Tokyo Ravens Japonesa

Tradução: Nie

Revisão: Math


Volume 9

Capítulo 1: Morte

 

 

 

 

“A verdadeira essência da magia são as mentiras?

Verdadeiramente. Isso soa como você.

Mas eu não acredito nisso.

As mentiras, de fato, tornam-se as flores da magia, mas as flores são sustentadas por suas raízes.

Confiança.

Sem isso, nenhuma mentira brilhará.”

 

~Hishamaru

 

PARTE 1

A criança não tinha nome.

Uma criança tabu. Um espírito maligno. Ela era mantida em desprezo e isolada. Ela entendia que era esse tipo de existência desde que aprendera sobre o mundo, mesmo que ninguém lhe explicasse.

Ela não era cuidada, não era amada e apenas ‘existia’ todos os dias. Ela acreditava sem dúvidas que isso continuaria até sua morte. Ela acreditava que essa era sua ‘vida’.

Mas ela estava errada. Não era assim.

Porque sua vida era cheia de ondulações, nem superior nem inferior a qualquer outra pessoa nascida naquela época.

Tudo começou com uma voz animada e espirituosa. A voz de um garoto que jogou as pessoas de lado e invadiu sua prisão, abrindo a pesada porta.

“Você é minha Shikigami? Entendo. Você é muito estranha.”

Era uma luz disparando na escuridão profunda.

No momento em que ela foi iluminada por essa luz, o verdadeiro significado de sua ‘vida’ começou.

 

 

“... Me desculpe... por sempre... esconder de você... sobre Hokuto...”

Um feitiço de cura.

Harutora recuperou a razão. Por que diabos ele estava se afastando!? Por que ele estava perdendo tempo!? O sangramento era grave!. Ele tinha que parar o sangramento agora! Rapidamente! Agora! Agora mesmo!

“... Mas... você provavelmente... já percebeu...”

Ele tinha feitiços de cura com ele. Ele os levara junto de outros talismãs como precauções contra sua aura sair do controle, contra o Oni que Natsume encontrara, e contra o Onmyouji monitorando os dormitórios. Certo, ele tinha a quantidade necessária e suficiente.

“... Harutora-kun...”

Ele se atrapalhou com a caixa de talismãs na cintura, abrindo a tampa com a ponta dos dedos e puxando talismãs – mas ele não conseguia concluir seu movimento habitual. As pontas dos dedos tremiam e não o ouviam. Sua mente fora imediatamente pintada de raiva e irritação, e ele até ficou incapaz de respirar.

“... Eu... amo você...”

Fique calmo! Não! Depressa! Rápido! Ele ignorou as pontas dos dedos que ainda não conseguiam se mover com sucesso, usando toda a mão para forçar a abrir a caixa de talismãs. Ela abriu. Ele pegou todos os talismãs coletados lá dentro, sem reservas.

“... Não vou perdoá-lo se você morrer...”

“Order!”

A aura que quase não deveria ser sentida fluía de algum lugar. Ele apertou os talismãs que havia agarrado na ferida como se quisesse parar o sangramento.

No momento em que ele usou magia, a névoa que envolvia sua mente se dispersou. Natsume permaneceu imóvel no braço esquerdo com os olhos fechados. O uniforme estava encharcado do peito ao abdômen. Um líquido quente e fresco escorria do peso apoiado em seu braço, mas rapidamente esfriou e endureceu ao entrar em contato com o ar externo.

Seu coração parecia como se um pedaço tivesse sido arrancado enquanto ele olhava para o corpo de Natsume. O frio de sangue coagulado. Ele resistiu à vontade de vomitar que subia em sua garganta, deixando de lado as distrações para se concentrar em sua magia.

Ele procurou e infundiu energia mágica nos talismãs de cura que ele pressionava no corpo dela. Ao mesmo tempo, ele reescrevia meticulosamente a magia dos talismãs para combinar com a ferida de Natsume. Cada segundo contava. Os efeitos foram otimizados enquanto muitos talismãs de cura eram reunidos. Ele empurrou sua pressão espiritual ao seu limite, despejando energia mágica com tanta força que a magia quase explodiu.

No entanto, ainda não fora suficiente.

Claro, essa era a primeira vez que ele tratava uma lesão grave de alguém com magia. Mas, por alguma razão, as coisas que ele tinha que fazer surgiram uma após a outra em sua mente. Ele acrescentou a aura de seu corpo à aura estagnada de Natsume, forçando-a a circular. Ele fez sua energia mágica, que havia sido aumentada através de talismãs dos cinco elementos conectados, fluir para os talismãs de cura. Então entoou a magia. Ele usou um Shikigami simples para preencher momentaneamente o tecido do corpo que estava faltando. Era mesmo no nível cirúrgico, mas agora ele podia entender esses procedimentos. Enfim, ele fez tudo o que pôde. Ele usou todos os seus meios para trazer Natsume de volta – ele tinha que trazê-la de volta!

“... Haru...!”

Ele sentiu como se tivesse ouvindo alguém gritando acima dele. Mas ele não conseguia entender o significado dessas palavras, embora sua mente estivesse tão clara.

“Harutora! Você...”

No momento seguinte, ele ouviu a voz de alguém novamente e um impacto caiu em seus pés e joelhos com um estrondo. Ele imediatamente protegeu o corpo de Natsume. Ele finalmente entendeu a situação depois de cair na estrada de asfalto – eles haviam caído no chão e pousado. Certo, ele estava voando no ar até agora – e fora de controle. Não, agora ele tinha que se concentrar em curar Natsume.

Ele deitou o corpo de Natsume no chão de concreto, continuamente lançando magias como se quisesse cobri-la. Ele parou o sangramento, fechou as feridas e reparou os órgãos danificados. Sangue insuficiente. Magia emergiu instantaneamente em sua mente e sua boca entoou um encantamento que ele nunca ouvira. Ele tinha que restaurá-la para antes do acontecido. Nada mais importava. Sem deixar uma única ferida. Absolutamente!

Droga!! Ele amaldiçoou inconscientemente.

“Droga, droga, maldição!!!” Reclamações transbordaram de sua boca.

Por que as coisas se tornaram assim? Por que as pessoas fizeram essas coisas? Por quê?

Quem foi...?

Momentaneamente, ele sentiu um terror e desespero que nunca conhecera, mas Harutora instintivamente negou tudo. De qualquer forma, ele não admitiria essas coisas, essas coisas não eram permitidas. Tinha que ser desfeito como se nada tivesse acontecido.

Tudo bem! Ele disse desesperadamente para si mesmo. O tratamento fora perfeito e o corpo ferido de Natsume estava claramente se recuperando gradualmente. Ela estaria tão boa quanto nova em pouco tempo.

Contudo...

Um alto rugido.

Ele procurou o próximo talismã a partir do conhecimento infinito que constantemente entrava em sua mente. Para fazer um coração parado bater e fazer com que os pulmões colapsados se expandissem. Para fazer alguém acordar dos mortos. Para fazer Natsume voltar...

“... tora!”

Como ele poderia repetir o erro que havia cometido com Hokuto!? Seu eu atual era diferente do daquela época. Seu eu atual só veio a existir depois que Hokuto desapareceu e ele superou várias experiências depois de definir seu objetivo de se tornar um Onmyouji. Ele deveria ser capaz de salvá-la! Salvar alguém não era demais. Sua amiga importante, sua mestra preciosa e amiga de infância insubstituível.

Ele definitivamente poderia salvá-la, então por favor, por favor, por favor...

“Harutora!”

Seu ombro foi agarrado por trás.

Seu corpo se encolheu e, ao mesmo tempo, algo reagiu rapidamente no canto de sua visão.

Algo preto, como a asa de um corvo...

“Gah!?”

Touji, que colocou a mão no ombro de Harutora, ficou chocado.

Não era outro senão o casaco preto que ele usava que derrubou Touji – pretendendo proteger seu ‘mestre’. Este vestuário, semelhante a uma capa e a um sobretudo, que parecia ser tecido de penas de corvo. A Asa do Corvo. A barra inferior tremulou ameaçadoramente enquanto se transformava.

Touji instantaneamente cruzou os braços para se proteger do ataque preventivo do Corvo. Ele foi atingido com força, mas conseguiu pousar na estrada de asfalto. Felizmente, Touji reagiu reflexivamente, ou então... Ou se ele não estivesse permanecido em sua forma Oni, ele não teria escapado tão facilmente.

Assim como Natsume.

“...!?”

O rosto de Harutora se torceu, tirando reflexivamente a Asa do Corvo e jogando-a para o lado. Imediatamente, o poder espiritual vindo da Asa do Corvo foi interrompido e uma exaustão intensa varreu seu corpo. Um calor intenso e pulsante o percorreu. Seus nervos sobrecarregados queimavam como se tivessem entrado em curto-circuito.

“Hah!” Harutora caiu na estrada de asfalto, a força de seu corpo se esvaindo.

Ele fracamente virou a cabeça na direção de Natsume, que estava ao seu lado.

Não era Natsume quem estava lá.

O que estava ali era o cadáver dela, envolto em um uniforme ensanguentado.

Depois de decolar com a Asa do Corvo, Tsuchimikado Harutora caiu no chão como se tudo o que o possuía tivesse desaparecido. Somente depois de confirmar isso, Ato Touji baixou a guarda.

Touji também estava extremamente confuso, mas reprimiu com força o coração vacilante e começou a estudar a área.

O lugar onde Harutora caíra era o meio da estrada. Embora estivessem muito longe do local do festival de fogos de artifício, parecia que o tráfego das áreas próximas também havia sido bloqueado. Mas, em vez de carros passando, havia vários visitantes que pararam nas proximidades para ver o que havia acontecido.

“... Reboot.” Touji silenciosamente entoou o encantamento, liberando sua transformação demoníaca.

Os fogos de artifício do festival ainda continuavam florescendo. O céu noturno estava pontilhado de rajadas de cor. A luz dissipada pelas explosões lentamente piscava ao seu redor.

Dairenji Suzuka também estava lá, em um local um pouco mais distante que Touji. Ela e Touji – e também Natsume – perseguiram o furioso Harutora juntos depois que ele foi possuído pela Asa do Corvo. Embora tivesse tocado o chão, não havia desfeito os Shikigami de papel. Congelada no lugar, ela olhou para Harutora com uma expressão pálida e ingênua – e para Natsume que estava na frente dele.

