Ultima Iter Brasileira

Autor(a): Boomer BR


Trauma Longínquo

Capítulo 87: Aceitação

 

 

A pousada situada na capital de Gilly não era nada se comparada a grande mansão Blazeworth na parte sul dessa cidade que era recheada com arranha-céus e construções feitas com a tecnologia máxima que era fornecida através dos recursos pela guilda R.O.U.N.D.S.

Em um dos quartos dessa mesma pousada uma janela estava aberta para o céu escuro da noite.

Observando o contraste de casas rústicas e prédios modernos uma garota com um chifre carmesim em sua testa se encontrava imersa em sua própria mente.

“Uma Dungeon comum não tem esse tipo de aparência externa, sem contar que a algumas horas atrás houve um pico de energia Aether se espalhando pelo ar, com certeza veio daquela coisa.”

Passo.

No quarto onde ela estava uma silhueta se ergueu da cama por trás dela.

— Então também percebeu, Kyra. — Foi o que disse a figura coberta pela escuridão no cômodo.

O cabelo escarlate curto da garota chamada Kyra ondulando levemente com os ventos entrando pela janela escancarada.

Ela continuou com seu olhar vazio fixado no colossal cubo escuro que destacava a distância com luzes Neon em padrões de circuito reluzindo em sua superfície.

— Aquilo é o que chamam de Dungeon reencarnada, mestre Gray?

— Com toda certeza, eu já vi algumas Dungeons reencarnadas mesmo só fazendo 2 meses que estou nesse mundo, mas uma aqui em Gilly... realmente incomum.

A mão do tal mestre da Kyra caiu sob o ombro pálido dela apertando-o levemente antes da face dele ser revelada pela luz lunar passando pela janela.

O cabelo prateado e liso refletindo os raios dourados das 3 luas nos céus enquanto seus dois olhos profundos e acinzentados se focavam na luz do tal cubo irradiando no horizonte da cidade.

— Algo dessa magnitude vai ser um grande pânico pra toda a capital, Dungeons reencarnadas corrompem os arredores até que sejam fechadas por completo. — Gray estreitou os olhos passando uma das mãos por baixo do braço de Kyra antes de apoiar seu queixo no ombro dela. — Um problema desses só pode significar uma coisa, que talvez eu não seja o único Lost nessa cidade.

“Tire suas mãos de mim seu Lost de merda.”, a mente de Kyra rugia em uma fúria silenciosa.

 

[Jack Hartseer]

 

— Minha cabeça tá um caos, m-mas acho que consegui entender tudo. — Afirmou Incis com uma respiração ainda meio pesada.

Quem se prontificou a explicar grande parte dos acontecimentos pra ela fui eu, assim como fiz com Zakio, porém fui interrompido algumas vezes por ele que também queria esclarecer algumas perguntas dela.

A gente mal tinha tempo a essa altura do campeonato.

[A entrada principal para o Boss da Dungeon está liberada, iniciando contagem regressiva para a sincronização de dados.]

Tremores fazendo nossos ossos vibrarem enquanto essa espaçosa câmara estremeceu com a gigantesca porta dupla de metal abrindo-se ao meio diante de nós.

— Capitã Incis, aja o que houver eu vou te proteger. — Akira grunhiu apoiada pelo meu ombro.

Incis também com dificuldades pra ficar de pé, se sustentara no ombro de Zakio com um sorriso dolorido. — Obrigada, é muita gentileza da sua parte Akira. Também fico feliz de ver vocês vivos depois de tudo.

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“Acho que é uma hora um pouco complicada pra se dizer esse tipo de coisa Incis, mas eu já tava sentindo uma falta desse jeitão dela.”, concordei internamente enquanto um feixe de luz passou no meio da abertura se formando no centro da porta dupla.

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O som abafado do metal rangendo contra o chão de pedra enquanto esse portão gigante se abria, a ansiedade consumindo meus sentidos.

Se assemelhou bastante com a primeira vez que cheguei em Leycrid quando Incis me fez atravessar aquele grande portão metálico que o Renard protegia.

