Um Alquimista Preguiçoso Brasileira

Volume 1

Capítulo 47: Em busca de ingredientes

Na Montanha Ancestral de Jade, Xiao Ning e Xiao Shui estavam vagando por uma área descampada, coberta apenas por uma grama amarelada, queimada pelo sol escaldante, que parecia perpetuar por aquela região.

Quando Xiao Shui perguntou o que estavam fazendo ali, no sopé da montanha, ao invés de subir para as regiões mais elevadas ― ainda assim, evitando os locais perigosos ―, que era geralmente onde o maior número de Ervas Espirituais são encontradas, Xiao Ning, em resposta, deu uma pequena aula:

― Por enquanto, estamos procurando por cabaças, Cabaças Amarelas, para ser mais específico. Embora amadureça apenas uma vez por ano, não é difícil encontrá-las. A fruta é proveniente de uma planta rasteira que, apesar de ser bastante comum, germina apenas em condições cujo contato com o sol é constante. Além do mais, é preciso ter uma boa fonte de água, pois só assim a cabaça será capaz de filtrar algumas gotas, já que o processo de filtragem costuma ser lento devido a casca dura. E essa região é perfeita. Afinal, recebe luz do sol o dia todo, tanto ao nascer quanto ao entardecer, e não tem árvores altas para bloquear a luz. E por ficar numa área mais baixa, sempre há neblina durante à manhã e a chuva que ocorre mais acima, desce morro abaixo.

Enquanto falava, Xiao Ning parecia abandonar o tom arrastado e sonolento de costume. Era sempre assim quando se tratava de Alquimia; seus olhos brilhavam conforme exibia conhecimentos de uma longa vida.

Os dois continuaram vagando pelo prado sem muita pressa, enquanto o sol incandescente queimava sobre suas cabeças. Naquele dia, a temperatura parecia estar particularmente elevada e o clima, abafado e seco. Ignorando o suor escorrendo em sua testa, Ning mantinha um olhar alerta ao redor, estudando com bastante atenção as partes mais distantes para não deixar nada escapar de seus olhos.

A Montanha Ancestral de Jade ficava localizada na Cordilheira dos Tesouros de Viço, na parte central do Império Dourado, e era o pico mais alto de todos, alcançando as nuvens. Devido aos numerosos montes e elevações menores, em parte agrupados uns nos outros e em parte separados por amplos espaços, os campos e encostas nas áreas mais baixas formavam extensos territórios de vegetação rasteira, formando uma superfície verde, quase uniforme, se não fosse os relevos ocasionais e a alta concentração de mata em alguns pontos.

Por causa dos extensos campos verdes, deformados aqui e ali por relevos, Xiao Ning era obrigado a manter uma atenção constante conforme procurava por qualquer vestígio daquilo que veio buscar.

Por outro lado, Xiao Shui parecia inquieta, mexendo os ombros a todo momento e apertando o punho de sua espada, como se para ganhar confiança. Debaixo daquela armadura de couro, deveria estar sendo assada aos poucos, mas não era isso que a incomodava. Seus olhos, vez ou outra, eram pegos fitando o preguiçoso de esguelha. Abria a boca para falar algo, porém, voltava atrás.

Não era por vergonha ou coisa do tipo. Não! Ela não estava preocupada com isso. Era uma questão de orgulho. Pedir ajuda para alguém que sempre desprezou parecia algo difícil de engolir e errado de fazer.

Nos últimos tempos, nutriu uma repulsa profunda contra Xiao Ning, pois acreditava ser ele a causa de todos os problemas de seu pai e por conta disso o condenou como um inimigo, chegando até mesmo a ofendê-lo em algumas ocasiões.

Apenas a pouco tempo descobriu a verdade e apesar de parte de seu desprezo ter se dissipado, ainda existia uma pequena fração daqueles sentimentos presentes em seu âmago e isso a envergonhava. Afinal, sabia que tinha sido injusta no passado e sabia também que era ainda mais injusto continuar nutrindo tais amarguras.

