Volume 2
Capítulo 6: Fortuna e Infortúnio: Fios de uma Corda Torcida
O DIA ESTAVA chegando ao fim, e antes que eu percebesse, já era hora de sair da escola. Faziam cinco dias desde que o exame fora anunciado, mas nada de significativo havia acontecido.
Pelo que pude perceber, cada turma mantinha registro de nenhum atraso ou falta. Os alunos estavam mais quietos do que o normal, vivendo a vida escolar com uma seriedade quase artificial.
Mesmo durante o fim de semana, normalmente um período em que os ânimos se exaltam e a disciplina relaxa, passou sem um único sussurro de problema. Todos pareciam manter firme controle sobre sua tensão.
A julgar pelo jeito como todos estudavam e se exercitavam diligentemente, evitavam atrasos e faltas, e mantinham uma ordem e polidez rígidas, estava claro que as quatro turmas entendiam que seu comportamento diário poderia ser a chave para o exame.
Até a turma de Ryuen, que não parecia ter entendido tudo no primeiro dia, se ajustou rapidamente. Kondo e os outros se moveram com cautela, sondando enquanto levavam em conta o comportamento de vida desde o início.
Eu não sabia quem havia sugerido isso, mas naquela turma, a palavra do líder era lei. Se isso fosse colocado em prática, pelo menos Ryuen tinha entendido a necessidade.
Pssht! Pssht, pssht!
Justo quando eu estava prestes a me levantar, senti pequenas picadas afiadas na nuca.
— Ngh… ei, isso dói! O que…? — Virando-me para identificar a picada desconhecida, encontrei a culpada: Morishita, parada ali com o que parecia ser… uma arma feita de hashis descartáveis.
— Então você ainda está vivo, hein? Nada mal — disse ela.
— "Nada mal" não é o ponto aqui… O que é essa coisa?
— Uma arma. Obviamente.
Pssht!
Antes que eu pudesse reagir, um elástico estalou na minha palma. Percebi que a arma improvisada era uma engenhoca crua, mas surpreendentemente funcional. Vários elásticos passavam e eram fixados a um quadro de hashis, com um pequeno mecanismo parecido com um gatilho. Puxava-se e o elástico voava. Simples e eficaz. E, como minha mão dolorida podia atestar, moderadamente dolorosa.
— Isso dói, sabia? — disse, esfregando o local.
— É porque estou atirando com a intenção de te machucar — respondeu Morishita, sem um pingo de remorso.
— E por que eu tenho que ser o alvo em primeiro lugar…?
Ainda assim, eu tinha que admitir: estava bem feita… Não era apenas uma arma montada aleatoriamente; era projetada para disparar elásticos especificamente.
— Quando você montou isso? — Perguntei.
— É uma arma secreta que elaborei cuidadosamente durante o intervalo. Uma arma mortal maravilhosa que até passa pelos detectores de metal.
Ao menos ela não estava trabalhando nisso no meio da aula.
— Vamos dar uma volta até os confins do inferno juntos. Bang!
— Eu absolutamente não quero fazer isso.
Enquanto trocávamos essas palavras inúteis, Satonaka se aproximou, parecendo um pouco hesitante.
— Tem um momento?
— Sim. O que houve? — respondi.
Surpreso por ser abordado por alguém com quem raramente interagia, uma parte de mim pensou que seria engraçado se Morishita atirasse um elástico em Satonaka.
Mas quando olhei, ela já tinha colocado a arma de elástico na mesa e olhava pela janela, o tédio estampado no rosto. Aparentemente, eu era o único que ela pretendia levar para essa "viagem ao inferno".
— Neste domingo — começou Satonaka —, estava pensando se você gostaria de sair com nosso grupo.
Ele se virou ao falar, e atrás dele um pequeno grupo de dois garotos e uma garota acenava para mim — Yanagibashi, Tsukasaki e Hoashi. Eu mal havia trocado algumas palavras com qualquer um deles antes.
— Sem pressão — acrescentou —, mas o que acha?
— Não tenho planos. Se vocês não se importarem, vou junto.
Ao dar minha resposta, os lábios de Satonaka se curvaram em um sorriso satisfeito e caloroso. Talvez a razão de me sentir estranhamente contente só por ver isso fosse o fato de ele ter um rosto bem proporcional e bonito que até um homem não poderia deixar de achar encantador.
— Se quiser, Morishita-san, você também pode vir — ofereceu ele.
— Vou passar — respondeu ela secamente.
Sem nem ao menos olhar para ele, fixou o olhar firmemente na paisagem fora da janela ao dar sua recusa direta. Satonaka, aparentemente sem se abalar, disse que enviaria os detalhes mais tarde por mensagem e voltou para o grupo.
— Por que você o recusou?
— Nenhum motivo em particular. Só não me interessa.
No tempo em que proferiu essa frase, ela havia mudado o olhar da janela para mim, agora segurando firmemente a arma de elástico de novo.
— Pode ser, Morishita, que você… sobre Satonaka…?
Pssht!
Uma picada surgiu na minha bochecha esquerda quando um elástico me atingiu sem piedade.
— Que pena, Ayanokoji Kiyotaka. Pensou que me veria toda corada e atrapalhada aqui?
— Pensei por um segundo, mas parece que não é o caso… Além disso, isso dói e é perigoso — murmurei, esfregando a bochecha.
— Simplesmente não tenho interesse nele. Além disso, rostos excessivamente andróginos não são meu tipo. Até mesmo um rosto horrivelmente distorcido como o seu, Ayanokoji Kiyotaka, é melhor — pelo menos posso oferecer um pouco de piedade. Está feliz em saber que gosto de você?
— Tenho quase certeza de que a tristeza superou a felicidade de longe — respondi. — Desculpe, mas vou embora.
— Fugindo? — ela provocou, pontuando as palavras com uma rajada de elásticos. Eu me abaixei e corri pelo corredor, escapando do fogo rápido dela.
Assim que saí, peguei meu celular e li a mensagem de Ichinose novamente.
PARECE QUE A HOSHINOMIYA-SENSEI QUER TE VER, AYANOKOJI-KUN.
Recebida a mensagem, me dirigi ao prédio especial que ela especificara.
O sol mal havia desaparecido no horizonte. Nesse horário, o prédio especial estava quase sempre deserto.
Dois anos atrás, aquele mesmo lugar foi palco de um incidente — Sudo fora pego na armadilha de Ryuen, emboscado em um ponto cego das câmeras de vigilância. Desde então, ainda mais câmeras foram instaladas nesse prédio.
Hoje em dia, quase todos os cantos do campus estavam sob olhos atentos, exceto espaços privados como vestiários e banheiros. Alguns alunos achavam a vigilância sufocante, mas para a maioria era uma rede de segurança bem-vinda, um escudo silencioso contra problemas que poderiam se espalhar.
