Volume 1
Capítulo 37: Origem/Ignição
[Incis Katulis]
— Está me dizendo que há um daqueles portais bizarros abaixo dessa mansão? — perguntei com uma expressão desacreditada.
O mordomo apenas acenou com a cabeça em afirmação no que Akira me olhou preocupada para perguntar: — O que acha?
As pupilas negras e inocentes dela em conjunto com seu cabelo curto de mesma cor quase gritou pra mim que ela queria ir nesse tal local apenas por curiosidade.
Só que apesar de tudo é claro que essa loucura poderia sim estar ligado ao ponto de ignição abaixo da mansão, aqueles portais bizarros que meu pai vinha pesquisando antes do seu desaparecimento.
“Será mesmo que devemos?”, a dúvida permeou pela minha mente como se estivesse pressa em um quarto apertado, sem muitas opções.
— C-Claro que não é certeza que isso seja a causa, mas podemos muito bem c-compreender melhor sobre esses infortúnios.
Nidrik gaguejava entre soluços de dor, seu longo cabelo dourado com a franja pontuda pendendo para baixo como um pêndulo, ocultando parte da sua face.
Meus punhos se apertando firmemente, um suspiro longo de tensão que foi expelido por mim.
— Não é seguro deixa-los aqui, sem contar que a esse ponto não sabemos se tem outros “sobreviventes” na mansão, por hora acho melhor procurarmos um lugar mais seguro, precisamos de respostas, senhor Nidrik. — Me prontifiquei aproximando-me com um olhar destemido.
— Entendo, é o certo realmente.
Ele se endireitou ficando ereto ao se segurar sob o ombro da garota de óculos e do seu jovem mordomo.
— Esse ao meu lado é Yo e essa é a Layaka, — os lábios rígidos dele tremiam. — Feitas as apresentações dos meus valiosos empregados acho que só precisamos achar um aposento mais adequado. — debochou com um sorriso dolorido.
— O-Obrigada senhor Nidrik. — A pesquisadora fungou esfregando uma lágrima por baixo dos seus óculos.
— Tudo bem, vamos até os aposentos do senhor Nidrik então, é o local mais próximo e talvez mais seguro daqui.
O jovem mordomo no fim deu sua ajuda e nós nos dirigimos de modo cauteloso até o quarto do senhor Nidrik, que ficava em um andar separado da mansão que era acessado pela sala de jantar em uma torre com uma escadaria em espiral, por que ele apenas não instalou um elevador?
A impaciência me consumia a cada degrau que subíamos auxiliando o dono da mansão a não cair com o estranho ferimento no seu abdômen.
A mancha em sua camisa branca de botões formava um grande borrão carmesim, espero realmente que ele tal ferimento não tenha sido tão grave.
Passos. Passos.
Nossa subida tensa ecoava entre as paredes curvadas em círculos enquanto luzes se ascendiam como tochas, cristais azulados acoplados as paredes cinzentas, talvez fossem feitas de puro concreto mesmo.
A voz forte, porém, meio tremida de Nidrik quebrou o silêncio.
— Enfim, a senhorita Katulis realmente anseia por respostas, não a culpo, essa residência tem muitos segredos.
Akira apressou os passos subindo os degraus um pouco mais afrente e apoiou sua mão sob a sua Katana embainhada como precaução.
Todos se atentaram as palavras do nobre loiro.
— Antes desse lugar ser o que é agora ele pertencia ao império de Ataraxia, porém por meio de uma aliança entre reinos almejamos um laço forte entre raças e culturas diferentes, assim camponeses comuns poderiam simplesmente residir nas redondezas e foi assim que fomos expandindo nossas terras.
“O que isso teria de relação com o ponto de ignição?”
Dúvidas me preenchendo e Nidrik apenas seguia com as explicações.
— Ghn! — Ele grunhiu de dor em um degrau desregulado, — abaixo dessa mansão jaz um antigo laboratório de pesquisas que pertencia ao instituto de Ataraxia.
— O-outro local dedicado a pesquisas? — pensei em voz alta com as sobrancelhas arqueando em dúvida.
Passos. Passos. Passos.
— Essa escadaria é tão longa assim? — Akira reclamou para no fim apenas ser respondida ignorada pela explicação de Nidrik.