Sua mente provavelmente estava em branco. Mesmo que Touji pensasse isso, ele não era uma exceção. Um impulso destrutivo quase enlouquecido ficou preso em Touji, espiando por este lado.

Mas Touji, que continuara enfrentando seu demônio, havia aprendido maneiras de lidar com o desespero.

Ele desistiu de pensar, enxugou as emoções e se aproximou de Harutora.

Harutora estava caído no concreto com uma expressão sem alma.

Seu tumulto até recentemente havia quase esgotado seu poder espiritual. Harutora não tinha estabilidade espiritual desde que lutara com Shaver na filial de Meguro. Ele também perdera o controle durante o dia de hoje e fora reprimido pelo Oni de um braço. Ele instantaneamente perdera o controle completamente por causa da Asa do Corvo.

Mas o Harutora atual parecia ter se recuperado um pouco da sanidade ao notar que sua vida estava em perigo, como se estivesse nos momentos finais de Natsume. Depois que Touji confirmou esse fato, ele decidiu interromper sua análise e desviou o olhar de Harutora.

Então, Natsume...

Ele lentamente se aproximou dela, sentindo seu pulso e verificando se ela estava respirando.

Ela ainda podia sentir aura do corpo da garota. No entanto, Touji soube que era isso que o Onmyoudou Geral chamava de aura persistente. A aura que permanecia no corpo de Natsume não era muito diferente da aura familiar de Natsume. Mas, mesmo assim, não era mais Natsume.

Ela não tinha pulso, nem estava respirando.

Natsume já estava morta.

Um impulso distante começou a mostrar suas presas em Touji novamente. Seria tão libertador confiar-se apenas a esse impulso. Mas Touji manteve-se completamente calmo. Agora, ele tinha uma missão pela qual tinha que ficar calmo.

“... Harutora.”

Touji chamou. Harutora não respondeu, mas Touji entendeu que, ao contrário de antes, essas palavras chegaram ao amigo.

Mas ele não sabia como continuar falando depois disso. Era um fardo muito pesado. Touji fez todos os esforços possíveis para eliminar suas emoções. Nesse tipo de situação, não fazia sentido se forçar a fazer coisas que ele não podia fazer. Touji cerrou os dentes levemente, levantando-se e virando-se para Suzuka.

“Suzuka.”

“...”

“Suzuka!”

Suzuka estremeceu, virando-se para ele.

“Me ajude a colocar uma barreira para afastar as pessoas. Você pode fazer isso?”

“... Uh, sim.”

Suzuka assentiu, sua expressão rígida. Mas algo desceu de cima mais rápido do que Suzuka poderia colocar uma barreira.

“Yukikaze...”

O Shikigami cavalo que Natsume havia montado enquanto perseguia Harutora, Yukikaze.

O antigo Shikigami que servia a família Tsuchimikado por gerações parecia já entender a situação. Depois de descer e ficar a uma certa distância de Natsume e Harutora, abaixou a cabeça com remorso. Touji deixou Harutora e se aproximou de Yukikaze, colocando a mão no pescoço.

Além disso, não fora apenas Yukikaze que apareceu.

“Ah, eles estão aqui! Pessoal!”

Até Touji, que estava mantendo a calma, inadvertidamente ficou rígido por causa daquela voz repentina.

Do outro lado de onde Yukikaze estava. Seus colegas de turma, Momoe Tenma e Kurahashi Kyouko, vieram correndo da direção da estrada. Quando Harutora perdeu o controle, Natsume montou em Yukikaze, e Touji e Suzuka montaram o Shikigami de Suzuka e imediatamente voaram para o céu noturno. Tenma e Kyouko, que foram deixados para trás, pareciam correr atrás de seus amigos. Kyouko, que usava yukata, havia tirado suas sandálias de madeira e corrido em seu tabi.

Ao ver os dois correrem, Touji sentiu o impulso de escapar, mas rejeitou esse desejo, se erguendo como se quisesse cumprimentar os dois.

Tenma e Kyouko estavam com falta de ar. Eles tinham que ter percorrido uma certa distância.

Mesmo assim, eles se aproximaram desesperadamente do lado de Touji.

“Co-Como está Harutora-kun? Você o encontrou?”

Touji apenas acenou com a cabeça para a pergunta de Tenma depois de hesitar por algum tempo. Depois de alguma confusão, o olhar de Tenma foi atraído para Harutora sentado na estrada. Instantaneamente, os olhos atrás dos óculos brilharam, mas quando ele notou a ‘outra pessoa’, ele ficou atordoado.

Kyouko, que chegou um passo depois, inclinou-se desconfortável, colocando as mãos nos joelhos. Então, ela levantou a cabeça para olhar para Touji, olhou para Tenma e depois virou o olhar na direção que ele encarava.

“... Eh?”

Um som estupefato vazou de uma lacuna em sua respiração caótica.

Ela perguntou com uma expressão quase aterrorizada:

“... Natsume-chan?”

O sorriso que surgiu reflexivamente em seu rosto desapareceu. Então, de repente ela empalideceu.

“O que você está fazendo?”

Perguntou Tenma. Então, como se suas próprias palavras o tivessem recuperado, ele agarrou a manga de Touji.

“O que você está fazendo!? Apresse-se e chame uma ambulância!” Sua voz e joelhos tremiam. “Rápido!”

Touji não se moveu em resposta às palavras suplicantes de Tenma, com o rosto dolorido. Tenma lentamente compreendeu o significado disso e ficou sem palavras.

Por outro lado...

“... Natsume-chan?” Kyouko repetiu sua pergunta com uma voz quase inaudível.

“De jeito algum... Você está brincando, certo? Já basta. Isso não é possível... Por que isso aconteceu...? Por que...?”

A histeria entrou lentamente na voz de Kyouko.

Os visitantes que observavam de longe também começaram a fazer barulho. O coração de Touji foi invadido por uma inquietação difícil de controlar novamente. Ele queria berrar alto, ele queria causar um tumulto. Mas fazer isso não ajudaria em nada.

Acalme-se. Touji apertou desesperadamente os punhos.

“... Tenma. E a ‘garota’?”

Tenma pareceu perceber instantaneamente a quem ele estava se referindo.

“... Ela provavelmente ainda está no mesmo lugar... Nós apenas tentamos alcançar vocês.”

Parecia que Tenma estava mais calmo do que Kyouko, ou ele ainda não havia entendido a realidade à sua frente.

“Entendo.” Touji assentiu levemente, depois gritou para Suzuka novamente: “Suzuka! A barreira!”

Suzuka assentiu trêmula depois que ele instruiu. Ela tentou usar magia imediatamente, mas não teve sucesso. Qualquer um que a visse assim não acreditaria que ela fosse uma General Divina.

Então...

“... Certo.”

De repente, Harutora murmurou para si mesmo. Touji, Suzuka, Tenma e Kyouko inadvertidamente olharam surpresos para Harutora.

“Vou perguntar ao meu pai. Mesmo que eu não consiga, meu pai... meu pai pode definitivamente curar Natsume.”

Elas eram realistas, mas obviamente palavras vazias. A raiva de Touji aumentou repentinamente.

“Harutora...” Touji falou solenemente. Então, Harutora virou-se para Touji, ainda caído no chão.

Sua expressão era a de alguém que havia sido derrotado e estava prestes a ser esmagado, mas ainda assim permanecia firme no último momento. A expressão de alguém que havia perdido tudo, mas ainda estava preso ao destino. Touji estava desamparado diante daqueles olhos que poderiam desmoronar a qualquer momento.

“Não é? Meu pai é um médico Onmyou profissional, certo? Touji, ele não selou seu Oni também?”

“Harutora, já chega.”

“Embora ele esteja brincando por aí, suas habilidades são excelentes. Meu pai definitivamente pode fazer isso. Meu pai definitivamente pode.”

“Harutora.”

“Ele definitivamente será capaz de ajudar, mesmo com Natsume assim. Afinal, ele é um médico Onmyou profissional, um verdadeiro Onmyouji, diferente de alguém como eu! Contanto que ele tente, até alguém morto...”

“Harutora!”

Ele atingiu seu limite. A expressão de Harutora desmoronou com o grito de Touji. Além disso, a coisa que rodava no corpo de Touji foi cuspida junto com seu grito de raiva. Ele sentiu como se houvesse um buraco no fundo do peito e sentiu uma dormência superando a dor.

“... Harutora.” Touji falou com ele novamente. Então, ele respirou fundo para se acalmar e continuou. “Nenhum Onmyouji pode ressuscitar os mortos, não importa quem.”

Ele disse isso indiferentemente, como se estivesse se convencendo.

Touji naturalmente disse a verdade óbvia.

Em algum momento, os disparos de fogos de artifício também pararam.

Um silêncio pesado e deprimente pesou sobre todos os presentes. Touji abaixou a cabeça, como se pressionado por esse peso.

Esse era o peso e a amargura da realidade. Ele não podia escapar ou rejeitar. Ele só podia aceitar e suportar.

Mas...

Havia alguma ‘torção’ naquele silêncio. Touji de repente se tornou consciente dessa distorção quando estava imerso naquele silêncio.

Ele franziu a testa. Ele percebeu que Harutora, que o olhava até agora, virara a cabeça.

Um rosto indisfarçado de alguém que fora forçado ao desespero, cortando tudo o que era desnecessário. Seus olhos tinham uma luz estranha.

Harutora estava olhando para Suzuka.

Ele rapidamente olhou para Suzuka. Ela também notou o olhar de Harutora e estava olhando para trás. Ela tinha uma expressão infantil e tímida, mas na base havia um terror de um tipo diferente de antes.

Uma corrente fria correu pelas costas de Touji.

As palavras que ele havia dito antes despertavam despercebidas em sua mente. A premonição que se formou antes de pensar – a desagradável e ameaçadora premonição – fez seu cabelo arrepiar.

“... Ei.” Ele falou às pressas. “Harutora, você...”

No entanto, a situação não esperou Touji transmitir suas ‘suspeitas’.