Quando cheguei ao ponto de encontro, a professora Hoshinomiya não estava à vista. Sem nada para fazer, me voltei para a janela e deixei meu olhar percorrer o pátio da escola, matando o tempo. Não planejava ficar ali por muito tempo — pretendia me encontrar com Hiyori depois.
Lá fora, podia ver alunos se dirigindo aos portões, enquanto outros iam para suas salas de clube, conversando em pequenos grupos.
— Atividades de clube, hein — murmurei para mim mesmo.
No fim, nunca participei de nenhum. Mas se pudesse recomeçar como calouro, talvez tentasse. Minha mentalidade havia mudado o suficiente para que a ideia não parecesse tão estranha.
A ponto de, se perguntado: "Está satisfeito como aluno?", eu poderia acenar com a cabeça, embora com alguma hesitação.
Afastei o olhar da janela e olhei pelo corredor. Momentos depois, o som de passos rápidos com salto alto ecoou pelo hall. Uma figura familiar surgiu, nossos olhos se encontrando antes dela acenar levemente e se aproximar com um sorriso fácil.
— Desculpe por fazer você esperar, Ayanokoji-kun. Chamando-me para um lugar como este, você precisava de algo?
— Você foi quem me chamou aqui, Sensei.
Ela inclinou a cabeça, com um tom brincalhão na voz.
— Do que está falando? Não há como uma professora chamar um aluno para um lugar assim. Ouvi da Ichinose-san que você queria me ver, Ayanokoji-kun, então vim.
Estou no mesmo barco, mas questioná-la mais parecia inútil.
Os olhos da professora Hoshinomiya claramente sorriam.
Enquanto eu ainda tentava entender o que ela realmente queria, ela se aproximou, muito mais perto, até que seu corpo tocou levemente o meu.
— O que você pensa que está fazendo?
— "O que eu penso?" Do que está falando?
Sua voz caiu a quase um sussurro ao se inclinar por vontade própria, ignorando minha pergunta e fingindo inocência. Antes que eu pudesse reagir, ela envolveu meu braço com o seu.

— Ayanokoji-kun, você vai ter que se esforçar muito no próximo ano — disse com um sorriso astuto. — Então acho justo te dar um pequeno serviço… assim.
Chamar esse tipo de comportamento de "serviço" era típico dela, mas para uma professora, era um ato totalmente fora dos limites.
Ainda assim, não tinha intenção de repreendê-la ali, nem de forçar meu braço para fora do dela. O mais importante era não tomar a iniciativa.
— Você continua astuta como sempre, Hoshinomiya-sensei — disse, escolhendo palavras em vez de ação para frear seu avanço.
— Eh? O que você quer dizer com "astuta"?
— Eu já tinha uma suspeita sobre a natureza deste exame — continuei —, mas a sua pequena façanha a confirmou. Nesta semana, a escola vai nos avaliar pelo "comportamento na vida escolar diária" — atrasos, faltas, conduta geral. Normalmente, essas coisas só causam pequenas variações mensais, mas agora vão pesar muito nas avaliações. Com as inúmeras câmeras de vigilância nos corredores, o corpo docente pode revisar facilmente as imagens para nos avaliar. E se me virem em contato próximo com um professor do sexo oposto, inevitavelmente isso vai prejudicar minha avaliação.
Não faz muito tempo, ela estava pronta para usar sua autoridade para levar a classe à vitória por qualquer meio, quase beirando a imprudência. Para evitar isso, eu havia contado a ela sobre minha aliança com Ichinose e os termos envolvidos, o que foi suficiente para mantê-la um pouco contida. Mas, no fundo, seu verdadeiro desejo permanecia inalterado: voltar rapidamente às posições de destaque e ver a queda da classe do Chabashira-sensei.
Ela soltou uma risadinha.
— Ayanokoji-kun, você está lendo demais nessa situação. Somos uma equipe, não somos? Por que eu faria algo para te atrapalhar? Além disso, nem sabemos se sua suposição sobre o exame está correta.
— Claro, não tenho prova definitiva — admiti com calma. — É apenas uma impressão. Mas não se preocupe, mesmo que você tentasse diminuir minha avaliação intencionalmente, isso não afetaria nossa aliança.
Minhas palavras eram calmas, quase burocráticas. E, enquanto eu falava, o sorriso dela se aprofundou, como se ela entendesse exatamente o que eu queria dizer.
— Que bom ouvir isso. Então, você está de acordo em deixar minha classe vencer desta vez, certo? Só dar um pouco de glória para uma classe que está quase empatada?
— Se pudéssemos controlar totalmente o resultado, talvez. Mas este é um concurso de quatro vias. Se nossa classe receber uma avaliação negativa, poderíamos acabar em último lugar. Não há garantia de que a classe da Ichinose ficará em primeiro.
— Ah, vamos lá. Não é aqui que seus talentos deveriam brilhar, Ayanokoji-kun? Você só precisa fazer minha classe ficar em primeiro e colocar a sua em segundo. Fácil.
— Infelizmente — disse secamente —, não tenho intenção de interferir ou ajustar os resultados.
— Por quê? Vai simplesmente ignorar o risco da Classe A ou Classe B vencer?
— Desta vez, até isso seria aceitável.
Os olhos dela se estreitaram.
— O que, você está dizendo que cinquenta pontos de classe não valem a pena pegar? Isso é—
— Não é isso — interrompi. — Apenas julgo que esta situação não vale a pena para revelar o verdadeiro valor da nossa aliança. Talvez você devesse começar acreditando na sua própria classe.
Há dois anos, a classe da Ichinose era um modelo de disciplina, tão boa quanto, ou até mais, que a da Sakayanagi. No entanto, a Hoshinomiya-sensei parecia não suportar a realidade de estar na Classe D. Ela estava sempre tramando, sempre procurando formas de mudar o equilíbrio, custe o que custar. Eu entenderia se fosse pura frustração, mas nesse caso, essa abordagem ameaçava sufocar a maior força da classe dela.
— Por favor, aprenda a cuidar deles também. Até o Chabashira-sensei consegue fazer isso.
—!
No momento em que mencionei o nome de sua rival de longa data, sua expressão mudou. Ela parou no lugar, afastando o braço do meu.
— Eu posso confiar em você… certo? — Perguntou baixinho.
O significado dessas palavras era simples, mas continha uma ameaça: se eu a traísse, ela poderia atacar a qualquer momento.
— Olhe para nossa aliança no longo prazo, não apenas no curto. É tudo que posso te dizer agora.
— Entendi… Bem, pelo menos você nos ajudou no exame especial anterior. Então, por enquanto… vou apenas observar.
Sua natureza cautelosa ainda estava firme. É bom que a Hoshinomiya-sensei permaneça vigilante e não tenha baixado a guarda. Mesmo assim, não havia necessidade de forçar uma vitória. Se a avaliação realmente dependesse de comportamento e atitude diários, interferir demais seria arriscado e problemático. Para classes como a minha ou a da Ichinose, onde comportamentos disruptivos já eram raros, criar estratégias desnecessárias só tornaria tudo mais perigoso. A estratégia mais segura e eficaz era deixar todos seguirem como sempre.
