Volume 1
Capítulo 9: Foi Mal
“Caminho da angústia?! Que porra é essa?”, pensei em pânico enquanto respirava rispidamente.
Meu coração acelerado, o sangue frio passando pelas minhas veias... todas essas informações confusas em que fui mergulhado deixaram o meu corpo desamparado, congelado.
De joelhos e olhos lacrimejando, eu só conseguia olhar para o grande portal que eu toquei a alguns segundos atrás.
Ele pulsava com sua luz crepitante enquanto girava como um redemoinho destorcido. Tive uma certeza nesse momento, eu nunca mais iria tocar nessa coisa de novo.
O silêncio de antes ainda permaneceu, mas tinha um pequeno detalhe que passou a me incomodar, Kaylleon não estava mais ali.
Eu revirei meus olhos pela escuridão do subterrâneo silencioso, mas a única coisa que me fazia companhia era o portal reluzente na minha frente.
— Se-senhor Kaylleon! — gritei na esperança de receber uma resposta, porém era óbvio que o silêncio foi a única coisa que consolou minha voz.
Os Pixels azulados subiram abruptamente e formaram um painel diante dos meus olhos.
[Você interagiu diretamente com a reencarnação de Dungeon!]
[A Dungeon adormecida foi despertada!]
— P-pera!
Brooooom!
Minha voz confusa foi engolida pelo som estrondoso que caiu sobre mim e tudo ao meu redor.
Foi então que acima do portal, acima do solo, de mim e toda essa assustadora escuridão, uma luz cor de sangue se ascendeu pulsando como milhares de veias.
Eram gigantescas linhas em padrões de circuitos, elas se espalharam como um cobertor por cima de todo o subsolo.
Tudo foi banhado pela luz carmesim dos circuitos e logo, qualquer coisa que estava sendo ocultada pela escuridão foi revelada. Bizarro, essa foi a única descrição que eu consegui dar vendo tudo.
Portas e degraus espalhados, entrelaçados aleatoriamente por todos os arredores, as escadas paravam no nada enquanto as portas simplesmente estavam posicionadas sobre as paredes degraus e qualquer lugar aleatório que se possa imaginar.
“Bizarro demais, assustador demais, confuso demais! Eu não quero mais permanecer aqui, eu quero voltar, quero voltar pra casa!”, eu gritei em minha mente.
Quando me virei de costas para o portal, já preparado para correr para o mais longe possível, fugir com todas as minhas forças... meu corpo congelou.
Meus olhos se arregalaram e meus lábios começaram a tremer em terror.
As sombras criadas pela luz no teto ficaram a se distorcer e rastejar pelo chão, como uma espécie de líquido.
Elas escorreram pelas pedras que ladeavam o musgo até me cercarem por completo.
— Qu-que merda?! — Dei dois passos pra trás vendo as sombras emergirem do chão se moldando em silhuetas monstruosas.
Um vapor negro se espalhou das sombras.
[Você está no domínio de uma Dungeon despertada!]
[Subsolo de Poena]
“Puta merda!”
Zuuush!
Meus pensamentos foram quebrados pela silhueta que pulou na minha direção ao lançar uma ponta afiada e metálica sobre mim.
— Aaah! — gritei jogando meu corpo para o lado em desespero.
Eu rolei pelo chão rígido e húmido até colidir com uma porta.
Tentei me recostar sobre a porta desesperadamente enquanto reprimia — ou tentava reprimir — o medo e a aflição.
“Merda! eu estou de novo... prestes a morrer?!”, minha mente foi virando uma nuvem negra de negatividade.
A sombra que pulou na minha direção virou o que parecia ser sua cabeça para mim jogando um som de estralo pelo ar. De repente sua silhueta negra parou de se distorcer e soltar a estranha fumaça escura pelo ar, isso também passou a acontecer com todos as outras sombras que estavam ali, permeando o vapor das trevas pelos arredores.
Logo todas começaram a ganhar uma aparência.
Grandes carapaças azuladas com mandíbulas gigantes, asas negras e caudas com ferrões. Eram todos parecidos com insetos, porém tinham o tamanho de uma pessoa e caminhavam com apenas duas patas.
Meu corpo passou a tremer e meu coração estava quase saindo pela boca.
