Volume 1
Capítulo 38: Cúpula De Memórias
[Jack Hartseer]
O silêncio. Não havia voz, não havia cor, não havia nada.
Até mesmo após abrir meus olhos não havia forma, o vazio. No meio de uma escuridão completa eu me senti em pânico, incapaz e fraco.
Gritos de terror queriam rasgar minha garganta em um ímpeto pra se libertar de dentro dessa prisão que eu chamava de corpo, mas... Eu não podia, não conseguia e nem iria.
A solidão e a sensação depressiva de sempre.
Meus dias nesse mundo bizarro estavam contados, eu sabia disso, até por que tinha uma maldição permeando pela gaiola que continha as minhas emoções, o meu corpo.
Uma chama carmesim se ascendia no infinito breu enquanto eu apenas continuava imerso na escuridão completa.
O fulgor... O ódio.
Eu sabia bem que essa chama era a minha raiva sem sentido.
Não. Era impossível, alguém fraco como eu seria incapaz de apenas ignorar esse ódio, essa dor que queimava em meu peito, a tristeza se tornava tão grande que se transformava em ódio, a metamorfose pútrida.
“Por que?”, me perguntei dentro de mim mesmo na esperança de ter respostas, porém... Estava vazio, eu era como um pote repleto de rachaduras que ninguém de fato sabia como elas surgiram.
Sem memórias, sem motivos... Sem propósito.
Vuuush
A chama atravessou o breu como uma flecha flamejante para no fim perfurar meu peito.
— Hgh! — Pela primeira vez minha voz conseguiu quebrar as correntes do medo e da incapacidade para saírem em forma de um ruído patético.
Além de tudo isso eu já havia tirado a vida de alguém, nessa mesma noite uma garota adentrou o meu quarto e com uma faca tentou me matar, mas se ela tentou tirar minha vida realmente importava o fato de eu ter a matado primeiro?
“Eu sou... Um assassino?”
A resposta pra minha pergunta interna era óbvia. Não, eu nunca fui um assassino e nem seria porquê...
“Por que era matar ou morrer. Eu nunca tive culpa, nunca quis machucar.”
— Jack!
Uma voz irritante caía sob mim.
— Jack.
E então eu fui completamente carbonizado pelas chamas carmesins que me engoliram por completo.
— A-AAAAAAAAAAAAAAAGH!
A última coisa que escutei antes de acordar soltando um grito de desespero e agonia foi aquela voz destorcida em um tom zombeteiro.
— Você sempre terá que sacrificar algo pelo seu bem, até mesmo machucar e matar, Jack.
[Incis Katulis]
O elevador finalmente parou de descer. Foram longos 2 minutos de um silêncio tenso presos dentro das paredes de metal azulado e apenas um único cristal de luz no teto, um ambiente claustrofóbico e opressor que foi quebrado quando a porta se abriu no meio.
Shhhhh!
O som de fumaça sendo expelida penetrou em meus tímpanos e nós saímos enfileirados de dentro do caixote de metal.
— Bom, cá estamos. — Nidrik suspirou, sua voz permeando pelas paredes rochosas e pontudas.
“Está mais parecido com uma caverna do que com um centro de pesquisas.”, foi o que pensei antes de olhar mais adiante e ver um gigantesco cilindro de aço enterrado entre crostas de pedra e cristais azul-marinho.
Passos. Passos. Passos.
— Q-Quantos anos esse centro de pesquisas tem afinal?
Akira caminhou adiante com uma das mãos escorregando levemente sob a parede de cristais e rochas ao nosso lado.
— Bom, ele existe há muito tempo, até mesmo antes desse quem vos fala estar de olhos abertos para com o mundo. — Nidrik a respondeu passando por mim. Seu grande cabelo loiro a balançar.
O grande corredor guiado por duas paredes desreguladas parecia nos engolir com sua grandiosidade, no topo de cada muro rochoso as pedras ficavam pontiagudas, como lanças mortais.
Layaka e Yo, os dois empregados do senhor Nidrik, ambos apenas acompanharam seu mestre como dois guarda costas.
Os dois sacaram armas pequenas de algum canto estranho de suas vestes, Yo revelando uma pequena adaga de combate e Layaka uma espécie de pistola silenciada.
“Mesmo sem um Vitalis eles ainda estão a par de lutar pela proteção do senhor Nidrik ou será que eles só não querem se proteger?”, indaguei mentalmente.
— Ei! Incis, vem logo. — A voz de Akira ecoou lá da frente.
— S-Sim, estou indo!
Eu apressei meus passos depois de dar uma última olhada de canto no elevador que já havia subido para seu local de origem.