— Eu sou um dos últimos Ataraxios genuínos que vive em Gilly e sou filho do terceiro rei de Ataraxia, na época em que essas terras ainda estavam a se expandir eu estive no laboratório onde meu pai veio para tratar de alguns assuntos relacionados a expansão de terras, e tratos de outros reinos... houve... uma explosão. — O nobre respirou pesadamente antes mesmo de chegarmos no ultimo degrau.
Não havia porta nem nada, era só o grande e espaçoso quarto do grandissíssimo dono dessa imensa mansão, eu realmente não pude evitar de ficar impressionada com o quão grande era.
— Uau! — Akira correu para o meio do quarto em empolgação.
— Uma explosão, imagino que tenha sido resultado de algum experimento mal sucedido no laboratório. — palpitei adentrando o local.
Paredes cor de creme revestiam os arredores espaçosos do quarto com um piso ladeado em lindas pedras lisas de cor obsidiana.
— Sim, houve um acidente. — Nidrik se aproximou da cama sentando-se sobre ela com ajuda dos seus criados. Ele levou a mão até seu cabelo dourado endireitando sua franja pontuda. — Esse acidente além de ter deixado todo o local devastado por uma estranha névoa e vegetação bizarra também matou diversos pesquisadores, porém o mais interessante vem nesta parte.
“O jeito de falar dele... não parece mais de um nobre, parece bem mais sério também.”, analisei em pensamentos meio apreensiva.
A cama de casal grande, porém meio bagunçada enquanto apenas uma única e colossal janela iluminava todo o quarto. A luz do luar cinzenta banhando o piso brilhoso.
— Essa explosão causou uma distorção no vazio e ali surgiu uma “falha visual” ou melhor, o portal que vocês conhecem por “ponto de ignição” hoje em dia.
O nobre se inclinou apoiando os cotovelos sob as coxas para no fim entrelaçar os dedos na frente de seu rosto de modo pensativo.
Tum!
Meu coração congelando, a respiração parando e o leve choque da informação caindo sobre mim. Meu corpo começou a dar leves tremidas e uma dúvida imediata tomou conta da minha mente.
“Por que nunca contaram isso para o meu pai?”
Dei alguns passos para perto de Nidrik que apenas ergueu seus dois olhos de cores divergentes para mim.
— Eu sei, perdão senhorita Katulis... eu era jovem demais na época e também fui induzido a me manter de bico fechado sobre tal coisa para não trazer pânico a população de Mythland, mas de algum modo e-essas distorções começaram a surgir por todo o mundo após alguns anos.
Eu engoli minha saliva respirando rispidamente e desviei meu olhar para Akira que apenas tentava alcançar uma pequenina estátua de argila no topo de uma prateleira muito alta, ela era muito baixinha pra isso.
Mesmo assim o mar de pensamentos dentro de mim se intensificou, como uma tormenta.
“Meu pai esteve pesquisando tanto por causa desses portais... a origem deles era logo aqui, embaixo dos nossos narizes.”
Um certo orgulho me preencheu, não vou mentir.
Mesmo depois de tudo senti que talvez pudesse estar compensando esse tempo que meu pai havia sumido.
— Então a origem disso tudo foi aqui.
— É-É, sim... perdão novamente.
Meu sangue a esquentar, minha carne pulsando juntamente dos meus batimentos acelerando.
Eles nunca iriam contar isso pra nós, não é? Se as coisas não chegassem a essas circunstâncias meu pai provavelmente iria morrer sem saber disso!
Antes de erguer minha mão em uma raiva súbita e descontrolada vi o olhar de Nidrik. Sua face constrangida e arrependida.
Os dois olhos de cores diferentes, um verde esmeralda e o outro era um vermelho meio vinho.
Parecia como dois portais profundos apesar de contratarem de modo pacífico com os fios dourados dos longos fios pontudos por cima das sobrancelhas dele.
Minha face se enrijeceu.
Um nobre desviando seu olhar de alguém comum como eu, isso foi algo que eu nunca tinha visto na minha vida, desde o início eu fui reprimida pelos mais fortes ou ricos, entretanto Nidrik demonstrou simpatia e apatia por pessoas como nós da guilda.
Bom, acho que no fim apenas o fato de toda a família Blazeworth estar em um trato com a nossa guilda, que era considerada um grupo de terroristas, já mostra que são de confiança.
