Torneio da Corte Brasileira

Autor(a): K. Luz


Volume 1

Capítulo 19: A Resposta no Abismo

O apito soa, Humine é o primeiro a executar algum movimento, correndo contra o adversário enquanto braveja. Ao se aproximar o suficiente, gira o corpo, impulsionando a perna desde baixo como um machado, estourando o golpe na face do Jay; toda a plateia fica desnorteada com essa visão.

Raízes roxas se espalham por dentro do chão, o torço do atingido inclina-se para trás, seus pés se arrastam pela terra por ser repelido.

Humine avança para aproveitar a proximidade do estrangeiro, mudando de ideia ao sentir uma má sensação preenchê-lo, visualizando um olhar rodeado afiado fitá-lo, uma hostilidade que o faz recuar com um salto, evitando que fosse alcançado na face por uma estocada do braço do Jay; um corte pequeno surge em sua bochecha. Apesar da distância criada entre eles, seu estado segue sendo de profundo alerta.

— UAU!!! — grita Gaojung. — ISSO QUE É UM COMEÇO!!! Alguém esqueceu de avisar Humine de que Jay tem vantagem contra estilos ofensivos?! Ele simplesmente ignorou isso e foi com tudo!!

— Foi como se ele tivesse dito: “É irrelevante! — exclama Malena. — Seu estilo não me preocupa! Não porta nenhum mísero valor!” Jay já foi tão insultado assim alguma vez?!

Sangue escorre do nariz do estrangeiro, limpo na passagem do braço. Seu cabelo foi bagunçado pela colisão, a área de impacto está marcada com alguns arranhões; diferente de um pouco mais cedo, seu olhar está de volta ao habitual, caído, tendo se acalmado após a última ofensiva. Ele suspira, falando em seguida:

— Você me assustou, que loucura foi essa de começar assim? Se eu estivesse preparado poderia ter decidido a luta ali.

— Sei que é lento para imergir no confronto, Jay. Sabia que não estava preparado para algo como aquilo. — O rapaz faz um selo de pássaro com as mãos, mantendo-o próximo do peitoral, lembrando algo como a forma de um “coração”. — Eu não vou cair facilmente, “meu consagrado”.

— As pessoas desse país são mesmo estranhas… 

Os dois se entreolham em suas posturas de luta, sendo Humine quem quebra a tensão, indo para o lado como um borrão, surgindo à frente do estrangeiro com um direto de esquerda; é defletido pelo lado contrário de uma mão. Os pés do atacante se abrem, com o segundo indo pela dianteira e o demais no rumo oposto, dando-lhe um bom sustento para lançar jabs; circunferências de vento são formadas a cada desvio que Jay faz, apertando a sobrancelha pela dificuldade.

“Esse cara…!” pensa Jay, vendo os punhos do oponente serem jogados de ângulos diversos, havendo alguns “falsos” entre eles que param no caminho. “Ele está misturando fintas ao bel-prazer para dificultar minhas leituras!”

Humine cessa os ataques para formar um selo de boi com as mãos, causando confusão ao adversário. Suas costas se inclinam para trás, aumentando a força na projeção de um chute reto que acerta o fígado do Jay; o corpo do atingido gira para o lado, tirando-o do golpe antes que ele fosse fundo na sua carne, espalhando o estouro para o ar.

“Nem esse chute funciona?!” considera Humine. Ele recua a perna para não ser pego em um agarrão.

“Essa cara… ele quase me distraiu com aquele movimento das mãos… ‘Desorientação induzida’, é?” A aura em suas mãos tem um destaque de brilho pelas veias, que estão tingidas de um forte tom arroxeado, emitindo vapor de igual cor a partir delas. “Maldição, não posso vacilar contra essa cara… Não queria revelar tão cedo as minhas ‘presas’, mas as coisas podem ficar complicadas se não for assim.”

— Ei! — chama Humine. Seu centro de gravidade foi abaixado, ficando com as mãos cerradas próximo da cintura. — Seu vídeo de exibição é totalmente sem graça!

— Como se você tivesse algum direito de falar do meu vídeo! O seu foi patético! Aquele negócio de “ficar mais popular entre as mu…” — Ele para ao ver o desespero do oponente em tentar calá-lo, um que solta sons indescritíveis da boca pela confusão que o aflige.

— Pare aí! Não continue falando disso!

Os narradores ficam incrédulos com os dois, ficando com expressões desmotivadas graças a situação.

Humine inspira fundo, começando a correr o mais rápido que pode por volta do estrangeiro, que o persegue com os olhos. O estrangeiro não vira muito o corpo, como se fosse contra o seu estilo fazer uma ação tão abrupta.