De repente, Yukikaze relinchou estridente ao lado de Touji como se quisesse chamar sua atenção. Imediatamente depois, uma sirene que havia sido misturada com o som dos fogos de artifício antes de repente entrou na estrada.

Um grande veículo preto dando uma impressão grosseira apareceu. Por causa do modelo familiar, Touji inadvertidamente tomou uma posição. Ele nem precisou olhar para as palavras ‘Agência Onmyou’ estampadas no veículo. Era um transportador usado pelas equipes de purificação de Desastres Espirituais.

Onmyouji, vestidos de pretos, pularam em dois e três para fora do transporte que freava. Exorcistas. Embora eles tentassem tomar uma formação enquanto suas roupas de proteção contra miasma batiam, seus movimentos de repente se tornaram desordenados. O homem na frente olhou para Touji e os outros, com os olhos arregalados. “Crianças?”

Touji inadvertidamente estalou a língua.

A Harutora havia perdido o controle no meio da movimentada área do festival de fogos de artifício. Houve uma batalha envolvendo magia de primeira classe e até mesmo uma batalha no ar depois que Hokuto fora convocada para parar a fúria da Harutora. Haveria muitas testemunhas.

Mais precisamente, fora a Asa do Corvo que perdera o controle, não Harutora. Além disso, a Asa do Corvo não era uma ferramenta mágica pura, era um Shikigami. A Asa Corvo fora de controle era originalmente um Desastre Espiritual móvel, uma Fase 3. Não era inexplicável que o Bureau de Exorcismo notasse essa aura e a visse como um Desastre Espiritual, ou que os exorcistas – uma equipe de purificação de Desastres Espirituais – tivessem subitamente chegado ali.

A equipe de purificação de Desastres Espirituais que desembarcou do transporte ainda cercava Touji e os outros, independentemente da confusão que sentiam em relação às circunstâncias. Além disso, seus rostos mudaram quando viram Natsume desabada no chão e coberto de sangue.

Os exorcistas eram especialistas em purificação de Desastres Espirituais e supostamente amadores em batalhas mágicas, mas não se sentiam assim em sua formação praticada. Essa era a pressão constante do profissional Onmyouji.

Yukikaze bufou como se perguntasse ‘o que fazemos?’. Touji conseguiu reprimir seu impulso de estalar sua língua novamente.

De qualquer forma, não havia nada que seu grupo pudesse fazer agora. Em vez disso, seria benéfico entregar a situação aos adultos. Honestamente, sua fé na Agência Onmyou havia sido abalada por causa do assunto referente a Souma Takiko. Uma vez ela dissera que fora a Agência Onmyou que atacara a antiga casa de Natsume, a residência da família Tsuchimikado. Então, ela apareceu na frente de Harutora e os outros com a Asa Corvo que originalmente deveriam estar naquela residência. Por isso, ele concluiu que Takiko estava associada à Agência Onmyou e via os dois como ruins.

Mas o Bureau de Exorcismo estava bem em comparação com a Agência Onmyou. Mesmo se eles fossem do mesmo tipo, havia pelo menos uma pessoa que ele percebia que podia confiar. Kogure Zenjirou dos Doze Generais Divinos. Ele era um ex-colega de classe do professor de sala de aula de Touji e dos outros, e conhecia Harutora, Natsume e Kyouko. Se ele conseguisse entrar em contato com ele, ele poderia ouvir seriamente a explicação deles.

Mais importante, se eles foram confiados às mãos do Bureau de Exorcismo – as mãos que poderiam ser chamadas de ‘lei’, deveriam ser capazes de ficar longe da premonição ameaçadora que ele havia sentido antes.

Touji respirou devagar, colocando a mão na cabeça de Yukikaze.

“... Suzuka.”

Ele falou enquanto levantava as mãos, mostrando que não tinha intenção de resistir.

Ao ver a atitude de Touji, Suzuka também obedientemente – na verdade, com uma expressão ainda mais aliviada que a dele – levantou as mãos. Os exorcistas ao lado deles ficaram surpresos, talvez porque conhecessem a Prodígio.

Kyouko ainda estava atordoada, mas ele decidiu que ela não estava em perigo ao ver sua aparência. Embora Tenma não tenha levantado as mãos, ele abaixou a cabeça e não fez nenhuma ação de resistência.

Mas Harutora fora diferente.

Harutora, que estava caído no chão até agora, reagiu aos exorcistas que os cercavam, seu corpo torcendo ferozmente. Ele sacudiu desesperadamente a cabeça, abrigando Natsume, depois a abraçando com força.

“Harutora!”

Touji gritou. Mas Harutora deixou passar pelos ouvidos. Ele olhou para os exorcistas com olhos vermelhos.

Finalmente, um dos exorcistas deu um passo à frente.

“... Somos uma equipe de purificação de Desastres Espirituais, pertencente à Agência Onmyou. Estamos prendendo todos vocês. Se você não resistir, não seremos grosseiros.”

Ele declarou sua lealdade ao proclamar isso. A respiração de Harutora acelerou e uma expressão cruel apareceu em seu rosto.

A aparência de Harutora parecia abalada pela confusão e entrara em pânico. Mas isso estava errado. Isso era superficial, e Touji tinha visto profundamente através dela. Diferentemente de quando ele parecia sem alma antes, uma vontade resoluta surgira no coração do atual Harutora.

Uma vontade perigosa.

“Harutora! Acalme-se!”

Touji não pôde deixar de chamar. Mas acabou se tornando o gatilho.

Harutora disparou do chão, estendendo a mão rapidamente. O que ele pegou foi a Asa do Corvo que ele havia originalmente retirado e jogado fora. O casaco preto saltou como uma bandeira batendo ou como uma coisa viva. Faixas de luz dourada ondulavam sobre o tecido preto. Harutora colocou a Asa do Corvo e segurou o corpo de Natsume nos braços.

Touji gritou o nome de Harutora novamente.

Ao mesmo tempo, os exorcistas colocam uma barreira.

“Não se mexa!”

Os exorcistas gritaram um aviso. A Asa do Corvo bateu a bainha como uma asa.

Uma rajada de vento. A Asa do Corvo agitou um turbilhão tempestuoso de energia mágica. Em seguida, penas negras como flechas foram lançadas em todas as direções ao mesmo tempo em que batiam nas asas. Aquelas penas cortaram em pedaços a barreira que os exorcistas haviam colocado.

A barreira quebrada à força espalhou energia mágica em seus arredores. Os exorcistas, junto com Touji e os outros estudantes, caíram imediatamente no chão, deixando passar a violenta energia mágica. Nesse período de tempo, uma figura negra voou para o céu noturno.

Harutora bateu as asas como um pássaro com Natsume nos braços.

“Aquele idiota...!?”

Os exorcistas constantemente lançavam magias um após o outro no céu enquanto Touji cerrava os dentes ao lado deles. A maior parte era magias de talismãs ou Correntes de Ouro Imóveis. Mas a Asa do Corvo que envolvia Harutora desviou todos eles de volta ou apenas os dispersou. Seus movimentos eram bem coordenados, mas a defesa automática do Corvo funcionava perfeitamente.

O contorno da Asa do Corvo foi absorvido no céu noturno em momentos e Harutora gradualmente se afastou deles junto com Natsume. Touji foi instantaneamente atacado por um intenso conflito emocional.

“... Droga!”

Chega! Ele deixaria o pensamento até mais tarde. Touji puxou rapidamente as rédeas de Yukikaze.

“Suzuka! Venha!”

Ele gritou enquanto montava o cavalo, lançando-se sobre ele.

Era a segunda vez que ele montava Yukikaze. O veterano Shikigami compreendeu as intenções de seu cavaleiro, pulando no céu noturno sem precisar que ele tocasse as rédeas.

“Touji-kun!” A voz de Tenma era acompanhada de gritos e magias que voavam dos exorcistas, mas o cavalo branco as evitava facilmente.

Suzuka ainda não havia percebido a situação e não havia agido decisivamente como Touji. Mesmo assim, ela fechou os olhos com força no final, direcionando o Shikigami em que ainda se sentava para subir enquanto gerava um grande número de novos Shikigami para lançar o local ao caos. Uma alternativa para uma cortina de fumaça.

“Como esperado dela.” Touji mudou sua consciência em direção a Harutora à sua frente, enquanto agradecia Suzuka em seu coração. “Yukikaze, estou contando com você!”

Depois de dizer isso, ele sacudiu vigorosamente as rédeas.

 

PARTE 2

O vento apressou-se imediatamente depois que ele se levantou. Os cabelos de Touji, dos quais ele havia tirado a bandana, ficaram despenteados. Por outro lado, Yukikaze galopou no ar sem nenhum medo do vento noturno. Logo depois dele estava o Shikigami em que Suzuka estava sentada. Era como uma cena de perseguição.

Mas essa perseguição estava manchada de desespero desde o início.

“O que você vai fazer!?”

“Parar Harutora!”

“Como!?”

“Eu não sei!”

A força do vento era muito intensa. As gargantas de Touji e Suzuka ficaram roucas enquanto conversavam.

No final, mesmo Touji não tinha certeza do que fazer. Mas ele não podia simplesmente ficar parado.

À sua frente, a escuridão da noite, juntamente com uma silhueta de asas gigantes, levemente iluminada por baixo pelas luzes da rua. Um corvo ‘alienígena’. Mas seu voo ainda era muito estranho. Caía enquanto tentava planar. Ele batia as asas caoticamente, subitamente desviando e saltando como se tivesse tropeçado. Sua trajetória instável e distorcida parecia retratar diretamente os sentimentos de seu mestre.

Mas, ao mesmo tempo, era como um animal ferido, violento e selvagem.

“Droga. Esse... bastardo idiota...!”

De qualquer forma, ele tentaria se aproximar. Felizmente, embora seus movimentos fossem desajeitados, parecia que a Asa do Corvo estava atualmente sob o controle de Harutora. Então, desde que a Harutora não ordenasse, não lançaria um ataque. Claro, ele não podia garantir que isso não iria ‘contra-atacar’.

“Yukikaze!” Ele balançou as rédeas e Yukikaze acelerou novamente.

Ele não tinha certeza de quão rápido a Asa do Corvo voava normalmente, mas Yukikaze firmemente fechou a distância até ela. Como ele previu, não houve ataques apontados para ele, mas ele podia sentir que a Asa do Corvo estava alerta para sua presença, mesmo que Harutora não estivesse.