Fechando meu punho que já estava próxima a gola da camisa dele, pronta para agarrá-la, eu apenas respirei fundo.
“Acalme-se, não vamos sair da linha de novo.”
Um pequeno fragmento de memória piscou em minha mente.
Acabei me recordando de quando perdi o controle e acabei machucando a Beatrice naquele duelo que ela teve contra o Jack.
Pondo a cabeça no lugar eu fechei os olhos puxando um pouco de ar pra dentro dos pulmões e logo em seguida o expulsei suavemente.
Tentei não lembrar do fato de Beatrice ter morrido por minha culpa também, só que isso era difícil também, que droga, muitas coisas ao mesmo tempo!
— Não há por que se preocupar senhor Nidrik. — Levei meu punho fechado até o peito da minha armadura como um gesto de saudação. — Nos ainda somos uma guilda e temos um tratado com essa família, o nosso dever tem que ser cumprido, o que tem que ser feito será feito.
Dei um sorriso a ele ao terminar minhas palavras de confiança e o mesmo apenas sorriu. — Obrigado, me sinto lisonjeado.
“Funcionou.”, ponderei aliviada a relaxar meus ombros.
— E-Ei, o que é isso aqui?
O grito desajeitado permeou pelo quarto e todos olharam na direção dele. Akira estava perto de uma estranha porta dupla de metal com um botão azul reluzente ao lado.
O senhor Nidrik se levantou de modo travado e meio ríspido para no fim lançar a resposta: — Ah sim, é o elevador para o porão da mansão, vamos agora?
— V-Você vai também senhor Nidrik? Não é melhor ficar aqui em repouso? — Layaka, a pesquisadora de óculos se manifestou no que o mordomo, Yo, veio até nós com uma expressão hesitante.
O homem loiro diante de mim se ergueu totalmente e endireitando sua postura apenas deu um leve suspiro para responder: — É com o dono de toda essa residência que vossas presenças se referem, não é a qualquer um sabe? Sem contar que... na explosão eu ganhei esse olho.
No mesmo instante em que Nidrik disse isso seu olho direito de cor carmesim irradiou um vapor brilhante de cor sangue.
Uma energia envolveu seu corpo soltando o mesmo vapor pelos seus arredores, os ventos sendo afunilados de um modo meio rígido quase como se estivesse querendo expulsar todos de perto.
“O que é isso afinal?!”, dei dois passos para trás com um suor descendo pela testa.
— E-essa pressão... é um Aether? Não, um Vitalis?!
Akira tentou desvendar que tipo de poder seria, mas sendo sincera nem eu identifiquei, a energia e sua intensidade eram totalmente diferentes das de um Vitalis ou um Aether.
Uma presença diferente, nem tão forte e nem tão fraca envolveu todo o quarto, parecia que Nidrik estava em todos os cantos possíveis, mas ao mesmo tempo não estava, difícil de se explicar.
— Abra este elevador senhorita....
— Akira, meu nome é Akira senhor Nidrik!
— Isso mesmo, aperte este botão ao lado da entrada, Senhorita Akira.
Nidrik sorriu de um jeito diferente do seu habitual, sua face apresentou confiança e uma certa astúcia com seus dentes prateados amostra, sua pele pálida foi envolvida por um brilho meio fosco.
Então acabava aqui.
Se isso realmente tivesse relação com toda essa loucura acontecendo na mansão Blazeworth, seria resolvido agora mesmo.
“Mas e se não fosse? talvez teríamos grandes problemas, mas apenas todas essas informações já foram úteis. É, se mantenha positiva Incis!”, encorajei a mim mesma no meu mar de pensamentos.
Passos. Passos.
Eu segui calmamente até o elevador quando Akira tocou sob o botão de modo empolgado. Um leve vapor foi expelido pela pequena abertura entre as duas portas metálicas seladas que no mesmo instante se abriram.
— Tudo bem então, eu espero que não haja nenhum empecilho no caminho senhor Nidrik, é um sério incômodo pra mim quando os outros veem meu lado mais violento. — Debochei deixando a insegurança de lado.
Estava na hora de acabar com isso. Eu precisava ser forte e continuar em frente, a filha do líder da guilda, o usuário mais forte de Vitalis da atualidade, Kaylleon Katulis.