Dualidade Brasileira

Autor(a): Pedro Tibulo Carvalho


Volume 1 – Arco 2

Capítulo 13: Um dia normal

Um total de oito horas se passaram desde que a polícia secreta foi acionada para tentar capturar o Licantropo. O capitão ainda está atrás dele, por mais inútil que o esforço pareça.

Bem, acho que essa é uma parte do que faz Edwars ser quem ele é. Sempre tão determinado e obcecado no dever, raramente vendo algo além do alvo…

E quem acaba sofrendo é o resto do esquadrão, como Euzinha. Por mais que eu tenha minhas responsabilidades, ainda é um saco não ter um único dia de folga aproveitado.

Meus olhos estavam grudados na papelada, um verdadeiro encosto na minha vida. Eu queria ir logo ver o Portador e, quem sabe, pegar o autografo dele.

— Miia, o capitão quer saber quantas pessoas precisaremos silenciar dessa vez. Já terminou a contagem? — A voz de Jim soou ao meu lado e, imediatamente, comecei a suar frio.

Não pude terminar o relatório… quer dizer, como poderia? Meu sono era mais importante!

A relação do capitão com o delegado Razer era complicada. Bem, o mais correto era dizer que ambos se odiavam… talvez eu pudesse apelar para isso e me safar da bronca que viria…

— Razer! Eu fui encarregado de pegar o relatório! Isso não tem nada a ver com você!

Ou eu posso só contar a verdade e chorar com o resultado.

— Dryas… se a seção de puxa-saco não levasse tanto tempo, talvez eu não precisasse gastar meu tempo com isso — retrucou Razer com um sorriso no rosto.

Apesar da minha situação, eu não pude deixar de rir. Todos os membros do esquadrão da Meia-noite sabiam da… admiração que Dryas tinha com figuras acima dele na hierarquia.

Era irritante e beirava o bizarro. Ele sem dúvidas faria qualquer coisa para agradar um membro de alta patente. Talvez por essa razão que ele nunca deixou o ranque de Cabo, mesmo que tenha entrado antes de mim.

Também é essa a razão que ele nutre um sentimento de rivalidade irritante e unilateral comigo. Seria fofo até, se ele não reclamasse tanto.

Ambos olhavam para mim com certa expectativa e eu engoli em seco. Claro, tenho que achar uma forma de sair dessa… preciso de um bode expiatório… mas quem seria…

— Ah, Nick! Chegou em boa hora! — O ex-delegado da força normal olhou para mim com certa irritação, mas não podia negar meu pedido.

Por mais que o ranque dele seja o mais alto numa delegacia, aqui ele não passava de um cadete, prova disso era a falta de condecorações no uniforme.

— Fez o que eu te pedi? — Inicialmente, ele me olhou confuso e, então pareceu entender a deixa. Ao menos, é o que eu gosto de pensar. — Hora, por favor. Não é possível que você é tão incompetente assim. Que tipo de delegado não consegue fazer uma contagem?

Com a atenção de ambos longe de mim, pude relaxar enquanto olhava a forma preocupada do veterano…

Eu não o invejava, nem um pouquinho.

 

Caminhei furtivamente até o quarto do Portador de Davi enquanto segurava um pedaço de papel e uma caneta.

Sem dúvidas ele já acordou do coma… quer dizer, já faz mais de dois dias! Não sei o porquê deles ainda o manterem num quarto de enfermaria. Se ele realmente tem aquele diário, ele devia ter uma capacidade de recuperação super-humana!

Minhas expectativas foram arrasadas quando entrei ali. Ele ainda tava dormindo… inacreditável! Mesmo com uma gatinha como eu indo vê-lo, esse cara tem a audácia de nem ao menos prestar atenção!

Eu achei que o filho daquele homem era mais forte que isso…

Sentei numa cadeira ao lado da cama dele enquanto cruzava as pernas. Graças a minha constituição de Nekomata, meus sentidos eram sensíveis e eu odiava aquele lugar.

O cheiro de remédio sempre foi desagradável, sempre me lembrava do meu passado, um que eu queria desesperadamente esquecer…

Tremi com a memória do rosto de meus pais ao contarem o dinheiro que aquela organização deu pra eles…

Não! Deixa de pensar nisso, Miia! Agora você é forte e livre, pode fazer o que quiser! Não posso pensar no passado mas também não tenho nada pra fazer…

Olhei para o cara na cama enquanto resmunguei, irritada. Bem, se não tenho nada pra fazer, acho que posso pregar uma peça no culpado pelo meu tédio…

Tirei a tampa da caneta e comecei a fazer minha obra de arte. Alguns minutos depois ela estava pronta e eu sorri convencida. Sem dúvidas eu era ótima em vingança!