*
Apenas cerca de trinta minutos haviam se passado desde que o sinal final tocou. Eu me encontrava na biblioteca ainda em uma hora relativamente cedo. Houvera alguns imprevistos, mas finalmente chegara a hora. O início de um novo exame durante a Golden Week, convites repetidos após as aulas e encontros casuais. Já fazia bastante tempo desde que Ishizaki me disse para encontrar Hiyori.
No momento em que entrei na biblioteca, um cheiro familiar me saudou: um aroma suave de papel, único deste lugar. Será que a Hiyori já está aqui?
A biblioteca da escola era enorme, com prateleiras altas e corredores largos, tornando tão difícil encontrar alguém quanto localizar um livro específico. Quando olhei para a bibliotecária na entrada, ela me deu um sorriso caloroso e silenciosamente levantou o dedo. A direção que ela apontou era onde os romances de mistério estavam alinhados. Parecia que a pessoa que eu procurava estava lá.
Caminhei lentamente naquela direção, ainda a uma boa distância, quando ela apareceu, surgindo de trás de uma prateleira alta. Por um breve e delicado momento, na biblioteca quase vazia, nossos olhos se encontraram. Mas o instante passou em um piscar de olhos. Ela se virou sem dizer uma palavra, desaparecendo nas sombras entre as prateleiras.
Senti que nossos olhos se cruzaram… mas ela não me percebeu? Chamar por ela ali pareceria uma intrusão no silêncio, então segui silenciosamente para onde ela havia desaparecido. Mas, ao chegar, ela não estava lá.
Comecei, então, a procurar nos estreitos espaços entre as prateleiras, meus passos engolidos pela quietude da biblioteca. Um, dois, três… Onde ela poderia estar? Certamente não teria ido tão longe. E então, lá estava ela. No fim da prateleira oposta à minha, a figura de Hiyori surgiu na minha linha de visão.
Nossos olhos se encontraram. Eu tinha certeza disso. Mas quase imediatamente, seu olhar desviou, e ela se escondeu atrás de outra estante. Sem dúvida, ela me viu. O que só poderia significar uma coisa… Estaria ela me evitando? Será porque demorei a ir vê-la? Ou porque não me transferi para a classe do Ryuen?
Esses pensamentos giravam na minha cabeça enquanto eu começava a me aproximar. Se ela pretendia continuar fugindo de mim na biblioteca, eu não teria escolha a não ser desistir. Afinal, não posso encurralar alguém que não quer me ver.
Esperando que não chegasse a esse ponto, caminhei até o último lugar onde a havia visto. Mas ela havia sumido novamente. Para onde ela foi agora…?
Então, quase como se estivesse se perguntando onde eu havia ido, Hiyori apareceu com a cabeça por trás de uma prateleira próxima. Ela estava a menos de dois metros, perto o suficiente para que, com um passo à frente e a mão estendida, eu pudesse alcançá-la.
—Hiyo—
Comecei, mas antes que pudesse terminar, ela se escondeu novamente. Embora desta vez não tivesse se afastado; ainda podia ver sua mão repousando na estante, e o contorno de seu uniforme espiando por trás dela.

— Eu estava te incomodando? — Perguntei baixinho.
Houve um momento de silêncio. Então, lentamente, seu rosto surgiu novamente.
— Você… veio aqui procurar um livro que queria ler? — Perguntou suavemente.
Por enquanto, ao menos, obtive uma resposta. Isso já foi suficiente para me deixar aliviado.
— Não, eu vim aqui hoje para te ver, Hiyori.
……
O significado das minhas palavras deveria ter chegado até ela sem dúvida, mas ela permaneceu meio escondida atrás da estante alta. Lembrei-me do que Ishizaki me disse há pouco:
"Certifique-se de ir ver a Shiina em breve. Ela anda meio pra baixo, talvez não tanto quanto eu, mas ainda assim."
E então, houve aquele encontro constrangedor quando acabamos no mesmo elevador alguns dias atrás. Por que eu não tinha ido vê-la antes? Eu podia me convencer de que estava ocupado, que havia motivos… mas a verdade era mais simples: eu estava a evitando, fugindo da culpa pela transferência de classe. E agora, eu me arrependia.
— Você ainda se incomoda — perguntei cuidadosamente — pelo fato de eu ter recusado seu convite para entrar na sua classe… e me transferido para a Classe C?
Antes de podermos ter uma conversa adequada, a parede desnecessária entre nós precisava cair. Por isso decidi enfrentar a situação de frente. A compostura de Hiyori se quebrou quase instantaneamente. Seus olhos, que tentavam encontrar os meus, desviaram-se, e seus lábios se apertaram firmemente.
— Eu… não posso dizer que não me incomoda. Fiquei me perguntando se, ao te convidar, acabei te afastando, Ayanokoji-kun…
— Isso não é nada como você. Você deveria saber que algo assim é impossível, certo?
A Hiyori que eu conhecia era sempre calma, inabalável, alguém de coração firme e olhar claro, capaz de enxergar através do ruído.
Eu presumia que ela entenderia, sem que eu precisasse dizer uma palavra, que minha mudança da Classe A para a Classe C tinha um propósito próprio, algo que eu só poderia alcançar lá. Só porque eu tinha recebido um convite para transferência, não havia chance de eu me afastar dela. Mas ainda assim, o fato permanecia: eu tinha demorado demais para ir vê-la.
— Quero me desculpar. Por não ter aceitado a transferência para a Classe B e por ter demorado tanto para te explicar o motivo. Esse atraso só causou mal-entendidos.
Hiyori ouviu em silêncio, absorvendo minhas palavras antes de balançar a cabeça.
— Não… Ayanokoji-kun, você não fez nada de errado — disse, ainda balançando a cabeça. — Toda essa questão da transferência… foi só eu criando expectativas egoístas, só isso. E mesmo que eu tenha pensado… talvez a razão de você não ter vindo me ver fosse algo da minha parte… ainda assim, não consegui me aproximar de você. Por favor… deixe-me me desculpar por isso.
À medida que essas palavras saíam de seus lábios, a parte do corpo dela ainda escondida atrás da estante começou a surgir lentamente. Então, com uma lentidão deliberada, ela abaixou a cabeça, cada vez mais, até parecer que não poderia se curvar mais.
Mesmo que Hiyori não tivesse nada pelo que se desculpar. Dito isso, continuar com um vai-e-vem de desculpas ali não levaria a nada produtivo.
— Eu pensei… — começou ela, a voz tremendo levemente —, pensei que já tinha me preparado para isso…
— Se preparar?
