Volume 2
Capítulo 142: Hóspede indesejado
Diferente dos métodos de diagnóstico, a cura para o Filamento Caliginoso era tão simples que deixou o bom doutor otimista de que conseguiria cuidar de toda a Família em pouco tempo. Tudo o que ele precisava fazer era uma mistura de Ervas usadas na medicina ― fáceis de achar, vale ressaltar ―, e entregar para o paciente consumir algumas vezes por dia ao longo de algumas semanas, dependendo do avanço da doença. E então, o corpo sozinho cuidará de expelir toda a sujeira.
― Ah! Ha! Ha! Se é tão fácil assim, logo teremos uma Família repleta de cultivadores saudáveis. ― Xiao Wen parecia satisfeito com tudo o que ouviu.
― Para o Líder Setorial responsável por comandar o setor de medicina, você tem aceitado bem minhas palavras. Não o incomoda que alguém de aparência mais jovem esteja te “dando lições”? ― Ning estava bastante à vontade, com as pernas esticadas e a coluna inclinada para trás, quase deitado.
Confrontado pela pergunta, o Dr. Wen esboçou um sorriso fraco e suspirou.
― Eu já fui muito arrogante na minha juventude. Mas aprendi que precisamos estar dispostos a escutar as pessoas, para evoluir.
Xiao Ning sorriu junto ao homem e uma conversa descontraída parecia que estava para começar. Contudo, a porta da câmara de repente foi aberta e Xiao Shui entrou.
― Sinto muito pela intromissão ― ela foi logo se desculpando ―, mas o Patriarca pediu para vê-lo. Parece ser urgente.
Aquilo foi a deixa para o médico se levantar e preparar a despedida.
― Não seria correto deixar o Patriarca esperando ― disse ele. ― Nós terminamos nossa conversa outro dia.
E assim, com a cabeça repleta de pensamentos e o espírito de pesquisador rejuvenescido, Xiao Wen partiu.
Ao mesmo tempo, no salão de visitas do 9º Ancião...
Com seus espetaculares 2,25 de altura e corpo robusto, o Patriarca ocupava uma poltrona no lado esquerdo, de frente para a mesinha de centro. Sua aparência era vigorosa como sempre, a de um homem no auge da meia idade ― apesar de possuir quase um século de vida ― sem fios brancos ou quedas suspeitas de pelo. De fato, seu cabelo escuro e longo, abaixo do ombro, era belo e engrandecedor.
Contudo, vestígios da batalha contra o 1º Ancião ainda podiam ser notados ao longo do seu corpo. Haviam arranhões em seu rosto, o punho esquerdo estava enfaixado, embora não parecesse quebrado, e muitos hematomas ainda não tinha desaparecido.
― Eu nem mesmo sonhava que você fosse tão resmungão ― disse Enlai, frustrado. ― É como dizem: “para conhecer uma pessoa, basta morar com ela”.
― Você está ocupando minha casa faz duas semanas. Vá encontrar outro lugar para ficar. ― A resposta que veio em seguida soou fraca e arrastada. Era a voz de um moribundo, sem forças para travar grandes batalhas.
Diferente do Patriarca, o tio Chang possuía uma aparência decrépita. Apesar da estatura elevada e dos músculos desenvolvidos, ele parecia menor, mais acuado, frágil. Seu rosto estava esquálido feito o de um cadáver, as bochechas magras, quase revelando o contorno dos ossos da face, e os olhos fundos, marcados por bolsas roxas e inchadas de noites mal dormidas.
Sua barba, sempre curta e bem cuidada, achava-se maior que o normal, repletas de tufos revoltos e algumas falhas que antes não ficavam tão evidente. De certa forma, ele tinha ganhado alguns “anos a mais”.
Tudo isso era consequência do ferimento grave que recebeu no abdômen durante a batalha pela liderança da Família e a cirurgia posterior, de enxerto.
― Essa sua mania de comer todas as carnes enquanto estamos dormindo é irritante ― continuou Xiao Chang, usando um tom ranzinza. ― Você ao menos cozinha elas?
