Torneio da Corte Brasileira

Autor(a): K. Luz


Volume 1

Capítulo 31: Pago pelos Punhos

O apito soa, iniciando o combate.

“Desta vez será diferente!”, pensa Laerte. Ele comprime os músculos das costas com o apertar dos braços à frente.

Quando Kimai o derrubou na fase anterior, ele ficou sentado na cama do seu quarto por horas, fitando a parede, irritado. “Uma vitória por sorte”, “quase estragou tudo”, “esqueceu da sua necessidade de ganhar?”, “que desempenho detestável”, entre outras frases que surgiam no fundo da sua mente para o atormentar. Em determinado momento, Laerte simplesmente se levantou e começou a desferir socos no ar com uma expressão fria, em contraparte aos golpes quentes, que faziam seus punhos emitirem uma tensão que torcia o redor.

“Que seja impregnado em meus punhos… a necessidade de vencer a qualquer custo. Esse corpo é uma ferramenta, uma moeda de troca, pela sobrevivência.”

Retornando ao presente, Jay dobra os joelhos e salta à frente, ficando surpreso com o que vê neste tempo: os arredores são rasgados por um Big Bang de branco, não devido a sua velocidade, mas a do oponente que a ofusca. Do branco vai ao preto; o rosto do Jay é acertado em cheio por um direto de direita.

O público arregala os olhos, o estrangeiro tem o semblante amassado, sendo repelido com uma explosão de vapor. A nuca dele cai sobre a terra, as pernas vão para o alto.

As listras de poeira dispersam-se em farelos.

O punho direito que o atingiu teve todas as faixas que o cobriam destruídas em pedaços, como parte da pele também foi.

 

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Os braços pequenos de um garoto moreno vão de um lado a outro, golpeando o inimigo à frente: uma criança também. Eles estão sujos de lama, caindo no chão depois de muitas trocas.

Mesmo antigamente eu sabia que tinha que depender “deles”, tanto para defender o meu orgulho, quanto o respeito da minha família… 

Os dois são separados pelos outros jovens.

O tempo passa.

Em casa, Laerte ajuda a irmã a se acomodar na cama. É um lugar pequeno, feito de tábuas com vento perturbando seu interior a partir dos buracos. A garota é menor que ele, sempre tossindo e com dificuldades para se mover normalmente, ajuda é essencial para que possa fazer qualquer coisa. Seus pais passam o dia fora trabalhando, voltando apenas bem tarde da noite, acabados.

A fatídica rotina prossegue, a madeira envelhece.

Um dia a garota é levada ao médico pela mãe, acompanhada do garoto. A conversa destrói seus ânimos, lhe restando ouvir cabisbaixos os resultados.

— (…) Apesar do quanto a medicina evoluiu para cuidar das nossas saúdes — diz o médico —, ainda não há bons resultados nos tratamentos das “Condições de Aura”. São casos raros em que a própria frequência da força ini enfraquece e fere o corpo… 

A expressão do Laerte fica mais obscura, seu corpo se torna pesado.

Porém, esses punhos ainda pareciam tão inúteis. Havia algo que eles não conseguiam proteger… 

— Pelos exames, está claro que em alguns anos sua filha irá precisar de ajuda especial de equipamentos específicos para se manter. Até lá ajudaremos com o que pudermos, mas o preço do uso das máquinas está além do nosso alcance.

O garoto puxa o canto da boca, rangendo os dentes em amargura.

O tempo passa.

Em uma academia, o dia de treino prossegue normalmente como em qualquer outro, ou ao menos era para ser assim: uma batida forte na porta chama a atenção de todos no local, incluindo o técnico.

— Huh? O que foi isso?

A porta é aberta com um chute, Laerte é quem surge. Está cambaleando, cheio das marcas de uma briga. Do lado de fora do edifício está um homem caído na calçada, sangrando pela boca — completamente nocauteado.

O garoto respira fundo ao observar o interior do lugar, em seguida se enraivece, correndo na direção do treinador. Ao estar próximo o suficiente, grita, socando a defesa de palmas do homem; seus dedos quebram na colisão do punho, mas o impacto transcorre pelo corpo do homem, o que o surpreende.

Os funcionários da academia agarram Laerte antes que pudesse fazer mais algo, prendendo seus braços, pernas e pescoço, tornando inútil até se debater. Sua cara é pressionada contra o chão.

A atenção do treinador se direciona ao semblante do invasor, que é igual ao de um animal descontrolado.