— Que você e eu estamos em classes diferentes agora — ela continuou, olhando para o chão. — Que talvez… não devêssemos mais conversar tão casualmente. Que eu deveria encerrar essa parte do nosso relacionamento. Mas agora… falando com você assim… eu não consigo… — Sua voz se perdeu, engolida pela hesitação.
Então era isso: ela estava tentando cortar nossa amizade, tentando se endurecer para me ver apenas como um oponente. Ao ouvir isso, senti uma onda de alívio me invadir. Eu havia chegado a tempo.
— Se você não se importar, Hiyori — disse, encontrando seu olhar —, que tal conversarmos sobre o mês que passamos separados? Tenho bastante tempo hoje.
— Isso é mesmo… ok?
— Claro — respondi sem hesitar. — Eu vim aqui hoje para te ver e conversar com você, Hiyori.
Quando transmiti meus sentimentos sinceros, pela primeira vez naquele dia, vi um sorriso gentil florescendo em seu rosto.
*
Encontramos uma mesa vazia na silenciosa biblioteca e nos sentamos frente a frente. As cadeiras rangiam suavemente contra o piso polido enquanto nos acomodávamos. Por um momento, nenhum de nós disse muito, como se estivéssemos medindo o espaço entre nós. Então, lentamente, começamos a falar, pequenos fios de conversa se entrelaçando sobre a mesa, tentando fechar o hiato de um mês que havia se aberto entre nós.
No começo, a voz de Hiyori ainda carregava um traço de formalidade, suas palavras cuidadosas e medidas. Mas, gradualmente, seu tom se suavizou, assumindo a cadência gentil e tranquila à qual eu já estava acostumado.
— Então… mesmo sendo terceira-ano, você ainda é a mesma leitora assídua de sempre?
— Sim — respondeu com um leve sorriso. — Na verdade, só ontem à noite, terminei outro livro.
Ela olhou para as prateleiras cheias de romances de mistério, acrescentando que tinha acabado de devolvê-lo mais cedo.
—A h, e na verdade, fiz mais um amigo de leitura.
Seus olhos se estreitaram de alegria enquanto ela juntava as palmas das mãos.
— Desde que nos tornamos terceiranistas, Kaneda-kun começou a me visitar com frequência por aqui.
— Kaneda, é? Ele parece alguém que lê bastante, então não posso dizer que estou muito surpreso…
Ainda assim, eu nunca tinha visto Kaneda na biblioteca antes do fim do nosso segundo ano. Por outro lado, se ele pensa em ir para a universidade, a biblioteca é o ambiente perfeito para estudar.
— E lá está ele.
Hiyori, que estava voltada para a entrada, notou a chegada de Kaneda e acenou com a mão. Me virei e, de fato, ele estava ali, parecendo levemente surpreso ao me ver. Levantei a mão em um cumprimento casual e, após uma breve pausa, ele se aproximou.
— Saudações, Shiina-shi, parece que me encontro aqui novamente hoje.
Um leve sorriso surgiu em seus lábios. Em suas mãos, a prova do meu palpite anterior: um livro da biblioteca acompanhado de um texto acadêmico denso.
— Você realmente ama livros, não é, Kaneda-kun? — comentou Hiyori calorosamente.
Ficava claro por suas palavras que ele visitava a biblioteca com frequência. Eu cruzei seu olhar e indiquei com os olhos o assento ao meu lado; ele assentiu educadamente antes de se sentar.
— Bem, sim. Ouvi dizer que você costumava vir aqui com frequência também, Ayanokoji-shi. Mas, ultimamente, parece que não tem aparecido.
No último mês, exatamente desde que Kaneda começou a frequentar a biblioteca, eu não apareci.
— Parece que estamos trocando de lugar. Acho que teremos mais chances de nos encontrar daqui em diante.
— Entendo. Como colega amante da leitura, isso é simplesmente maravilhoso.
As palavras eram educadas, mas sua expressão não parecia especialmente alegre. Era uma recepção formal, nada mais. Naturalmente, minha presença ou ausência fazia pouca diferença para ele. A única pessoa realmente contente com a adição de um novo amigo de leitura era Hiyori, sentada à minha frente.
— De qualquer forma — continuou Kaneda —, parece que você tem estado ocupado. Sua transferência da Classe A para a Classe C… devo admitir, fiquei um pouco — não, bastante surpreso… hm?
Suas palavras pararam no meio, enquanto uma sombra se projetava sobre nossa mesa. Olhei e encontrei a bibliotecária ali.
— Desculpem interromper a conversa de vocês três — disse ela. — Shiina-san, sei que é repentino, mas poderia me ajudar com algo? Não deve demorar.
— Se você não se importar, claro — respondeu Hiyori com sua habitual gentileza. — Por favor, esperem um pouco, ok? Vou recomendar alguns livros depois.
Com isso, ela se afastou com a bibliotecária, os passos silenciosos no carpete.
Ficamos apenas nós dois, Kaneda e eu, pessoas que não eram particularmente próximas. A súbita ausência de nossa conhecida comum deixou o ar levemente constrangedor. Um sentimento que aprendi a reconhecer ao longo do tempo nesta escola.
Decidi tomar a iniciativa.
— Kaneda, que tipo de livros você costuma ler?
Sua resposta foi rápida e direta.
— Não sou muito bom nesse tipo de conversa fiada sem sentido.
A "bola" que eu tinha lançado para ele foi capturada e imediatamente arremessada em outra direção. Eu pensei que era uma pergunta inofensiva para alguém que gosta de livros, mas claramente ele não a viu assim. Ou talvez meu lançamento tenha sido desajeitado.
— Foi mal — disse. — Se a forma como perguntei te ofendeu, peço desculpas.
Talvez eu tivesse me superestimado, achando que poderia manter o clima leve facilmente.
— Não — disse ele após uma pausa. — Devo me desculpar pela minha grosseria. Não há necessidade de parecer tão abatido.
— Eu só estava tentando manter a conversa, de verdade.
— Consigo perceber isso — respondeu ele.
— Se você não quer conversar comigo, não precisa se forçar.
— De algum jeito, você realmente me desestabiliza. Não é que eu não goste de conversar com você, Ayanokoji-shi, mas… oportunidades de falarmos frente a frente assim são raras. Bem, acho que comecei a pensar em coisas demais. Até Shiina-shi voltar… se não se importar, que tal conversarmos um pouco?
Ver Kaneda adotando uma postura mais positiva me deixou um pouco contente.
— Se houver algo que você queira saber, fique à vontade para perguntar — disse. — Claro, não posso responder ilimitadamente sobre assuntos de classe.
Eu sabia que Kaneda entendia os limites, mas quis deixar claro mesmo assim. Ele tirou os óculos, soprou suavemente sobre as lentes e puxou um pano dobrado do bolso. Poliu cada lado com movimentos lentos e deliberados antes de recolocar.