Passo. Passo.
Os insetos gigantes a se aproximar de mim lentamente. Formigas, libélulas e alguns pareciam com besouros.
Eu pude sentir a intenção assassina de cada um deles perante mim e não sei dizer quando diabos eu havia adquirido essa capacidade, mas eu definitivamente podia saber que essas coisas buscavam a minha morte.
Skreeeeek!
A formiga amedrontadora soltou um grunhido perturbador e sem hesitar disparou na minha direção.
Meu coração bateu firme, mesmo que o terror estivesse me consumindo eu ainda não podia aceitar, não podia entender os motivos de tudo isso.
Eu precisava saber o que estava havendo, se não que sentido teria em morrer ali afinal?
Morrer tão repentinamente sem entender nem os motivos por trás disso com certeza era patético pra mim, patético demais até pra um merda como eu, foi por isso que eu... eu decidi...
— Merdaaa! Moon Blade! — Minha voz desesperada ecoou.
Eu decidi pelo menos tentar não morrer!
[Você equipou a Moon Blade!]
Raios vermelhos envolveram minha mão e a adaga negra guardada em meu inventário surgiu sobre ela.
Eu joguei a lâmina da arma branca contra a garra afiada do inseto.
Corta!
Um impacto se espalhou por todo meu braço direito.
Faíscas voaram pelo ar e eu puxei a lâmina negra para o lado jogando a garra do formigão para longe.
A formiga gigante tropeçou pra trás mesmo que a adaga não tivesse causado danos algum em sua garra.
“É isso... eu não quero morrer aqui, não agora, eu preciso de respostas! Preciso sair daqui!”
Minha mente se instabilizou por um segundo quando eu me ergui do solo com a adaga negra em minha mão.
Os insetos amedrontadores que andavam sobre duas patas exalavam um brilho frio de puro instinto assassino dos seus olhos.
Talvez eles perceberam que o garotinho fraco diante deles poderia de alguma forma estar tentando se defender?
Não, eu duvido que essas coisas monstruosas poderiam pensar assim, afinal... monstros sempre foram monstros. E assim como nos Isekai, eles não iriam hesitar em matar alguém fraco!
Passos! Passos!
Eu movi minhas pernas com todas as minhas forças correndo como se não houvesse amanhã.
Me foquei em correr na direção de apenas um alvo, a porta metálica que refletia a luz avermelhada do teto, o elevador que me fez chegar nesse lugar.
“Uma vez que eu alcance a saída, uma vez que eu fique longe daqui. tudo vai ficar bem. Eu vou ficar a salvo de novo.”, eu tentava amenizar a situação em minha mente enquanto meus passos ecoavam.
— Blurgh! — Eu vomitei sangue de repente.
Um impacto acertou minhas costas que se arquearam no mesmo momento.
Meu estômago e minha espinha se estremeceram com a pancada que fez meu corpo voar para frente.
— Urgh! Agh! — Meu corpo rolou sem parar, mas mesmo assim eu mantive minha mão firme no punho da Moon Blade.
Essa adaga era minha última esperança junto do elevador.
Quando meu corpo parou minha visão já estava borrada, minhas costas estavam jogando uma correnteza de dor estridente sobre todo o meu corpo e o monstro que me atacou se aproximava.
Eu vi suas longas pernas espinhentas seguidas de patas pontudas tocando sobre o solo incessantemente, correndo.
Chegando cada vez mais perto.
Skreeeeeek!
“Porra! Eu não posso, não posso morrer aqui! Não quero morrer assim!”, minha mente lutava juntamente com meu corpo que tentava se erguer.
O rastro azulado dos olhos do inseto sanguinário, suas garras prontas para me partir em pedaços, suas asas negras, tudo parecia permear uma pressão sobre mim, sobre minha mente e físico.
Eu estava acabado, isso era um fato imutável nesse momento.
“Você já deve ter visto que aqui é bem perigoso, então em caso de emergência eu vou te dar isso.”
Eu me lembrei das doces palavras de Incis ao me entregar a arma branca que eu empunhava, era uma pena que eu não pudesse nem agradecer antes de morrer.
A morte de alguém fraco, alguém que não faria diferença alguma no mundo, a minha morte.
