta.

— Não vai rolar — disse, tirando o diário e o levitando para perto de mim. Aquele cara obviamente não sairia por bem, logo, só havia uma alternativa.

— Bem, você quem sabe… — Senti uma alteração no ar e, antes mesmo que pudesse compreender o que aconteceu, meu corpo foi lançado para longe, um forte impacto no meu estômago.

Levantei-me e olhei para o rapaz em minha frente. Senti a mesma mudança repentina no ar e pulei para o lado. Para minha surpresa, vi o rapaz aparecer ao meu lado e preparar um soco.

Uma magia de velocidade? Não importa… se for em um confronto físico, não vou perder pra ninguém! Levantei minha guarda e notei o mesmo sentimento de antes… em seguida, fui lançado para a direita com um soco no rosto.

O que tá acontecendo? Isso não é normal… — Vejo que seu cérebro de primata não entende, né? Bem, não o culpo. Alguém que teve tudo dado a si desde criança jamais poderá compreender os esforços que pus nessa magia!

O mesmo sentimento, levantei minha guarda e estendi meus sentidos. Ele tem que vir de algum lugar, mas de onde?

Num instante, senti algo mudar nas minhas costas. Era como se meus sentidos fossem distorcidos, bem atrás de mim. Não… não era uma distorção… era mais como se…

Uma forte dor interrompeu meus pensamentos e me mandou de volta para o ponto inicial. Caído no chão, olhei para Edwars, que não fez nenhum movimento para me ajudar.

Ele esperava que eu vencesse isso sozinho? Bem… acho que é justo. Ele prometeu me levar mas nada além disso. O mesmo sentimento no ar e eu girei meu corpo para o lado, vendo o pé do jovem quebrar o chão.

Não é velocidade… essa sensação de distorção no ar e a forma como eu estou alguns segundos atrasado sempre que ele me pega num golpe…

— É isso… Você manipula o tempo, não é? — Vi surpresa no rosto dele e pulei de volta a briga. O diário já havia começado a curar meus sentimentos e podia lutar sem me preocupar demais com a roupa, visto que fora reforçada.

Dei um direto no rosto, seguido por um cruzado no rim. Seu corpo enfraqueceu e eu aproveitei a falta de controle dele para enviar vários Jabs, quase como uma metralhadora.

Minha energia circulava o meu corpo de uma forma muito mais livre que antes. Eu estava mais forte, ainda que meu último confronto não deixasse isso transparecer.

Senti a distorção no ar, seguido por algo diferente. Um som de vidro se quebrando… Não, não era só isso, mas parecia mais como se ele o esticasse até o limite.

— Dispare duas esferas para fora! — Fiz como o Espectro ordenou e dei um salto para longe. Não sei o porquê de eu obedecer… só que era instintivo.

Tentei mais um passo, mas não consegui mover um músculo.

— Prisão Temporal… — Ouvi ele dizer, num tom convencido. — É como você disse, meu poder manipula o tempo. Eu insiro uma linha extra no fio temporal e faço o que eu quero com ele… desde aliviar os efeitos num corpo, até dobrá-lo, dessa forma.

Merda… por que você me mandou disparar energia? Agora tô parecendo um idiota!

— Não, olhe com atenção. — Foi tudo o que disse antes das duas esferas aparecerem na minha visão, sendo atraídas diretamente para meu oponente.

Ele pareceu surpreso e deu um salto para trás, quebrando a concentração na arte mística.

— Mas… como? — perguntei, olhando surpreso para o Espectro.

Foi então que lembrei do que o Bruxo acabara de falar. Ele dobrou o tempo, mas, ainda assim, o tempo ainda é uma linha. Ele claramente parte de um lugar…

As duas esferas partiram da mesma posição e tinham a mesma carga energética, elas deviam se repelir, mas devido a manipulação temporal elas foram arremessadas contra o alvo e o seguiriam caso ele não desfizesse a técnica…

Incrível… Ele viu por trás da habilidade antes mesmo que eu conseguisse pensar numa forma de contra-atacar.