Tomando coragem, mesmo se achando indigna, apertou mais forte o cabo da espada e por fim abriu a boca:

― Você disse que não precisa estar no Reino do Despertar para usar o Sentido Espiritual, certo? ― E Xiao Ning apenas maneou a cabeça, confirmando sua pergunta. ― Poderia me ensinar?

Ele olhou para ela com uma expressão preguiçosa.

― Eu até posso, mas não seria melhor esperar para quando entrar no Reino do Despertar? Acho que não falta muito para você romper de nível. E será mais fácil quando isso acontecer. ― Xiao Ning não via problema em ensiná-la a sentir a Energia Espiritual exterior. Apenas achava um trabalho desnecessário, visto que ela já se encontrava na 7ª Camada do Reino Mundano.

Porém, em contrapartida ao preguiçoso, Xiao Shui estava determinada.

― Quero aprender agora! ― afirmou ela, resoluta. ― Preciso ficar o mais forte possível até o Festival da Geração do Caos! Não quero decepcionar meu pai e meu irmão!

Xiao Ning olhou para ela de lado. Percebia-se por sua expressão determinada que não cederia tão fácil. Soltou um suspiro desanimado e se rendeu:

― Tudo bem, eu te ajudo.

Ouvindo isso, Xiao Shui abriu um sorriso alegre. Da última vez em que tocaram no assunto, ele deixou a vaga promessa de ensiná-la a usar o Sentido Espiritual. Na ocasião, chegou até mesmo a receber uma bronca deste que sempre se provou ser um preguiçoso sem limites. Porém, desde então, nada a respeito foi dito, como se a questão tivesse sido esquecida.

Por achar que estaria abusando de sua boa vontade, não tocou no assunto antes. Afinal, depois de tudo que fez, não se achava no direito.

Entretanto, agora que enfim tomou coragem para perguntar, o caso parece ter sido outro. Xiao Ning não tinha esquecido nada, apenas estava enrolando, aguardando pelo momento em que ela aprendesse a usar sozinha.

Seja como for, a promessa havia sido feita de novo e desta vez ela não deixaria de pedir apenas por se sentir culpada pelos seus atos passados. Por causa das histórias contadas por seu pai, sabia o quão útil podia ser o Sentido Espiritual e não perderia a chance de aprender a usá-lo.

― E você, vai treinar o que para o Festival? ― Sentindo-se mais bem humorada, Xiao Shui decidiu puxar conversa. Falava tão pouco com Ning e sempre de maneira tão severa, que vinha se sentindo mal por seu comportamento, pois ele a ajudava tanto.

Não era algo que conseguia evitar. Ela estava sempre se dedicando tanto ao seu cultivo e ele era sempre visto vadiando pelos cantos, que isso fazia seu sangue ferver. Mas precisava mudar, pois apesar de ainda persistir um traço daquele ressentimento que nutriu durante um tempo, percebeu nele uma boa pessoa. Preguiçoso, sim. Insensível, não.

― Eu não vou participar. ― Xiao Ning deu um meio sorriso de lado e declarou, sem vergonha nenhuma. ― Eu só queria os prêmios do Evento e já consegui. Porque me daria ao trabalho de entrar em outra luta? Para perder mais uma unha? ― Estendeu o dedinho da mão direita, mostrando o minúsculo pedaço de unha, dando seus primeiros sinais de renascimento.

― Como assim, não vai participar! ― exclamou Xiao Shui. ― Se você não for, a Família passará vergonha. Dirão que você ficou com medo e fugiu. O Festival da Geração do Caos é muito importante para toda a cidade e se um membro das quatro Famílias se acovardar, todos comentarão.

Uma vez que os nomes daqueles que participarão do Festival já haviam sido divulgados, anunciar uma desistência era inconcebível. Seria preciso uma boa desculpa para justificar tal ação, como um ferimento grave ou coisa do tipo. Afinal, esse era o evento mais importante para toda a Cidade da Fronteira do Caos e ter um desistente poderia não apenas trazer vergonha para a pessoa, mas também para toda a Família.

Entretanto, para a exasperação de Xiao Shui, Ning apenas deu de ombro.

