Volume 2
Capítulo 1: Quero viver
BOKUTSUNAGARI
Quero viver
Era uma noite tranquila na residência dos Nishida. O ar fresco da madrugada preenchia os cômodos da casa. Mas aquela noite foi marcada para sempre por um homicídio: o pai da família foi morto pela própria esposa. O filho mais velho, Akihiro Nishida, presenciou tudo. A mulher, sem intenção de machucar os filhos, os abraçou em silêncio.
— Entendam... Seu pai queria matar vocês. Queria me matar também. Eu só fui mais rápida. Eu impedi que ele fizesse qualquer coisa. Vocês acreditam em mim, não é, crianças?
— Sim, mãe. Eu acredito. — respondeu o mais novo, sem hesitar.
A mulher percebeu que apenas um dos filhos respondeu. Passou então a mão nas costas de Akihiro... e cravou as unhas nas costas da criança.
— Ah! S-sim... Eu acredito, mãe... — respondeu, gaguejando.
— Vou chamar as autoridades. Contar tudo o que aconteceu. Se eles perguntarem algo... vocês dizem que sim, certo?
Os dois assentiram, instintivamente. Sentaram-se no sofá, imóveis, enquanto a mulher ligava para a polícia.
— Rem... você acredita na mamãe?
— Eu acredito. Já ouvi ela falando com as amigas sobre como não confia em homens... Que muitos batem nas esposas. Será que o papai era um desses?
— Ele... Ele não era!
— Deve ter sido coisa da sua cabeça. A mamãe não faria isso...
Antes que a conversa seguisse, batidas fortes interromperam o silêncio.
— Residência dos Nishida? Polícia!
Os meninos olharam para a mãe. Ela surgia na sala com roupas rasgadas, hematomas no rosto e cortes pelo corpo. Abriu a porta apenas o suficiente para encarar os policiais, com um olhar de pânico bem ensaiado.
— Ah... são vocês. Entrem, por favor.
Ela abriu a porta por completo. Os policiais entraram e começaram a vasculhar o local — o corpo do homem, os móveis revirados, os filhos imóveis no sofá. Um dos oficiais se agachou diante dos garotos.
— Olá, meninos. Sinto muito pelo pai de vocês. Queria entender melhor o que aconteceu. Tem algo que sua mãe não contou pra gente? Se vocês me contarem... eu prometo que levo vocês pra tomar sorvete amanhã.
— Não! A mamãe sempre fala a verdade pra mim e pro meu irmão! Eu confio nela! — Rem respondeu na hora, com firmeza.
O policial sorriu e olhou para Akihiro, esperando a confirmação.
O garoto desviou os olhos para o canto da sala. Lá estava a silhueta da mãe, em pé, imóvel, com o olhar vazio cravado nele. Não disse uma palavra... mas a ameaça estava estampada no rosto.
— Sim... Minha mãe nunca mente pra gente. Ela sempre é sincera comigo e com o Rem.
O policial assentiu, colocando a mão no ombro dos dois.
— Vou ver com a mãe de vocês se posso levar vocês pra tomar sorvete amanhã...
— Não precisa, senhor. Mas obrigado — respondeu Akihiro.
A mulher entrou novamente na sala, logo atrás dos outros dois policiais.
— Só mais um caso de agressão contra mulher. A mesma merda de sempre... Vamos embora, tô morrendo de sono. — comentou um deles, sem cerimônia.
— Espera aí... — disse o que estava com as crianças, se levantando e se aproximando do colega, falando em sussurros:
— Você quer mesmo encerrar isso aqui assim? A gente nem sabe se ela tá dizendo a verdade.
— Para de se preocupar com essas porcarias. A mulher tá toda machucada, cheia de marca. Ninguém faria isso só pra encobrir um crime.
— Mas ela... não demonstrou nada. Nem medo, nem tristeza. Nenhum arrependimento.
— E daí? Para de complicar tudo. Vamos só relatar o que vimos, ela pega a herança e a vida segue. Agora cala a boca.
O homem abriu um sorriso forçado para a mulher.
— Vamos resolver o restante na delegacia. Talvez você consiga a herança do seu... ex-marido.
Ela forçou um sorriso também.
— Claro. Obrigada pela ajuda.
