A Voz das Estrelas Brasileira

Autor(a): Altair Vesta


Volume 3 – Parte 3

Capítulo 66: Renascer da Chama

Diante do homem esguio, Bianca paralisou.

Seus amigos perderam a consciência de repente e, no presente momento, ela se via solitária com o misterioso, que carregava a mesma voz daquele chamado.

O cabelo ondulado chamava a atenção com um coque amarrado na altura da nuca, mas aquele detalhe era insignificante perto de outra característica.

Os olhos, tão azul-escuros quanto os fios emaranhados sobre a cabeça, pareciam lhe congelar a alma.

A menina mal conseguia respirar perante aquela presença. No entanto, era necessário controlar as emoções para compreender a sucessão de mensagens recebidas por ele.

Engoliu em seco e uniu os lábios trêmulos, prensando-os a fim de cessar toda a tremedeira corporal.

Os pequenos punhos se fecharam após soltarem a mochila, que caiu à frente das pernas levemente flexionadas.

Sustentou-se na postura desequilibrada e, ao estreitar as sobrancelhas, tomou coragem no intuito de entoar:

— Como assim... estava me procurando?...

A voz soou um tanto afônica, baseada na apresentação ainda acuada.

O azulado, autoproclamado de Lúcifer, inclinou o rosto à esquerda, onde sua orelha quase tocou o ombro.

Não deixou de analisá-la nem por um segundo, sempre movendo os olhos noturnos e fazendo-a sentir novos calafrios na nuca.

Ele sustentou o silêncio num primeiro instante. Levantou os dois colegiais desmaiados na pura força dos braços — que não aparentavam possuir força alguma, de tão franzinos.

Bianca boquiabriu, mas nenhuma palavra escapo.

Em percepção à preocupação dela, o homem assentiu com a cabeça e deu meia volta, sem largá-los.

Sem alguma pressa, caminhou até a calçada mais próxima, onde havia dois bancos de cimento, e os deitou ali.

A marcada acompanhou tudo, incapaz de reagir.

— Então... por onde começo? — Levantou-se para retomar o foco à garota atônita. — Já não deve ser novidade que seus poderes continuam ativos, por isso irei direto ao ponto.

Durante sua pausa, o momento de silêncio só foi cortado pelo assobio da fraca brisa, incumbida de fazer seus fios soltos dançarem na mesma direção.

Bianca prendeu a respiração sem notar, tamanha a ansiedade por qual seria a resposta oferecida.

Não demorou muito até ele, através de um fraco lamento, proferir em alto e bom tom:

— Este universo progride aos poucos para seu fim.

Passado um breve período da inédita quietude, a menina não resistiu a reagir boquiaberta.

Da garganta, que parecia envolvida por um nó poderoso, escapou os balbucios:

— O que...? Não... — E então, veio o sorriso de escárnio. — Por favor... que tipo de brincadeira é...?

— Filha de Elisa Doherty, que faleceu prematuramente por conta de uma doença degenerativa. — À sequência inesperada, a menina esgazeou as vistas. — Ficou sob os cuidados de Levi, seu filho adotivo, que perdeu sua amada e ganhou o poder da estrela de Leão. Desde então, foi usada para seus próprios fins, maltratada e posta à beira do desespero, até que seu salvador apareceu.

— Para...

— Presenciou a queda de sua casa, junto com as lembranças que tinha de sua querida mãe. Prestes a ser morta, foi salva...

— Para! — O grito dela interrompeu o homem.

Com as mãos nas têmporas, buscou afastar o conto resumido de sua vida desde quando se tornou uma marcada. No entanto, o próprio locutor resolveu parar, sentindo que já era o bastante.

— Não planejo te fazer algum mal. — Chamou de volta a atenção dela, a face contraída graças às emoções deturpadas que se reuniam no peito. — Se não acredita em mim, irei lhe mostrar. Pois preciso de sua ajuda... uma das únicas especiais que restou da Seleção Estelar.

Especiais?

— Sim. Aquela que fez a Maldição das Estrelas alcançar seu estágio mais poderoso. — Lúcifer estreitou as vistas, deliberando ainda mais calafrios contra o corpo da menina. — Você é necessária para que evitemos o fim do universo. E...

Ele mesmo descontinuou a frase, desviando o olhar frígido pela primeira vez.