— Parem de o pressionar! — ordena, fazendo com que eles apenas o mantenham selado sem o puxar. Um silêncio cai sobre o local. — Por que fez isso, pivete? Responda!

— Certo… Hehe… Fiquei sabendo que essa academia tá na merda faz algum tempo, sem nenhum destaque! Então decidi vir aqui oferecer uma proposta irrecusável, mas o cara lá fora não me deixava entrar de jeito nenhum, por isso acabei com ele!

— Entendo… Ao que interessa: com quanto de aura você nasceu? Aquele não foi um soco ordinário.

624 II! E já consigo controlar!

— Alto como o esperado, mas está longe de está “controlado”. — Um sorriso também se forma em seu rosto. — Qual a proposta?

— Eu serei a estrela em ascensão dessa espelunca! Então me der dinheiro! O máximo que puder!

...então eu corri atrás. Nem que fosse a força eu decidi que mudaria isso, que também poderia protegê-la com os punhos a minha moeda de troca!

 

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Jay roda para trás, batendo as costas e outras partes do corpo; raízes de energia roxa se espalham pelo solo. Só para na parede, espalhando um baque e poeira na colisão.

— HÃ!!? O QUE FOI ESSE ACERTO?!! — braveja Gaojung. — O quão forte foi?... JÁ ACABOU?!!

Antes que os narradores pudessem analisar mais da situação, Laerte avança contra o adversário já girando o ombro direito para atacar. O concreto cede com o impacto do punho, Jay esquiva abaixando a cabeça, e, com a força reunida se levanta rápido buscando agarrar o braço do oponente.

O boxeador evita ser pego ao recuar o membro, neste instante Jay muda de postura e lança um soco; Laerte recua o estomago para poucos adiante do punho estendido. Uma batalha de pouco centímetros para o contato.

Tendo falhado em sua finta, Jay investe, sendo recepcionado com um direto de esquerda no rosto que amassa seu rosto e joga seu corpo para trás.

Laerte vira o corpo, lançando golpes curvados no estilo Detroit, amassando mais o torço e cabeça do rival; em sequência arranca com a guarda fechada no peek-a-boo, acertando-o como um touro, jogando-o de vez contra o muro.

A empolgação da plateia aumenta..

Socos são projetados por rotas variadas, desde diagonais, laterais e retas, resultando na mesma coisa: explosões pelo corpo do Jay, que está fechado numa tentativa de amenizar os danos. Suas costelas, fígado, umbigo, bordas da cabeça e braços são torturados pela dor. O concreto atrás racha, liberando poeira a cada choque.

No andar VIP os indivíduos são afetados igualmente pela demonstração de força.

— Ótimo! — exclama Unsai. — Agora basta manter a pressão!!

— Eu já não tenho tanta certeza se vai funcionar — comenta Humine.

— Hum? Como assim?

— Se estratégia de pressão funcionasse eu teria tentado. Com tantas superfícies apoiando o corpo, Jay não poderá ser verdadeiramente machucado.

— Ah! A dispersão!

— Sim.

Ao sentir uma colisão na cintura, Jay desliza pela parede, ileso. Ele roda pela força residual, disparando a mão direita como uma lança, que Laerte evita mandando a cabeça para o lado; emenda um golpe de esquerda contra as costelas dele, pressionando-o novamente no muro.

 A pressão prossegue, uma prisão que não pode ser quebrada.

 

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Entrevista do Jay:

— (...) creio que seja fútil perguntar seu sobrenome depois de ter o feito com seu irmão, então vamos para a próxima: Qual sua idade e o quanto possui de força ini?

— Acho que tenho 18 anos…

— “Acho”?!

“Afinal eu fui adotado.” O rapaz suspira. — A medida da minha aura é 385 II.

— Entendo. Diga algo que gosta e odeia.

— Hm… Gosto de comer bem. Não gosto de desapontar minha família, principalmente meu irmão.

— Quais suas impressões do torneio? E o qual o seu maior desejo envolvendo-o?

— O que Ury respondeu sobre isso também será minha resposta.

— Certo… O que devo dizer? Você é bem leal, Jay.

 

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Os vultos das estocadas voam, espalhando cortes pelos braços e um pelo rosto do Laerte, que segue balançando os membros para o esmurrar. O veneno se espalha pelos nervos, a ardência dos cortes estressa o pugilista.

“Comparado ao que Ury passou…”, pensa Jay, seu aspecto é constantemente coberto pelos estouros dos impactos. Sua visão começa a duplicar as imagens do que vê.