— Esse tipo de oponente não é um que você pode enfrentar sozinho, mas, como é um teimoso idiota, vou te dar uma ajuda.

Ei… não precisa ofender! Se bem que não tenho tempo para discutir. Vou arrebentar a cara desse Bruxo e seguir em frente.

— Faça sua energia explodir ao redor! — Pera, quê? Ele não pode estar falando sério! Isso seria como disparar um Canhão Astral… precisaria relaxar todos meus músculos e ficaria desprotegido… — Faça!

Senti aquela distorção no ar de novo e fiz como ele me mandou. Não vou duvidar dele… ele já se provou.

Minha fé foi recompensada com um grunhido do Bruxo, que foi lançado contra a parede.

Espera… é isso! O bruxo acelera o seu tempo enquanto desacelera o tempo ao seu redor. É uma arte que parece invencível, mas ele ainda precisa acertar um golpe… se eu liberar minha energia um pouco antes de ele usar, ele não vai conseguir passar por ela!

— Vejo que não é tão burro como parece… — A voz dele soou convencida, mas não deixei aquilo me incomodar.

Com um grito, eu saltei contra ele. Senti aquilo de novo e liberei minha energia, vendo como ele saiu voando ao tentar um ataque nas minhas costas.

Espera um pouco…

Virei para trás e corri em direção da parede. Assim que senti aquilo de novo, contei um segundo e liberei o máximo de energia possível nas minhas costas.

Um grito, seguido pelo homem sendo lançado com tanta força contra uma outra parede que se afundou nela.

— Nada mal…

— Qual o problema? Não quer continuar a luta? — Ele saiu de onde estava, cambaleando um pouco. — Você é bem previsível, sabia! Depois que age que nem um covarde, fica fácil telegrafar seus ataques!

— Seu…

Avancei contra ele e, quando estava prestes a dar um soco com tudo, Edwars apareceu na minha frente e segurou meu punho.

— O que é agora!

— Olhe atentamente, Lewnard. Ele está desacordado. — Era verdade. Assim que dei uma olhada mais de perto, vi que meu oponente realmente desabou no chão.

Que… fraco.

Não, não é isso. Esse cara era forte, só ver os arredores. Ele também segurou bem alguns dos meus ataques e sua Arte era poderosa o suficiente para manipular um conceito exotérico como o tempo.

Sim… eu acho que… fui eu que fiquei mais forte.

Olhei para o espectro com um sorriso infantil. Queria que ele me dissesse algo? Isso é estranho… a alguns minutos atrás eu estava brigado com ele. Por que disso?

Lembrei das instruções que ele me deu e senti um calor no peito.

É, faz sentido.

Mesmo que Zozolum tivesse me treinado, isso era diferente. Enquanto aqueles dois meses foram gastos cobrindo teoria, aqui era algo mais prático, algo que eu podia entender com facilidade.

Eu me senti conectado a ele? É estranho… Eu não gosto dele. Não suporto a presença dele me julgando e criticando mas… acho que formei um vínculo com ele, ainda que não gostasse disso.

Não foi a primeira vez que ele me ensinou algo. Só consigo sentir a Energia graças a ajuda dele… Sim, no final, tenho muito o que agradecer a ele…

Olhei para o Espectro uma vez mais e notei como ele me olhava com um sorriso provocativo.

É mesmo, esse babaca lê mentes.

— Vamos logo.

— Qual foi, não ia me agradecer? Dizer como me admira? Declarar seus sentimentos para mim? — Não enche… não vou fazer nada do tipo.

— Então, onde fica o salão de execuções?

— Venha comigo — falou Edwars, tomando a dianteira. — Uma coisa que acho que não entendeu é que ela será executada em algumas horas, o que significa que temos tempo para fazer uma parada.

— Uma parada? Por quê?

Edwars parou e olhou para mim com um sorriso. — Os Líderes do Clã… acho que devíamos convencê-los antes de tudo… incluindo seu Tio Avô… Kruger Hollick.

 



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