— Mas o que... — Eu fiz um rosto abismado perante uma luz que desceu das alturas.
A luz carmesim no teto se dissipou para baixo rapidamente.
Os raios escarlates bateram sobre o chão como trovões.
Os circuitos gigantes lançaram correntes de energia sobre o solo destruindo tudo pelo caminho.
Booom!
O chão repleto de musgo se rachou e as vibrações percorreram não só pelo solo como também pelo meu corpo.
Minha visão foi tomada pela explosão de luz que jogou meu corpo para as alturas juntamente dos seres que estavam tentando me matar.
Os corpos dos insetos se dilacerando como ceda enquanto meus ouvidos eram ensurdecidos pelo som da explosão.
Minha visão girou de um lado pro outro enquanto eu tentava não vomitar com a sensação de tudo dentro do meu corpo balançando para todas as direções.
Ventania! Impacto!
Quando me dei conta, eu estava na superfície, meu corpo foi jogado para fora do solo juntamente de uma explosão de destroços e poeira nunca antes vistos.
— PUTA MEEEERDAAAA! — gritei voando pelos ares.
Felizmente eu não voei tão alto assim.
Meu corpo voltou para baixo e assim caiu sobre uma lona que se rasgou destruindo uma bancada de madeira.
Minha cabeça doeu com o impacto que com certeza poderia ter sido bem pior se não houvesse essa lona, bem conveniente.
— Urgh! Q-que droga... acabou de acontecer? — minha voz fraca foi se instabilizando junto com minha visão borrada.
Piscando meus olhos lentamente eu consegui ver os céus vermelhos acima de mim... uma cúpula bizarra cheia dos malditos circuitos de antes.
Gritos ecoavam por toda a cidade e o ar ao meu redor estava pesado.
Tentei controlar a confusão que senti erguendo-me dos destroços de madeira e com isso pude ver melhor como a tal Leycrid estava.
Vidros estraçalhados, prédios destruídos, pessoas mortas sobre as calçadas tingidas de sangue... Me senti em um verdadeiro campo de batalha.
Sinceramente, seria melhor permanecer no subsolo se fosse pra ver algo do tipo.
Eu engoli a vontade de vomitar revirando meus olhos pelas redondezas.
Vupt!
Foi então que os ventos se rasgaram pelo meio da rua.
Um vulto passou colidindo com o que parecia ser um carro enferrujado.
O som estridente do veículo sendo esmagado seguido da imagem de sua lata amaçando, uma pessoa colidiu com ele!
No mesmo segundo em que eu pude focar meus olhos sobre a figura que foi jogada contra o carro vi uma pessoa caminhando calmamente no meio da rua.
Cabelos prateados, olhos púrpuros, pele pálida e uma linda capa negra seguida de um capuz. Uma mulher, outra mulher!
— Hm? — ela parou seus passos quando percebeu minha presença.
“Merda! Quem é ela?! E aquela pessoa que foi jogada contra o carro foi...”, eu voltei meu olhar desesperado para o veículo amassado e lá estava ela, Incis.
A guerreira que antes vi massacrar seus inimigos facilmente agora estava sangrando pela boca com cortes pelo rosto e parte do seu peitoral de metal amassado.
— Incis! — Foi a única coisa que pude gritar quando vi a cena.
— Hoh! Então você a conhece? Que desagradável, parece que vou ter que matar mais pessoas. — disse a mulher de cabelos prateados ao fechar seu punho na minha direção.
Um brilho purpuro envolveu a mão dela e um vapor da mesma cor exalou de seus olhos frios e sem vida.
“Uma habilidade!”, eu preparei minha mente e físico para o pior quando vi a poeira brilhante na mão dela se dissipar.
— Não por muito tempo!
Uma voz ecoou por toda a cidade trazendo consigo uma presença sinistra.
Um calafrio, meu estômago embrulhando e a sensação de estar sendo observado, tudo isso surgiu de uma hora pra outra com a misteriosa entonação que caiu sobre nós.
Somado de um vulto dourado eu apenas vi um punho.
Punho esse que viajou pelo ar como um meteoro colidindo com o belo queixo da mulher no meio da rua.