Mal dava pra acreditar que consegui ficar vivo até esse momento.

De repente a voz de Zakio veio em minha direção. — Jack. — Um tom imponente que me obrigou a responder de imediato.

— S-Sim, pode falar.

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— Aconteça o que acontecer... — Ele segurou Incis mais firmemente com uma das mãos por baixo do braço dela. — não se arrisque demais como fez até agora.

Minha mente e corpo paralisando.

Os olhos se arregalando, uma expressão confusa.

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Como se não bastasse Incis logo em seguida acrescentou com um tom acolhedor e meio triste: — Sim Jack, pega leve. A gente já passou por poucas e boas, mas isso não significa que você precise por sua vida em risco também, não quero sair daqui com um de nós a menos.

A voz de Akira se sobrepôs sob a de Incis. — Falou e disse, o capitão Jack é nosso companheiro no final das contas.

Meus punhos antes firmemente selados se abrindo levemente, a ansiedade se esvaindo aos poucos.

Foi como se de uma hora pra outra eu tivesse sido tirado de um vazio em branco, tive a impressão de ver uma mão acolhedora me tirando desse enigma bizarro chamado eu.

“Essas pessoas realmente se importam comigo assim?”, meu coração acelerou de forma abrupta enquanto um calor misterioso me envolveu por um mero segundo.

Talvez eu não fosse essa tal lâmina solitária que Abyssus havia dito. De algum modo poderia haver esperanças pra alguém como eu, eu poderia ser como todas as outras pessoas... poderia ser...

Aceito, eu fui aceito.”, essa frase percorreu o labirinto caótico dentro da minha cabeça e por um segundo fez meus olhos marejarem.

— C-Capitão Jack, o que é isso?!

— Chorando antes mesmo da luta começar e eu pensando que você tinha amadurecido, moleque.

— E-Eu... — Tentei enxugar minhas lágrimas em meio à confusão de sentimentos, porém percebi que estava equilibrando Akira ao meu lado com uma das mãos, a garota de cabelo escuro curto se inclinou levemente em resposta antes de levantar a voz com um biquinho.

— O-Opa capitão Jack, para de chorar na frente da capitã Incis, isso está sujando a imagem que ela tem de mim!

— Que surpresa, você parecia sempre estar prestes a chorar, mas nunca pensei que faria isso em um momento desses, Jack Haha!

 A risada gentil de Incis tinha um pouco de dor envolvida, ela realmente estava sem energias mesmo depois de Zakio lhe dar um pouco das poções Vitae.

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Esse momento havia sido quebrado por essa estranheza, essa gentileza incompreensível e repentina dessas pessoas.

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Por mais que eu estivesse confuso com o real motivo de me sentir tão emocionado com esse momento a ponto de deixar algumas lágrimas escorrerem, nenhum deles me repreendeu ou me criticou apontando dedos, não fui vítima de olhares desafortunados e de comentários inoportunos.

Foi apenas espontâneo. Aconteceu.

Não, talvez fosse só eu que era sentimental demais.

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Quando todos adentraram da câmara do Boss uma entonação poderosa caiu sob eles.

Finalmente, eu estive esperando por vocês. — A voz de Melize Hozarik ressoou pela vastidão da câmara repleta de pilares destruídos e poeira pelo ar.

O tremor proveniente da porta de acesso para essa sala aparentemente parou quando de dentro da nuvem espeça de poeira saíram 4 figuras que conhecíamos muito bem.

Passos. Passos. Passos.

Eles adentraram a sala do Boss e isso significara que a partir desse momento estavam sob misericórdia da 6° lâmina da organização de assassinos do império, Melize Hozarik.

— Z-Zakio, Incis, eu sabia que viriam!

O grito que veio por trás das costas de Melize foi engolido por um impacto monstruoso que fez mais e mais destroços metálicos em conjunto de pedras irem aos ares.