― Podem falar o que quiser, mas não participo. ― Pouco se importava com o que os outros pensariam dele. ― Eu já fui espancado por uma Besta Demoníaca e agora perdi duas unhas. Meu peito ainda dói, sabia? Não ligo que me chamem de covarde.

― Você sempre com esse assunto da unha. Elas já estão crescendo, certo? Então supere isso! ― exaltou-se Xiao Shui, não aguentando mais ouvi-lo falar a respeito dessa história. ― Muitos estão contando com a sua participação. Apesar de ser mais fraco, você conseguiu lutar contra o discípulo mais forte da nossa Família.

― E olha no que deu! ― Xiao Ning mais uma vez exibiu as unhas faltando. ― Vai estar cheio de gente forte lá, não é? Prefiro ficar assistindo desta vez.

Já havia passado tempo o bastante ao seu lado para saber que não o convenceria falando de orgulho, honra e essas coisas, então, Xiao Shui decidiu mudar de estratégia.

― Você sabe que os prêmios do Festival são melhores que os da competição da Família, certo? Eles darão duas Pílulas Espirituais Médias para o vencedor.

― Faço minhas próprias pílulas. ― recusou Xiao Ning prontamente.

― O vencedor também ganhará vinte moedas de ouro. ― insistiu Xiao Shui.

― Não vale a pena, não vou ganhar mesmo.

Xiao Ning estava determinado a não participar do Festival da Geração do Caos. Desde que retornou a vida, apenas sofreu durante suas batalhas. Preferia passar esse tempo praticando Alquimia do que se preparar para apanhar ainda mais. Pelas histórias que escutou, estaria cheio de cultivadores do Reino do Despertar participando deste Festival. Vinte moedas de ouro? Não, obrigado. Era melhor ficar na plateia assistindo.

― Esqueça isso. ― disse ele. ― Vamos começar a praticar seu Sentido Espiritual.

― Aqui? ― indagou Xiao Shui. Gostou da notícia, mas ficou surpresa. Pensou que só iriam praticar quando voltasse para casa. Seria essa uma tentativa de mudar o rumo da conversa? Pois se fosse, aceitaria a oferta de bom grado.

― Claro, porque não? Este lugar é perfeito para começar. Mas antes, existem algumas coisas que deve saber. ― disse Xiao Ning enquanto cruzava o prado, ainda atento aos arredores. Xiao Shui logo deixou de lado a tentativa de convencê-lo e se atentou às suas palavras. ― Primeiro, você sabe o por que dizem só ser possível usar o Sentido Espiritual após avançar para o Reino do Despertar?

Ela, concentrada no que ele tinha a dizer, balançou a cabeça negativamente. Esse sempre pareceu um fato comum.

― Bem, a quantidade de Energia Espiritual que alguém é capaz de reter no Reino Mundano é ínfima. É nesse momento que se está aprendendo sobre essa força, sentindo-a, tornando-se mais íntima dela. Por isso também, muitos consideram os cultivadores neste Reino como: Mortais.

Xiao Shui estava ouvindo com extrema atenção, mas até o momento, ele não tinha dito nada que já não soubesse. Isso era algo que ela aprendeu quando ainda frequentava os Salões Espirituais para iniciantes, antes mesmo de começar a cultivar.

― Quando se é um Mundano ― continuou ele ―, a Energia Espiritual sentida por um cultivador é aquela que está dentro de si ou quando se está cultivando, e as vezes, nem assim alguns conseguem percebê-la, pois mesmo estando conectados a ela, a quantidade é insignificante. Nada mais do que um vestígio débil de sua real força. Além disso, algo importante de se notar é: desde o nosso nascimento já possuímos Energia Espiritual e em níveis baixos é difícil senti-la. Pense da seguinte maneira: o nosso coração está constantemente bombeando sangue através de nossas veias, mas nem por isso podemos notá-lo... bom, nem sempre. No entanto, quando se avança para o Reino do Despertar...

Neste momento, Xiao Ning parou. Colocando a mão sobre a testa, de forma a bloquear a luz forte do sol refletindo nas superfícies mais lustrosas, apertou os olhos e mirou em um lugar distante.