— Ghargh! — Ela voou para as alturas quando a energia dourada do impacto se transformou em pequeninos dragões reluzentes.
— S-Senhor Kaylleon! — gritei ao ver Kaylleon, aquele velhote esquisito com seu punho erguido para cima, sim, ele fez isso!
Suas vestes elegantes agora continham rasgos nas pontas e a camisa branca por baixo de sua gravata estava repleta de manchas vermelhas, mas ainda assim era inegável, essas roupas eram dele.
— Você não deveria estar aqui garoto, apresse-se e corra! — disse Kaylleon com seus olhos exalando um brilho dourado.
Senti meu coração ficar pesado apenas com seu olhar coberto pela aura amarelada.
“Ele realmente é forte pra caralho então? Não, esse não é o ponto aqui, Incis está em perigo!”, eu ignorei meus pensamentos e rapidamente corri na direção de Incis.
Isso foi uma atitude clichê da minha parte, mas eu sequer poderia fazer alguma coisa diferente pra ser sincero.
— Incis! — Eu subi sobre o capô amaçado do carro e ergui minha mão até o braço da garota com o corpo enterrado nos bancos.
— N-não me toque Jack...
A voz tremida dela saiu com um pouco de sangue da sua garganta.
— Mas p-por que?!
— E-eu fui... tola, eu salvei você e por isso pensei que poderia fazer algo melhor que isso, apenas deixe a situação se resolver, eu já deixei pessoas demais morrerem por causa da minha tolice.
O rosto vívido dela agora estava vazio e deprimido, o sangue sobre sua face trazia uma sensação de melancolia pra mim.
Seu sorriso de antes agora estava oculto por dois lábios selados, molhados com o líquido carmesim.
“Droga, no final tudo isso foi culpa minha, eu que fiz ela se sentir assim, eu andei pensando nisso tudo como uma brincadeira e aqui e estamos.”, eu fechei meus punhos enterrando as unhas nas minhas palmas.
Foi tudo muito repentino, uma hora eu estava em um Isekai super maneiro e agora tinha uma pessoa sofrendo na minha frente, se sentindo culpada por ter me salvado, salvado alguém que estava apenas vivendo em um mundinho de fantasia ilusório.
Com minha perna apoiada sobre o capô destroçado eu virei meu rosto para trás. Eu não era digno de mostrar minha face nojenta e arrependida pra essa gentil mulher.
— Fo-foi mal Incis... Eu... Realmente sinto muito.
Nos céus eu pude ver colisões distorcerem o ar e jogando sons estrondosos pela cidade.
“Isso tudo é aquele velhote? O que ele planeja afinal?”, indaguei em pensamentos quando Incis levantou sua voz atrofiada.
— O-o meu pai é bem poderoso... e-eles o conhecem como “o punho de dragão”, então tenho certeza que... ugh! — Ela tenteou se erguer dos destroços.
— Não se mecha assim! P-pode ficar pior. — Eu tentei segurar ela com um certo constrangimento e inquietação.
— Vejo que fez bom uso da adaga que te dei né? — ela olhou para a lâmina negra meio arranhada em minha mão — De qualquer modo... Esses terroristas pensam mesmo que vão selar um Ranking A?
Incis se apoiou sobre meu ombro com um sorriso sem vida no rosto, uma esperança solitária parecia surgir nos seus olhos âmbar vidrados nas duas figuras lutando nos céus.
“Ranking... A?”, meus olhos se arregalaram voltando toda a atenção para os céus.
[Alguém Desconhecido]
— Como ousa... ferir o meu rosto?! Eu Nattalia Kresphory... vou te fazer pagar por isso. — Perdi a razão em minhas palavras que saíram juntamente de algumas gotas de sangue.
Um chute avulsamente quebrou os ares em minha direção.
Foi como um dragão prestes a engolir a minha cabeça sem piedade alguma!
Impacto!
Eu joguei meu antebraço para a direita impedindo que metade da minha face fosse esmagada pelo chute que estremeceu todo o meu corpo.
Isso com certeza me custou muitos pontos de vida.
— Sim, eu Kaylleon o punho de dragão ousei machucar alguém como você, agora diga mocinha, o que fez vocês iniciarem toda essa besteira? — perguntou ele com um sorriso arrogante.