O corredor avança subitamente com a mão direita na forma de um sabre, procurando a parte detrás do pescoço do Jay, conseguindo desferir um golpe por lá, mas ganhando de retorno o lado contrário de um punho cerrado sobre sua cara; seu golpe de sabre foi contra-atacado de imediato, a força do seu impacto se dispersa no ar.

Para não cair, o rapaz segura a manga do Jay, sentindo no mesmo instante o resultado do ato: os arredores se deformam numa espiral, pois seu corpo está girando, parando repentinamente no bater do seu rosto no chão. Seu corpo fica estirado para o alto.

O estrangeiro investe, cessando a ação ao presenciar as cambalhotas que o outro faz para sair do seu alcance. De pé, Humine cospe sangue para o lado, agora possuindo uma marca na dianteira da face igual o adversário.

— A situação parece ruim para Humine — fala Malena. — Apesar do seu estilo não depender de agarrões, seus golpes são ineficazes. Afinal, como se deveria lutar contra alguém que simplesmente inutiliza e usa tudo que é jogado sobre ele a seu favor?! Jay é realmente inabalável!

— AAAH!!! E LÁ VAI ELE PARA OUTRO EMBATE!!! — fala Gaojung. 

Humine lança o braço direito, encontrando apenas o nada pela cabeça do adversário ir ao lado; Jay revida com um soco, um com dois dos dedos superiores avantajados, sendo rebatido pelo antebraço do oponente.

Os dois se encaram, suas pernas são ajustadas para melhorar seus posicionamentos. Jay projeta mais um soco, que é parado ao ser pego pelo pulso por duas mãos; Humine tenta quebrá-lo com uma torção, porém o estrangeiro percebe, abrindo sua postura para o lado em para realizar uma técnica de dispersão com o braço agarrado. Humine fica pasmo ao sentir suas pernas se debruçaram de uma vez sobre o chão.

Ao notar que o estrangeiro está preparando para atacar com o outro braço, o rapaz solta o pulso dele, fechando uma guarda que recebe o choque, sentindo-a estremecer; seus joelhos deixam de tocar o solo e ele é jogado para trás, rodando de lado contra o chão, quicando duas vezes antes de parar.

“Hm? Sério?” pergunta-se Jay. “Não tenho força o suficiente para jogar alguém tão longe naquela pose… Ele se jogou junto?... Apesar de ter te ajudado a sair do meu alcance, é uma decisão bem questionável.”

O acertado se levanta, cerrando os dentes enquanto contorce o semblante em dor, soltando e interrompendo seus gritos de aflição. Seu braço direito, por onde foi atingido, está com a pele torcida em uma espiral.

— Foi mal. — Jay chama a atenção dele. — Mas não sou tão bom quanto meu irmão para acertar vários “pontos” ao mesmo tempo… Então quando eu toco em um, é para valer.

Humine faz o selo do cavalo nas mãos, respirando fundo com os olhos fechados, lembrando algo como uma oração pela postura compacta em que está. Depois de alguns segundos expirando densamente ele volta a formar uma postura de luta, ficando com as pernas muito separadas com os braços à frente, que parecem cobras prontas para dar o bote em alturas diferentes.

— Entendo… ainda não foi o suficiente para você. — Jay também retoma sua pose de batalha.

Os dois se encaram.

O público e os narradores ficam tensos na espera, havendo muitos que gritam para encorajar quem está na desvantagem ao contrário dos que incentivam o estrangeiro a nocautear o adversário. Mesmo com tudo isso os dois prosseguem não dando um passo, criando uma tensão que incendeia a arena em altas labaredas.

Mais segundos se passam, a falta de qualquer ação fazem murmúrios se espalharem por todo o prédio.

As chamas cobriram os lutadores ao ponto de deixar apenas seus cabelos expostos, sendo apagadas pelo balanço do braço do Jay. Ele está com uma expressão desconcertada, dizendo em um tom monótono:

— Vai atacar não?

— Por que eu iria?! Estou me recuperando da dor!

As pessoas ficam pálidas ao ouvirem essas palavras, estarrecidas pela maior quebra de expectativa que já tiveram nas suas vidas.

— Bem… — Gaojung compartilha do mesmo sentimento da torcida.

— ...faz sentido — completa Malena.

O estrangeiro começa a caminhar na direção do oponente.

— Fala sério… — diz Jay, não tendo pressa no ritmo dos passos. Humine fica apreensivo com a aproximação. — Você só me dá trabalho, que figura. Por que não se rende? Se tem essas lágrimas nas bordas dos olhos apenas com um acerto, o restante do confronto não lhe será interessante.