Os policiais foram embora. A casa ficou em silêncio. Akihiro observava tudo. Um sentimento estranho, misto de raiva e confusão, começou a se formar dentro dele — e aquele sentimento o acompanharia até os seus 16 anos.
Era mais uma manhã comum. A luz do sol batia no rosto de Akihiro, acordando-o. Ele se arrumou em silêncio, desceu as escadas tentando não acordar o irmão, e saiu para a escola.
A caminhada era tranquila. O ar frio acalmava seus pensamentos. Na escola, sentou-se no mesmo lugar de sempre — isolado. Mas aquele dia seria diferente. Um novo aluno entrou na sala.
O garoto usava o uniforme da escola, olhos verdes e cabelo azul-escuro.
— Oi. A aula ainda nem começou... Por que já tá aqui?
— Prefiro esperar aqui. Não sou muito sociável, pra falar a verdade.
— Ah, entendo. — Ele se sentou ao lado de Akihiro. — Me chamo Hikaru Shimabukuro. Prazer.
— Akihiro Nishida.
— Beleza, Nishida. Qual sua matéria favorita?
— Não tenho uma... Mas gosto de geografia.
— Eu curto matemática.
— Nunca foi meu forte.
O silêncio tomou conta da sala. Nenhum dos dois tinha mais assunto.
— Tem algum hobby?
— Não. — respondeu Akihiro, sem olhar nos olhos dele.
— Que pena... Eu gosto de ler.
— Legal.
A sirene tocou.
— Começou. Te vejo depois da aula, Akihiro!
Ele apenas acenou, tirando o caderno da mochila.
A aula foi entediante. Durante as sete aulas, Akihiro apenas divagava. Ao fim do dia, encontrou Hikaru no portão.
— E aí, Akihiro. Já indo pra casa?
— Sim.
— O que vai fazer?
— Nada. Provavelmente dormir.
— Ah, não seja sem graça! Eu e uns colegas vamos caçar vampiros hoje à noite. Quer ir?
— Vampiros? Quantos anos vocês têm? Dez?
— Tem vários boatos rolando... A gente quer ver se é verdade.
— Que idiotice...
— Tá com medo? — Hikaru sorriu de leve.
— Só não quero me meter. Vai que aparece algum maluco armado?
— A gente vai levar tacos, facas. Ninguém vai mexer com a gente!
Akihiro suspirou, acelerando o passo.
— Ei, Akihiro! Não seja tão chato!
— Eu não me importo com o que você pensa de mim.
Dessa vez, foi Hikaru quem suspirou.
— Se mudar de ideia, vamos nos encontrar na frente da escola às nove da noite.
Akihiro não respondeu. Continuou andando até o amigo sumir de vista.
Em casa, encontrou Rem vendo TV com a boca suja de salgadinhos.
— Ah, chegou. — disse o mais novo.
— Minhas aulas acabam às três. As suas?
— Meio-dia.
— Hm.
O assunto morreu. Akihiro foi direto para o quarto e se jogou na cama.
— Que dia chato...
O tempo passou devagar. Ele ficou encarando o teto, sozinho, no quarto abafado. Até que Rem entrou no quarto.
— Vou dormir na casa de uma garota.
— E eu deixei?
— Precisa? Já sou maduro o suficiente.
— Ainda sou seu responsável.
— Akihiro... posso dormir na casa de uma amiga?
— Vai fazer merda com ela?
— Claro que não.
— Então beleza. Mas esteja em casa amanhã às dez da manhã.
— Valeu, maninho!
Rem desceu correndo as escadas e saiu de casa.
— Já tinha até feito a mala... idiota. — murmurou Akihiro.
— Ele já tinha feito as malas... que moleque idiota — Akihiro resmunga, ainda deitado em sua cama.
O tempo continua passando. Do entardecer ao anoitecer, e Akihiro ainda não saiu do lugar. Apenas encarando o teto, enquanto os pensamentos martelam sua cabeça. Até que, em meio à escuridão do quarto, o som de passos ecoa pelas ruas vazias. Curioso, ele se levanta, olha pela janela e vê alguns garotos caminhando em direção à escola.
— Ele realmente vai caçar vampiros... que idiota.