Não entendendo o motivo da explicação ter parado de maneira súbita, deixando-a curiosa para ouvir o resto, Xiao Shui, querendo descobrir a causa, seguiu a linha traçada pelos olhos dele. Porém, quando não encontrou nada, além de capim ressecado nas pontas e um amontoado de folhas dotadas de um verde exagerado, decidiu chamar sua atenção e pedir para continuar falando:

― Ei...

No entanto, antes que fosse capaz de dizer uma segunda palavra, Xiao Ning soltou um grito empolgado:

― Achei! Eu sabia que ia encontrar aqui! ― exclamou. E, em seguida, saiu correndo em direção às folhas verdejantes, que de tão vibrantes pareciam refletir a luz do sol.

― Ei! Espera. ― pediu Xiao Shui. Entretanto, ele não lhe deu ouvidos e saiu correndo, parecendo um garotinho excitado.

Deitado no campo aberto, como se estivesse tomando banho de sol, via-se um extenso emaranhado de folhas verdes lustrosas; era um verde de fazer os olhos arderem sob o sol reluzente. As lâminas eram como pranchas gigantes, chegando a medir mais de cinquenta centímetros cada uma. Possuía um formato abaloado, com as bordas cobrindo a terra, caindo sobre o próprio peso. Embora se arrastasse pelo chão, o caule da planta era lenhoso e se acentuava nas extremidades.

O emaranhado de lâminas verdes se estendia ao longo de uns duzentos metros de comprimento, dando forma a uma diminuta floresta inexplorada, com um teto intransponível, capaz de refletir qualquer luz invasora que tentasse atingir o solo abaixo.

Xiao Ning se aproximou do canteiro silvestre com um sorriso de empolgação estampado no rosto, enquanto Xiao Shui vinha em sua perseguição, logo atrás.

― Ahaha! Parece que demos sorte. ― comemorou ele, alegre pela descoberta. ― Acho que ninguém nunca explorou esse lugar. Parece intocado.

― É isso? ― questionou Xiao Shui com estranheza. Conhecia bem as Cabaças Amarelas. Já havia visto imagens delas durante seus estudos sobre Ervas e Frutas Espirituais. Porém, nunca tinha encontrado uma na sua forma mais selvagem, nem mesmo a planta da qual originava.

Tentado pela pergunta, Xiao Ning não se conteve ao exibir seus conhecimentos:

― Essa é a Videz-fusco, uma espécie de arbusto rasteiro. Está vendo estas folhas gigantes? Elas servem para bloquear a luz do sol durante a germinação da fruta, que, como eu disse antes, ocorre apenas uma vez por ano e quando atinge o estágio maduro, passa a ser a assim conhecida: Cabaça Amarela.

Por ser um dos ingredientes usados na primeira Composição Alquímica que criou, Xiao Ning conhecia bem as funções e cada aspecto dessa planta. Passou anos estudando-a, catalogando seu florescer.

Assim como todo o resto dos ingredientes usados na criação da Pílula da Borboleta Monarca, a Videz-fusco era uma Erva Espiritual fácil de ser encontrada e germinava em quase todo lugar, dispensando a necessidade de um ambiente controlado para se desenvolver, por isso ele sabia que poderia encontrá-la, mesmo procurando em uma região típica, que era o caso do Império Dourado.

Semelhante às plantas comuns, algumas espécies de Ervas e Frutas Espirituais exigem um ambiente com um clima característico para crescer, tornando assim impossível ou pouco improvável a germinação em locais distintos. Enquanto existem muitas Ervas que só florescem no Império Dourado, outras não podem ser encontradas em parte alguma de todo o Continente Central.

Durante o desenvolvimento da Pílula da Borboleta Monarca, Xiao Ning usou ingredientes que eram muito comuns em quase todas as regiões que já visitou, não podendo ser encontrados apenas em lugares cuja neve se faz presente todos os dias, em ambientes desérticos ou em locais de solo pedregoso.