— Você e Shiina-shi… parecem ser próximos — disse finalmente.
— Hm? Ah, somos amigos de leitura, assim como você. Ela é alguém com quem posso conversar.
— Amigos de leitura, é? Talvez. Mas a expressão que vi no rosto dela antes, quando olhei da entrada, era algo que não via há um mês. Fiquei sinceramente surpreso. Fazia tanto tempo desde que a vi sorrir genuinamente assim…
— Talvez seja culpa minha. Pedi desculpas à Hiyori antes, e ela me perdoou. Então talvez você veja esse sorriso novamente, tanto na classe quanto aqui na biblioteca.
Omiti a parte sobre o convite de transferência de classe. Kaneda era de uma classe rival e tinha laços próximos com Ryuen. Não seria agradável falar sobre isso com ele, e eu também não tinha como prever como a informação poderia se espalhar.
— Você percebe o quão incrível isso é?
— Incrível?
— Você não percebe? Ou talvez… está apenas fingindo que não? Diga-me, Ayanokoji-shi — já pensou em se considerar sortudo?
Havia um tom investigativo em sua voz, como se estivesse me testando.
— Sortudo? Isso é um termo amplo — não é fácil de responder.
— Minhas desculpas, deixe-me ser mais claro — disse ele, ajustando levemente a postura. — Mesmo do ponto de vista de outro homem, sua aparência é excepcional. Você é mais alto que a média, bem proporcionado sem exalar intimidação desnecessária, e carrega uma certa limpeza que atrai as pessoas. Você costumava namorar o Karuizawa-shi e agora… até há rumores ligando você a Ichinose-shi. Quanto mais um homem chega a conhecê-lo, mais não consegue evitar sentir tanto admiração… quanto uma pontada de inveja pela distância entre você e eles.
As palavras de Kaneda foram inesperadas, tanto que me peguei inclinando-me, curioso apesar de mim mesmo.
— Não é apenas a aparência — continuou ele —, academicamente também, você agora é citado como o melhor aluno de todo o nosso ano por aqueles que, por si só, são considerados de alto desempenho. Eu costumava me orgulhar de pensar que minhas habilidades poderiam igualar as suas. Agora, sinto vergonha disso. E depois há sua capacidade física. Desde abril, em todas as aulas de Educação Física, você tem obtido resultados excepcionais. Para alguém como eu, que é péssimo em esportes, mesmo que ficasse de cabeça para baixo, não chegaria nem perto do seu potencial.
Eu jamais imaginaria que Kaneda Satoru pudesse falar com tanta eloquência e paixão, ou por tanto tempo. Mesmo enquanto me elogiava, ele se rebaixava em igual medida. A verdade é que sua posição no ano não era desprezível: ele facilmente se colocaria nos trinta por cento superiores em capacidade geral. Não havia necessidade de se diminuir assim. E ainda assim, ele continuava, elevando-me continuamente.
— E agora, você finalmente revelou a força que manteve escondida por dois anos. Você assumiu a liderança da Classe C para reconstruí-la após a saída da Sakayanagi-shi. Até mesmo essa ponta perigosa de seu raciocínio, não, talvez especialmente isso — deve atrair as pessoas. Você é a própria encarnação de um herói. Eu realmente invejo você.
— Inveja de mim? — respondi. — Sou apenas um traidor que abandonou a Classe A. E o fato de ter contido minha força todo esse tempo, objetivamente, é mais provável de ser visto como um vício do que como uma virtude.
— Um anti-herói — ele retrucou com uma risada seca e leve — ainda é um herói.
Ele olhou por cima do ombro. Seguindo seu olhar, avistei Hiyori em um computador, trabalhando ao lado da bibliotecária. Ela ainda não voltaria por algum tempo.
Pelas palavras e pelo jeito dele, percebi algo: os sentimentos de Kaneda por mim eram muito mais profundos do que eu imaginava. Eu já tinha previsto muitas reações à minha transferência, mas a dele estava entre as mais intensas. No início, pensei que seus comentários derivassem da lealdade ao Ryuen, líder de sua classe. Mas… não era isso. Uma coisa, porém, era certa — Kaneda não gostava de mim.
— Ah… minhas desculpas. Parece que falei demais.
Parecia que Kaneda, também, entendia como suas próprias palavras seriam percebidas pelo outro.
— Não há nada pelo que se desculpar — respondi de forma direta. — Cabe a cada pessoa decidir como vê o outro.
— Até essa parte sua é tão irritantemente incrível, Ayanokoji-shi. Mesmo que você esteja preparado para ser detestado, não deveria ser agradável ser realmente detestado por alguém. Ou será que você simplesmente não se importa com a minha opinião porque sou apenas eu?
— Não é isso — disse. — Não importa com quem estou falando, eu responderia da mesma forma.
A verdade era simples: eu sempre agi sabendo que algumas pessoas não gostariam de mim. Era algo esperado.
— Mesmo que essa pessoa fosse a Shiina-shi? — Perguntou Kaneda, com o tom mudando levemente.
Ele escolheu bem o exemplo. De todos os alunos desta escola, ela certamente era uma das mais apropriadas para mencionar. Estava pronto para responder imediatamente, mas as palavras emperraram na garganta.
Não me importaria se Hiyori não gostasse de mim. Sim, visto de um nível fundamental, isso era correto. Foi com pleno conhecimento desse futuro que recusei o convite de Hiyori e me transferi para a Classe C. A razão de não ter ido me desculpar imediatamente era porque precisava priorizar outras questões. O que ela sentia era uma preocupação secundária ou terciária, colocada baixo na minha lista de prioridades.
— Esqueça — disse Kaneda suavemente, antes que eu pudesse responder. — Parece que fiz uma pergunta indelicada.
Sem esperar minha resposta, ele empurrou a cadeira para trás e se levantou.
— Vou indo por hoje.
— Tem certeza? Hiyori parecia querer que você esperasse — observei.
— Tudo bem. Esteja eu aqui ou não, não faz diferença agora. Peço desculpas por monopolizar a conversa antes.
— Não é nada. Não se preocupe.
— Entendo. Então agradeço sua generosidade.
Com um ar leve, mas inconfundivelmente resoluto, seus passos desapareceram no silêncio da biblioteca enquanto ele se afastava. Pouco tempo depois, Hiyori voltou, os olhos se movendo aqui e ali, como se procurasse alguém.
— Oh? Você está sozinho, Ayanokoji-kun? — Perguntou, inclinando a cabeça. Aparentemente, Kaneda não havia falado com Hiyori ao sair, embora ela estivesse próxima da entrada.
— Sim. Ele disse que tinha um assunto urgente e se foi. Pediu que eu te dissesse que voltará em breve.
— Entendo. Isso é algo para se esperar ansiosamente.