“Harutora!” Touji se inclinou e gritou. “Acalme-se! Pouse por enquanto! Harutora!”

“...”

Embora ele tenha gritado, Harutora não respondeu. Yukikaze acelerou novamente, ficando lado a lado com a Asa do Corvo. Então, o Shikigami de Suzuka circulou para o outro lado de Harutora como Touji fizera. Quando eles criaram uma formação com a Asa do Corvo no meio, Suzuka gritou: “Bakatora!”

Mas Harutora não parou.

Nesse momento, a Asa do Corvo desviou repentinamente e Yukikaze mergulhou para o lado quase simultaneamente. Touji, que estava inclinado para o lado, agarrou as rédeas apressadamente. Imediatamente depois, figuras estreitas rasgaram o céu noturno, passando rapidamente pela Asa do Corvo, que rapidamente desviava.

Andorinhas cinzas. Elas eram WA1 Andorinhas Chicote. Além disso, não havia apenas uma. Depois veio uma segunda, depois uma terceira. Quando Touji rapidamente estabilizou sua posição no Yukikaze, um total de dez Andorinhas Chicote estavam dançando, centrados na Asa do Corvo.

“O que!?” Touji não pôde deixar de ficar boquiaberto. “Um Investigador Mágico? Aqui!?”

As Andorinhas Chicote pertenciam às fileiras de Shikigami sintéticos e eram chamados de Shikigami vinculativos ou aprisionadores, pois estavam em uma categoria específica. Era um Shikigami feito pelo homem, projetado para o Departamento de Investigação de Crimes Mágicos, cujo principal uso era capturar criminosos que usavam magia. Na maioria das vezes, os Investigadores Mágicos não confundiam seu praticante-alvo.

“Cuidado!” Suzuka gritou um aviso em pânico. “Essas coisas foram modificadas! São coisas diferentes!”

Andorinhas Chicote eram Shikigami feitos pelo homem, comercialmente disponíveis, criados pela Corporação Bruxaria. Mas não era estranho que os Investigadores Mágicos fizessem pessoalmente vários pequenos ajustes na maioria dos casos antes do uso.

Mas, como Suzuka havia previsto, parecia que a magia das Andorinhas Chicote de alta velocidade que voavam diante deles havia sido fortemente modificada. De fato, Touji tinha visto esse tipo de Shikigami obrigatório várias vezes, mas as Andorinhas Chicote diante dele agora pareciam diferentes das coisas que ele tinha visto antes. Sua mobilidade e, mais importante, seus movimentos coordenados como um grupo de dez eram diferentes.

“Poderia ser...!?”

... Eles estão sendo controladas por uma pessoa?

Como se respondesse à sua suspeita, as dez Andorinhas Chicote se moveram juntas, cercando o casaco do corvo como um par de mãos.

Eles mantiveram uma curta distância da Asa do Corvo que voava irregularmente, mantendo a formação ao redor completamente ordenada. A mobilidade de seu grupo fazia com que parecessem um único organismo.

 

 

Dez andorinhas cinzas ao redor de um corvo gigante.

Além disso, era como um grupo de hienas caçando um animal selvagem. Embora elas não atacassem diretamente, elas permaneciam atrás dele. Mesmo que a Asa do Corvo batesse suas asas poderosamente tentando sacudi-las, elas eram capazes de se esquivar com facilidade e leveza, como se confiassem ao vento, e a Asa do Corvo não conseguia nem tocá-las. Os olhos de Suzuka se arregalaram com esses movimentos ingênuos.

“Como isso é possível? Elas não estão se esquivando automaticamente. Controle de longa distância? A esta altura? Como pode ser possível?”

“Suzuka! Você consegue rastrear o praticante a partir da energia mágica?”

“E-Eu vou tentar!”

O fato de eles não terem certeza de quem estava controlando esses Shikigami o deixava desconfortável. Se ele pensasse bem, provavelmente era alguém dos Investigadores Mágicos, mas como ele poderia ter percebido isso? Não, pensando bem, Harutora e os outros haviam sido monitorados por pessoas desconhecidas quando estavam no dormitório masculino. Teria sido um julgamento equivocado que eles haviam cancelado sua vigilância por enquanto?

... Droga. O que devo fazer!?

Ele queria impedir Harutora, mas não conseguia agir de forma imprudente, pois não entendia o objetivo do praticante que controlava as Andorinhas Chicote diante dele. Suzuka estava tentando procurar a localização do praticante, mas rastrear as coisas de volta ao praticante exigia uma técnica extraordinária e sua força atual era limitada por causa de seu selo. Embora ela estivesse se concentrando em seu entorno, rastrear energia mágica era um esforço árduo.

Então, enquanto Touji e Suzuka estavam amarrados, a Asa do Corvo – Harutora – foi a primeira a agir.

“... Não atrapalhe!”

Com uma sacudida, a bainha inferior da Asa do Corvo se abriu como uma explosão, parando imediatamente. Yukikaze e o Shikigami de Suzuka foram pegos de surpresa e passaram por Harutora, voltando imediatamente. As Andorinhas Chicote também passaram e sua formação foi arruinada, mas elas corrigiram suas trajetórias com os menores ajustes e continuaram perseguindo a Asa do Corvo. Mas a Asa do Corvo espalhou sua bainha inferior novamente, subindo para um espaço mais alto antes delas recomporem sua formação.

A Asa do Corvo repetiu essa manobra complexa, desenhando um arco enquanto girava para baixo. As dez Andorinhas Chicote seguiram com precisão seus movimentos, perseguindo-o com agilidade. Não importava as Andorinhas, mas os movimentos da Asa do Corvo realmente não pareciam os movimentos de um humano carregando outro. Toda vez que a bainha inferior da Asa do Corvo ondulava como uma asa, luz dourada dançava no céu noturno como poeira estelar.

Mas as andorinhas não eram inferiores em comparação. Todas não faziam os mesmos movimentos, mas mudavam sutilmente sua formação enquanto se aproximavam constantemente da Asa do Corvo. Da mesma forma, a Asa do Corvo não lhes dava nenhuma oportunidade de flanquear.

“Ridículo.” Touji suprimiu seu humor inquieto.

Então, chegou a hora das Andorinhas Chicote agirem.

Duas delas abriram as asas ao mesmo tempo, as penas ‘esticando’. Como seu nome sugeria, suas asas se tornaram vários chicotes, cobrindo a Asa do Corvo. Elas realizaram a ‘ligação’ que era o uso original desses Shikigami. A Asa do Corvo viu isso como um ‘ataque’. Fazendo uso de uma oportunidade momentânea para deslizar pelos chicotes que se estendiam dos dois Shikigami, sua bainha brilhou. A frente da Asa do Corvo se transformou instantaneamente em uma lâmina afiada, cortando as asas das Andorinhas Chicote com um golpe.

No entanto, as Andorinhas Chicote – o praticante que estava controlando o grupo de Shikigami – não estavam preocupadas com as feridas recebidas. Depois das duas primeiras, as Andorinhas que restavam começaram a cercar a Asa do Corvo em pares ou trios.

Os chicotes que se estendiam das andorinhas cinzas se aproximaram. A Asa do Corvo voou ao redor do centro da formação, destruindo todos eles. Complexo, mecânico e preciso. Aos olhos dos observadores, parecia algum tipo de performance.

Lag brilhava através dos cortes das Andorinhas Chicote e eles pararam de se mover.

Mas...

... O que está acontecendo? Isso é estranho.

A Asa do Corvo continuou contra-atacando, mas o número de inimigos não diminuía. As Andorinhas Chicote cortadas pararam se sofrer Lag e, imediatamente, bateram as asas para retornar à formação. Além disso, os lugares em que haviam sido cortadas já haviam se recuperado quando retornaram à próxima onda de ataques. Obviamente, essa era uma função que as Andorinhas Chicote comuns não poderiam ter.

Seus meios de ataque lentamente se tornaram mais fortes também. O número de Shikigami que estendia chicotes simultaneamente passou de dois para três e depois para quatro. Um ataque contínuo sem lacunas. Paralelamente, as respostas da Asa do Corvo começaram a ficar lentas.

Então, no momento em que uma finalmente a enredou, as outras nove voaram instantaneamente em direção à Asa do Corvo, que se preparava para escapar para cima. Embora a Asa do Corvo tenha combatido duas delas, as outras andorinhas se transformaram em chicotes, amarrando a Asa do Corvo junto com Harutora e Natsume.

“Harutora!?”

A Asa do Corvo perdeu sua capacidade de voar como um pássaro preso em uma rede, começando a cair livremente em uma parábola. Touji e Suzuka perseguiram às pressas atrás dela. Em algum momento, o cenário abaixo deles havia mudado de ruas residenciais para estradas com grandes quantidades de edifícios. A Asa do Corvo arremessou contra a parede de um deles. Touji sacudiu desesperadamente as rédeas, mas seria tarde demais.

Ele colidiria.

No momento em que ele acreditou nisso:

“... Noumaku saraba tatagyateibyaku saraba bokkeibyaku sarabata tarata senda makarosyada ken gyakigyaki saraba biginnan untarata kanman...!”

Um encantamento vindo de Harutora. Era a magia do Reino do Fogo. Ao mesmo tempo, a asa do corvo estava coberta de chamas e os chicotes das andorinhas que amarravam suas asas foram incinerados.

“Gah!?”

Fogo derramou adiante e Touji fechou os olhos. As chamas que floresceram no céu noturno instantaneamente queimaram todos os Shikigami. A bainha inferior da asa do corvo batia para limpar seus restos. Ela rodou, evitando colidir com o edifício por menos que milímetros. Mas seu movimento era ainda mais bizarro do que antes de sua luta. Ele vacilou e caiu.

Touji insistiu com Yukikaze, correndo rapidamente para a Asa do Corvo.

“Harutora!” Ele gritou alto, verificando sua aparência.

Harutora deslizou enquanto olhava desesperadamente à sua frente. Não havia calma em seus olhos. Embora ele planejasse primeiro mandá-lo para a terra, mas a julgar pela situação atual, era provável que o pouso descuidado resultasse em queda.

Só então...