Tirei a caneta de perto do rosto do Portador enquanto me preparava para descer da cama dele. No entanto, antes que eu pudesse pensar em fazer algo, a porta se abriu e a última pessoa que eu esperava veio visitar o Portador.

— Senhorita Elizabeth?

Ela me olhou curiosa e com um leve rubor no rosto. — Eu não esperava que ele tivesse interesse em Nekomatas… ou que você tivesse interesse em caras mais novos.

Só então eu reparei a posição em que estava e senti meu rosto corar. Não! Definitivamente não! Enquanto eu admiro muito ele, Lewnard era muito novo para mim…

Quer dizer, eu sou uma mulher adulta, caramba!

Enquanto agarrava um único fiapo de pensamento lógico, notei que, para minha irritação, a princesa de Juvicent sorriu.

Ah, não vai ficar assim. Essa criança acha que pode provocar uma mulher mais velha e sair por cima? Vou mostrar para ela!

— Sim, claro! Pode não parecer, mas o Lew é uma besta! Acho que só não envelheci ainda por conta dele!

Aquilo arrancou uma reação dela, um rubor e os olhos arregalados e com um brilho de mágoa e… inveja?

Ela escondeu bem aqueles sentimentos, mas para uma profissional como eu, era fácil ver esse tipo de coisa. Quer dizer, por que uma nobre como ela gastaria seu tempo vindo aqui?

Óbvio que ela tinha um interesse nele… mas como? Bem, acho que não interessa.

— Tudo bem, vou deixar vocês a sós! — Ela estava para bater a porta quando um sussurro a paralisou.

— Grace…

Imediatamente em senti uma enorme culpa pelo que falei. Não só pela princesinha, também por conta das notícias que o Portador receberia ao acordar.

Eu vi Grace Hollick em primeira mão e posso dizer, com toda a certeza, que ela era uma garotinha boa e o que o conselho de nobres pretendia fazer para ela era algo inumano.

Eu sou uma mestiça, e mesmo eu acho errado executar uma garotinha… independente do que ela se tornaria.

Uma coisa curiosa sobre os Nors era que, por mais que eles pudessem se reproduzir como humanos normais, eles tinham outra forma de aumentar seus números… uma muito mais eficiente.

Haviam três tipos de pessoas nesse mundo. Quando eu falo isso, não me refiro a humanos especiais, normais e bruxos… não… isso é apenas uma terminologia científica que pouco importa ao meu ver.

Homens, Monstros e aquilo que eu gosto de chamar de Pseudo-humanos.

Os Homens estão na categoria de pessoas normais e especiais. Qualquer ser humano saudável entra nessa categoria… os Monstros são seres como eu e o Licantropo, criaturas que não pertencem a humanidade… já os Pseudo-humanos…

Eles são pessoas que podem se tornar Monstros apenas tendo o veneno de um Nor injetado na corrente sanguínea deles.

Não existe um padrão específico para essas pessoas, ao menos não um que fora descoberto. Os Bruxos até tentaram mas, depois de várias falhas, não acharam nada que permita essa transformação…

E é até melhor que não tenham achado. O genocídio que viria com isso não teria precedente algum.

A mera ideia que a filha dos Hollick, uma família que existe desde os quatro portadores originais, esteja se tornando um Licantropo é insana demais.

Acho que é por isso que os Hollick são, justamente, os mais interessados em ver Grace Hollick morta.

Sai de cima dele e fui até a porta, a princesinha ainda estava lá, paralisada com o que ouviu. Sem dúvidas ela sabia do que estava acontecendo por trás dos panos…

— Olha, sugiro que aproveite bem a companhia dele — sugeri com o máximo de sinceridade possível. — Depois que ele descobrir o que aconteceu, ele sem dúvida vai ficar obcecado… quando isso acontecer, desista dele e siga em frente…

Deixei Elizabeth ali enquanto me perdia em memórias de novo. Memórias de como as coisas costumavam ser antes do esquadrão da meia-noite ser formado… e o quão feliz todos eram naquela época.

Incrível como a papelada me parece agradável agora.

 

 


E voltamos com a história. Bem, como podem ver, as coisas começaram a se agilizar e é bom que nosso querido protagonista acorde logo...

 

Para os que querem ler mais trabalhos meus, deem uma chance para A Lenda do Destruidor, nesse mesmo site.

 

Com isso dito, até o próximo capítulo



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