Ele dá um passo à frente, a chuva de ofensivas vibra o chão debaixo dos seus pés que seguem avançando a cada instante.

— AH! SURREAL!!! Jay segue firme!! — brada Gaojung. — Ele está fazendo Laerte recuar?! Mesmo após sofrer daqueles impactos desumanos!? Estou vendo errado?!

O estrangeiro dá mais um passo ao desferir a estocada, uma que falha, e com isso, ao perceber que a enxurrada de pancadas irá voltar, ele relaxa o corpo por completo, deixando ser fuzilado.

“Isso não é nada!!” Jay investe, recebendo um golpe que balança a cabeça, sendo neste instante que seu punho também conecta com o rosto do Laerte, entortando-o. Suas costas colidem no solo, o boxeador cambaleia para trás.

O estrangeiro levanta com um único impulso; Laerte estabiliza seu equilíbrio. Logo ambos retomam suas posturas de luta.

— O tempo do reconhecimento acabou — diz Shinsai —, agora será para valer.

Jay salta, seu braço se torna um borrão, reaparecendo no surgir de um corte no peitoral do oponente, que recua para evitar um ferimento pior.

“Tch! Apesar de conseguir vê-lo claramente, esses aumentos súbitos de velocidade são difíceis de lidar.” Laerte move os pés rapidamente, mandando-os de um lado ao outro, variando as direções à medida que as do adversário também mudam por o perseguir. Entre algumas ofensivas, Jay recebe de um a três jabs da esquerda do rival, liberando faíscas nas viradas da sua cabeça.

Pelo corpo do boxeador a dor o percorre por dentro dos braço igual as brasas de uma fogueira violenta. Ao olhar para o oponente nota que o dano que causou se resume a praticamente nada — anulado pela eficiência da dispersão — um prêmio frustrante por todo o esforço que fez.

Neste ponto a torcida já havia percebido quem está no controle, quem está… mais próximo da vitória. Sem se importar — por ser praticamente imune — Jay caminha dentro de um furacão de ofensivas em busca do seu centro.

O andar VIP está em chamas. 

— Argh! Que estilo irritante! — comenta Omnislai, sua voz é quase engolida pela da torcida à volta.

— Isso não é bom para o Laerte — começa Humine —, diferente de mim, melhor, de todos nós, ele não possui nenhuma técnica de chute para focar as canelas do Jay.

— Mesmo se tivesse, não iria funcionar. — Shinsai aponta para as pernas do estrangeiro. — Ele está mais atento ao próprio jogo de pernas, seus movimentos nem se comparam aos das rodadas anteriores. Talvez seja por causa das drogas, ou depois de ter sérias dificuldades contra você, Humine; em todo caso, um chute baixo ou uma rasteira não servirão contra seu estado atual.

— Sério?... Então o que Laerte vai fazer?!

— Não sei… 

— Vocês não devem se preocupar com ele — diz Kimai —, ele sempre se prepara para cada luta. Algo definitivamente acontecerá, por que não tem como o controle de um confronto não está em suas mãos.

O grupo fica mais concentrado no telão ao ouvirem essas palavras.

De volta ao combate, Laerte suspira, estando a um passo de ter o pescoço perfurado pelos dedos do rival. O lado contrário da sua mão esquerda desvia a estocada, sucedendo de virar o cotovelo duas vezes para defletir mais dois ataques.

As pernas do estrangeiro tocam uma na outra pelo seu cessar repentino. Ele vê Laerte fazer algo fora do ritmo de antes, pois ao invés de seguir recuando e atacando, ele está investindo com o centro de gravidade baixo em uma ofensiva total.

A mão do Jay parte o ar sem hesitação, perfurando a carne do oponente por baixo da clavícula, tendo os dedos imersos no vermelho que vaza.

O rapaz abre mais os olhos ao ver o pugilista ainda vindo à frente. Ele roda um dos pés para intensificar a torção que aplica por baixo da clavícula, enxergando os resultados claros na pele à volta, mas sem qualquer resultado. O avanço continua descomunal, atingindo-o.

Veias ressaltam por todo um braço, um tênis arrasta de lado pela terra, a cintura do Laerte gira densamente, estremecendo as partículas do ar. Com um balanço lateral ele acerta as pernas do oponente, as juntando e amassando no soar de um estrondo; Jay é jogado para o alto, rodando rapidamente com a leveza de um boneco de palha.



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