E embora sua familiaridade com a vegetação do Continente Central não se comparasse a tantos outros continentes em que foi capaz de realizar extensas pesquisas, apoiadas por todo um time de especialistas, sabia que não seria difícil encontrar os ingredientes usados em sua criação. Prova disso era o fato de ter conseguido comprar tudo sem grandes problemas.

― Eu não sabia disso. ― admitiu Xiao Shui, que pouco conhecia do tempo de crescimento da Fruta Espiritual. Estudou apenas alguns de seus efeitos. ― Mas se elas só amadurecem uma vez por ano, nós estamos na época certa? Porque eu não estou vendo nenhuma Cabaça Amarela.

Com a ponta dos dedos, Xiao Shui se abaixou e levantou algumas folhas, espiando os caules entrelaçados no fundo, escondidos da luz do sol. No entanto, não encontrou qualquer indício do fruto, nem mesmo uma fruta verde ou um botão de flor.

Porém, ao contrário dela, Xiao Ning espichou as pernas, ficando na ponta dos pés e olhou sobre o teto da diminuta floresta, procurando por uma falha.

― Eu te disse que esse lugar parece não ter sido encontrado por ninguém antes de nós. ― repetiu ele. ― Essas Frutas Espirituais não apodrecem quando ficam muito tempo sem serem colhidas. Longe disso, elas se tornam ainda mais preciosas. Quanto mais velhas, mais refinadas e puras se tornam a essência dentro dela e maior é o volume de água absorvida. E esse canteiro parece ter uns cinco há seis anos de idade... ― Enquanto se espichava para espiar sobre o campo de lâminas verdes, Xiao Ning repentinamente parou de falar quando mirou em algo. ― Acho que encontrei. ― declarou.

Dando a volta no canteiro, tomando cuidado para não pisotear a planta, ele seguiu rumo a um amontoado de folhas secas que se opunham ao verde lustroso apresentado até então. Era uma região tingida por um marrom tumular, composta por galhos ressecados e quebradiços. A luz do sol penetrava sem obstáculos, aquecendo o solo diretamente.

E bem ali, camuflado em meio as folhas mortas, encontrava-se um objeto ligeiramente maior que um palmo e de formato oval. Possuía uma coloração amarela, de um fruto maduro saudável. Em uma de suas extremidades, via-se um caule ainda vivo, embora ressecado, ligando a cabaça ao resto do canteiro.

Enquanto Xiao Ning avançava para pegar a Cabaça Amarela, com Xiao Shui seguindo-o logo atrás, comentou:

― Sabe, o mais curioso dessa Fruta Espiritual é o fato dela agir meio que como um parasita. A Videz-fusco não consegue fornecer os nutrientes necessários para o fruto maturar de forma adequada, após atingir certo estágio de crescimento, ainda mais se tratando da água. Então, a Cabaça Amarela rouba o que precisa e, aos poucos, mata a planta ao redor. É por isso que você nunca vai encontrar uma com mais de dez anos.

Adicionando um pouco mais de conhecimento, Xiao Ning quebrou o caule seco que prendia o fruto, sacudiu-o e bateu com leveza usando os nós dos dedos contra a casca dura numa tentativa de sondar seu conteúdo, deixando um som abafado escapar. Estava cheia de líquido.

Satisfeito com o achado, não tardou em guardar a Cabaça Amarela dentro da Bolsa de Armazenamento que havia ganhado durante o Evento de Seleção.

Era um momento empolgante para ele por diversos motivos, pois além de conseguir encontrar o que procurava sem muito esforço, também estava testando pela primeira vez a sua própria Bolsa de Armazenamento.

No entanto, Xiao Shui, apesar de achar fascinante tal conhecimento em Ervas e Frutas Espirituais, estava mais interessada em outra coisa.

― Tudo bem, eu entendi. Você conhece bastante sobre essas cabaças. Mas agora pode me ensinar sobre Sentido Espiritual? ― pediu, sucumbindo à ansiedade.

Xiao Ning olhou de lado, encarando-a por um instante com uma expressão confusa no rosto, quando exasperou:

― Ah, é verdade. Eu estava falando sobre Sentido Espiritual, não é mesmo? ― pareceu se recordar. ― Me esqueci completamente. Ahahaha! ― riu de si mesmo e de sua memória fraca.