Por um instante, Akihiro sente um impulso estranho dentro de si. Uma mistura de tédio, inquietação e... talvez inveja? Não, ele não se permitiria admitir isso. Mas, de alguma forma, estar sozinho naquela casa o fazia se sentir ainda mais preso.
Depois de hesitar por alguns minutos, ele se levanta da cama e troca de roupa. Pega uma jaqueta, coloca nos ombros e desce as escadas. Ao sair de casa, sente o ar frio da noite invadir seus pulmões. Uma sensação desagradável e familiar.
A caminhada até a escola não é longa, mas o silêncio da cidade naquela hora da noite o faz sentir como se estivesse atravessando um deserto. Ao chegar, avista Hikaru e mais dois garotos ao lado do portão.
— Olha só quem resolveu aparecer — Hikaru diz, com um sorriso de canto.
— Não se iluda. Eu só vim garantir que vocês não fizessem nenhuma burrice grande demais — Akihiro responde, com desdém.
— Pode relaxar. Só vamos patrulhar a região e ver se encontramos alguma pista. Tem muita gente dizendo que viu coisas estranhas por aqui nas últimas semanas.
— Bom, não tem problema você ir com a gente, mas pelo menos trouxe alguma coisa?
— Um canivete.
— Melhor que nada. Bom, vou te apresentar o grupo.
Ele primeiro aponta para as duas garotas.
— Essa é a Hinata, e essa é a Tenzo. E esse é o Haru.
— Prazer em conhecer vocês.
O resto do grupo não responde, criando um silêncio um tanto desconfortável. Alguns olhares de estranheza pairam no ar, até que Hikaru corta o clima:
— Bom, vamos lá!
O grupo caminhava pelas ruas noturnas da cidade. O silêncio era pesado; os únicos sons presentes eram os passos dos jovens e o vento gelado que os envolvia. Akihiro, um pouco atrás, não tinha intenção de se aproximar dos outros. Mas seu espaço é invadido por Hinata, que se aproxima colocando o braço em volta de seu ombro.
— Você é virgem? — pergunta, com um pequeno sorriso.
— Quê?... Sim, eu... Eu sou, sim.
— Ah, que pena... Um garoto tão fofo ainda não fez nada com nenhuma garota. — Os outros membros do grupo tentam conter o riso, mas alguns não resistem a dar risadinhas.
— Que tal, depois da nossa aventurinha de conto de fadas, irmos para minha casa brincar um pouquinho? — Ela encosta os seios no braço dele.
— Eu não estou a fim de me envolver sexualmente com alguém ainda... Me desculpa.
O garoto se afasta de Hinata e se aproxima um pouco mais do grupo.
— Você é a primeira pessoa que recusa a Hinata, Akihiro — diz Haru, dando um leve soco em seu braço.
— Eu não quero fazer sexo ainda.
— Deixe de ser medroso, vai ficar se guardando só porque não é uma garota com quem você tem intimidade?
— Eu não estou a fim, só isso.
Haru se aproxima ainda mais e sussurra no ouvido de Akihiro:
— Se você for com a Hinata, eu juro que vai ser bom. Ela faz muito bem.
— Dispenso...
O garoto se afasta de Haru. A caminhada continua por ruas, becos, parques e estações de metrô. Já era quase onze horas da noite e nada de estranho havia acontecido, o que começava a estressar Haru.
— Hikaru, estamos andando há quase três horas. Você acha que vamos encontrar alguma coisa?
— Pra ser sincero, não. Que tal nos separarmos em grupos? Ou melhor, cada um vai para uma direção.
O grupo concorda com a sugestão, exceto Akihiro, que mantém a expressão neutra.
— E você, Akihiro?
— Tanto faz. Só quero achar alguma coisa pra essa saída não ter sido inútil.
— Ok, então está decidido. Cada um vai pra uma direção. Se não acharmos nada, voltamos pra cá, na frente da cafeteria.
Com todos de acordo, cada um segue por um caminho diferente da cidade. Akihiro entra num beco, Hikaru segue pelas ruas vazias, Tenzo vai em direção às lojas de conveniência, Haru desce as escadarias do metrô, e Hinata discretamente segue Akihiro.
— Mas que pé no saco... Por que eu vim? — murmura o garoto, segurando o canivete no bolso.