“Headband! Ali!”

Suzuka, que se aproximou do lado, apontou um braço e gritou alto. Após uma observação cuidadosa, havia um prédio em construção à frente deles. O andar mais alto não tinha parede externa e seu esqueleto de aço estava exposto.

A altura era perfeita. No momento em que ele considerou isso, Touji insistiu fortemente com Yukikaze.

Ele fez o cavalo deslizar no caminho adiante da Asa do Corvo.

“Pare.” Os olhos de Harutora se arregalaram e ele parou a Asa do Corvo que tentou atacar reflexivamente, mudando sua trajetória. Por isso, ele correu para o prédio inacabado que se aproximava deles pela frente.

“!?”

Harutora segurou Natsume com as duas mãos. Ao mesmo tempo, a Asa do Corvo disparou na frente dele para absorver o impacto. Ele conseguiu atravessar a lacuna entre os reforços e cair no chão.

Harutora deslizou pelo chão, carregando Natsume e envolvido pelo casaco preto. Yukikaze seguiu logo atrás dele, aterrissando no chão e diminuindo a velocidade enquanto suas ferraduras raspavam fortemente com o chão.

Harutora e Natsume, cobertos pelo casaco do corvo, colidiram com os materiais de construção colocados nas proximidades enquanto deslizavam, parando apenas quando estavam perto do centro do andar. Então, eles caíram de lado, exaustos. Touji respirou fundo, batendo levemente no pescoço de Yukikaze e descendo ao chão para se aproximar de Harutora.

Harutora, trêmulo, levantou a parte superior do corpo, mas, mesmo assim, ele também tentou proteger a Natsume imóvel. Ele ofegou, os ombros subindo e descendo. Embora estivesse exausto mental e fisicamente, por enquanto não parecia ferido.

Touji falou severamente com seu amigo um ano mais novo com um tom de reprovação:

“Harutora.”

Harutora abaixou a cabeça, continuando a ofegar.

“Harutora!”

“...”

*BOOM!* O ar da noite roncou. Harutora se encolheu de susto, mas ainda não planejava erguer os olhos, nem estava preparado para responder a Touji.

O Shikigami que Suzuka montava deslizou ao lado dos dois. Suzuka olhou para o par, Harutora com a cabeça abaixada e Touji olhando para ele, e desmontou sem palavras do Shikigami.

Touji olhou para Suzuka pelo canto do olho.

“... O praticante?”

“Desculpe...”

Parecia que ela não tinha conseguido encontrar a pessoa que controlava as Andorinhas Chicote.

“Entendo.” Touji não culpou Suzuka, ele apenas pronunciou silenciosamente essas palavras.

Então, como se percebesse a presença de Suzuka por causa do diálogo, Harutora inclinou de repente, virando a cabeça.

Ele colocou sua força em seus joelhos trêmulos, levantando-se com uma expressão horrível. Então, ele correu em direção à tímida Suzuka, agarrando seus ombros magros com as duas mãos.

“Suzuka!”

Harutora olhou diretamente nos olhos de Suzuka.

Então, ele falou essas palavras.

“Suzuka. O Ritual Taizan Fukun. O Ritual Taizan Fukun pode reviver Natsume! Assim como você queria fazer antes, se usarmos o Ritual Taizan Fukun...”

Ele falou em um tom cruel.

A feiura de alguém que sucumbiu aos seus delírios – e também de uma alma clamando em desespero.

“Controle-se, Harutora!”

Touji berrou com raiva, mas Harutora não ouviu, olhando apenas para Suzuka. Suas mãos que seguravam os ombros de Suzuka tremiam constantemente, mas ele definitivamente não a deixava escapar.

“Por favor...”

“Não.”

Suzuka respondeu imediatamente.

Sua voz, que explodiu em um lamento, era covarde, imprópria para o seu comportamento habitual.

“Suzuka...”

“N-Não! Não... Não brinque com isso! O que você está dizendo!?”

“Não estou brincando, estou falando sério!”

“Cale a boca! Vo-Você esqueceu o que me disse naquela época?”

Suzuka falou como se estivesse lançando suas palavras, a luz das lágrimas brilhando nos cantos dos olhos. Ele temia que as coisas tivessem se desenvolvido como ele previra quando Harutora escapou dos exorcistas.

No entanto, a própria Suzuka ainda não havia se recuperado do choque da morte de Natsume. As palavras dispersas de sua boca tremiam por causa de sua vacilação e o som dela gritando desesperadamente o machucou.

“Você me parou como se fosse natural quando eu estava sendo arrogante naquela época! Agora você planeja se virar tão facilmente quando é a sua vez? Como você pode!? Como você pode!? Deve haver um limite para o egoísmo! Você é... Você é desprezível!”

Foi basicamente um soluço no final. Harutora não tinha intenção de deixar Suzuka choramingar.

Suzuka olhou para Harutora com os olhos chorosos.

“E quanto... E quanto ao preço? O que você fará sobre o custo!? Qual vida você vai oferecer pela da Natsume...!?”

Sua pergunta final foi cheia de terror, pois ela já sabia a resposta.

Harutora respondeu claramente após um breve silêncio.

“... Eu morrerei.”

“Não fale bobagens!!!”

“Eu não estou falando bobagens. Natsume... eu a fiz morrer, então isso é uma compensação natural.”

Touji não precisava ver seus olhos. Ele estava falando completamente sério.

“Suzuka, por favor. Estou te implorando.”

Harutora colocou força em suas mãos enquanto implorava do fundo do seu coração. Os olhos de Suzuka se arregalaram e as lágrimas começaram a escorrer de seus olhos. Ela balançou a cabeça para os lados enquanto chorava. Recusa – mas, mesmo assim, ela não conseguia escapar das mãos de Harutora.

Ele não podia continuar assistindo.

Touji estendeu a mão sem palavras, colocando-a no braço da Harutora. A Asa do Corvo não reagiu, mas Harutora continuou segurando os ombros de Suzuka, não planejando recuar.

Touji falou, aparentemente murmurando para si mesmo:

“... Está tudo bem em deixar Natsume nesse tipo de lugar?”

Ele podia sentir Harutora tremendo sob o tecido da Asa do Corvo. Sua força recuou. Touji removeu lentamente a mão de Harutora do ombro de Suzuka.

Depois que a mão direita se afastou, a mão esquerda naturalmente deixou o ombro dela. Suzuka ficou parada, fungando.

No próximo momento.

A Asa do Corvo, que estava ociosa, tremulou de repente. Ela apontou a bainha para o canto da sala, como uma cobra erguendo a cabeça em forma de foice.

“... Ei, desculpem-me por interrompê-los quanto estão tão ocupados.”

Uma voz soou. Touji, Suzuka e Harutora viraram a cabeça em surpresa.

A figura de um jovem homem apareceu lentamente na escuridão.

Um jovem homem estiloso vestindo calças e uma camisa emparelhada com um colete. Não, seria melhor chamá-lo de adolescente do que de jovem homem. Sua idade parecia ser a mesma que a de Touji. Mas ele não se sentia instintivamente como se fosse um ‘humano’. Ele provavelmente era um Shikigami. Além disso, sua presença não era a de um Shikigami feito pelo homem. Um Shikigami servo.

Cabelo preto precisamente cuidado e pele branca sem nenhum tipo de bronze ou marca. Ele usava um ascot e luvas brancas. Ele estava vestido como um velho aristocrata, mas a coisa mais notável sobre ele era a lente redonda sobre o olho direito. Provavelmente era um monóculo.

Então, Suzuka congelou no momento em que viu o monóculo.

“... Não pode ser...” Ela soltou uma voz rouca como se isso fosse uma piada.

Touji e Harutora imediatamente assumiram posições, confrontando o jovem que apareceu diante deles. Mas o jovem não se importou, aproximando-se vagarosamente e depois parando.

Com um rosto calmo, o homem sorriu refrescantemente e disse:

“... É um prazer conhecer vocês dois. Meu nome é Yashamaru. Estou honrado em conhecê-los.”

 

PARTE 3

Um monóculo de outra era.

Mas Suzuka tinha lembranças desse monóculo. Era algo que ela queria esquecer, mas não conseguia.

Não era apenas aquele monóculo. Aquela roupa, voz e aparência. A idade era completamente diferente, mas havia muitas semelhanças. Até a aura ao redor dele era a mesma. Isso era impossível. Definitivamente impossível. Porque ele já estava morto. Morto!! Há dois anos!!

Mas seus instintos cortaram bruscamente seu raciocínio fracamente protestante.

“... Pai...”

Houve um atraso momentâneo antes que Harutora e Touji reagissem. Suas palavras estavam desatualizadas e o tom não era do seu estilo. Seus entendimentos não foram capazes de recuperar o atraso imediatamente.

Suas expressões não pareciam entender a ‘implicação’ nas palavras de Suzuka. Isso era natural. Porque ela mesma não entendia o que estava acontecendo.

O homem que se chamava Yashamaru sorriu levemente.

“Suzuka.” Ele a chamou em um tom extremamente natural. “Isso é um pouco repentino, mas mesmo que eu quisesse passar um pouco mais de tempo em nosso reencontro, esse caminho pode ter seu próprio drama.”

“...”

A maneira como ele falava também era completamente a mesma. Ele era completamente idêntico. Mesmo se ele tivesse uma aparência muito mais jovem, a personalidade em seu núcleo não havia mudado.

“Mas eu não posso ter você me chamando de pai. Não posso fazer nada em relação a sua surpresa, mas você também é um praticante independente. Você tem que interpretar corretamente as coisas, não importa quando. Mais importante, você não deve se amaldiçoar com tanta facilidade. Quero ser um pouco rigoroso com você, mas você ainda é muito desajeitada ao lidar com magias de segunda classe. Preste atenção.”

Os joelhos de Suzuka inadvertidamente começaram a tremer por causa de sua alegre e gentil atitude instrutiva.

Ela lentamente começou a suar e sua força de vontade encolheu. Era como um sapo sendo encarado por uma cobra. Ela sentia rejeição, desejo de escapar e terror, mas ela não conseguia nem resistir. Porque a obediência já havia sido gravada em sua alma.

“... Suzuka? O que está acontecendo?”