Ficou tão entretido ao encontrar a Videz-fusco que acabou se esquecendo sobre o assunto levantado antes.

― Eu estava falando sobre o que mesmo? ― perguntou, tentando se lembrar.

Xiao Shui logo se dispôs a responder:

― Você estava falando sobre o Reino do Despertar.

― Ah, sim. O Reino do Despertar! ― exclamou, parecendo recordar algo. ― bem... ― divagou por um momento, tentando encontrar as palavras certas. ― Quando se torna um Despertado, a Energia Espiritual dentro de você aumenta de maneira exponencial e esse acréscimo traz consigo alguns... efeitos. ― Ainda mantendo sua atenção na procura por Cabaças Amarelas, Xiao Ning teve dificuldades em encontrar as palavras adequadas. ― Um desses efeitos é que as pessoas se tornam mais sensitivas...

Parou mais uma vez no meio da frase quando encontrou outra parte semimorta no canteiro. E com Xiao Shui seguindo-o de perto, ele caminhou enquanto falava.

― Veja bem, mesmo os cultivadores Mundanos conseguem sentir a Energia Espiritual, mas por estarem nos estágios iniciais do cultivo, esses sentidos são pouco aguçados. Por isso, quando se torna um Despertado e há um aumento na Energia interna, o cultivador consegue sentir a Energia Espiritual com mais familiaridade. É por isso também que, quanto maior o Reino em que estiver, mais apurado será o Sentido Espiritual.

Xiao Ning estava por inteiro absorto em sua atividade de colher Frutas Espirituais. Nesse último momento, falou tanta coisa para Xiao Shui, mas a verdade era que mal estava prestando atenção nas próprias palavras. Por esse motivo, teve de confirmar:

― Você... você está entendendo?

― Bem, resumindo, você está falando que quanto mais Energia Espiritual o cultivador tiver, mais preciso o Sentido Espiritual será. ― sintetizou Xiao Shui, que estava conseguindo acompanhar a explicação. ― E, o motivo para alguém no Reino Mundano não conseguir usar o Sentido Espiritual é porque ainda está no começo do cultivo e tem pouca Energia, é isso?

― Isso! Isso mesmo. ― confirmou Xiao Ning, que neste instante se abaixou para pegar uma segunda Cabaça Amarela. Tornando a se levantar, continuou. ― É claro, existem pessoas cujas percepções permanecem adormecidas ou pouco exploradas por um longo tempo, independente do nível alcançado. Algumas vezes isso acontece porque o cultivador não pratica, afinal isso é uma habilidade e precisa ser exercitada, outras é por não ter aptidão. Também existem alguns casos especiais em que uma pessoa desperta um tipo de Sentido Espiritual muito específico. Porém, isso não importa para você agora, já que não se enquadra nesse caso.

Xiao Ning fez uma pausa e procurou ao redor por um sinal que pudesse levá-lo a encontrar mais uma cabaça. Quando não encontrou, voltou a falar conforme contornava o canteiro:

― Mas como eu já falei, não é porque você está no Reino Mundano que não consegue usar o Sentido Espiritual. No final, é apenas uma questão de familiaridade. O instinto para usá-lo sempre esteve lá, só precisa praticar. Apenas, será um pouco mais difícil e trabalhoso.

― Eu já disse, não me importo com isso! ― declarou Xiao Shui, resoluta. Trabalharia o quanto fosse preciso para se tornar mais forte.

Xiao Ning olhou para ela com um olhar preguiçoso. Não conseguia se ver dedicando tanto para se fortalecer. Em seguida, colocou a Bolsa de Armazenamento de lado e disse:

― Já que você está tão determinada, vamos subir um pouco mais a montanha e eu te ensino no caminho como usar o Sentido Espiritual. Na volta, nós colhemos mais algumas cabaças.

Dizendo isso, os dois começaram a subir uma ligeira inclinação no prado, rumo a uma ladeira que havia mais à frente. Enquanto andavam, ele continuou sua aula sobre a maneira certa de sentir a Energia Espiritual.

 

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