A sucessão de informações fez a mente da Marcada de Deneb travar.

Ao mesmo tempo que buscava motivos para acreditar nas palavras disparadas pelo desconhecido, a vontade de rir daquilo tudo e somente taxá-lo de louco crescia aos poucos.

Porém, ela mal esperava pelo que viria na sequência:

— Precisamos despertar o descendente da Águia. — O balde de água fria, de fato, trouxe o maior baque à garota. — Ele é peça chave nessa quebra-cabeça. Por isso, é fundamental que venha conosco.

O chão que Bianca pisava pareceu desmoronar.

Ele com certeza falava de Norman, incapacitado desde o “final” da seleção há três anos. Abordar a palavra despertar lhe trouxe uma gama de sentimentos bons e ruins.

Sua cabeça embaralhada, graças a quantidade de resoluções proferidas pelo homem que se chamava de Lúcifer, se esforçou para realinhar a rota.

Sua suspensão de descrença aumentou em proporções inimagináveis, inapta a escolher o que deveria ser verdade ou não.

Fato era que aquele estranho sabia de sua história, poderes e, por fim, sobre a própria seleção.

Mostrou-se irredutível nesse aspecto, o que por si só já levantava bastante credibilidade a seu favor.

Apesar disso, seria muito difícil assimilar toda aquela súbita virada de chave nos acontecimentos.

Foram três anos se acostumando a viver normalmente, após sucessivos eventos que trouxeram a vida e a morte próximas do mesmo limiar.

Com o coração acelerado por conta da forte indefinição, ela abraçou a si mesma.

Ao mesmo tempo que a esperança surgia, o medo vinha pungente para lhe socar o estômago.

E isso se tornava claro por sua postura imutável, prestes a se ajoelhar e sofrer naquele mar de agonia.

— Acho que você precisa de um tempo para pensar... — Ele voltou a falar, dessa vez com um tom mais sereno. — O universo está em jogo, lembre-se disso. Voltarei em breve, esperando sua resposta.

Lúcifer deu a volta e caminhou até desaparecer.

Só então Bianca pôde superar a paralisia, onde as pernas estremecidas não aguentaram o peso do próprio corpo e levaram-na ao chão.

Sentada, as mãos apoiadas no asfalto frio, tratou de reequilibrar a respiração arfante.

Procurou remediar toda aquela experiência que durou poucos minutos, mas que pareceu se arrastar por horas.

Sequer remeteu aos colegas desmaiados nos bancos ao lado. As mãos regressaram à cabeça, que começou a sofrer de uma dor insólita.

“O que eu faço?...”, quase afundou a testa nos joelhos flexionados, mas logo tomou sua decisão.

Não poderia perder tempo ali.

Se a encontraram e, ainda por cima, foi delegada ao pedido inusitado...

“Preciso voltar logo.”

Se reergueu, sem soltar as alças da mochila. Encarou a dupla adormecida no banco, lembrando de quase ter revelado seus segredos a eles em um tenso instante de indefinição.

Um fraco sorriso surgiu em meio ao desalento.

— Me desculpem...

O pedido afônico jamais seria capaz de alcançá-los.

O regresso do irreal não permitiu a garotinha esperar que despertassem, pois sequer saberia como explicar a eles sobre o episódio.

Foi tudo tão rápido que mal conseguia organizar as prováveis consequências que recairia sobre eles.

Ainda assim, restava a maior das preocupações.

Na retomada da determinação, deixada de lado por um bom tempo, começou a correr rumo ao ponto de ônibus.

Precisava chegar em casa o quanto antes.

As engrenagens do tempo e do destino jamais tinham parado de girar...

Passou uma hora desde o encontro com o homem misterioso, incumbido de informá-la sobre questões inimagináveis, como o fim progressivo do universo.

Ainda custava um pouco a dar créditos a tal esclarecimento, mas não podia esquecer de tudo que passou no tempo como uma marcada.

O espaço para o fictício já fora determinado há tempo. Precisava lidar com aquilo da melhor forma e, para piorar, pela primeira vez encontrava-se sozinha nesse meio.

“O que vocês fariam?...”, ponderou sobre as atitudes que Norman ou Layla teriam nesse cenário.