― O que espera que eu faça? Minha casa foi destruída.
― Vá pedir moradia para a Ah-kum. Foi ela quem a destruiu.
A sugestão fez o Patriarca ter calafrios. Apesar de ela ainda não ter se recuperado do confronto árduo, com toda a certeza, se resolvesse bater na porta de sua casa pedindo abrigo, receberia um desafio de duelo com apostas previsíveis.
Os dois seguiram a conversa, através de resmungos e acusações, até que a interação foi interrompida pelo surgimento de duas figuras. Shui entrou na sala acompanhada por Ning, que não parecia estar muito motivado.
― E então, o que vocês querem? ― O preguiçoso se jogou numa poltrona no fundo da sala e olhou de um para o outro, esperando pela resposta.
Xiao Shui, por outro lado, sentou-se ao lado do pai, que se encontrava no sofá.
― Ning, que bom que você veio. Temos alguns assuntos importantes para discutir ― começou o Patriarca, assumindo um tom sério.
― De qual tipo?
― Como você já sabe ― o tio Chang assumiu o seguimento da conversa ―, sua participação no festival expôs sua identidade de “Alquimista”.
― Eu nunca quis manter segredo. ― Xiao Ning tinha uma voz divertida enquanto afirmava algo que sempre deixou claro.
― Todo mundo agora sabe a verdade ― continuou o tio Chang, que apesar da voz fraca conseguiu exprimir uma cara feia para o afilhado. ― Depois que as pessoas descobriram, presentes começaram a chegar de todos os lado. Já recebemos tesouros de Famílias e Seitas até mesmo de fora da cidade.
― Oh, então eu estou rico? ― brincou Ning, olhando para Shui e dando uma piscadela.
― Isso não é motivo para fazer piadas ― disse a cultivadora do gelo.
― Não é mesmo! ― reforçou o Patriarca. ― Todos os presentes serão seus, é claro. O problema é que nós acabamos de receber uma carta da Seita Waidanshu. Você a conhece, estou certo?
― É a Seita que o Chan frequenta ― disse o preguiçoso, lembrando-se da conversa que teve com o amigo. ― Se não me engano, é ela que tem os Alquimistas tudo deste império.
― Quase todos ― corrigiu o tio Chang.
― E nós também estamos devendo muito dinheiro para ela ― lembrou-se Xiao Shui, que de repente se sentiu mais preocupada com o rumo da conversa.
― Verdade. Estamos devendo ― confirmou o Patriarca. ― E é por isso que estamos tão apreensivos. Além de não termos o montante necessário para saldar a dívida, o recente atentado que sofremos torna tudo mais complicado. Uma rebelião gera instabilidade, que por sua vez gera insegurança em nossa capacidade de ser fiéis às nossas promessas.
― O que dizia a carta? ― Xiao Ning percebeu que o assunto era delicado e por isso assumiu uma postura mais séria.
― No geral, era simples e direta. E isso é o que mais me preocupa ― informou Enlai, que tinha uma expressão fechada. ― Ela apenas elogiou, brevemente, nossa conquista em conseguir um Alquimista e avisou que em breve estará enviando representantes para nos saudar.
― Ela não falou da dívida, do ataque do Ancião e nem nada do tipo? ― Com as sobrancelhas franzidas, Xiao Shui encarava o líder dos Xiaos de uma maneira apreensiva.
Enlai balançou a cabeça em negativa e continuou:
― Acredito que eles estão planejando usar o assunto para exigir alguma coisa. E levando em consideração que o foco deles é a Alquimia, provavelmente será algo relacionado ao Ning. Por isso, eu gostaria de estar preparado. Ter pelo menos 60% do dinheiro em mãos. Mas...
― Mas não temos esse dinheiro ― completou Ning.
E o tio Chang soltou um suspiro pesaroso, confirmando as suspeitas do afilhado.
― Antes do ataque de Xiao Dong, nós tínhamos um pouco mais de 55% ― disse ele. ― Mas tivemos que tirar de nossas reservas para fazer reparações.