— Não me subestime! Eu sou o cara!

Eles ficam frente a frente. As sombras escurecem a dianteira do corpo do Jay, destacando suas intenções hostis para o rival.

— Minha pose está toda aberta, sem nenhuma proteção digna de parar a destreza dos seus ataques… — O estrangeiro revela seu olhar nas trevas, refletindo a imagem do oponente pelas íris, um que voltou a fechar a defesa. — Ainda sim, não vai atacar?

— Se eu fizer qualquer coisa você vai anular ou reverter contra mim, é simplesmente idiotice.

— Nesse caso, como pretende ganhar sem atacar?

Desta vez não obtém resposta, notando a expressão do Humine fechar-se em incômodo. Jay suspira, em seguida fica sério; ele dispara o punho como um tiro, alvejando a exata mesma área que torceu antes, fazendo o oponente apertar as pupilas pela dor, mas é só o começo do tormento, pois em seguida é continuamente acertado por uma tempestade desses ataques, não tendo descanso nem para mover as pernas na busca de uma fuga.

Várias espirais foram marcadas pelos braços do rapaz, até seus ombros e partes da cintura sofrem com os contatos. Os olhos dele estão claros, perdendo o brilho devido a dor, uma que destrói por completo sua pose. Prestes a cair para um abismo, cada fibra do seu corpo estremece.

 

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No passado, um pouco antes da luta começar, tocaram nos telões as gravações sobre a entrevista que cada um teve. Essa foi a do Humine, que foi feita com ele sentado à mesa:

— Qual seu sobrenome? e qual sua idade? — indaga o entrevistador, que não está sendo pego pela câmera. — Quanto possui de força ini?

— Kos é meu sobrenome. — O jovem está com os braços estendidos, seus punhos estão no centro da cadeira. Ele tem dificuldade em manter o contato visual pela vergonha que sente, sabendo que será transmitido no futuro para o público. — Tenho 20 anos, minha aura tem uma frequência de 223 II.

— Eh? Pela sua altura e jeito do rosto eu achava que tinha 18 anos. Quais são suas impressões do torneio?

— Mmm… Não gosto da ideia de ser tudo tão liberado. Apesar de sermos lutadores, sentimos dor como qualquer humano e, mesmo que não pareça, é frustrante ver o corpo que você construiu por anos ser quebrado para uma recuperação longa… Ao menos é minha opinião, já que não sou masoquista; provavelmente ninguém simpatizará com isso. Só que não é tudo ruim na minha perspectiva desse torneio… O alcance de público, o tratamento e o prêmio são de alto nível, o que deixaria qualquer um empolgado, não sou exceção. 

— Entendo, interessante. (...) Diga algo que gosta e algo que odeia.

— Pode ser qualquer coisa?

— Sim, desde comida ou uma pessoa, fica a sua escolha.

— Deixa eu ver… gosto de sair para passear, me refresca. Odeio que algum evento que tenho interesse seja cancelado.

A conversa continua, chegando ao questionamento final:

— Qual o seu maior desejo envolvendo este torneio?

— Aí você complica para mim! hahaha… Quero ser mais popular entre as mulheres, é minha única ambição, sei meus limites, então não estou pensando alto demais.

 

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Retornando ao presente, Humine está desabando para o solo, indo para o fundo do abismo da derrota. Seus traços são puxados para o pela velocidade em que cai, seus cabelos são balançados pela ventania que foge do fundo da escuridão.

“Um mísero degrau… Isso que sou?”

A perna esquerda dele desliza pelo muro do abismo, dobrando-se enquanto a realidade alterna-se entre a verdadeira e a do delírio. Suas pernas param de uma vez, explodindo suas cores por toda a resistência que impõem, estando a direita estendida, estourando um chute baixo sobre a canela do Jay, que tem seu equilíbrio abalado e o membro acertado defletido para trás.

Um sorriso se molda no rosto do Humine, que sobe com o impulso do pé esquerdo, subindo junto de um gancho que mais parece o lançamento de um míssil, atravessando o ar até estourar debaixo do queixo inimigo, amassando a face dele enquanto põe o seu corpo de pé.

“Mesmo que minha motivação seja uma merda, não tem como aceitar esse destino!”

Ele sobe com um salto, carregando Jay junto, que se liberta apenas na queda, batendo as costas no chão; o oponente cai de pé, mostrando as costas, moldando um selo de rato perto da boca, tampando-a com os dedos levantados.

— Dobre-se, meu degrau! — O brilho do seu olhar se intensifica.

O confronto acaba de começar.



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