Touji perguntou, observando Yashamaru. Mas ela não conseguiu responder. Touji olhou interrogativamente para a aparência de Suzuka. Depois de perceber que ela não estava em um estado em que pudesse responder seriamente, ele imediatamente voltou sua atenção para ele.

“... Yashamaru, hein?” Suas palavras murmuradas foram misturadas com um tom tenso que era mais do que ironia. “Então? Esse ‘pai’, é o seu apelido ou algo mais?”

“Hahaha, que pensamento agradável. Mas a resposta é: não. Sinto muito, mas significa o que você de fato pensou.”

“Hmph. Isso é muito estranho então. Não importa o quão bom você seja em se vestir como jovem, você não parece ter idade suficiente para ser o pai da Suzuka, e antes disso, você é um Shikigami, não um humano, certo? Até onde eu sei, Suzuka só tinha um pai e esse homem já deveria ter morrido.”

Touji cuidadosamente empilhava perguntas como se estivesse calculando a distância entre ele e seu inimigo. Só então...

“Sim.” Yashamaru afirmou com uma atitude direta e indisfarçada.

“Então, o que exatamente está acontecendo?”

“Assim como eu a avisei agora, suas palavras não estavam corretas. Deixe-me me apresentar novamente. Meu nome é Yashamaru. Meu nome na vida anterior era Dairenji Shidou. Embora eu tenha morrido há dois anos, ressuscitei como um Shikigami. Enfim, é isso que está acontecendo.”

Yashamaru falou simplesmente. Touji, Harutora e Suzuka esqueceram de respirar, estupefatos.

Dairenji Shidou. Um Onmyouji Nacional de Primeira Classe chamado de Professor – um membro dos Doze Generais Divinos.

Ele também era o pai da Prodígio Dairenji Suzuka, o chefe da Divisão de Espíritos Persistentes da fechada Agência da Casa Imperial, e já fora membro central do Sindicato dos Chifres Gêmeos. Além disso, ele fora o cérebro por trás do ataque terrorista com Desastres Espirituais da Grande Purificação Hinamatsuri dois anos atrás.

Dairenji Shidou foi atraído pelo Desastre Espiritual que causou e morreu no ataque terrorista. Assim como ele próprio havia admitido.

Mas...

“... Ressuscitou...? Shikigami...?” Suzuka gemeu, atordoada.

Yashamaru colocou as mãos com luvas brancas nos quadris e disse levemente:

“Não é incrível?”

Sua atitude era um tanto sarcástica e não tinha um pingo de tensão, contrastando bastante com as três pessoas que ele enfrentava.

Ele realmente não tinha mudado. Nada havia mudado. Ele não tinha nada de especial e não havia perdido nada. Seu habitual humor e aleatoriedade. Sua alma fora tingida em uma atmosfera trivial e desonesta.

Mas Suzuka sabia mais do que ninguém.

Seu pai era ‘tirânico’ desde que ela se lembrava. Envolto nessa atmosfera, ele usou indiferentemente ela e o irmão como experimentos, realizando repetidamente pesquisas mágicas. Durante a infância dela, ele casualmente usou várias magias proibidas apenas por diversão. Suzuka tinha visto isso com seus próprios olhos.

O ‘humor’ desse homem estava diretamente ligado ao ‘perigo’ que ele representava. Havia uma brutalidade completamente calma sob aquela atmosfera aristocrática frouxa. Ele tinha sabedoria, conhecimento e uma poderosa ‘força’ como praticante.

“De qualquer forma, meu ‘eu’ atual se chama Yashamaru, não Dairenji Shidou. Estritamente falando, eu sou uma pessoa diferente – embora também seja muito estranho dizer isso. Porque eu não sou ‘humano’.”

“...” Suzuka sentiu-se tonta.

Uma sensação desagradável como se sua cabeça estivesse girando, mesmo que fosse óbvio que nada havia acontecido. Além disso, havia um zumbido profundo em seus ouvidos. Seu senso de equilíbrio desapareceu e ela erroneamente sentiu o chão sob seus pés desmoronar. Ela não conseguia respirar direito.

... Ele morreu... Ele morreu... Morto... e então...

Ele havia ressuscitado? Mais que absurdo era – Não. Até ela sabia sobre as possibilidades nessa área.

O Ritual Taizan Fukun.

Dairenji Shidou – seu pai – havia sido o membro de mais alto escalão da antiga Divisão de Espíritos Persistentes. E a Divisão de Espíritos Persistentes fora um departamento criado para pesquisar os ‘mitama’ chamados ara-mitama e nigi-mitama.

No Onmyoudou Geral, que havia sido estabelecido com uma forte exclusão de conceitos religiosos, ‘mitama’ se referia a ‘almas que se tornaram Desastres Espirituais’. No momento, a magia relacionada às almas era designada como mágica proibida, mas a Divisão dos Espíritos Persistentes era o departamento que mais avançara nessa proibição. O chamado Ritual Taizan Fukun era exatamente uma ‘magia de controle da alma’.

Mais importante, seu pai já fora membro central do Sindicato dos Chifres Gêmeos, uma sociedade secreta dos crentes em Yakou. Pode-se dizer que o pai dela estava em uma posição em que ele tinha mais conhecimento do que qualquer outra pessoa sobre o Ritual Taizan Fukun, um ritual de ressurreição que Yakou havia incorporado em seu próprio sistema de magia.

Suzuka realmente tentou usar o Ritual Taizan Fukun no passado e seguiu a pesquisa que a Divisão de Espíritos Persistentes havia conduzido. Não, com mais precisão, fora uma parte dessa pesquisa. Metade dos resultados da pesquisa da Divisão de Espíritos Persistentes fora perdida devido ao ataque terrorista com Desastres Espirituais. Até Suzuka não estava certa do ‘quão perto’ a Divisão de Espíritos Persistentes – seu pai – chegara do Ritual Taizan Fukun de Yakou. Ela não podia afirmar que algo como reviver como um Shikigami após a morte era impossível.

“... Dairenji Shidou... O verdadeiro, hein...” A voz de Touji tremeu quando ele murmurou.

Certo. Suzuka lembrou.

O Oni no corpo de Touji. Essa era a coisa pela qual ele estava possuído por ter sido arrastado para o Desastre Espiritual que seu pai causou. Para Touji, seu pai era o culpado que havia distorcido sua vida.

Então...

“Certo.” Um sorriso frio surgiu no rosto de Yashamaru e ele olhou alegremente para Touji. “Para dizer a verdade, eu esperava muito conhecê-lo, Ato Touji-kun. Ouvi falar da sua situação e parece que causei muitos problemas para você.”

“...”

“Haha, tudo bem, não me encare assim. Estou muito interessado no ‘demônio’ em seu corpo, pois afinal parece que acabamos no mesmo barco.”

“... O que você disse? O que isso significa?”

“Que obtivemos as mesmas bênçãos.”

Yashamaru sorriu, apontando levemente para Touji com o dedo indicador, ainda com os braços cruzados.

“Deixe-me dizer primeiro que é uma coisa valiosa, sabe? Humanos não relacionados que são compatíveis são um milagre raro. Para ser sincero, acho que não há razão para não prestar atenção. Você também está muito interessado, certo?”

“...”

Touji cuidadosamente evitou responder às palavras provocativas de Yashamaru. O fato de ele estar incomumente alerta poderia ser uma prova de que ele inatamente sentiu o perigo que Yashamaru representava.

Escusado será dizer que Suzuka não perdeu uma palavra. O que ele havia dito agora. Seu pai sabia do Oni que possuía o corpo de Touji. Além disso, de acordo com o que ele acabara de dizer, parecia que o Oni de Touji não era o mesmo que um simples Desastre Espiritual. O mesmo barco. As mesmas bênçãos? O que estava acontecendo? Quanto que seu pai sa...

“Então...”

Ignorando a agitação de Suzuka, Yashamaru continuou falando como queria. Depois de separar os braços cruzados, ele colocou a mão direita no peito e virou o corpo para encarar Harutora frente a frente.

“... Escusado será dizer que eu também estava extremamente ansioso para conhecê-lo. Mas, mais precisamente, esse você atual. Se posso ser tão rude em dizer isso, nunca prestei muita atenção a ‘Tsuchimikado Harutora –kun’ antes. Isso até algumas horas atrás.”

Yashamaru sorriu depois de dizer isso.

Um sorriso bonito e iludido. Um sorriso demoníaco que era apenas atraente por causa da escuridão que abrigava profundamente.

“Então, como devo me dirigir à alma de um Onmyouji tão bom? Pelo que vi antes, não é mais o Rei da Estrela do Norte, certo? Devo simplesmente chamá-lo de Lorde Yakou?”

O ar esfriou rapidamente. Era como se a verdade sobre a qual Suzuka e Touji evitassem com força se tornasse um bloco invisível de gelo e esfriasse o ar circundante.

A verdade que Souma Takiko lhes contara e provou com a Asa do Corvo.

A reencarnação de Tsuchimikado Yakou.

Suzuka não conseguia ver a expressão de Harutora de sua posição. Atualmente, Harutora ainda estava envolto na Asa do Corvo – as roupas que Tsuchimikado Yakou costumava usar com frequência – enquanto ouvia as palavras de Yashamaru. Talvez por isso, o Harutora atualmente à frente de Suzuka parecia uma pessoa diferente do Harutora que ela conhecia.

... Bakatora...!

Sua garganta estava seca. Suzuka apertou os punhos com força, encarando as costas de Harutora.

As costas de Harutora começaram a tremer lentamente.

“... Meu nome é Harutora, Tsuchimikado Harutora.”

A tensão no coração de Suzuka foi aliviada no instante em que ela ouviu essas palavras. Um leve sorriso também apareceu na boca de Touji.

Em contraste...

“... Hmph.” A expressão de Yashamaru mudou.

Mas ele imediatamente voltou à sua antiga atitude.

“Entendo. Então deixe-me cumprimentá-lo novamente. Tsuchimikado Harutora-kun, estou muito feliz em conhecê-lo. Por favor, perdoe minha rude saudação, eu mal podia esperar. Afinal, o eu anterior poderia ser chamado de a maior autoridade em Yakou. Pensava nele enquanto estava acordado e dormindo.”