— Ei vejam! tem alguém amarrado lá no teto. — Exclamou Akira apontando sua única mão restante para as alturas.

Os olhos de todos subiram em direção a figura que tinha seus braços e pernas firmemente amarrados por prateados e finos fios, semelhante a uma pequena mosca presa em uma teia de aranha a garota se debateu.

— P-Pessoal! Socorro! — Gritou a pobre pesquisadora de cabelos castanhos sentindo seus braços e pernas prestes a serem decapitados pelos fios.

— Layaka! — As pupilas amarelas de Incis tremendo.

Zakio arregalou os olhos. — N-Não é só isso, vejam aquela coisa atrás de Melize Hozarik.

“Atrás...”, Jack guiou sua atenção para a gigantesca silhueta esférica erguendo-se por trás da mulher de cabelos negros e olhos azulados no centro da câmara.

Boooom!

Explosões de poeira e destroços subiram no que a massa esférica de corpos em conjunto subiu ainda mais alto.

Melize sorriu enquanto os fios metálicos atrás dela se moviam como tentáculos. — Essa é a minha nova marionete, costumava ser o Boss original dessa Dungeon, porém decidi exterminá-lo e me divertir um pouco já que o título de Boss foi transferido pra mim.

“Senhorita Hordri... não, essa não é e nunca foi a senhorita Hordrik, aquela mulher chamada Hordrik não era nada mais nada menos que uma máscara, a máscara que manipulou todos antes da mansão virar essa Dungeon.”, a mente de Jack se enfureceu enquanto seu olhar ficou sério.

— Aquela coisa é três vezes maior que todos aqui, c-como vamos eliminar aquilo?! — Quem levantou essa questão com uma voz tremida foi Incis.

Os olhos de Akira brilharam avistando algo.

— Caraca!

Um vulto esverdeado envolto de uma poeira reluzente de mesa cor cruzou os ares contra a colossal besta voando na câmara.

Corta!

A silhueta borrada partindo os ares era de um homem que apesar de todas as adversidades do momento continuou de pés não importa o que acontecesse, ele continuou a lutar nas esperanças dos seus companheiros retornarem.

Renard.

“Eu não vou parar agora que meus companheiros finalmente conseguiram chegar vivos, não vou parar!”, o guerreiro com olhos brancos e cabelo negro balançou seus braços que no formato de duas lâminas afiadas dilaceraram grande parte dos corpos amontoados que formavam o monstro esférico voando entre os pilares do salão.

Os olhos de Melize Hozarik a reluzir em um azul assassino no que ela ponderou consigo mesma.

“Já faz 1 minuto que transformei o Boss em minha marionete, Renard Shadoky sofreu lacerações por todo o seu corpo, porém ainda assim está vivo. Ele esteve tentando ganhar tempo pros seus companheiros? Não, só está tentando se opor a mim, é óbvio tendo em vista que ele roubou parte dos materiais que compõem meus fios apenas pra transformar seus braços em duas espadas.”.

Jack piscou seus olhos e nesse pequeno intervalo viu a assassina de cabelo negro sumir.

Foi inevitável pra ele gritar: — Merda, ela se moveu pessoal!

Apesar de cansadas Incis e Akira se prontificaram em suas posturas defensivas enquanto Jack e Zakio afiaram seus olhares nos arredores.

O monstro composto pelos cadáveres das bestas dessa Dungeon continuou flutuando sob o ar sem se manifestar com relação a eles 4, porém...

Estalos.

Faíscas.

O tilintar de metal contra metal, esse som irritante e agudo que não só Jack, mas todo o grupo conhecia se expandiu por essa sala.

O primeiro a levantar a voz com uma face assustada foi o guerreiro ruivo com sua cicatriz em cima do nariz, Zakio.

— Ela não veio em nossa direção, está na verdade priorizando Renard.

A silhueta de Renard com sua capa negra e a assassina de olhos azuis trocando golpes letais eram iluminadas a cada faísca eclodindo entre os ataques.