Vendo seu sorriso gentil, parecia que ela realmente aguardava a próxima visita dele. Por algum motivo, eu havia me convencido de que ela passara o último mês inteiramente sozinha. Mas a verdade era diferente: ela vinha, aos poucos, ampliando seu círculo, reservando tempo para passar com Kaneda aqui na biblioteca.
Pensando bem, não havia nada de estranho nisso. Assim como eu havia mudado de classe, feito novos amigos e gradualmente aumentado meu círculo de contato, Hiyori também vinha mudando desde o dia em que nos conhecemos. Em algum momento, ela conheceu novas pessoas ao longo do caminho e se aproximou delas.
O que começou como meros colegas, ou a conexão casual entre seniores e juniores, poderia se aprofundar em amizade… e eventualmente em uma companhia próxima. Nos dias que viriam, pessoas muito mais próximas a ela do que eu naturalmente apareceriam em sua vida, uma após a outra. Talvez até amanhã, alguém poderia ocupar aquele assento vazio ao lado dela.
…
Enquanto ela baixava os olhos para o livro nas mãos, me tornei consciente dos meus próprios pensamentos e fiquei levemente surpreso com eles. Quem se aproxima de quem, isso deveria ser apenas um dado para mim. Um detalhe a ser avaliado apenas por sua utilidade potencial.
E ainda assim, eu me pegava em devaneios inúteis e egoístas. Tentava imaginar alguém invisível, sentado ali ao lado de Hiyori. Não conseguia explicar — por que eu não podia mais vê-la da mesma forma que via os outros estudantes. Mesmo sexo, sexo oposto. Amigo, melhor amigo.
Esses rótulos nunca determinaram como interagia com os outros. Eu falava com muitos alunos, livre das restrições de gênero ou do grau de proximidade. Se nossos interesses combinavam ou não, se parecia provável nos darmos bem, esses fatores existiam, mas nunca determinavam fundamentalmente se eu aceitaria ou evitaría alguém.
E ainda assim… com tanta interferência nos meus pensamentos, eu não podia mais negar. Hiyori não se encaixava exatamente na estrutura que eu vinha usando até então. Não era como mover conscientemente alguém de uma categoria para outra, como se por escolha. Era mais como algo que estava do lado certo até ontem e que, sem que eu percebesse, havia deslizado silenciosamente para o lado esquerdo.
Estar no mesmo espaço, lendo e compartilhando livros, já me preenchia de uma sensação de realização. Se eu fosse descrever em palavras, seria "uma sensação de felicidade". Essa expressão provavelmente é a mais próxima da realidade. Não é que passamos um tempo especialmente longo juntos, nem trocamos muitas conversas em um curto período. Mas, pensando bem, eu naturalmente sentia uma sensação de proximidade com ela desde cedo.
O nome dela também — não comecei a chamá-la de Hiyori porque ela pediu. Não foi uma escolha calculada; simplesmente aconteceu, naturalmente. Antes que eu percebesse, meu olhar estava fixo em seu rosto enquanto ela olhava para o livro. Ela não percebeu por um tempo. Então, em um momento fugaz e desprevenido, levantou o olhar, e nossos olhos se encontraram sem esforço, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
— Está tudo bem?
— Sim.
Meu coração se acalma ao olhar para o rosto de Hiyori. Mas dizer algo assim só a incomodaria, sem dúvida.
Algum tempo depois, já passava das seis da tarde, Hiyori e eu deixamos o santuário silencioso da biblioteca e saímos pelos portões da escola.
— Posso passar na biblioteca novamente amanhã? — Perguntei enquanto caminhávamos.
— Claro que pode. Você nem precisa da minha permissão, sabe? — disse ela, talvez divertida por eu sequer pensar em pedir, cobrindo a boca com a mão e soltando uma risadinha suave.
— Pode ser porque penso na biblioteca como se fosse sua casa.
— Bem… não posso negar isso. A menos que tenha outros planos, estou lá todos os dias.
Se ela não estivesse ali, eu quase acreditaria que ela havia pegado um resfriado. Esse pensamento trouxe de volta a memória de uma época em que Hiyori havia parado de frequentar a biblioteca por um tempo.
Era mais ou menos na época em que a notícia de que Karuizawa e eu estávamos saindo havia se espalhado pela escola. Certamente éramos apenas parceiros de leitura, mas ela ainda assim tinha sido atenciosa o suficiente para ajustar suas visitas, evitando silenciosamente os momentos em que eu poderia estar por lá.
— Ah—
Sua suave exclamação puxou meus olhos na mesma direção que os dela. Um pequeno carrinho estava se movendo lentamente em direção ao portão principal, suas rodas rangendo sobre o pavimento.
O leito do carrinho estava cheio de flores em um riot de cores — vermelhos vivos, amarelos ensolarados, rosas pálidos e brancos puros, tão vívidos que se destacavam contra a luz do fim de tarde.
Paramos para observá-lo passar. Mas a mulher de meia-idade que puxava o carrinho nos notou e, sorrindo, parou bem à nossa frente.
— Hoje me deixaram vender aqui como uma ocasião especial. Gostariam de dar uma olhada?
— Está tudo bem? — Perguntou Hiyori.
— Claro — respondeu a mulher calorosamente.
Os olhos de Hiyori se estreitaram de alegria enquanto ela se aproximava do carrinho. Eu me juntei a ela, olhando para as flores cuidadosamente arrumadas.
O Keyaki Mall não tinha loja de flores. Se você quisesse dar flores de aniversário ou para alguma celebração, ou comprava artificiais na loja de departamentos ou as pedia online. Por isso, vê-las assim, frescas e arrumadas em um carrinho, era revigorante.
Flores cortadas, como mosquitinhos (baby’s breath), balançavam suavemente com a brisa, ao lado de hortênsias em vasos, pesadas de flores. Alguns vasos cuidadosamente organizados completavam a exibição.
— São lindas…
Hiyori, ao meu lado, murmurou baixinho para as flores, os olhos percorrendo cada uma delas. Ficava claro que ela tinha dificuldade em decidir, os dedos delicados pairando como se traçassem linhas invisíveis entre cada opção.
Esperei em silêncio, deixando seus pensamentos seguirem seu curso. Depois de um tempo, ela pareceu se decidir. Sua mão se estendeu, os dedos parando logo acima de uma flor delicadamente embrulhada.
— Posso ficar com esta?
Era uma única papoula, pétalas carmesim dobradas cuidadosamente em torno de seu centro escuro, embrulhada com cuidado.
— Só uma?
— Sim. Acho que é justamente por ser apenas uma que ela é tão bonita — respondeu com um pequeno sorriso confiante.
— Flores não se medem em quantidade, jovem — comentou a florista com um sorriso caloroso, explicando que isso se chamava ippon-maki — um embrulho de caule único.
— Então vou levar uma dessas — disse, tirando meu celular para pagar.
— Ah — não, Ayanokoji-kun — protestou Hiyori, atrapalhada. — Eu vou comprar…
— Está tudo bem, deixe-me dar de presente.