Yashamaru falou elegantemente enquanto encarava Harutora com uma expressão composta. Essa atitude era elegante e cavalheiresca, definitivamente não hipócrita, mas isso era apenas parte da natureza de seu pai – apenas superficialmente.

“Além disso, me atrasei em oferecer minha mão para você. Então, eu estava realmente pensando em assistir em silêncio por mais algum tempo... Mas as coisas saíram decentemente bem. Bem, eu tentei agir de forma independente assim.”

Depois que Suzuka ouviu isso, ela entendeu imediatamente a intenção de seu pai. Arrepios subiram por todo o corpo.

Ela gritou quase instintivamente.

“... Ba-Bakatora!”

Ela teve a coragem de tentar parar o pai na cara dele. A Suzuka de antes definitivamente não poderia ter feito isso.

Mas...

“Não dê ouvidos a ele! Esse cara é o líder do Sindicato dos Chifres Gêmeos! Foi ele quem levou os fanáticos em Yakou a realizar um ataque terrorista!”

Ela gritou desesperadamente. Ela estava assustada, tão assustada que estava no seu limite, mas os desenvolvimentos que se seguiriam... Se ela não falasse, seriam ainda mais assustadores e difíceis de aceitar.

Então, no momento em que sua voz estridente terminou de gritar, ela sentiu as correntes do pai que a haviam amarrado até agora um pouco mais frouxas. Certo, ela já era diferente de antes. Ela não era uma cobaia do Professor, ela era a Prodígio Dairenji Suzuka.

Yashamaru disse com um sorriso irônico:

“Ei, ei, Suzuka, você se dá bem com Harutora-kun, hein? Você deveria convidá-lo para se juntar a nós, se você quiser estar com ele.”

Suzuka ficou furiosa com as palavras do pai. O que ele quis dizer com ‘nós’? No coração do pai, Suzuka ainda estava do lado dele – não, ela estava ‘abaixo’ dele. Ela não podia perdoar como ele naturalmente considerava Suzuka alguém que pensava da mesma forma que ele.

“... Não seja ridículo!”

Ela comprimiu sua raiva e ódio e cuspiu. Embora ainda houvesse medo em sua voz, ela não podia deixar seu coração deformado. Ela fez o possível para encarar o pai, que tinha tomado uma expressão descontente.

Só então...

“... Primeiro, há duas coisas que quero confirmar.”

Foi Touji quem de repente interveio. Yashamaru respondeu agradavelmente:

“O que seria?”

Touji reuniu sua expressão e disse:

“Os Shikigami de antes eram seus?”

“Ho? Começar a partir da conclusão é uma das minhas técnicas favoritas. Você está falando sobre as Andorinhas Chicote? Sim, eram meus.”¹

Depois de dizer isso, Yashamaru lentamente alcançou o indicador e o dedo médio no bolso do colete. Ele sacou em câmera lenta um talismã dobrado, como se estivesse provocando o vigilante Touji.

Um talismã Shikigami. Com um movimento do dedo, uma coruja foi convocada.

Era o W12 Olho de Coruja criado pela Corporação Bruxaria. Era um Shikigami do tipo de detecção, um Shikigami feito pelo homem que compartilhava seus cinco sentidos com o praticante para investigação a longa distância e situações semelhantes. Mas, assim como as Andorinhas Chicote de antes, esse ‘Olho de Coruja’ havia sido extensivamente modificado. Em particular, suas penas – e seu corpo – pareciam negras.

Diferente do shikigami inorgânico e mecânico criado pela Agência Onmyou, a maioria dos Shikigami da Corporação Bruxaria tinha a forma de animais reais. Portanto, seus exteriores eram azuis para indicar que eram Shikigami. Essa mudança de cor era um requisito da Agência Onmyou e havia se tornado um padrão fundamental associado à magia. Como o ‘Olho de Coruja’ que Yashamaru convocou havia sido modificado, poderia ser descrito como um Shikigami já diferente do produto comercialmente disponível.

Então, Suzuka soltou um triste grito ‘Ah!’ no instante em que viu a coruja negra. Foi porque ela percebeu o truque que Yashamaru havia usado para controlar o grupo de Andorinhas Chicote. Ele provavelmente escondera o Olho de Coruja preto no céu noturno e observara os meandros da situação. O controle do voo das Andorinhas Chicote tinha que ter sido coordenado através deste Shikigami do tipo detecção.

Yashamaru levantou o braço direito. Depois que o Olho de Coruja preto bateu as asas algumas vezes, ele parou no braço de seu mestre. Seus olhos redondos de coruja que brilhavam na escuridão pareciam relacionados às lentes de seu monóculo.

“... E seu objetivo?” Touji perguntou.

“Haha, eu realmente não quero dizer isso porque sinto que vou ser odiado, mas o maior motivo foi porque eu queria me intrometer.”

Yashamaru riu se desculpando. Talvez esses fossem seus verdadeiros sentimentos.

Mas, por outro lado, era o estilo do pai nunca agir absolutamente sem calcular o valor da ação.

“Eu me mostrei pelas mesmas razões. Embora eu tenha suportado isso no início, o Bureau de Exorcismo acabou entrando... Eu queria tentar minhas cartas, não importava o quê. Na verdade, eu ganho algo. Originalmente, Shikigami sintéticos comercializados com pequenas modificações não deveriam corresponder a você, mesmo em grupo, se você estivesse usando a Asa do Corvo. Isso serve como prova de que Harutora-kun ainda não recuperou seu poder original... Ou suas memórias. Bem, é por isso que eu apareci tão descaradamente assim – não posso negar isso.”

Ele falou com uma maneira desorganizada de falar do começo ao fim.

Só então...

 

 

“Original?”

Harutora inclinou-se para a frente, talvez porque não pudesse ouvir de perto. Suzuka ainda não conseguia vislumbrar a expressão de Harutora da perspectiva dela, mas uma inquietação densa irradiava de sua voz e atitude.

“Você não ouviu? Eu sou...”

“Entendi. Próxima pergunta.”

Touji continuou à força, parando Harutora enquanto cerrava os dentes.

A atitude estranhamente agressiva de Harutora provou que ele ainda estava mentalmente angustiado, como esperado. Por outro lado, Touji sentiu-se, de alguma forma, hábil. Mesmo se ele estivesse longe do nível de Suzuka como praticante, ela poderia não conseguir igualá-lo quando se tratava de tenacidade e fortitude mental.

“Você é um Shikigami, certo? Isso significa que você tem um mestre, certo?”

Suzuka ficou surpresa com essa pergunta. Ela não tinha pensado tão longe também. Por outro lado...

“É claro.” Yashamaru respondeu simplesmente.

Touji sorriu – um sorriso sinistro.

“Entendo, então a próxima pergunta: Na verdade, tivemos uma briga com a mestra de um Shikigami chamado Kumomaru recentemente. É muito fácil associá-lo àquele Shikigami chamado Kumomaru, então você poderia estar relacionado?”

O corpo de Harutora ficou rígido por causa da pergunta de Touji e Suzuka quase engasgou.

Como resultado, Yashamaru assentiu com admiração.

“Bons instintos. Talvez eu realmente tenha encontrado uma mina de ouro... É verdade. Kumomaru e eu servimos a mesma mestra. Minha mestra é Souma Takiko, a Princesa do clã Souma...”

Touji se moveu antes que sua palavra fosse concluída.

“Primeiro selo, Purge!”

Ele gritou, transformando-se em um demônio em um flash e retirando a distância.

“O que!?”

O corpo de Touji estava coberto com uma armadura de samurai antes que os olhos de Suzuka pudessem se arregalar em surpresa. Touji avançou com animosidade em relação a Yashamaru.

Ele próprio iniciou as negociações e depois as separou com um ataque surpresa. Suzuka foi pega completamente desprevenida, mas Yashamaru ainda sorria, levando-o de frente sem se esquivar.

*CRASH!* O impacto atravessou o chão. Yashamaru, que se defendeu contra o ataque de Touji com um único braço, rapidamente balançou o braço com o qual havia defendido.

“Tch!” Touji foi enviado voando e se endireitou no ar. Suzuka ficou atordoada – mas Harutora não. Ele imediatamente seguiu o ataque surpresa de seu parceiro.

“Order!”

Ele correu para o lado e jogou um talismã – um dos que ainda restava – atrás dele. Ele já havia formado um selo manual para as Correntes de Ouro Imóveis quando o talismã estava formando trepadeiras. Desnecessário dizer que a Asa do Corvo também havia entrado em um estado de batalha e estava em guarda pelos ataques de Yashamaru.

“Minha nossa!” Yashamaru riu alegremente. “Tomar uma decisão sem pensar nisso. Quão jovem... Tudo bem.”

A figura de Yashamaru desapareceu.

No momento seguinte, a forma samurai Touji foi lançada voando por um chute direto.

Suas costas de repente colidiram com uma viga de aço exposta.

“Gah!?” Lag correu na armadura que cobria Touji - no momento, Yashamaru virou-se rapidamente, saltando em direção a Harutora. Ele se prendeu nas Correntes de Ouro Imóveis de Harutora. Yashamaru não se esquivou, nem se desmaterializou. Depois de pegar a magia que amarrava seu corpo inteiro, ele a quebrou à força.

A bainha inferior da Asa do Corvo disparou, cortando como várias lâminas no ar em direção a Yashamaru. No entanto, o Shikigami desviou de todas com a palma da mão, pousando habilmente na frente de Harutora. A Asa do Corvo forçou seu mestre a voltar antes daquele momento.

“... Sim, parece que você realmente não voltou ao seu estado anterior.”

Mas Yashamaru comentou com uma expressão relaxada, inclinando-se para a frente e fechando facilmente a distância em um ritmo acelerado.

“Ugh!?”

Harutora recuou mais uma vez. Como para encobrir esse movimento, Touji jogou um saco de cimento empilhado nas proximidades de Yashamaru. Mas Yashamaru desmaterializou-se instantaneamente e apareceu nas costas de Harutora.

A Asa do Corvo ferozmente cortou com todo o seu poder em seu ombro. Yashamaru deliberadamente riu alto, evitando o golpe da Asa do Corvo ondulante, esquivando-se para trás.

“Ufa.”

Ele exalou bruscamente, jogando diretamente uma cerca.