Apesar da sujeira e da aparência hostil dos becos, o trajeto parecia tranquilo. No entanto, Akihiro sentia uma estranha sensação de estar sendo observado — talvez apenas um morador de rua. Essa paz estranha se quebra com um grito feminino, falho e alto. Akihiro nota que veio da direção por onde ele passou e volta rapidamente.
— Alguém está aí? Se sim, por favor, diga alguma coisa!
A preocupação cresce enquanto ele corre entre os becos. Mas toda ansiedade se transforma em horror ao encontrar quatro homens ajoelhados, devorando um cadáver — o de Hinata. Seu corpo estava jogado no chão, com a mandíbula arrancada e o estômago sendo devorado. Aquilo não era normal. Não eram apenas canibais. Eram vampiros.
— Hinata?...
A voz de Akihiro sai baixa, tremendo. Um sussurro. Mas foi o suficiente para chamar a atenção das criaturas, que se viram como predadores alertados.
— Olha só, gente, mais uma presa — diz o mais magro deles, com cabelos bagunçados e prateados, dentes tortos e roupas desalinhadas.
— Kagami, ele parece mais suculento. Vamos nele primeiro — responde o mais forte, com roupas de couro e cabelos cacheados e escuros.
Ao ouvir isso, Akihiro tenta reagir. Pega o canivete, mas seu corpo treme. Ele não consegue se mover. Kagami avança numa velocidade impossível, mordendo e arrancando metade de sua mão junto com o canivete. Akihiro encara o que restou: seu dedão, indicador e parte da palma tinham sumido. Ele olha para trás, vendo Kagami mordendo e balançando o pedaço de sua mão como um cão brincando com a presa.
Akihiro grita com força, mas mal tem tempo para entender o que aconteceu. O outro vampiro surge por trás e crava as presas em sua garganta, rasgando brutalmente a carne e arrancando um pedaço inteiro da traqueia e das cordas vocais. A garganta se abre como um rasgo de carne viva, cuspindo sangue para todos os lados. O grito se transforma em um gemido sufocado.
Ele cai. Não sente mais o chão — apenas dor. Uma dor tão aguda que cada segundo parece durar uma eternidade. Os quatro vampiros se lançam sobre ele como hienas enlouquecidas. Um deles morde com violência sua perna esquerda, arrancando a carne até o osso e o arremessando como um pedaço de carne de açougue. Outro crava os dentes na parte inferior do abdômen, mordendo com força e puxando os músculos rasgados como se estivessem desfiando carne moída.
Akihiro tenta gritar, mas apenas um som grotesco escapa. Seu corpo convulsiona no chão enquanto os monstros o devoram ainda vivo. Seu ouvido é arrancado por uma mordida abrupta, fazendo com que sons se embaralhem em ruídos abafados e distorcidos. O vampiro que arrancou a orelha mastiga o pedaço como um chiclete, cuspindo partes no rosto do garoto.
Seus olhos quase saltam das órbitas ao ver seu próprio braço sendo torcido e quebrado com facilidade. Os ossos estalam como galhos secos, e logo o braço inteiro é arrancado fora, sangue espirrando em todas as direções. Eles se revezam, mastigando partes de suas costelas, arrancando pedaços do rosto — um deles chega a cavar os dedos nos olhos do garoto, esmagando os globos oculares com um prazer sádico.
A carne é devorada com estalos, osso por osso, músculo por músculo. O peito é rasgado e dilacerado aos poucos, enquanto o corpo ainda pulsava fracamente. Não restava mais nada além de uma carcaça viva e sem forças, quase irreconhecível.
Mas então, passos. Estranhos, lentos, ameaçadores. Os vampiros congelam.
Eles sentem.
Aquela presença. Aquela coisa. Um medo instintivo toma conta dos monstros. Sem pensar duas vezes, largam os restos de Akihiro e correm, se desfazendo nas sombras como ratos fugindo da luz.
— Que garoto mais fofo...
Akihiro, em agonia total, abre levemente os olhos. Sua visão é turva, misturada com o sangue que escorre da testa e invade seus olhos. Ele vê uma garota. Cabelos castanhos curtos. Olhos vermelhos como brasas vivas.
— Quer a minha ajuda?
Ela sorri.
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