― A gente está devendo quanto? Umas mil, duas mil moedas de ouro ― Embora já tivesse ouvido falar nos empréstimos da família, Ning não tinha noção do quão profundo era o problema.
Antes de responder, o Patriarca, um tanto constrangido, passou a mão na testa e desviou o olhar. Demorou algum tempo para que enfim respondesse:
― Setenta e cinco mil moedas de ouro.
― Pera aí, quanto? ― Pensando ter escutado errado, Xiao Ning colocou a mão na orelha, formando uma concha, e esticou a cabeça para ficar mais perto do líder.
― Isso tudo!? ― Por outro lado, Xiao Shui estava chocada com o absurdo que tinha escutado.
― Bem, nós gastamos quase tanto quanto uma Seita grande ― disse o tio Chang. Embora já soubesse da informação, ainda assim era surpreendente ouvir sendo dito em voz alta. ― Mas em comparação, nós somos a Família com o maior número de cultivadores dentro da cidade. Apesar de algumas pessoas dizerem o contrário, nós somos sim a segunda maior potência dentro da cidade e podemos enfrentar os Zhans sem problemas. ― Seu orgulho era notável ao fazer tais afirmações. Acreditava que cada moeda tinha sido bem usada.
― Quanto nós temos? ― Xiao Shui estava mesmo preocupada. Apesar de os Xiaos e os Waidanshu serem aliados, era difícil prever o que aconteceria.
― Pouco mais de trinta e nove mil moedas ― informou o Patriarca. ― O ideal seria termos 60%, mas se tivéssemos 55% poderíamos argumentar.
― E se contarmos com os presentes que eu ganhei? ― sugeriu Ning.
― Nós já estamos contando ― afirmou o tio Chang, sem vergonha nenhuma. Estava pegando os tesouros do afilhado sem ao menos pedir.
― Devia pelo menos ter avisado ― resmungou o preguiçoso, estreitando os olhos.
― Nós ainda temos alguns recursos que podemos usar para cobrir o valor necessário ― a voz do Patriarca era de conclusão ―, mas existe a chance de não conseguirmos a tempo. E mesmo se conseguir, não há garantia de que os Waidanshus irão nos perdoar. Por isso, o motivo de tê-lo chamado aqui é para alertá-lo sobre qualquer mudança que possa acontecer.
― Não sabemos o que eles farão quando vierem, então o melhor é ficar atento ― o tio Chang continuou. ― E no caso de sua vida estiver em risco, algo que eu acredito ser improvável, não hesite em fugir.
A conversa seguiu em um clima tenso e nos instantes seguintes os dois mais velhos da sala seguiram dando dicas do que fazer, no caso do aliado se tornar um inimigo. Mas o que eles não sabiam era que o preguiçoso tinha a idade ainda mais elevada do que ambos e que conhecia diversas artimanhas para fugir e se esconder.
Foi alguns minutos mais tarde, quando discutiam os movimentos que a Família faria para evitar algo desagradável, que uma visita surpresa chegou.
Acompanhado de um dos Virtuosos que estavam protegendo a casa do 9º Ancião, Xiao Bai surgiu de repente na entrada do salão, interrompendo a reunião. Ele vestia roupas belas e de costura detalhada, como de costume, mas algo nelas eram diferentes. O pano não brilhava tanto quanto outros tecidos e a cor era apagada, um marrom desbotado, quase uma camuflagem. E na cintura era possível observar a presença de duas Bolsas de Armazenamento.
O Jovem Nobre entrou no salão após ser anunciado e, no instante em que viu o Alquimista, lançou um olhar frio em sua direção ― mal percebeu que estava sendo encarado por um par de olhos ainda mais gélidos. Porém, ele logo abriu mão da atitude desafiadora e mudou o foco de sua atenção.
― Patriarca Enlai ― existia amargura e ressentimento em sua voz ao pronunciar tais palavras. ― Eu tenho um pedido para fazer.
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