Tinha esperanças de que as coisas lá em cima estivessem mais calmas, porém por enquanto ainda eram apenas esperanças e nada mais, sabendo disso meus punhos se fecharam enterrando as unhas em minhas palmas firmemente.
— É isso. — Murmurei meio angustiada finalmente seguindo em frente.
Indo adiante onde Akira e os outros estavam havia uma beirada espinhenta de cristais azuis, um penhasco que com certeza não era nem um pouco baixo.
— Cristais são de energia Aether condensada. — Analisei me agachando perto de uma das pedras cristalizadas que iluminava os arredores do barranco.
— Energia condensada... um ponto de ignição não deveria corromper os arredores? A energia Aether é basicamente a vida do planeta, não faz sentido. — Akira levou a mão ao queixo pensativa.
“É verdade, se aqui há um daqueles portais que o senhor Nidrik mencionou então o ambiente deveria estar com algum tipo de corrosão, podridão ou qualquer coisa que não seja benéfica pro ambiente, porém esses cristais são apenas sinal de que a energia vital está em abundancia aqui.”, juntei peças em minha mente.
— Vocês vão entender se observarem com seus próprios olhos. — Nidrik retrucou caminhando calmamente para uma descida a direita do penhasco, seus empregados sempre o seguindo.
Passos. Passos. Passos.
Nossos passos a permear entre o interior vazio e oco da caverna, a iluminação de tom safira sempre batendo contra a coloração acinzentada das paredes e do terreno baldio.
Sem muitas opções eu e Akira apenas os acompanhamos.
Uma descida íngreme era o que fazia meus calcanhares doerem, mas isso logo se tornou apenas um pequeno detalhe quando na parede de pedras e terra ao nosso lado eu vi uma grande armadura metálica soterrada.
— U-Uaaah!
Akira deu um pulo para trás no susto.
— Uma armadura Azather. — pensei em voz alta olhando a maquina coberta de cristais e rochas de cima abaixo.
— Esse centro de pesquisas estudava não só a biologia, eram feitos testes com novos modelos e protótipos de tecnologias para o império sendo uma das principais a tecnologias a Azather, — Nidrik parou de frente para a armadura de aço soterrada. — o Aether fundido trouxe muitas novidades pro mundo da tecnologia, mas que lástima... e pensar que as armas mais mortais da atualidade só existem por causa disso. — Ele apoiou a mão sob a manopla metálica saindo pra fora da parede ríspida, sua face meio deprimida.
A pesquisadora com seu cabelo preso em rabo de cavalo se aproximou do nobre com uma expressão apreensiva.
— Não é sua culpa senhor Nidrik.
Seguindo o consolo da garota, Yo apenas continuou: — Exatamente senhor, você nem era nascido na época, certo?
Akira em contra partida passou a encarar a máquina mortal adormecida entre o verdadeiro caixão de pedra e pedras reluzentes, ela não piscou por um único segundo.
A luz safira banhando seu cabelo curto de cor negra enquanto suas pupilas tão escuras quanto um abismo parecia ganhar mais e mais vida.
“No fim ela é apenas uma garota normal.”, pensei em um certo alívio, tentando ignorar os perigos que isso poderia trazer pra ela mesma.
Após isso nós apenas continuamos nosso caminho, passamos por barrancos, subidas e tivemos até mesmo que escalar algumas regiões mais altas, para no fim chegarmos no centro do local.
O cilindro metálico enterrado no chão era como uma espada gigante em um pedestal, pronta para ser tirada dali a toda força e em frente dele estava a distorção reluzente, o portal chamado de “ponto de ignição”.
Mesas, cadeiras, capsulas destruídas e papeis velhos, os restos do que um dia foi um laboratório de alta tecnologia estavam expostos para todos os lados, havia até mesmo uma grande estante de livros rachada ao meio, perfurada pelos cristais azul marinho.
— Finalmente. — Dei um suspiro tomando a frente.
— Capitão Incis!
Meu coração acelerou, no mesmo instante em que Akira passou na minha frente desesperadamente, sua face apreensiva.
— O-o que foi senhorita Akira? — Yo franziu as sobrancelhas no que Akira desembainhou sua espada lentamente.
— Em cima... — sussurrou ela antes de ser envolvida por chamas purpuras que eclodiram de sua espada sendo liberta.
“Em cima?!”, eu ergui minha cabeça para visualizar em uma gigantesca abertura no teto.
Dois pontos carmesins gigantes pulsando em um vapor avermelhado e assassino.
[Um combate se aproxima, prepare-se!]
Shaaaaaaaaaarh!
Um grunhido ameaçador que bramiu pela caverna cupulada fazendo tudo ao redor vibrar em submissão.
— Merda, todos pra trás! — gritei para Nidrik e companhia.