Destilou a inquietude nas pernas nervosas, enquanto o rosto era direcionado aos punhos cerrados sobre a mochila acima delas, dentro do ônibus.

A apreensão crescia a cada minuto de aproximação à parada onde deveria descer, na esquina do quarteirão de sua casa.

Chegou ao ponto de voltar a arquejar, o que a fez levar uma das mãos sobre o peito.

Fechou os olhos com força, tentando reprimir os mais árduos pensamentos, assim que o transporte virou na rua do trajeto derradeiro.

Ela desceu e correu o mais rápido que pôde. Chegou na calçada de sua casa, ofegante ao extremo e levantou o rosto até observá-la.

Com muito medo, caminhou a passos trôpegos à porta de entrada. Sabia que estava destrancada, pois a amiga de seu maninho ficou lá a manhã inteira, como prometido.

Por isso, levou a mão até a maçaneta e, com cautela, a girou. O leve rangido acompanhou o movimento da estrutura de madeira branca.

A menina entrou na residência e logo fitou Helen, como esperado, preparando o almoço na pia da cozinha.

Ela encarou por cima do ombro, à medida que o ruído lhe chamou a atenção.

— Oh! Bem-vinda de volta, Bianca!

— Helenzinha...

Defronte o sorriso natural da universitária, a Marcada de Deneb fechou a passagem e fez seu caminho pela região recepcionista do local.

Varreu os arredores através das vistas ansiosas. Fitou cada detalhe na busca por qualquer incongruência ali dentro.

Não encontrou algo de relevante, com exceção de Norman, já a postos no sofá da sala.

Um misto de alívio e apreensão a dominou, assim que os olhos se conectaram à presença do rapaz.

Pressionou os lábios, cerrou os punhos e manteve a cabeça um pouco baixa, postura que arrancou uma pitada de preocupação da jovem adiante.

— O almoço já está pronto — disse, puxando de volta o foco da menina. — Tome um banho e troque de roupa para se juntar a nós.

— S-sim...

Cabisbaixa, a garota caminhou a passos curtos, sem sequer compartilhar sua chegada com o garoto.

Subiu as escadas, jogou a mochila no chão e, antes de ir ao banho, deitou-se na cama mais afastada da janela.

De braços abertos, encarou o teto. Exalou um forte suspiro. Tudo ainda balançava com muita vivacidade em sua cabeça, lhe trazendo um incômodo difícil de ser vencido.

Seguia incapaz de encontrar uma resposta para a pergunta feita há pouco.

Não sabia o que fazer e tampouco conseguia imaginar quais seriam os feitos de Norman e Layla.

No entanto, havia algo, bem ínfimo em seu peito, que tinha potencial para uma possível saída.

Se existisse alguma possibilidade, por mais diminuta que fosse, para que seu maninho pudesse salvar ela ou a Marcada de Vega...

“Ele com certeza faria isso...”, estreitou as sobrancelhas, próxima de fazer os cílios se tocarem.

Talvez aquela fosse a conclusão necessária para o momento. Tinha ciência de que, certamente, faria de tudo para poder retomar a consciência daquele que a salvou.

A grande dúvida residia sobre as origens da pessoa responsável por lhe apresentar essa chance. E, como se não fosse o bastante, restava o tal fim do universo.

“Preciso contar isso pra Helenzinha...”

Fundamentada nessa escolha inicial, resolveu prosseguir com os afazeres pessoais.

A barriga roncou de fome, como se os sentidos corporais tornassem a despertar após o momento de nervosismo.

Tirou seu uniforme escolar, tomou um banho não tão demorado e vestiu-se com roupas mais leves; uma blusa sem manga, acompanhada de uma saia com rendas na borda.

Penteou o cabelo, o amarrando num simples rabo de cavalo que ia até metade do pescoço e desceu ao piso inferior.

Encontrou o silêncio da garota que ajudava Norman a se alimentar, então juntou-se à mesa e colocou seu almoço no prato de vidro.

Embora não a encarasse diretamente, Helen sabia que algo tinha acontecido.

Não era a mesma coisa do dia anterior, onde constatou o motivo como preocupação quanto as provas da escola. Podia sentir um peso diferenciado no semblante e na postura da menina.

Ainda assim, permaneceu em silêncio e deixou-a se alimentar da forma devida, antes de qualquer coisa.