Enquanto ela olhava para mim, acrescentei.
— É um pedido de desculpas por te fazer esperar um mês. Embora… não seja nem de longe suficiente para compensar.
Uma única papoula. Menos de 400 pontos. Uma compra tão barata que mal podia ser chamada de presente, mas sua expressão suavizou.
— Não, não — disse ela, inclinando a cabeça. — Estou realmente feliz.
Quando levantou o rosto novamente, pensei ter visto um leve rubor tocar suas bochechas. Talvez fosse a súbita luz do pôr do sol, tingindo o céu de laranja e vermelho profundos.
— Então aceito com prazer — murmurou, tão suavemente que eu poderia ter perdido se não estivesse tão perto. Quando o pagamento foi feito, a florista me entregou a flor em vez de Hiyori, os olhos alternando entre nós antes de oferecer um educado.
— Obrigada.
Ficamos ali, quietos, assistindo o carrinho se afastar, o rangido das rodas diminuindo até desaparecer da vista.
Quando o carrinho de flores se foi, a rua ficou silenciosa novamente; éramos apenas nós dois. Estendi a papoula que estava carregando, as pétalas escarlates tremendo levemente na brisa da tarde.
— Muito obrigada.
— Não precisa agradecer. É só eu me permitindo uma desculpa egoísta para me desculpar.
Foi o que eu disse, mas na verdade era um pouco diferente. Eu só queria dar um presente para Hiyori.
Eu só queria vê-la feliz.
O impulso foi súbito, um instinto que me levou a entregar a ela está papoula.
Ela segurou a pequena flor junto ao peito, os dedos enrolados protetores ao redor do caule, e olhou diretamente para mim. Quando nossos olhos se encontraram pela primeira vez, havia pura alegria em seu rosto, um sorriso quente e silencioso.
Mas enquanto mantínhamos o olhar, aquele sorriso mudou, lentamente, quase imperceptivelmente, para uma expressão que eu não esperava.
—Por que você está chorando?
Hiyori, cujos olhos brilhavam levemente de lágrimas, talvez não tivesse percebido isso. Seus dedos pálidos e delicados passaram rapidamente pelos cantos dos olhos, enxugando a umidade.
— Para mim, até te conhecer, Ayanokoji-kun, hoje deveria ser apenas um dia comum. O fato de agora se tornar um momento tão cheio de felicidade e realização que parece irreal, como se eu pudesse acordar a qualquer momento…
Sua voz, saída do coração, tremia enquanto continuava.
— Estou tão feliz… tão, tão feliz. Que não nos afastamos, Ayanokoji-kun.
Curiosamente, eu sentia exatamente o mesmo que Hiyori.
— Eu também. Este deveria ser apenas mais um dia, mas, em vez disso, tornou-se algo realmente significativo.
Se não havia falsidade nas palavras de Hiyori, isso significava que nossos sentimentos eram mútuos. Essa sincronização, que deveria ser insignificante, parecia estranhamente reconfortante e me deixou feliz por algum motivo.
Sob o brilho carmesim do pôr do sol, gravei sua imagem na memória: Hiyori segurando a papoula perto do corpo, os olhos brilhando na luz que se apagava.
Para que, não importa quanto tempo passe, eu pudesse recordá-la sempre que quisesse.
*
Quando voltei ao saguão do dormitório, a visão familiar de Hashimoto me recebeu, jogado no sofá, com o celular na mão. No momento em que seus olhos pousaram em mim, ele guardou o aparelho no bolso e se levantou.
— Desculpe, Shiina, preciso pegar o Ayanokoji — disse ele casualmente, com um tom leve, mas sem deixar espaço para discussão.
Hiyori não pareceu nem um pouco incomodada com sua brusquidão. Ela se curvou educadamente, os lábios se curvando em um sorriso suave, e me acenou rapidamente antes de entrar no elevador. As portas se fecharam com um suave toque sonoro.
Hashimoto ficou ali, sorrindo de orelha a orelha, acenando de volta para ela.
— Nos esbarramos com frequência — comentei. — Você estava me esperando?
— É, mais ou menos — disse ele, já se virando em direção à saída. — Vamos dar uma volta.
Sem me dar muita escolha, ele me conduziu para fora do saguão. Caminhamos por um caminho lateral tranquilo, longe da rota usual entre os dormitórios e a escola.
— Sabe, você é muito tolerante com a Shiina. Na verdade, melhor dizendo, você é bem próximo dela. Aquela flor mais cedo… você a deu para ela, não foi?
Joguei um olhar de lado para ele.
— O que te faz pensar isso?
Não havia ninguém por perto quando entreguei a papoula a Hiyori; Hashimoto não poderia ter visto.
— Não faça que nem bobo. Não há mistério aqui. Só de ver como ela ficou feliz segurando aquela flor, qualquer um perceberia.
Aparentemente, era isso que Hashimoto sentiu ao nos ver juntos.
— Você tem mencionado muito o nome da Shiina ultimamente — continuou. — Me deixou curioso sobre algo. E hoje decidi que obteria a resposta, de um jeito ou de outro.
Hashimoto respirou fundo, depois travou os olhos nos meus.
— Duvido que alguém mais se sentiria confortável em te perguntar isso, então serei o vilão e vou direto ao ponto — disse. — A Shiina é alguém… especialmente próxima de você?
Pela expressão dele, percebi que estava completamente sério.
— Há algum problema em eu ter alguém próximo?
— Não exatamente um problema — admitiu. — Mas não posso dizer que ficaria completamente tranquilo com isso.
Ele disse de forma evasiva. Quando olhei para ele, desviou o olhar, como se as palavras tivessem deixado um gosto amargo.
— Não é só comigo — continuou. — Aposto que a Ichinose também não ficaria muito feliz. O que corre na Classe D é que ela gosta de você. E se isso for verdade, então ela deve ter ouvido que você terminou com a Karuizawa e decidiu se colocar como a próxima candidata. Desde que participamos daquela conversa sobre alianças juntos, achei que a forma como ela te olhava era… diferente. Honestamente, imaginei que era apenas uma questão de tempo até vocês dois ficarem juntos. Ou… vocês já estão namorando?
— Não estamos namorando — respondi simplesmente.
Essa deveria ter sido a resposta que Hashimoto queria, mas em vez de parecer satisfeito, ele franziu a testa.
— Por quê? Se é a Ichinose, você não poderia pedir uma namorada melhor. Honestamente, até eu, que mal a conheço, diria sim sem pensar se ela confessasse. Ela está nesse nível, sabe? Você não tem motivos para recusar.
— Desculpe acabar com sua fantasia, mas ela não me confessou.
— Mesmo que não tenha, você poderia dar o primeiro passo. Se ela gosta de você, vá em frente sem hesitar — ele clarificou apressadamente — ah, não de um jeito estranho, quero dizer.