O golpe ágil e que se movia como um chicote sacudiu o ar noturno ao seu redor. Harutora foi lançado voando no ar como papel junto com a Asa do Corvo que o defendeu instantaneamente.

 

 

A Asa do Corvo estendeu sua bainha e envolveu um reforço, e Harutora conseguiu pousar no chão. Touji rugiu e correu para substituí-lo, mas Yashamaru pisou no chão com um ‘tsk tsk’, movendo-se para a esquerda e para a direita com passos saltitantes e evitando belamente os sucessivos ataques.

“Eu era muito bom quando era jovem, sabia?” Yashamaru levantou levemente os punhos com um sorriso frio, assumindo uma posição de boxe.

Mas ele abriu o punho muito rapidamente.

“Mas escusado será dizer que eu faço isso agora... Om jirijiri sowaka.”

Ele formou um selo Rakshasa com os dedos enluvados. Névoa negra jorrou, entrelaçando Touji e contraindo seus movimentos.

“Ugh!?” Yashamaru encolheu os ombros na frente de Touji enquanto cerrava os dentes.

“... म ...”

Uma sílaba-semente. A sílaba-semente do mantra Mahamayuri. O mantra atingiu o Touji enlaçado, fazendo-o voar novamente.

Harutora lançou magia de um talismã sem pausa.

“Hm, que rude.”

Com essas palavras, ele rapidamente tornou a mágica ineficaz. Ele ignorou o atordoado Harutora e agiu antes que a Asa do Corvo se defendesse automaticamente.

“On bishibishi karakara shibari sowaka.”

Correntes de Ouro Imóveis.

A entoação parecia não ter motivação, mas a energia mágica com a qual era infundida era imensa.

As Correntes de Ouro Imóveis amarraram a Asa do Corvo junto com Harutora. Harutora caiu no chão e, por outro lado, Touji levantou-se trêmulo depois de ser atingido de frente pelo mantra da sílaba-semente. Mas a armadura que cobria seu corpo estava sofrendo um Lag intenso e tremeluzia constantemente. Não importava continuar lutando, ele estava em um estado perigoso, onde tinha que liberar imediatamente sua transformação demoníaca.

O vencedor fora decidido.

Suzuka só foi capaz de assistir com os olhos arregalados durante esse tempo.

“... Bem?”

Yashamaru limpou a poeira de si mesmo, dando tapinhas em sua roupa, ainda sorrindo gentilmente.

“Embora isso tenha sua própria diversão, é um pouco vazio... Por favor, permita-me expressar minhas desculpas pela Princesa – minha mestra Souma Takiko – se deixar levar. Mas isso é uma questão completamente diferente, não? Por que você não pensa seriamente em considerar trilhar o caminho de Onmyoudou conosco?”

Ele falou extremamente sério. Mais uma vez, era inacreditável.

“Claro, minhas desculpas serão acompanhadas de reparações. Sinto muito pelas negociações anormais, mas considere o Ritual Taizan Fukun. Pode ser um pouco demais para mim dizer isso, mas você poderia me chamar de autoridade mundial em magia com almas, especialmente o Ritual Taizan Fukun. Eu mesmo sou uma evidência. Harutora-kun, não direi a você para fazer algo imprudente como desistir de sua vida. Embora possa haver algumas condições adicionais, eu definitivamente seria capaz de despertar lindamente essa garota – a isca, sua substituta, Tsuchimikado Natsume.”

Yashamaru falou alegremente com o Harutora imóvel.

Suzuka apertou os lábios. A proposta agora era uma coisa para Harutora, mas a incomodava ao extremo. Seu arrependimento não podia crescer mais.

Além disso, Yashamaru também falou com Touji.

“Você também, Touji-kun. Sua força só pode florescer no sentido mais verdadeiro sob minha orientação. Espero que você nos chame. Além disso, se você recusar, não importando o que... então não haverá o que fazer e eu o ajudarei recuperando esse Oni. Embora você tenha ficado ‘aqui’ por dois anos, você era originalmente alguém não relacionado a este mundo. Não é tarde demais para recuperar sua vida como uma pessoa comum. Você vai decidir tudo.”

Touji decidiu se tornar um Onmyouji para lidar com o Oni dentro dele. A proposta de Yashamaru estava relacionada às aspirações de Touji.

Então...

Yashamaru não falou com Suzuka.

Para o pai, o destino de Suzuka havia sido decidido desde o início.

Depois de dizer isso, Yashamaru liberou as Correntes de Ouro Imóveis de Harutora. Harutora levantou-se enquanto respirava com dificuldade, mas não tomou outras ações.

O Olho de Coruja batia as asas e voava acima de sua cabeça. Parecia que ele havia se retirado temporariamente do lado de fora do prédio durante a batalha. A coruja preta voltou ao lado do dono, descendo para o ombro dele.

Após o último bater das asas da coruja, um silêncio sufocante e cheio de desespero invadiu a área.

Harutora, Touji e Suzuka nem sequer mexeram um dedo. Um sorriso frio surgiu no rosto de Yashamaru enquanto ele encarava o grupo.

Nenhum deles sabia quanto tempo havia passado.

De repente, todo o edifício inacabado foi coberto por uma barreira. Não prestando atenção à Suzuka em pânico e aos outros, Yashamaru acenou calma e formalmente.

“Parece que as equipes de purificação de Desastres Espirituais de antes finalmente nos alcançaram. Tudo bem, vou partir por hoje.”

Palavras inesperadas. Mas Yashamaru abriu um sorriso na frente de Suzuka e dos outros.

“Pode ser um efeito de se tornar um Shikigami, mas tenho tirado muito mais conclusões do que na minha vida anterior. Bem, espero que você considere minha proposta novamente. Todos vocês... especialmente Harutora-kun. Estou ansioso para que tipo de respostas vocês darão.”

Mas Yashamaru continuou maliciosamente.

“Há um assunto precário em mãos. Tsuchimikado Natsume morreu sem nenhum preparo. Espero que você se lembre de que, mesmo se você se preparar para realizar o Ritual Taizan Fukun, seu tempo é extremamente limitado e não há tempo para se desperdiçar. Entendido?”

Depois dessas palavras finais, Yashamaru endireitou as costas sem esperar por uma resposta ou reação de Suzuka e dos outros.

Ele elegantemente posou e curvou-se educadamente. Então desapareceu sem som.

Ele desmaterializou-se. Além disso, era uma discrição quase perfeita que apenas um Shikigami poderia realizar. Embora esse prédio devesse ter sido trancado pela barreira dos exorcistas, parecia que não lhe causava nenhum problema. O Olho de Coruja bateu as asas e voltou a ser um talismã, queimando em um estalo. Com isso, todos os vestígios de Yashamaru desapareceram.

Segundos depois, holofotes brilhando iluminaram Suzuka, Harutora e Touji.

“Esta é a quinta equipe do Bureau de Exorcismo! Tsuchimikado Harutora, Ato Touji e Dairenji Suzuka. Rendam-se obedientemente! Resistência não será tolerada!”

Sapatos de couro tamborilaram no chão quando a equipe de purificação de Desastres Espirituais correu em direção ao andar em que Suzuka e os outros estavam. Assim como Yashamaru disse, eram os exorcistas de antes. Pela maneira como eles propositalmente anunciaram seus nomes, provavelmente já tinham pego em custódia Kyouko e Tenma, que ficaram para trás, e obtiveram essa informação. As posições daqueles dois piorariam se resistissem de forma imprudente.

“...!”

*BANG!* Touji socou o chão. Uma longa fenda atravessou o concreto.

“... Reboot.” Mas depois, Touji entoou o encantamento como se estivesse exalando todo o ar de seu corpo.

Suzuka caiu abruptamente no chão. Harutora abaixou a cabeça, cambaleando. Os exorcistas pediram que ele parasse, mas ele não os ouviu.

Na frente dele... estava Natsume.

“... Natsume.” Seu gemido estava molhado de lágrimas.

O cadáver de Natsume silenciosamente imóvel estava ali.

Depois, a quinta equipe do Bureau de Exorcismo prendeu Tsuchimikado Harutora, Ato Touji e Dairenji Suzuka.

Eles também coletaram o corpo de Tsuchimikado Natsume.

Os exorcistas haviam bloqueado a área ao redor do prédio inacabado. Espectadores se reuniram nos arredores, imaginando a comoção.

Do outro lado da estrada, longe daqueles espectadores.

“... Eu fui realmente estúpido por esperar algo desse Oni de um braço.”

Uma garota extremamente pequena olhou secretamente sobre a área através das sombras. Ela parecia ser uma estudante do ensino fundamental – no máximo – com uma aparência externa que tornava muito fácil para ela ser enviada até uma estação policial se fosse flagrada andando sozinha na estrada a essa hora.

No entanto – deixando de lado a Agência Onmyou por enquanto – a polícia ainda não havia conseguido notá-la. A garota estava se escondendo com muito cuidado também. No entanto, a razão pela qual ela estava tão escondida não era por causa da patrulha, mas porque ela estava atenta a um adversário ainda mais difícil.

Dairenji Suzuka não era a única que sabia o quão assustador ele era. Para ela, que sempre dedicava muita atenção, já era bastante perigoso ter se aproximado deste lugar sem os devidos preparativos.

Mas desta vez, ela tinha que testemunhar os desenvolvimentos, mesmo que isso representasse um risco.

“... Não há como evitar, eu vou ter que agir... Embora seja muito problemático...” A garota murmurou baixinho como se estivesse dizendo isso para si mesma. Contrastando com sua aparência inexpressiva, como uma boneca, suas palavras tinham genuína determinação.

Mas a questão era como agir. A garota temia que quase não houvesse tempo restante e que sua força fosse insuficiente. Não havia muito que ela pudesse fazer.

“...”

A garota pensou profundamente e seriamente, afastando-se rapidamente da área.

Acabara de chegar às dez da noite.

Não havia muito tempo para esperar, mas o amanhecer estava infinitamente distante.


Nota:

1 – No original, em japonês, a pergunta de Touji é feita de modo não-usual, partindo da conclusão para então questionar. Infelizmente, essa pergunta se perde em sentido ao trazer tanto ao inglês quanto ao português, fazendo com o mais próximo a ela seja a forma como foi aqui representada.



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