— P-Precisamos fazer alguma coisa. — Incis deu um passo adiante. — Ughn! — Parou antes de suas pernas fraquejarem.

Caindo de joelhos seu cabelo preto ondulou sob seus ombros.

— Incis. — Jack tentou segurá-la.

O garoto se assustou já que do nariz pequeno e pálido dela o mais puro carmesim escorreu e por mais que a mesma tentasse fazer uma face serena pra seus companheiros todos sabiam de seu estado atual uma vez que ela contou tudo o que passou antes de se reencontrarem.

— Capitã Incis...

— Porra, a gente tá contra a parede aqui.

A tribulação entre as vozes de Zakio e Akira fizeram suor descer pela testa do pobre Jack.

Com uma das mãos atrás das costas de Incis ele fez um pouco de força pra fazê-la ficar de pés novamente no que os dois olhos dourados dela se fixaram no rosto dele.                                      

 — O-Obrigada Jack, acho que quem acabou pegando pesado demais fui eu Hghh!

Os lábios de Jack se torcendo uns nos outros e suas sobrancelhas se enrijecendo em pura insegurança.

“Droga, a gente ainda tá fodido demais.”

Raiva e frustração se reunindo no coração dele.

Enquanto isso o combate feroz foi deixando seus rastros por cada canto da sala do Boss.

Bam!

Um barulho crepitante se alastrou pelo vazio quando uma broca de fios metálicos foi atirada por Melize na direção de Renard.

Os ventos se afunilando ao redor do projétil girando com seus fios tão afiados quanto as lâminas de Renard.

— Eu vou.

— Ficou maluco, Zakio?! Incis e Akira não estão em condições de lutar também.

— Você cuida das garotas, Renard é um dos meus companheiros mais valiosos, foi ele quem salvou Incis de virar um soldado de Zykron.

As pupilas negras de Jack se dilatando.

“E-Eu não sabia que esse cara era foda nesse nível.”, ele oscilou seu olhar entre Incis e Zakio chocado com tal informação.

Um brilho azul-marinho se reunindo ao redor da mão direita de Zakio quando seus dois olhos carmesins refletiam as faíscas e vultos reluzentes do combate acontecendo diante deles.

— Zakio, foi mal. Eu comi o seu dedo, n-não tinha dito isso antes eu só estou viva por causa dele agora. — Bufou Incis se erguendo por completo pra ser retrucada com apenas uma frase de seu companheiro com cabelo espetado.

— A única coisa que eu realmente não aceito perder não é a merda de um dedinho, mas sim as pessoas que eu protejo todos os dias. Venha Vi’Zihao!

Ventania!

A longa e grossa lâmina prateada se materializando no ar em conjunto de raios irradiantes e chiados visuais.

“Então esse era o nome dessa espada dele.”, a mente de Jack sentiu uma pequena fração do poder contido nessa gigante espada de metal sendo empunhada pelo seu companheiro.

— Pode mesmo empunhar essa coisa sem um dos dedos? — Indagou o garoto no que os ouvidos de todos zumbiu.

Uma verdadeira distorção metálica.

A voz do jovem foi engolida pelo som das partículas de ar sendo partidas com um único balançar da lâmina espessa na mão de Zakio.

Tch! Não subestime o seu capitão, moleque idiota.

O cabelo negro de Jack dançando em conjunto com a sua capa rasgada cobrindo seus ombros e torso enquanto apenas os ventos foram deixados pra trás com a arrancada de Zakio.

— O capitão Zakio é muito maneiro! — Os olhos de Akira brilhando.

A atenção do garoto caiu perante Incis, pra no fim ele presenciar um diálogo estranho entre as duas garotas do grupo.

— Akira, pra onde foi sua espada? É bem visível que você perdeu um dos braços, mas perder sua única arma já é demais.

— Minha espada? Ah, a capitã Incis realmente é muito esperta. — Akira começou a suar frio. — B-Bom... eu fiquei focada demais na capitã e perdi. — Seus lábios se curvaram em um sorriso tremido.



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