A distinção era trivial.
— Ichinose e eu somos aliados. Nada mais, nada menos.
— Então você traça essa linha, mantendo apenas a aliança, mesmo no futuro?
Antes que eu pudesse responder, ele continuou.
— O que significa… você está atrás da Shiina agora, não é?
— Estou surpreso. Não pensei que você se preocupasse tanto com a vida amorosa dos outros.
— Para ser preciso, estou preocupado que esses sentimentos possam afetar as chances da classe de vencer.
Não se tratava de quem eu namorava, mas se eu poderia deixar sentimentos pessoais atrapalharem meu julgamento. Isso parecia ser o que o preocupava. Um jeito muito típico de pensar do Hashimoto.
— Não, nem preciso ouvir sua resposta, já sei. Você cortou laços com a Horikita e os outros com quem passou dois anos enfrentando tudo junto, e se aliou a nós. Não duvido que suas ações mudariam só porque se apegou a uma ou duas garotas como Ichinose ou Shiina.
— Para alguém que acredita nisso, você parece bem interessado no assunto. Especialmente quando se trata da Hiyori.
Era óbvio que ele dava mais peso a ela do que a Ichinose.
— Do ponto de vista de um outsider, sempre pareceu que você tratava Shiina de forma especial.
Hashimoto concluiu dizendo que seria ótimo se fosse só preocupação desnecessária, mas a verdade era que eu já tratava Hiyori de um jeito que eu não conseguia definir completamente.
Isso não significa que eu deixaria sua presença afetar o desempenho da classe. Mas, em nível pessoal, eu sabia que não queria tratá-la de forma descuidada.
— Entendi.
— O que quer dizer com isso?
— Posso gostar da Hiyori.
— Hã?
— Não posso afirmar com certeza o que é esse sentimento ainda — disse, buscando as palavras certas. — Mas, no mínimo, é um sentimento que não tenho por mais ninguém, ou talvez apenas algo que está começando a se formar.
A causa da inquietação e dos erros em meu próprio raciocínio até então. A razão pela qual não era fácil de encontrar é porque era algo fora do meu alcance de experiência.
— Es-espere, você está falando sério? E o que é isso de agir como se fosse a primeira vez que sente algo assim? Você estava namorando a Karuizawa não faz muito, não é?
Se a emoção que acabara de descobrir estava realmente se enraizando dentro de mim… Não pude evitar sentir uma admiração silenciosa pela força das emoções e pelo momento imprevisível em que surgem. O impulso de saber mais cresceu, insistente e espontâneo.
Se eu rastreasse meus passos, encontraria o exato momento? Quando me tornei consciente da Hiyori pela primeira vez? O que a tornava diferente de todos os outros?
Queria cavar mais e mais fundo, até atingir o leito rochoso. Não, agora não é hora de se perder em fantasias desnecessárias.
Tirar uma conclusão agora, como se apenas traçasse uma estratégia, seria um desperdício enorme.
Seja qual for o desfecho, essa emoção era um experimento extremamente fascinante, intrigante demais para apressar.
— Então… dependendo de como as coisas forem, você está planejando namorar a Shiina? — Perguntou Hashimoto de repente.
— Achei que você acreditava que minhas ações não mudariam. Então por que está tão ansioso para se intrometer na vida amorosa dos outros?
— Bem, só desta vez… chame de minha "filosofia do amor", se quiser. Está gritando dentro de mim que eu absolutamente preciso confirmar isso.
— Sua filosofia do amor, é? Você realmente tem experiência para sustentar isso? — Fiz a pergunta tendo em mente Maezono, a que havia sido expulsa.
— Ei, você está me subestimando um pouco, Ayanokoji — ele sorriu de canto. — Não sou nenhum Don Juan, mas entre o fundamental e o ensino médio eu namorei duas… não, tecnicamente três garotas.
A hesitação antes do terceiro nome deixava óbvio de quem ele estava falando.
— Então? Vai namorar a Shiina? Se não puder responder, apenas diga…
— Namorar ou não depende da outra pessoa — interrompi. — Não é algo que eu possa decidir sozinho.
— Hah, justo. Mas pelo jeito que você está falando… se isso for realmente a primeira vez que sente algo assim, então é seu primeiro amor, não é?
— Talvez.
No momento, eu não tinha nada com que negar.
— Não importa quantas pessoas você namore, só existe um primeiro amor — disse Hashimoto friamente. — E quase nunca você acaba ficando com essa pessoa. O meu? Uma colega da escola primária. Eu nem conseguia manter uma conversa decente com ela. Claro, quando você coloca assim, parece romântico, talvez até especial… mas, na verdade, não é grande coisa. Especialmente para os caras — somos criaturas simples. Se ela é bonita, já estamos meio apaixonados.
Eu entendia isso muito bem: fosse homem ou mulher, a maioria das pessoas é facilmente atraída por quem tem boa aparência. Mesmo na TV ou em revistas, aqueles que chamam atenção e atraem olhares são, esmagadoramente, homens e mulheres belos.
— É por isso que você deve simplesmente jogar seu primeiro amor de lado — continuou. — Se uma garota bonita o bastante se apaixonar por você, não importa se é o seu décimo ou vigésimo amor, você pode recomeçar dali mesmo.
Mesmo com todas as suas voltas, a posição de Hashimoto permanecia consistente.
— Primeiro amor ou não, fique longe da Shiina. Esse é meu conselho mais forte — como seu estrategista, seu amigo e seu camarada com o objetivo de chegar à Classe A.
Hashimoto estava claramente em alerta quanto ao meu relacionamento com Hiyori se desenvolver de uma forma inesperada.
— Não é complicado, certo? — insistiu. — Você poderia voltar com a Karuizawa. Poderia namorar a Ichinose. Ou, sei lá, ficar com qualquer outra garota. Só não com a Shiina.
Ficava claro que Hashimoto observava minha reação, repetindo de propósito. Se eu concordasse ou discordasse demais, ele tomaria como um sinal ruim.
— Entendo muito bem a sua preocupação. Mas você está contando com os ovos antes da galinha.
— Posso confiar em você?
— Provavelmente você não vai acreditar só porque eu digo. Mas sim, pode confiar em mim.
A verdade era que Hiyori já tinha se tornado alguém indispensável para mim. Alguém que despertava emoções que eu jamais havia sentido antes. Se isso era ou não o "primeiro amor" de que Hashimoto falava, eu não podia evitar o desejo de descobrir.
Quero mergulhar nessa onda irresistível de emoção, deixar-me consumir por ela, apenas para ver aonde me levará. Quero me despedaçar junto dela, parte por parte, e buscar a resposta onde quer que esteja.
Vou lembrar do conselho dele pelo que é, mas não tenho a menor intenção de parar. Porque, a essa altura, já estou mais do que pronto para mergulhar, não importa a profundidade para onde isso me arraste.
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