Todos terminaram de almoçar alguns minutos depois, até que o rapaz adormeceu na própria cadeira de rodas.

Bianca prontificou-se a levá-lo para dormir no andar de cima, em seu quarto.

Enquanto isso, a universitária permaneceu na cozinha, tomando para si o trabalho de lavar os utensílios utilizados e arrumar toda a bagunça criada pela confecção da refeição.

A garotinha subiu os degraus com ele nas costas, como sempre fazia, e deitou-o na cama.

O cobriu com o lençol e ficou ali, ao lado, o fitando em completo silêncio por um período esticado.

A brisa invadiu o cômodo, junto aos tênues raios solares. As cortinas dançaram ao alcance das vistas, mas todo o foco mantinha-se voltado ao Marcado de Altair.

Retornaram as ponderações quanto aos caminhos que deveria ou não seguir com ele. A cada vez que o contemplava, mais a vontade de tê-lo de volta crescia.

Era difícil conter tantas emoções a aflorarem no peito dolorido, repleto de arrependimentos e melancolia.

Não queria ser tomada por aquele aprisionamento invisível. Por isso, escolheu realizar algum serviço doméstico, a fim de espairecer o quanto pudesse.

Logo encarou as roupas do colégio, jogadas sobre sua cama. Aproximou-se delas e, após respirar fundo, começou a dobrá-las com cuidado.

De repente, a voz de Helen chegou:

— E então... vai me contar o que houve? — Ao vê-la interromper as ações por dois segundos, obteve a deixa necessária. — Sabe que não precisa esconder as coisas de mim. Não só estou aqui para ajudar Norman, como também para te ajudar.

Apesar do singelo choque, a menina empenhou-se em continuar focada na dobragem da calça, essa que ainda tinha certa dificuldade em acertar o padrão que lhe foi ensinado.

O ambiente silencioso trazia o som das próprias palpitações cardíacas aos ouvidos.

Depois de perder alguns segundos até atingir o resultado desejado, repousou o jeans sobre o lençol e, por fim, corrupiou-se.

Enxergou a universitária encostada com o braço na lateral da passagem aberta. Com alguma relutância, assentiu consigo e resolveu contar sobre o evento à companhia.

Levou bons minutos até destrinchar tudo nos mínimos detalhes, a favor de que nada passasse despercebido.

Helen se aproximou e se sentou na beirada da cama, ao lado da garota.

Vidrada em todas as letras proferidas por ela, não esboçou qualquer reação e tampouco ofereceu retrucas.

Esperou até a sílaba final, na iminência de entoar uma opinião:

— Então não acabou ainda?... — Encarou as mãos, meramente trêmulas sobre as pernas. — Três anos se passaram... A partir do momento que seus símbolos continuaram em seus corpos e você continuou com seu poder, eu imaginei isso. Mas o universo a caminho do fim...

— Ainda não consigo acreditar. Mas ele disse que quer despertar o maninho. — Bianca cerrou os punhos, de maneira a suportar a enxurrada de emoções. — Eu não sei o que fazer... Eu quero muito que ele volte, só que não consigo confiar naquela pessoa.

— É o natural. Não se pressione tanto. — Levou a palma sobre um de seus ombros, no intuito de confortá-la. — Vamos pensar juntas. Mesmo que eu não tenha vivenciado este evento tanto quanto vocês, eu quero o melhor para o Norman. Quero salvá-lo, da mesma maneira que ele me salvou...

— Eu também...

— Por isso você deve aceitar. — A voz masculina invadiu o local, trazendo um baque arrepiante à dupla. Elas logo viraram o rosto ao sentido de onde ela soou. — Estão tão obstinadas em fazê-lo renascer e ainda sofrem de relutâncias?

Sentado na janela aberta, o homem encontrou o olhar esgazeado de ambas.

As mechas do longo cabelo ondulado começaram a menear no mesmo ritmo das cortinas em sua volta.

Dessa vez, o vento tornou-se gelado e tomou o espaço com muito mais intensidade que o normal.

Pelo próximo minuto, ninguém disse uma palavra. Somente a aflição restou.

Entre eles, Norman seguia sem dar sinais de que viria a despertar.  

Opa, tudo bem? Muito obrigado por ler mais um capítulo de A Voz das Estrelas, espero que ainda esteja curtindo a leitura e a história! 

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